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Alterações do contrato de trabalho

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IV – Alterações Objetivas do Tipo Qualitativas

1 – Conceito

As alterações contratuais objetivas do tipo qualitativo podem ser definidas como alterações no objeto do contrato de trabalho que afetam a natureza das prestações pactuadas, ou seja, a estrutura constitutiva dessas prestações. A alteração de função é considerada como a alteração qualitativa principal.

2 – Alteração de Função

Indubitavelmente a alteração funcional é a mais recorrente e relevante alteração qualitativa assimilada pelo Direito do Trabalho.

A priori se faz necessária a distinção entre função e tarefa, nas palavras de Maurício Godinho Delgado,

Função é o conjunto sistemático de atividades, atribuições e poderes laborativos, integrados entre si, formando um todo unitário no contexto da divisão do trabalho estruturada no estabelecimento ou na empresa.(...)

A tarefa consiste em uma atividade laborativa específica, estrita e delimitada, existente na divisão do trabalho estruturada no estabelecimento ou na empresa. É uma atribuição ou ato singular no contexto da prestação laboral. [16]

Nessa linha de raciocínio, podemos concluir que a função nada mais é que um conjunto unitário e sistemático de tarefas, que impõe ao empregado um posicionamento específico dentro da empresa na qual presta serviços. Insta salientar que a função também pode envolver poderes, prerrogativas laborais que tem origem no contrato de trabalho. Porém também é possível que a função englobe uma única tarefa, mas isso é raro, o que normalmente ocorre é o englobamento de várias tarefas, atribuições, poderes e atos materiais concretos. Mas a simples execução de algumas tarefas componentes de uma outra função não implica necessariamente a ocorrência de uma alteração funcional, "é preciso que haja uma concentração significativa do conjunto de tarefas integrantes da enfocada função para que se configure a alteração funcional objetivada." [17]

As alterações funcionais podem ser: favoráveis ou desfavoráveis ao empregado.

As alterações funcionais favoráveis são lícitas, e normalmente resultam de um acordo que pode ser unilateral ou bilateral, porém existem alterações funcionais favoráveis que podem decorrer de alterações normativas.

As alterações funcionais desfavoráveis, em oposição às alterações funcionais favoráveis, são ilícitas, porém passíveis de discussão judicial. Aliás, dependo da gravidade da alteração de função, o empregado pode solicitar a rescisão indireta do contrato de trabalho, com fulcro no art. 483 da CLT [18].

Todavia, cumpre destacar que existem alterações funcionais lícitas, que aliás são muito comuns dentro das empresas, onde determinadas situações vivenciadas pelo empregador faz com que sejam necessárias tais alterações, são elas:

a) Situações excepcionais ou de emergência: são entendidas como parte do jus variandi, são alterações funcionais de curto tempo, em casos de emergência ou excepcionais, tem sempre caráter transitório, sem qualquer prejuízo salarial. São resultantes da aplicação combinada do art. 450 da CLT [19], Súmula 159 do TST [20], princípio da boa-fé e da lealdade.

b) Substituição Temporária: esta situação ocorre em casos específicos onde substituição temporária ou comissionamento interino resulta de situações intrínsecas à dinâmica da própria empresa, como por exemplo, substituições em caso de licença-maternidade, licenças previdenciárias, férias, etc.

Esse tipo de substituição guarda certa semelhança com a substituição excepcional ou de emergência, no que tange à temporariedade, porém decorrem de situações previsíveis pelo empregador.

c) Destituição do Cargo de Confiança ou Função de Confiança: Essa alteração contratual é específica, pois se trata de retorno ao cargo efetivo após a ocupação de cargo ou função de confiança (reversão). Para melhor compreensão deste tipo de alteração contratual, convém que façamos a distinção entre: reversão, retrocessão e rebaixamento.

Reversão – é o retorno ao cargo efetivo, após ocupação do cargo ou função de confiança. Art. 450 da CTL.

Retrocessão – é o retorno ao cargo ao longo efetivo anterior, sem se estar ocupando cargo de confiança. De um cargo efetivo mais alto para um mais baixo. (art. 444 e 468 da CLT).

Rebaixamento – é o retorno, determinado com o intuito punitivo ao cargo efetivo anterior mais baixo, após o empregado ter ocupado cargo mais alto. O rebaixamento é grosseiramente ilícito.

Prima face,esse tipo de alteração é prejudicial ao empregado, haja vista que, durante o exercício de tal função, nos moldes do art. 62, II [21] e parágrafo único; e 224, §2º da CLT [22].

Nos moldes do art. 499 da CLT [23], não há que se falar em estabilidade ou garantia de emprego aos trabalhadores em cargos de confiança empresarial. A reversão à função anteriormente exercida também é lícita, em decorrência desse tipo de função tem com o exercício do poder diretivo do empregador, conforme art. 468, parágrafo único, CLT. [24]

Todavia, convém destacar a Súmula 372 do TST [25], que dá ao empregado uma estabilidade financeira, vedando a supressão da gratificação a empregado que exerceu função de confiança por mais de 10 anos.

d) Extinção de Cargo ou de Função – a princípio será válida, desde que não cause prejuízo patrimonial ou moral para o empregado e haja afinidade entre a nova e a velha função.

e) Alteração de Plano de Cargos e Salários (PCS) ou Quadro de Carreira: A priori é lícita a alteração que resulte de modificação do PCS ou do quadro de carreira adotado pela empresa. É necessário que seja respeitado o novo posicionamento funcional do empregado, a qualificação profissional e o nível salarial. Por óbvio, não existe qualquer óbice quando tais alterações forem benéficas ao empregado.

f) Readaptação Funcional por Causa Previdenciária: Esse tipo de alteração contratual envolve empregado com deficiência física ou mental superveniente à sua contratação. A idéia do legislador foi a de manter o indivíduo com o vínculo empregatício, por vários motivos, que vão desde a sua inserção social, bem como seu sustento e o de sua família. Assim, o que se propõe com a readaptação é a preservação do emprego e da dignidade do trabalhador, porém tal alteração contratual, embora lícita sofre certa limitação, pois, é vedada a irredutibilidade garantia no art. 7º, VI da Constituição Federal.

Impende salientar que no moldes do art. 461, §4º da CLT [26], o empregado readaptado não pode servir de paradigma para equiparação salarial de outros empregados, ainda que exerçam funções idênticas.

g) Promoção ou Remoção:

Promoção é o ato pelo qual o empregado é transferido, em caráter permanente, com efetivas vantagens, na estrutura de cargos e funções da empresa, de uma categoria para outra categoria superior. Esta engloba duas variantes: progressão horizontal e progressão vertical.

A progressão horizontal é aquela através da qual o empregado passa a exercer outra função, entretanto, com o mesmo nível hierárquico, dessa forma o empregado é deslocado para outra função ou setor da empresa, mas sem que tal deslocamento afete de modo significativo sua situação funcional. Em um primeiro momento, desde que justificada, tal alteração é lícita, pois ainda que de forma unilateral, está no âmbito das alterações garantidas pelo poder diretivo do empregador. E a mesma só será ilícita caso resulte em prejuízos salariais e/ou profissionais graves. [27]

Já a progressão vertical é quando o empregado é deslocado de uma categoria inferior para uma categoria superior, com efetivas vantagens.

Devemos sempre ter em mente que a promoção implica necessariamente em melhorias para o empregado, seja de condições econômicas, seja de condições de hierarquia. Mas o simples fato de haver um aumento salarial não resulta em promoção se o empregado continuar exercendo as mesmas funções e tendo as mesmas responsabilidades.

Embora normalmente o empregado aceite a promoção, ele também pode se recusar a aceitar, com fulcro no art. 468 da CLT:

Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia. [grifo nosso].

Não é pacífico o entendimento de recusa por parte do empregado, mas é pacífico que, caso a empresa possua quadro de pessoal organizado em carreira, será impossível a recusa da promoção, pois, no ato da celebração do contrato já existia a previsão de ocupação de determinado cargo. De encontro a essa impossibilidade de recusa, temos a possibilidade de que o empregado em empresa com quadro de carreira se recuse a continuar exercendo a mesma função, se ele já preencheu os requisitos necessários para ser promovido e não o foi.

remoção importa na alteração circunstancial do contrato na qual o empregado é transferido do local de trabalho, de modo que seja necessária a mudança de sua residência.


V - ALTERAÇÕES OBJETIVAS DO TIPO QUANTITATIVO

1. Introdução

As alterações quantitativas são variações no objeto do contrato de trabalho, que atingem o montante das prestações pactuadas, apresentando como formas mais significativas as alterações na duração do trabalho e as alterações de salário.

Na doutrina podem ser encontradas diversas classificações e formas de abordagem sobre o assunto, uma delas, por exemplo, é a apresentada pelo Prof. Amauri Mascaro Nascimento [28], que prefere o estudo unificado das alterações objetivas quantitativas e qualitativas, inserindo as transferências e as hipóteses de suspensão do trabalho nesse contexto e remetendo as modificações na duração do labor para o capítulo referente à jornada de trabalho.

Nessa mesma linha, pode-se mencionar a abordagem conferida por Sérgio Pinto Martins [29], que também discute o tema sob o prisma unificado, porém com ênfase nas hipóteses de transferência de empregados.

Finalmente, Maurício Godinho Delgado [30] enfrenta a temática das alterações objetivas pormenorizadamente, sob uma óptica mais específica, classificando-a de acordo com seus diversos aspectos e conforme a natureza jurídica de cada uma das modificações contratuais existentes.

Por esta razão, em virtude do rigor técnico apresentado pela última vertente descrita, o presente trabalho adota a classificação segundo a qual as alterações objetivas são quantitativas (duração e salário) e qualitativas (local), restando inserida na primeira toda a matéria relativa à jornada de trabalho.

2. Alteração da Duração do Trabalho.

As modificações relativas à duração laborativa podem configurar três modalidades: a primeira, no sentido ampliativo da duração do trabalho; outra, no sentido redutor da duração do trabalho e, a terceira, nas alterações ocorridas no horário de trabalho, com ou sem influência na própria duração laborativa.

Antes do estudo de cada uma das referidas modalidades de alteração contratual, faz-se necessário relembrar qual a distinção entre os conceitos de duração do trabalho, jornada de trabalho e horário de trabalho.

Inicialmente duração do trabalho é a expressão mais ampla para designar o lapso de tempo de labor ou de disponibilidade do empregado ao empregador, em função do contrato de trabalho; abrange os distintos e crescentes módulos temporais de dedicação do trabalhador e pode ser diária, semanal, mensal e, até mesmo, anual. A CLT regula a duração do trabalho nos artigos 57 a 75, englobando a jornada, a duração semanal, os intervalos intra e interjornadas e repousos trabalhistas.

Depois, jornada de trabalho constitui a denominação em sentido mais restrito, compreendendo o tempo diário à disposição do empregador, ou seja, designa a mensuração diária do horário de trabalho. Por exemplo, a jornada de trabalho dos jornalistas é de seis horas diárias.

Por último, a expressão horário de trabalho é utilizada rigorosamente para referir o momento em que o trabalhador inicia e termina suas atividades laborativas. A CLT estabelece nos artigos 7º, 62 e 74 algumas normas relativas ao horário de trabalho, suscitando discussões acerca de três tipos de jornadas (controladas, não controladas e não tipificadas).

Cumpre ressaltar, desde logo, que a prorrogação da duração laborativa obreira enseja, via de regra, o pagamento do adicional correspondente às horas extraordinárias, consoante mandamento constitucional previsto no artigo 7º, XVI, CF/88. Exceto nas hipóteses de regime compensatório lícito e de força maior, em que aludido acréscimo não incide nas verbas salariais do trabalhador.

Além disso, em geral, devem ser observadas duas condições para a validade da dilação da jornada: a primeira, só é lícita a alteração por mútuo consentimento; e a segunda condição exige que não resulte em prejuízos para o obreiro.

A) Alterações Ampliativas da Duração do Trabalho

Quanto a esta espécie de variação da duração do trabalho, há de se ressaltar três aspectos relevantes, que se referem à classificação das alterações lícitas ampliadoras da duração laborativa obreira; às repercussões jurídicas das prorrogações ilicitamente realizadas; e aos efeitos jurídicos da prestação de horas suplementares.

a) Classificação das Alterações Ampliativas Lícitas

As modificações ampliativas da jornada consistem naquelas que alargam a duração do trabalho para além do estabelecido em contrato ou pela norma jurídica e podem ser lícitas ou ilícitas, obviamente, caso correspondam ou não à permissão constante do ordenamento jurídico.

As alterações lícitas podem ser classificadas conforme a Causa da Prorrogação; o Título Jurídico da Prorrogação e a Tipologia pelo Tempo Lícito de Prorrogação.

a.1) Causa da Prorrogação

No tocante à causa da prorrogação, ou seja, adotado como critério classificatório o fator motivador da alteração contratual, encontram-se englobadas as prorrogações por acordo; prorrogações por regime de compensação de jornada ou horários; necessidade imperiosa por motivo de força maior; para a realização de serviços inadiáveis ou cuja execução provoque prejuízos manifestos; e prorrogações para reposição de paralisações empresariais.

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Com efeito, a prorrogação de jornada por acordo, prevista no artigo 59, caput, da CLT, consiste na extensão do labor sem qualquer causa excepcional, mas decorre de mero acordo escrito bilateral ou negociação coletiva.

Frise-se que há relevante vertente de entendimento apontando no sentido de que o dispositivo consolidado supra descrito não teria sido recepcionado pela ordem constitucional vigente [31], em face da inexistência de um motivo relevante para justificar o sobretrabalho, máxime a previsão contida no mandamento constitucional do artigo 7º, XIII e XVI. Muito embora prevaleça que tenha ocorrido sua recepção pelo ordenamento maior, uma vez que a CF não limita a dilação da jornada de trabalho somente a situações excepcionais, mas fixa limites temporais diários e semanais.

Também, é oportuno mencionar a existência de corrente doutrinária e jurisprudencial segundo a qual, uma vez admitida a compatibilidade entre este regime e a Constituição, o título jurídico de tal prorrogação seria apenas aquele próprio da negociação coletiva [32], porque assim prevê o artigo 7º, inciso XIII, da CF e porque essa dilação é claramente desfavorável ao obreiro, afeta-lhe a saúde, bem como implica em riscos para a segurança no trabalho, além de suprimir a vantagem constitucionalmente garantida de 44 horas semanais.

Sustentando, ainda, que a jurisprudência dominante plasmada na Súmula 85, vem se referindo à possibilidade de acordo bilateral apenas no tocante ao regime compensatório clássico, favorável ao obreiro, e que, portanto, seria necessária negociação coletiva para a situação exposta pelo artigo 59, caput, CLT.

Entretanto, não parece ser razoável esta interpretação, uma vez que referido dispositivo constitucional do inciso XIII, refere-se a "acordo ou convenção coletiva de trabalho", e, toda vez que a Constituição quer remeter à negociação coletiva, o faz expressamente, conforme o inciso XIV do mesmo artigo 7º e no inciso VI do artigo 8º ou usando os termos "acordo coletivo" ou "acordo coletivo de trabalho", como nos incisos VI e XXVI, do artigo 7º, CF/88.

Assim, o inciso XIII do artigo em comento abrange o acordo individual e o coletivo de trabalho, além da convenção coletiva, caindo por terra a tese antagônica supramencionada.

Da mesma forma que a Súmula 85 suscitada não se refere ao acordo de prorrogação de jornada do caput, art. 59, mas à compensação do § 2º do mesmo artigo; tampouco sua leitura permite extrair a ilação de que haveria restrição quanto ao cabimento de mero acordo somente nas hipóteses de compensação de horários. Com efeito:

I- A compensação da jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva; II - O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido contrário (...) Súmula 85 TST.

Quanto à prorrogação pelo regime de compensação de jornada ou horários, prevista no artigo 7º, XIII, da CF e no § 2º do artigo 59, CLT, verifica-se dois sistemas de compensação. O primeiro, entendido como clássico [33], consiste na distribuição das horas de um dia pelos demais dias da semana, o que permite ao empregado, por exemplo, não trabalhar aos sábados, compensando mediante o acréscimo de uma hora extra diária de 2ª à 6ª feiras.

O segundo sistema de compensação retrata o parâmetro anual para o regime compensatório, conhecido na linguagem empresarial como banco de horas.

Inobstante tratar-se de tema pertencente ao capítulo da jornada de trabalho, que tem também como objeto de estudo a flexibilização, é oportuno tecer breves considerações a respeito desse regime compensatório.

Primeiramente, para relembrar que foi a L 9.601/98 introdutória do novo tipo de contrato a termo e de alterações no modelo compensatório tradicional, inaugurando a sistemática anual de compensação de horários.

Depois, o texto original permitia estabelecer blocos temporais de 120 dias para o regime compensatório, ao longo dos quais deveriam ocorrer os excessos e respectivas reduções de jornada de trabalho, respeitados os limites de duas horas suplementares ao dia.

No entanto, tal modelo teve o parâmetro excessivamente ampliado para um ano, através da edição da Medida Provisória nº 1.709/1998, renovada por MPs sucessivas, sendo a última com validade indeterminada, a MP nº 2.164-41/01.

Consigne-se que há respeitável corrente doutrinária que defende não ser sensata a extensão do parâmetro da flexibilização compensatória para um ano, não se verificando a extensão ponderada das horas complementares, posto que a jornada extenuante de labor contínuo durante semanas e meses ao longo do ano, cria riscos à saúde do obreiro e à segurança no trabalho, em evidente afronta ao estabelecido pelo artigo 7º, XXII, da Carta Magna.

Por outro lado, admitida referida modalidade de flexibilização de jornada, pelas mesmas razões anteriormente descritas acerca da possibilidade de mero acordo bilateral autorizar a compensação, também aqui, existe a mesma celeuma sobre a viabilidade ou não desse instrumento, para a aplicação do banco de horas ao contrato individual de trabalho.

Vale mencionar, ainda, a existência das Orientações Jurisprudenciais 182 e 223 da SDI-I/TST e o novo texto da Súmula 85 do mesmo Tribunal, que foram editadas com a intenção de reduzir tais debates, entretanto, sem o êxito esperado, pois a controvérsia não parece estar pacificada.

No que se refere à prorrogação da duração do trabalho para atendimento de necessidade imperiosa por motivo de força maior, descrita no artigo 61, caput e § 2º CLT, constitui modalidade de prorrogação excepcional, decorrente de fato extraordinário, incomum, que se considera situada dentro do jus variandi empresarial.

É importante ressaltar que a definição legal de força maior no âmbito do direito laboral encontra-se no artigo 501, CLT; e que, restará afastada sua configuração sempre que houver imprevidência por parte do empregador e caso não ocorra repercussões previstas no § 2º desse artigo.

Da mesma forma, a prorrogação para atendimento de necessidade imperiosa derivada de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto, disposta também pelo artigo 61, encontra-se igualmente amparada no jus variandi do empregador.

A extensão de jornada para reposição de paralisações empresariais, prevista pelo § 3º do artigo 61 do Estatuto Consolidado, corresponde às dilações com vistas à recuperação de tempo perdido pela sustação do trabalho decorrente de causas acidentais ou por força maior, que impossibilitou a realização do serviço.

Trata-se, também, de situação excepcional permissiva da prorrogação da duração normal de trabalho, que também pode resultar de ato unilateral do empregador.

a.2) Título Jurídico da Prorrogação

Após a análise da dilação temporal laborativa segundo a Causa da Prorrogação, passa-se agora, ao estudo da classificação conforme a espécie de Título Jurídico, ou seja, segundo o meio hábil para se deflagrar referida a extensão lícita da jornada de trabalho. São três os instrumentos: o ato unilateral do empregador; ato bilateral das partes e ato coletivamente negociado no contexto da relação de emprego.

Sob este prisma, as prorrogações por ato unilateral do empregador são aquelas derivadas do poder de direção, no exercício do já mencionado jus variandi e, são três as previstas no artigo 61 da CLT, todas já analisadas neste trabalho: dilações decorrentes de necessidade imperiosa por força maior; necessidade imperiosa devido a serviço inadiável ou cuja inexecução possa resultar manifesto prejuízo; e prorrogações dirigidas à reposição de paralisações empresariais por causas acidentais ou por força maior.

As prorrogações derivadas de ato bilateral das partes, por sua vez, abrangem duas modalidades previstas pelo artigo 59, CLT. A primeira refere-se ao acordo de prorrogação de jornada, no caput; e a segunda, relativa ao acordo de compensação de jornada, no § 2º.

As prorrogações por ato coletivamente negociado, ao seu turno, abarcam os instrumentos da manifestação da autonomia privada coletiva admitidos pela ordem jurídica, que podem figurar, também, tanto no regime compensatório, quanto na prorrogação de jornada.

Vale lembrar que, também será permitido à negociação coletiva fixar regras jurídicas para delimitar as condições de exercício do jus variandi empresarial, nos casos de força maior e serviços inadiáveis, porque a negociação coletiva pode estabelecer regras mais favoráveis ao trabalhador, restringindo prerrogativas legais estabelecidas em benefício dos empregadores.

a.3) Tipologia pelo Tempo Lícito de Prorrogação

De acordo com o último critério de classificação das Alterações Ampliativas Lícitas da Duração do Trabalho, a Tipologia pelo Tempo Lícito de Prorrogação, são cinco as espécies de prorrogação existentes, considerando o tempo permitido à dilação da jornada, as já mencionadas: extensão da jornada por acordo; prorrogação por regime compensatório de horas; por necessidade imperiosa para conclusão de serviços inadiáveis e em decorrência de força maior; e prorrogação para reposição de paralisações.

Sob este enfoque, observada a ordem seqüencial, desde o tempo mais curto de prorrogação ao mais extenso; tem-se que a prorrogação por regime compensatório de horas é autorizativa de dilação de duas horas extras diárias, sem efetiva ampliação da jornada semanal do obreiro, constitui a alteração do § 2º do artigo 59 da CLT, que dispõe sobre o limite máximo de dez horas diárias.

Por conseguinte, a prorrogação para reposição de paralisações, também, autoriza a ampliação da jornada em duas horas diárias, durante 45 dias no ano, podendo representar até 12 horas extras semanais, alcançando mais de 50 horas de sobrejornada no mês, por 45 dias, repita-se.

A prorrogação por acordo, segundo o exposto, é aquela relativa às horas meramente suplementares, que, nos mesmos moldes da anterior, permite dilação de duas horas diárias, sem limitação temporal prévia no ano.

Depois, a prorrogação por necessidade imperiosa decorrente de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto, que autoriza aumento de quatro horas extras diárias e vinte e quatro horas semanais. (§ 2º, art.61, in fine).

Embora aparentemente inexista limite temporal para esta modalidade de prorrogação de jornada, a excepcionalidade da autorização enseja a observância de fronteiras máximas no que tange aos dias ou semanas sob este regime de sobretempo, que se verificam diante da cessação do fator extraordinário que o justificou em dado momento.

Por último, a quinta modalidade de extensão da duração do trabalho, segundo a tipologia pelo tempo lícito de prorrogação, consiste na necessidade imperiosa decorrente de força maior, a qual, também, à primeira vista, autoriza a dilação sem limites temporais. Mas, consoante exposto, encontra-se restringida em face da superação do acontecimento inevitável que ensejou a medida excepcional.

b) Prorrogações Irregularmente Procedidas.

As prorrogações podem ser regulares ou irregulares, de acordo com sua harmonização às normas jurídicas incidentes sobre o tema.

Obviamente, são irregulares as dilações que não atendem aos requisitos fixados através das normas jurídicas vigentes. Para fins práticos, não há distinção relevante entre estas e aquelas ampliações regularmente constituídas, porque a teoria das nulidades prevalecente no âmbito do Direito Laboral confere os mesmo efeitos jurídicos das prorrogações lícitas ou ilícitas.

Isto ocorre porque é inviável a devolução ao obreiro de sua força de trabalho transferida ao empregador, que, por outro lado, se enriqueceria sem fundamento válido se não fosse compelido a remunerar as horas extraordinárias irregulares acrescidas do adicional correspondente.

Merece destaque apenas, o disposto pelo artigo 75 da CLT, que prevê a incidência de punições administrativas ao empregador que de forma irregular se vale do trabalho extraordinário.

c) Efeitos Jurídicos do Trabalho Extraordinário.

De acordo com o que já foi ressaltado, em regra, a jornada extraordinária cumprida pelo empregado será devida com sobrerremuneração específica do artigo 7º, XVI, CF/88, exceto a resultante de regular regime de compensação e necessidade imperiosa derivada de força maior.

Consigne-se que, há respeitável vertente de entendimento sustentando que há incidência de adicional de horas extras, mesmo naquelas hipóteses de prorrogações por força maior e para reposição de paralisações, com fulcro no disposto pela norma constitucional supracitada.

Entretanto, prevalece que, no caso de força maior, a remuneração será paga como normal, conforme infere-se do disposto na primeira parte do § 2º do artigo 61, CLT, que estabelece como limite mínimo a ser pago o valor da hora normal, mas nada menciona quanto à sobrerremuneração.

Situação semelhante acontece na hipótese do § 3º, que trata da prorrogação para reposição de paralisações, em que também não incide o adicional de 50%, mas somente em virtude do critério diferenciador da força maior e, portanto, não abrange as reposições derivadas de causas acidentais diversas do critério supramencionado.

Vale lembrar, também, que as horas extras recebidas habitualmente e seu respectivo adicional, integram o salário para todos os fins, refletindo-se nas parcelas trabalhistas e previdenciárias. Não havendo, por outro lado, a habitualidade da aludida prestação, não haverá essa repercussão no contrato de trabalho.

Portanto, as horas extras e seu adicional têm caráter de salário condição, isto é, as verbas podem ser suprimidas na hipótese de superveniente desaparecimento do sobrelabor. Este entendimento, atualmente, encontra-se descrito na Súmula 291, TST, que, entretanto, prevê o pagamento de uma indenização pela supressão das horas extras habituais (as quais, a propósito, perderão a natureza salarial, cessando os reflexos sobre os demais pagamentos nelas respaldados [34])

Finalmente, o cálculo do trabalho suplementar é composto do valor da hora normal, integrado por parcelas de natureza salarial e acrescido do adicional previsto em lei, contrato, instrumento de negociação ou sentença normativa, sendo este entendimento plasmado na Súmula 264 do TST.

Cumpre salientar que, hoje, o adicional de horas extras é de 50%, revogado, portanto, o antigo percentual do artigo 59, §1º CLT, salvo índice mais favorável previsto nas demais fontes do direito laboral.

B) Alterações Redutoras da Duração do Trabalho

As alterações redutoras da duração do trabalho são aquelas que diminuem o tempo de labor ou de disponibilidade do obreiro por período menor que o padrão fixado no contrato empregatício ou na norma jurídica. Podem ser classificadas segundo seu título jurídico autorizativo ou conforme a causa motivadora de sua ocorrência.

As primeiras englobam as reduções por ato unilateral do empregador; as autorizadas por acordo bilateral e as reduções por negociação coletiva.

As reduções de jornada por ato unilateral do empregador ou bilateral das partes somente são consideradas válidas se não implicarem em diminuição de salário, ressalvados os casos em que a redução tiver ocorrido em atendimento a específico interesse extracontratual do empregado.

Quanto às alterações por negociação coletiva, estas podem até mesmo ensejar redução salarial, em virtude da previsão expressa no artigo 7º, VI da Constituição Federal.

As alterações redutoras classificadas segundo sua causa são as decorrentes de motivo de força maior ou prejuízos comprovados; as derivadas de conjuntura econômica adversa e aquelas reduções provocadas por interesse do trabalhador.

C) Alterações de Horário de Trabalho

São modificações que atingem o posicionamento da jornada de trabalho no contexto da distribuição diária e semanal do labor pelo empregado. Podem ser: alterações no mesmo horário; alterações do horário noturno para o diurno e vice versa.

Observado o princípio da inalterabilidade contratual lesiva do artigo 468, CLT, considera-se lícita toda alteração de horário no mesmo turno, em virtude da manifestação do jus variandi próprio da atividade empresarial na relação de emprego.

Da mesma forma, tem prevalecido a aceitação como válida a transferência do turno noturno para o diurno, ainda que haja perda salarial pela supressão do adicional correspondente. Porque se trata de medida mais benéfica sob qualquer outro ponto de vista. Mas há quem entenda ilícita esta modificação [35].

Quanto à terceira modalidade de alteração de horário de trabalho, considera-se ilícita a transferência do empregado do turno diurno para o noturno, tendo em vista o evidente prejuízo nos diversos aspectos da vida em sociedade, inobstante o pagamento de adicional e o acréscimo da hora ficta.

3. Alteração de Salário

As alterações contratuais objetivas quantitativas também englobam as modificações do salário, podendo ser positivas ou negativas, considerado o montante percebido pelo trabalhador.

A) Elevações Salariais

As alterações positivas de salário não merecem maiores considerações, em virtude de que, a princípio, são modificações lícitas do contrato empregatício, mais favoráveis ao obreiro.

B) Reduções Salariais

As reduções salariais, ao seu turno, podem ser diretas ou indiretas. As primeiras envolvem tanto a redução nominal do salário, quanto sua redução real.

Tendo em vista a vedação expressa pela ordem jurídica vigente, pode-se afirmar que as reduções salariais são, em regra, ilícitas. Entretanto, existem situações que autorizam alterações redutoras, dentro do jus variandi.

a) Redução Salarial Direta

A redução salarial direta pode ser nominal ou real. A primeira é aquela que atinge a expressão numérica da remuneração, a qual é vedada seja pela renúncia, ato unilateral do empregador ou acordo bilateral.

Todavia, a proibição não alcança as parcelas de natureza salarial que se enquadrem como salário condição, ou seja, aquelas verbas que são devidas somente em decorrência de uma contraprestação específica, as quais, uma vez cessadas no contrato de trabalho, autoriza-se a supressão da fração salarial respectiva; é o que ocorre com os adicionais, por exemplo.

A redução real de salários, por sua vez, consiste naquela que atinge o efetivo valor econômico monetário da remuneração, diminuindo-a sob o aspecto substantivo.

Vale lembrar que a ordem jurídica atual não apresenta mecanismos eficazes contra a desvalorização da moeda e, conseqüentemente, do salário real. Após o advento do Plano Real, estabeleceu-se a desindexação de salários, inexistindo hoje reajustes automáticos, melhor assim (...).

b) Redução Salarial Indireta

Consiste na hipótese de alteração objetiva quantitativa decorrente de mudança em cláusula contratual distinta da regulatória do salário, mas que repercute no nível remuneratório.

Trata-se de alteração contratual lesiva, sendo, em regra, proibida no Direito do Trabalho. Entretanto, a norma comporta exceções, considerando válidas algumas modificações autorizadas por norma coletiva de trabalho, com fulcro na parte final do inciso VI do artigo 7º da Carta Magna.

Cumpre mencionar, ainda, que existem situações de redução salarial indireta tipificadas pela lei como hipóteses de justa causa empresarial, ensejando a rescisão indireta do contrato de trabalho, de acordo com o artigo 483, alíneas d e g e § 3º, CLT.

Da mesma forma, o ordenamento veda a redução da zona de trabalho de vendedor viajante ou pracista, que importe em redução de salário.

Nesta seara, a Lei do Empregado Vendedor - Lei 3.207/57, em seu artigo 2º, § 2º, assegura ao empregado "como mínimo de remuneração, um salário correspondente à média dos 12 últimos meses...". entretanto, caso a alteração da zona de trabalho não produza redução salarial, será considerada lícita.

Consigne-se que a principal modalidade de pagamento salarial utilizada no cotidiano dos profissionais vendedores se dá através de comissões. Logo, a comissão tem natureza jurídica salarial e sujeita-se à regra da irredutibilidade, "salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo".

Obviamente, o princípio da irredutibilidade na hipótese se adéqua ao caráter variável da parcela salarial, o que obsta ao empregador a diminuição do parâmetro de cálculo das comissões; do contrário, terá que garantir que a média final não signifique redução salarial - em atenção ao dispositivo da lei especial supramencionada.

Finalmente, há de se ressaltar que, a comissão consiste em espécie de salário variável, portanto, está sujeita à regra protetiva fixada tanto pelo artigo 78, CLT, quanto pelo VII, do artigo 7º da CF, ou seja, tem a garantia de salário nunca inferior ao mínimo previsto para o empregado comissionista.

Questão que tem despertado debates interessantes é a que se refere ao critério de prescrição a ser adotado nas hipóteses de prejuízo derivado de alteração contratual ocorrida no período da prescrição qüinqüenal, ou seja, no período anterior a cinco anos da data do ajuizamento da ação trabalhista.

De acordo a corrente perfilhada pelo TST, nas situações em que a concessão do direito pleiteado depende do reconhecimento da legalidade ou ilegalidade da alteração do pactuado, a alteração e as parcelas dela decorrentes resultam de um ato único para efeitos de prescrição, o que gera a prescrição total, segundo o disposto na Súmula 294 do TST, abaixo transcrita:

294. PRESCRIÇÃO. ALTERAÇÃO CONTRATUAL. TRABALHADOR URBANO. Tratando-se de demanda que envolva pedido de prestações sucessivas decorrente de alteração do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o direito à parcela esteja também assegurado por preceito de lei. (g.n.)

Por outro lado, há auspiciosa corrente jurisprudencial, que sustenta, havendo alteração contratual ilícita, com prejuízo decorrente de redução mensal do salário, a lesão passa a ocorrer periodicamente e, como tal se renova mês a mês, devendo, por isso, ser pronunciada apenas a prescrição parcial do direito de ação.

Porém, parece prevalecer que a prescrição a ser aplicada é a total, porque a modificação contratual redutora do salário deu-se em ato único e em período anterior aos cinco anos do prazo prescricional e também porque as diferenças salariais reivindicadas decorreram de ajuste contratual e não de dispositivo da legislação, hipótese que afasta a prescrição parcial, consoante o entendimento plasmado na Súmula 294 C. TST.

4. Negociação Coletiva nas Alterações Quantitativas do Contrato de Trabalho

A negociação coletiva constitui o processo de autocomposição de interesses específicos dos atores sociais, legitimados pelos representantes dos trabalhadores e empregadores na busca de entendimento para a elaboração de convenções ou acordos coletivos, através dos quais fixam condições de trabalho que têm aplicação cogente sobre os contratos individuais.

A Constituição Federal de 1988 inovou em relação à negociação coletiva e instituiu a possibilidade de flexibilização das relações de trabalho, que resultará na redução ou na reconfiguração autônoma, negociadas coletivamente, dos direitos trabalhistas vigentes, com o propósito de preservar os empregos nos períodos de crise econômica.

Não se pode, entretanto, confundir a flexibilização das condições de trabalho com a desregulamentação do Direito do Trabalho [36], pois esta simplesmente "retira a proteção do Estado ao trabalhador, permitindo que a autonomia privada , individual ou coletiva regule as condições de trabalho e os direitos e obrigações advindos da relação de emprego" [37].

Além disso, a desregulamentação pura e simples do Direito do Trabalho representa a negação do princípio extraído do art. 7º da Constituição Federal, de que os trabalhadores urbanos e rurais têm assegurada uma relação jurídica protegido por um rol mínimo de direitos trabalhistas, cujo traço marcante é aderir automaticamente a toda e qualquer relação individual de trabalho, independentemente da vontade das partes.

A teoria da desregulamentação, que na verdade, significa trabalho desprotegido, não encontra ressonância na Constituição Federal, pois o princípio da proteção dos trabalhadores nas relações jurídicas trabalhistas propõe um patamar mínimo de direitos que independem da vontade dos interessados. Quanto às alterações contratuais sob análise, a Constituição Federal ao mesmo tempo que consagra o princípio da irredutibilidade salarial; por outro lado, reconhece a força normativa dos instrumentos de negociação coletiva e promove a mitigação do princípio suscitado, permitindo que a norma autônoma negociada venha a autorizar a redução de salários.

Diante dessa realidade, há quem defenda inexistir limites à negociação coletiva. No entanto, segundo Maurício Godinho Delgado, melhor é a interpretação que atende aos fins teleológicos da norma e da ordem jurídica, para reconhecer a existência de limites à autonomia privada coletiva.

Com efeito, são amplas as possibilidades de validade e eficácia das normas coletivas à luz do princípio da adequação setorial negociada. Entretanto, está claro que essas possibilidades não são plenas e irrefreáveis, uma vez que o aludido princípio não alcança os direitos revestidos de indisponibilidade absoluta, integrantes do chamado patamar civilizatório mínimo.

A respeito, o artigo 503 da CLT dispõe que: "É lícita, em caso de força maior ou prejuízo os devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25%, respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região."

Especialmente para situação econômica adversa, o artigo 2º, da Lei n. 4.923, de 1965, que Institui o Cadastro Permanente das Admissões e Dispensas de Empregados, Estabelece Medidas Contra o Desemprego e de Assistência aos Desempregados, e dá outras Providências, prevê, mediante negociação coletiva, redução de jornada e salário:

A empresa que, em face da conjuntura econômica, devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução de jornada normal ou do número de dias do trabalho, poderá fazê-lo, mediante prévio acordo com a entidade sindical representativa dos seus empregados, homologado pela Delegacia Regional do Trabalho, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável, nas mesmas condições, se ainda indispensável, e sempre de modo que a redução do salário mensal resultante não seja superior a 25% (vinte e cinco por cento) do salário contratual, respeitado o salário mínimo regional e reduzidas proporcionalmente a remuneração e as gratificações de gerentes e diretores.

Parte da doutrina entende que a Constituição Federal, ao possibilitar redução salarial mediante negociação coletiva, delegou às partes poder de decisão, no plano coletivo, sobre limitar, ou não, redução dos salários ou jornada.

Nesse sentido, Pedro Paulo Teixeira Manus [38] (2001:92): "Entendemos que o art. 7º, VI, da Constituição Federal, revogou tacitamente o art. 503 da CLT, à medida que limitou as possibilidades de redução salarial à negociação coletiva. Estaria, assim, mesmo na hipótese de prejuízo, sujeita à negociação coletiva a possibilidade de redução."

Para Sérgio Pinto Martins [39] (2006:565), o artigo 503 da CLT foi revogado, porque, após a Constituição Federal de 1988, a redução dos salários só é possível mediante negociação coletiva, in verbis:

Mesmo havendo prejuízo ou motivo de força maior, o salário não pode ser reduzido unilateralmente pelo empregador, mas poderá ser mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho. A Constituição não fixa também proporcionalidade aos salários para efeito de redução. A proporcionalidade da redução será determinada na convenção ou acordo coletivo, podendo até mesmo ser superior a 25%, dependendo da negociação coletiva, pois a Lei Maior não especifica limites, que serão estabelecidos na norma coletiva.

Por outro lado, Mauricio Godinho Delgado [40] (2002:1010) pondera que, em hipóteses de situação econômica adversa, a negociação coletiva deve se adaptar ao disposto no artigo 2º, da Lei n. 4.923, de 1965, que prevê limite de redução salarial a 25%, in verbis:

Parece claro que a Constituição recepcionou, em parte, antigos preceitos legais que estabeleciam parâmetros para a redução salarial (critério da motivação tipificada) – agora submetidos tais preceitos, sempre, ao crivo da negociação coletiva. Desse modo, a redução permitida pela norma autônoma negociada teria de se enquadrar nas situações de força maior ou prejuízos devidamente comprovados (art. 503, da CLT) ou, pelo menos, conjuntura econômica adversa (Lei n. 4.923, de 1965), respeitado o percentual máximo de 25% de redução e o salário mínimo legal (art. 503, da CLT). Esta parece-nos a interpretação que melhor atende aos princípios teleológicos de qualquer norma e ordem jurídica (fins acentuados no Direito do Trabalho, relembre-se); que melhor atende também ao princípio da norma mais favorável, imperante no ramo justrabalhista; a interpretação, por fim, que melhor se harmoniza ao critério hermenêutico que sempre busca encontrar no Direito a noção de sistema, isto é, um conjunto de partes coordenadas entre si.

A despeito da divergência doutrinária sobre limites da negociação coletiva, deverá prevalecer o princípio da razoabilidade. Se por um lado a crise atual exige renúncia a parcelas importantes ao sustento dos trabalhadores, por outro se deve respeitar patamares civilizatórios mínimos, mesmo diante da flexibilização autorizada constitucionalmente, pois é inconcebível a uma sociedade que respeita dignidade humana e valorização mínima deferível ao trabalho reduzir direitos a níveis de miserabilidade (DELGADO, ibidem:137).

Desse modo, verifica-se o relevante papel das negociações coletivas no Direito Laboral moderno, sobretudo, aplicável às hipóteses das alterações objetivas quantitativas aqui estudadas, sendo certo, também, que suas possibilidades não são ilimitadas, conforme amplamente demonstrado acima.

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Sobre os autores
Ramón Júlio Suarez Romaris

Advogado. Especialista em Direito do Trabalho pela PUC/SP.

Elessandra Santos Marques Válio

Advogada. Especialista em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Mestre em Direito Constitucional, Doutoranda em Direito pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMARIS, Ramón Júlio Suarez ; VÁLIO, Elessandra Santos Marques. Alterações do contrato de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3125, 21 jan. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20909. Acesso em: 20 abr. 2024.

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