Fomos a uma solenidade de conclusão de curso de uma Faculdade de Direito, vinculada a um Centro Universitário de relativa expressão na Capital Mineira e nos surpreendemos com fatos e atitudes inusitados, principalmente porque proporcionados por instituição de ensino que, pela sua própria natureza, deveria ser protagonista exemplar no atendimento às regras constitucionais do Estado de Direito em que estamos inseridos.
Pelo contrário, sentimo-nos em ambiente próprio de Estado Totalitário na realização de festejos político-militares.
Chegamos, pontualmente, às 16 horas, horário de início da solenidade, e deparamos com os portões fechados do Teatro Minas Centro, que haviam sido cerrados 10 minutos antes, por ordem da Reitoria, não entendemos a que pretexto. Foram reabertos 25 minutos após, para entrada das várias centenas de pessoas que se espremiam no calor e na confusão das escadarias de acesso ao local. Era a “segunda chamada”, grotesca, como percebemos, fazendo com que nós todos ali perdêssemos algumas partes do evento para o qual nos preparamos, nos vestimos, em pleno domingo à tarde, em homenagem a formandos do nosso ciclo de amizade ou de nossos laços familiares.
Não parou por aí. Seguranças esparramados aos borbotões, com os tradicionais fones de ouvido e vestidos de preto, com caras de poucos amigos, revistavam as bolsas das mulheres, à procura de apitos e outros apetrechos que pudessem fazer barulho e “incomodar” a festividade. Voltemos à informação: seguranças revistavam as pessoas, com comandos imperativos para invasão do interior de suas bolsas, sob pena, numa eventual recusa, de ter a entrada impedida ao recinto, a despeito dos bilhetes de acesso distribuídos antecipadamente pela Comissão de Formatura.
É de se perguntar: com que autoridade a Faculdade, o Centro Universitário, a Segurança, sua preposta, cometeram tais sortes de absurdo? Será que não sabem que o direito de revista pessoal pertence ao Poder Público, à Administração Pública, em casos excepcionais e justificados? Que a Busca e Apreensão somente podem ser efetivadas por agentes públicos, segundo ditames constitucionais e processuais penais, de objetos que causem risco à incolumidade pública ou que sirvam para instrução de procedimento de natureza criminal?
Ficamos em dúvida sobre estarmos adentrando em evento militar ou policial e imediatamente nos lembramos que essas Organizações tratam, sempre, e atualmente, os seus convidados com maior respeito e mais dignidade. Começam, também, é óbvio, as suas comemorações em horário pontual, mas não impedem a entrada de quem, em cidade deste porte, com características peculiares de trânsito, em deslocamentos longos, pode estar sujeito a pequenos atrasos e ser punido, é claro, somente pelo tempo que extrapolar por decorrência dessa eventualidade, não sendo obrigado a amargar a espera injustificável de quase meia hora por segunda reabertura dos portões.
Lá dentro, o tempo todo, os seguranças avançavam sobre pessoas que tentavam fotografar, da plateia, o seu parente no palco, chegando a dar tapas em suas mãos e braços e, pior, entravam em meio às fileiras de cadeiras, para arrebatar dos jovens, idosos e idosas, entusiasmados com a vitória escolar de seus amigos, irmãos, filhos e netos, os apitos e pequenas buzinas com que manifestavam sua satisfação em momento significativo da vida de todos eles.
As manifestações, comuns, na chamada nominal do formando para recebimento do seu diploma, passaram a ser oportunidade de barulho ao aplaudir o concluinte do curso e, simultaneamente, por grande parte da plateia, de vaia estrondosa aos leões de chácara, que investiam sobre os presentes à procura dos objetos da proibição, como se fossem drogas ilícitas ou perigosas armas de fogo.
Ficamos revoltados com o festival de truculência que presenciamos e nossa atenção se desviou do foco da formatura para o cenário de intolerância e desrespeito às pessoas.
A Constituição Federal deixa claro que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” [1]. Perguntamos: qual é a lei que proíbe silvos de apitos e troar de pequenas buzinas em eventos desta natureza? Será que existe e não nos demos conta?
Parece que o Centro Universitário não concorda com as explosões de alegria que essas ocasiões sugerem e proporcionam. É assim no mundo todo. Lembram-se das vuvuzelas no Campeonato Mundial de Futebol, na África do Sul? Foram consideradas ilegais ou criminosas? Foram apreendidas?
Apitos, confetes, serpentinas, buzinas, balões e fotografias são expressões tradicionais de contentamento e felicidade e não podem, de jeito nenhum, ser grosseiramente reprimidas. Somos um País Tropical, terra do Carnaval, da alegria e do calor humano!
O Chefe do Cerimonial, com sua voz gutural de locutor de rádio FM [2], só faltou declarar, alto e bom som, que era terminantemente vedada qualquer manifestação de alegria entre formandos e seus queridos convidados e que deixassem essas frivolidades para fora do ambiente universitário!
Foi um espetáculo trágico!
Lamentável em todos os sentidos, o evento marcou também por se tratar de formatura de Curso Jurídico. Sugere, tranquilamente, dúvida quanto ao conteúdo do ensino ministrado a essa amostragem discente. O que lhes terá sido ensinado como conceito de Liberdades Democráticas? E de Direito Constitucional? Sobre garantias fundamentais? E sobre o Poder de Polícia?
Pela demonstração naquilo que é o coroamento do trabalho de cinco anos de duração do curso, é preferível não conhecer as respostas!
Notas
[1] BRASIL, Constituição da República Federativa – Art. 5º, II.
[2] Frequência Modulada