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Improbidade sindical

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A natureza de tributo que se atribui à contribuição sindical, somada ao interesse coletivo oriundo da atuação das entidades sindicais, implica na necessidade de controle da probidade e da legalidade dos atos praticados por dirigentes sindicais.

SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. AUTONOMIA SINDICAL. 3. LIMITES À AUTONOMIA SINDICAL.4. IMPROBIDADE ADMINISTINISTRATIVA SINDICAL. CONCLUSÃO


1. INTRODUÇÃO

As associações sindicais, pessoas jurídicas de direito privado, são titulares de autonomia administrativa e financeira, ao passo que mantidas, em regra, por contribuições de seus associados, nos termos delimitados em estatuto próprio. A interferência sobre a administração das entidades sindicais, portanto, encontra óbice nos princípios da liberdade e da autonomia sindical. Quer dizer, ao Estado, aos empregadores e às próprias entidades sindicais umas em relação às outras é vedada, em princípio, a interferência na administração, cujas decisões devem ficar a encargo da diretoria eleita pelos respectivos filiados.

Não obstante, a natureza de tributo que se atribui à contribuição sindical, somada ao interesse coletivo oriundo da atuação das entidades sindicais, implica na necessidade de controle da probidade e da legalidade dos atos praticados por dirigentes sindicais.

Certamente, a autonomia dos sindicatos não pode ser confundida como impossibilidade de atuação estatal quando presente indícios de violação a interesses dos trabalhadores e ao ordenamento jurídico.


2. AUTONOMIA SINDICAL

A liberdade sindical trilhou longa trajetória de lutas travadas pelos trabalhadores. Sua elevação à condição de direito fundamental, materializada através de declarações internacionais de direitos humanos, é fruto de um processo evolutivo fortemente marcado pela busca do reconhecimento da fragilidade do trabalhador individualmente considerado (OLIVEIRA, 2009:53).

A Constituição da Organização Internacional do Trabalho - OIT, cuja última redação foi aprovada na 29ª Conferência Internacional do Trabalho realizada no ano de 1946, em seu preâmbulo, faz menção expressa à defesa da liberdade sindical. Outrossim, em 18 de junho de 1998, na 86ª Conferência, aprovou-se a Declaração da OIT relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, cujo artigo 2º estabelece como princípios, dentre outros, a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva[1].

Efetivamente, a liberdade sindical passa a ser compreendida como pressuposto básico dos direitos humanos e da democracia após a 2ª Guerra Mundial, mais precisamente em 1948, quando a OIT editou a Convenção n. 87 com o objetivo de tutelar a liberdade sindical. Sem dúvida alguma, dentre os diversos instrumentos de direito internacionais, a Convenção 87 é o mais significativo ao tratar da liberdade sindical, cumprindo o importante papel de atuar como diretriz para os ordenamentos nacionais a respeito do tema. Seu texto conta com mais de cem ratificações. O Brasil, entretanto, não integra esse grupo de nações por conta da manutenção no Texto Constitucional de 1988 da unicidade e do imposto sindical (OLIVEIRA, 2009:66).

Especificamente, a Convenção n. 87 da OIT busca assegurar aos trabalhadores, empregadores e aos próprios sindicatos autonomia relacionadas à constituição de novas entidades; filiação às entidades existentes; elaboração de estatutos e regulamentos; eleição; gestão e organização de programas de ação; além da existência livre de dissolução administrativa:

ARTIGO 2

Os trabalhadores e as entidades patronais, sem distinção de qualquer espécie, têm o direito, sem autorização prévia, de constituírem organizações da sua escolha, assim como o de se filiarem nessas organizações, com a única condição de se conformarem com os estatutos destas últimas.

ARTIGO 3

1. As organizações de trabalhadores e de entidades patronais têm o direito de elaborar os seus estatutos e regulamentos administrativos, de eleger livremente os seus representantes, organizar a sua gestão e a sua actividade e formular o seu programa de acção.

2. As autoridades públicas devem abster-se de qualquer intervenção susceptível de limitar esse direito ou de entravar o seu exercício legal.

ARTIGO 4

As organizações de trabalhadores e de entidades patronais não estão sujeitas à dissolução ou à suspensão por via administrativa.

A Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade sindical e a não interferência estatal na atividade dos sindicatos:

Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;

A liberdade sindical, igualmente, é manifestação do direito de associação no âmbito trabalhista (NASCIMENTO, 2006:145). A autonomia sindical é núcleo essencial da liberdade sindical. Sem autonomia sindical não é possível vislumbrar um modelo de liberdade sindical como direito fundamental. Trata-se, pois, de eixo para a interpretação das normas jurídicas em matéria sindical. A autonomia sindical se dirige principalmente ao Poder Público, objetivando evitar interferências indevidas na atuação sindical. Mas também se destina aos particulares por conta da eficácia horizontal dos direitos fundamentais. A autonomia sindical, pois, deve ser observada pelo Estado, pelos empregadores e pelos próprios sindicatos (BRITO PEREIRA, 2011:20/21).

Essa autonomia coletiva funda-se na idéia de uma ordem sindical baseada na liberdade política, com redução da interferência estatal, resultando em uma visão distante do controle estatal sobre a organização e a ação dos sindicatos. A autonomia coletiva favorece o direito à livre negociação coletiva do que resulta a transferência de poder normativo do Estado para os sindicatos. Trata-se, pois, de auto elaboração da regra jurídica, bem como de tutela sindical ao invés da tutela estatal. Quer dizer, diferenciando os direitos tutelados pelo Estado dos direitos tutelados pelo sindicato (NASCIMENTO, 2006:137 e 142).

A autonomia sindical manifesta-se por intermédio de uma série de prerrogativas das entidades sindicais.  Trata-se de poder que os sindicatos têm de organizar, sem intervenção estranha, o seu governo e fixar regras jurídicas dentro de um círculo de competência preestabelecido pelo Estado (ROMITA, 2005:332).

A liberdade de administração do sindicato é decorrência do princípio da liberdade sindical e se divide nas idéias de democracia interna e autarquia externa. Primeiramente, ao elaborar seus estatutos, o sindicato acaba por definir as regras do processo eleitoral, cujo conteúdo deve atentar para o princípio democrático, segundo qual a todos os trabalhadores representados pela entidade sindical deverá ser possibilitada a participação no pleito.  A autarquia externa diz respeito à liberdade conferida ao sindicato em administrar-se sem interferência externa.  O controle e a fiscalização dos atos da diretoria do sindicato competente aos seus próprios órgãos (assembléia, conselho fiscal e outros previstos em estatuto). Não sendo excluída, por certo, a atuação jurisdicional quando provocada pelos interessados (NASCIMENTO, 2006:147/148).


3. LIMITES À AUTONOMIA SINDICAL

O grau de intervenção do Estado na criação, manutenção e extinção dos sindicatos reflete no reconhecimento da existência da autonomia sindical, cuja origem decorre do princípio da liberdade sindical. Entretanto, a tutela jurídica sobre a liberdade sindical, na diretriz adotada para a liberdade de associação, prima pelo princípio da legalidade. Nessa linha, sindicatos e dirigentes sindicais devem pautar sua conduta de acordo com o ordenamento jurídico, o qual, por sua vez, não poderá atuar como instrumento de limitação da liberdade sindical. Apresenta-se, pois, um conflito constante entre a liberdade de atuação dos sindicatos e o poder regulador do Estado inerente às relações sociais (OLIVEIRA, 2009:49).

Não obstante ao reconhecimento da liberdade sindical, devem os atores sindicais primar pela observância da legalidade, segundo o estabelecido pela própria Convenção n. 87 da OIT, artigo 8º:

ARTIGO 8

1. No exercício dos direitos que lhe são reconhecidos pela presente Convenção, os trabalhadores, entidades patronais e respectivas organizações são obrigados, à semelhança das outras pessoas ou colectividades organizadas, a respeitar a legalidade.

A autonomia sindical não é absoluta. No âmbito do direito civil, a autonomia da vontade oriunda do liberalismo sofre limitações perante os direitos fundamentais. Da mesma forma a autonomia sindical, cujo conteúdo não goza de caráter absoluto capaz de se sobrepor aos demais direitos. Quer dizer, a autonomia sindical requer limitação em prol dos interesses da própria coletividade representada pelo sindicato. A propósito, estabelece o Decreto-Lei n. 200/67, artigo 183, que as entidades privadas que recebem contribuições parafiscais e que prestam serviços de interesse público ou social estão sujeitas à fiscalização do Estado.

A autonomia dos sindicatos não significa soberania. Embora autônoma em sua organização interna, aos sindicatos recai a obrigação de observância do ordenamento jurídico estatal. A associação profissional tem sua autonomia limitada pelo direito dos indivíduos e dos demais grupos sociais, incumbindo ao Estado velar pelo respeito a esse direito. Enfim, a associação sindical responde perante a ordem jurídica pelas ofensas que cometer contra direitos alheios como qualquer sujeito de direito (ROMITA, 2005:332).

BRITO PEREIRA classifica a liberdade sindical como princípio para, então, defender a possibilidade de atuação do estado para disciplinar os conflitos decorrentes. Além da intervenção estatal e dos empregadores, deve-se considerar a possibilidade de atuação estatal em face de práticas abusivas, tais como a perpetuação de dirigentes mediante a manipulação do processo eleitoral, a cobrança de taxas abusivas em prejuízo aos trabalhadores integrantes da categoria e, ainda, o desvio de receita sindical (BRITO PEREIRA, 2011:27/28).

Deve-se diferenciar a atuação estatal oriunda do Poder Executivo daquela exercida pelo Poder Judiciário. Especificamente, a intervenção judicial se dá a partir de princípio do devido processo legal que abrange o contraditório e a ampla defesa, o que não ocorre em relação ao Executivo, cuja atuação está fundada no poder de polícia da Administração. A atuação do Judiciário, pois, garante à entidade sindical e aos seus dirigentes livre manifestação para defender a legalidade dos atos praticados. Nessa linha, o entendimento do Comitê de Liberdade Sindical da OIT através dos Precedentes 464 e 465:

464. Los principios enunciados en el artículo 3 del Convenio núm. 87 no impiden el control de la actividad interna de un sindicato si ésta viola disposiciones legales o estatutarias. Pero es importante que el control de las actividades internas de un sindicato y la adopción de medidas de suspensión o disolución queden en manos de las autoridades judiciales, no sólo para garantizar un procedimiento imparcial y objetivo y para asegurar los derechos de la defensa (que sólo pueden ser garantizados plenamente por un procedimiento judicial normal), sino también para evitar el peligro de que las medidas adoptadas por las autoridades administrativas parezcan arbitrarias. (Véase Recopilación de 1996, párrafo 426.)

465. No debería procederse a un control externo sino en casos excepcionales, cuando existen circunstancias graves que lo justifi quen, ya que de otro modo se corre el riesgo de restringir el derecho que, en virtud del artículo 3 del Convenio núm. 87, tienen las organizaciones de trabajadores de organizar su administración y sus actividades sin una intervención de las autoridades públicas que tienda a limitar este derecho o a entorpecer su ejercicio legal. El Comité estimo que cuando la ley confi ere las facultades de intervención a un funcionario judicial, contra cuyas decisiones existe el recurso ante el Tribunal Supremo, y que la petición para lograr dicha intervención debe ser apoyada por una proporción importante de la categoría profesional de que se trate, no se produce violación de los principios antes mencionados.(Véase Recopilación de 1996, párrafo 427.)

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A respeito do sistema sindical brasileiro, cujas características marcantes são a presença da unicidade e da contribuição compulsória, é mais importante ter sindicatos e garantir espaços para que possam agir, do que restringir sua atuação em decorrência do sistema vigente. Entretanto, a finalidade do sindicato é a representação dos trabalhadores e empregadores, sendo, pois, inadmissível a existência de entidade que se destina tão somente a beneficiar alguns dirigentes (BRITO PEREIRA, 2011:23).


4. IMPROBIDADE ADMINISTINISTRATIVA SINDICAL

O substantivo feminino probidade significa a qualidade do que é probo, integridade, honestidade e retidão. Seu antônimo, o também substantivo feminino improbidade diz respeito à desonestidade, ação má, perversa, maldade ou perversidade[2].

A improbidade administrativa, por sua vez, constitui violação ao princípio constitucional da probidade administrativa, isto é, o dever do agente público agir sempre com probidade (honestidade, decência, honradez) na gestão dos negócios públicos (PAZZAGLINI, 2009:02).

Para a defesa do patrimônio público, a responsabilização dos infratores requer uma análise da moralidade administrativa, princípio da Administração Pública. A improbidade administrativa liga-se à teoria do desvio de poder ou de finalidade. O ato imoral em seus fins viola o princípio da legalidade, razão pela qual pode ser questionado via ação civil pública, cuja legitimidade, dentre outros, recai sobre o Ministério Público (MAZZILI, 2012:196/197).

Estabelece o artigo 37 da Constituição Federal não só os princípios que regem os atos administrativos, como também as penalidades cabíveis para os casos de improbidade administrativa:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

No âmbito infraconstitucional, os atos de improbidade são classificados pela Lei n. 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa - LIA, artigos 9, 10 e 11, como atos que importam em enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao erário e aqueles que atentam contra os princípios da Administração Pública. A análise da conduta do agente público, portanto, deve se pautar nas hipóteses de tipificação de improbidade previstas na LIA.

Além de tipificar as condutas que receberam o rótulo de atos de improbidade, a LIA também especifica quais serão os sujeitos dos atos de improbidade. Quer dizer, quais entidades poderão ser vítimas de atos de improbidade, bem como quais sujeitos poderão ser responsabilizados por tais atos. O artigo 1º da LIA estabelece, portanto, quais são as pessoas jurídicas que podem ser sujeitos passivos (vítimas) de atos de improbidade, bem como aqueles, agentes públicos ou particulares, que poderão ser responsabilizados por tais atos:

Lei n. 8.429/92

Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos. (destacou-se)

Os sindicatos, em regra, não recebem verbas do Poder Público diretamente. Como visto, suas receitas provêm de contribuições dos trabalhadores e empregadores. Dentre as várias contribuições que compõem a base do custeio sindical, entretanto, destaca-se a contribuição sindical, estabelecida em lei, cuja obrigatoriedade vinculada a todos os integrantes da categoria, do que resulta sua natureza de tributo.

Estabelece o Código Tributário que tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada (CTN, art. 3º). De fato, a contribuição sindical representa prestação pecuniária imposta ao obrigado e a ser adimplida mediante pagamento de determinado valor. Da mesma forma, não se trata de sanção por ato ilícito, mas sim obrigação prevista em lei (CF, artigo 149, CLT, artigos 578/610, CTN, artigo 217, I), decorrente da condição de integrante de determinada categoria (OLIVEIRA, 2009:85/86).

A respeito da natureza jurídica de tributo atribuída à contribuição sindical, já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

CONSTITUCIONAL. SINDICATO. CONTRIBUIÇÃO INSTITUÍDA PELA ASSEMBLÉIA GERAL: CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO. NÃO COMPULSORIEDADE. EMPREGADOS NÃO SINDICALIZADOS: IMPOSSIBILIDADE DO DESCONTO. C.F., art. 8º, IV. I. - A contribuição confederativa, instituída pela assembléia geral - C.F., art. 8º, IV - distingue-se da contribuição sindical, instituída por lei, com caráter tributário - C.F., art. 149 - assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato. II. - R.E. não conhecido (RE nº. 198.092-3-SP).[3]

Certamente, são também públicos os recursos que determinados setores da população, por força de preceitos legais e independentemente de qualquer contraprestação direta e imediata, estão obrigados a repassar a certas entidades. Os valores da contribuição sindical são captados do público, isto é, da parte que integra a categoria profissional, de forma compulsória. A pessoa que pertence a uma categoria profissional está obrigada a contribuir, de maneira semelhante ao que ocorre com os impostos, que são também obrigatórios e captados da população, do público em geral (TULIO, 2008:27/28).

Não custa lembrar que os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais ficam equiparados ao crime de peculato (CLT, artigo 522). Igualmente, estão também sujeitos de responsabilização nos termos da LIA os atos praticados em prejuízo do patrimônio das entidades sindicais, tendo em vista tratarem-se de entidade custeada com recursos de natureza tributária (LIA, artigo 1º, § único).

Deve-se tutelar o interesse dos trabalhadores e empregadores que integram determinada categoria em não haver atos de improbidade, desvio de valores e demais irregularidades em prejuízo da administração da entidade sindical, sem prejuízo da responsabilização criminal. Certamente, há o interesse dessa coletividade em afastar da direção sindical indivíduos que pratiquem atos de improbidade; que atuem de forma contrária aos interesses dos representados; que, enfim, pratiquem o enriquecimento pessoal à custa das contribuições de trabalhadores e empregadores.

A responsabilização de dirigentes sindicais também decorre do princípio da liberdade sindical, ao passo que se deve afastar da atividade sindical aquele que não contribui para a efetivação da liberdade sindical. Especificamente, aquele que transforma a entidade sindical em mero ente arrecadador, mas desprovido de atuação efetiva na busca de melhores condições aos representados através do processo de negociação coletiva.

Portanto, as condutas praticadas por dirigentes sindicais que importem em enriquecimento ilícito decorrente da aferição de qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade; qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação ou dilapidação dos bens ou haveres da entidade sindical; bem como a prática de ato que atente contra os princípios da administração, especificamente qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade à entidade sindical, devidamente tipificados como atos de improbidade, são passíveis de responsabilização nos termos da LIA (LIA, artigos 9º/11).

A esse respeito, citam-se como exemplos ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual na Justiça do Trabalho em face do Prefeito e do Secretário de Educação do Município de Turilândia, Estado do Maranhão, por intervenção indevida no sindicato dos servidores municipais[4], bem como ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual em face do Presidente da Confederação Nacional do Transporte pelo suposto desvio de recursos de contribuições sindicais destinadas a entidades do Sistema S[5].

Semelhantemente, decidiu a Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público do Trabalho no processo administrativo n. 9945/2009[6]:

Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das associações ou entidades sindicais, por estarem equiparados ao crime de peculato (art. 552, CLT) e serem possíveis de acarretar a destituição de diretores ou de membro de conselho (alínea (c), artigo 553, CLT), afetando a representatividade disposta no inciso III, artigo 8º, da Constituição da República, assim como por atraírem a aplicação das disposições sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos por atos de improbidade (Artigo 1º, § único, c/c artigo 7º, Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992), são de interesse público tutelável pelo parquet trabalhista.


CONCLUSÃO

A autonomia sindical requer limitação em prol dos interesses da própria coletividade representada pelo sindicato. Certamente, a natureza de tributo que se atribui à contribuição sindical, somada ao interesse coletivo oriundo da atuação das entidades sindicais, implica na necessidade de controle da probidade e da legalidade dos atos praticados por dirigentes sindicais.


BIBLIOGRAFIA

1.            ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Landolfo. Interesses difusos e coletivos. São Paulo: Editora Método, 2011.

2.            BARBOZA, Márcia Noll. Definição de improbidade administrativa. In Cem perguntas e respostas sobre improbidade administrativa. Incidência e aplicação da Lei n. 8429/1992. Coordenadora Márcia Noll Barboza. Brasília: ESMPU, 2008.

3.            BRITO PEREIRA, Ricardo José Macêdo. Revisitando o conceito de autonomia sindical. in Temas de Direito Sindical. Homenagem a José Cláudio Monteiro de Frito Filho. São Paulo: LTr, 2011.

4.            KAUFMANN, Marcus de Oliveira. Das práticas anti-sindicais às práticas anti-representativas. Sistema de combate e a tutela de representações coletivas de trabalhadores. São Paulo: LTr, 2005.

5.            MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2002.

6.            MAZZILI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 25ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

7.            NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de direito sindical. São Paulo: LTr, 2006.

8.            OLIVEIRA, Alberto Emiliano de Neto. Contribuições Sindicais. São Paulo: LTr, 2009.

9.            PARGENDLER, Mariana Souza. A ressignificação do princípio da autonomia privada: o abandono do voluntarismo e a ascensão do valor de autodeterminação da pessoa. In http://www.ufrgs.br/propesq/livro2/artigo_mariana.htm, acessado em 30 de agosto de 2011.  

10.         PAZZAGLINI, Marino Filho. Lei de improbidade administrativa comentada. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2009.

11.         ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2005.

12.         SANTOS, Ronaldo Lima dos. Teoria das normas coletivas. São Paulo: LTr, 2007.

13.         TULIO, Denise Vinci. Sujeitos passivos dos atos de improbidade administrativa. In Cem perguntas e respostas sobre improbidade administrativa. Incidência e aplicação da Lei n. 8429/1992. Coordenadora Márcia Noll Barboza. Brasília: ESMPU, 2008.

14.         Dicionário Houassis. http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm, acessado em 20/03/2012.

15.         http://www.mp.ma.gov.br

16.         http://www.estadao.com.br

17.         https://intranet.pgt.mpt.gov.br

18.         http://www.oit.org.br


Notas

[1] http://www.oit.org.br/sites/default/files/topic/decent_work/doc/constituicao_oit_538.pdf, acessado em 16/01/2012;  http://www.oit.org.br/sites/default/files/topic/oit/doc/declaracao_oit_547.pdf, acessados em 16/01/12.

[2] http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm, acessado em 20/03/2012.

[3] No mesmo sentido RE 176638, RE 177154, RE 183730, RE 184266, RE 190477, e RE 192725.

[4] http://www.mp.ma.gov.br/site/DetalhesNoticiaGeral.mtw?noticia_id=5232, ACESSADO EM 17/07/11.

[5] http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110227/not_imp685148,0.php, acessado em 17/07/11.

[6] https://intranet.pgt.mpt.gov.br/camara/consultavoto.php?ementa=pesq&idprocesso=35700&np=9945/2009&data=09/29/2009%2000:00:00, acessado em 22/03/12.

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Sobre o autor
Alberto Emiliano de Oliveira Neto

Procurador do Trabalho da Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA NETO, Alberto Emiliano. Improbidade sindical. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3187, 23 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21354. Acesso em: 19 abr. 2024.

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