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A pretensão cientificista do juspositivismo e seu afastamento do ideal de justiça

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06 – CONCLUSÃO

A justiça, conquanto seja de difícil definição e possa contar com alguma mutabilidade em sua concepção em cada época especificamente examinada, é um ideal humano cuja persecução e concretização devem se dar diuturna e incessantemente, pois se constitui em elemento indispensável para preservação das sociedades.

A lei é um instrumento de intervenção social que, por sua essência e fins, carece de guardar estreito viés com a justiça, pois sem esta não se vislumbra possível atingir suas finalidade pragmáticas de realização da segurança, paz social e bem comum, ou seja, de um mínimo de justiça nas relações sociais.

 O direito enquanto ciência vale-se de um método sistemático e racional para descoberta de suas verdades e produção do conhecimento, porém dito método não pode subverter a essência do objeto examinado. Assim, demonstra-se inadequada e, em verdade, irreal, a pretensão juspositivista de privar o direito de qualquer conotação valorativa, pois os valores são o substrato de que deve se valer o Exercente do Poder Legislativo para editar as normas que integrarão o ordenamento jurídico, sob pena de o produto legislado, servir de mero instrumento de afirmação política, desgarrado dos legítimos interesses sociais.

O desvirtuamento da lei do sentimento de justiça, acolhido e prezado por determinada sociedade, constitui-se em ofensa tão severa e profunda que abala os termos fundamentais em que se estrutura o pacto de convivência e cooperação existente entre os indivíduos integrados em cada organização social, autorizando-os, na ausência de outros meios efetivos de resistência a esta modalidade de arbítrio, a se valerem da desobediência civil.


BIBLIOGRAFIA.

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LAMAS, Lívia Paula de Almeida. O positivismo jurídico e a norma injusta. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 93, 01/10/2011. Disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10466. Acesso em 06/11/2011.

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WOLKMER, Antonio Carlos. Fundamentos de História do Direito. 2ª Ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.


Notas

[1] Neste sentido, Machado Paupério (Paupério, 1983/161) afirma que: Sob o enfoque especificamente jurídico, porém, a justiça, fundamento do direito, é, segundo Aristóteles e Santo Tomás (v. do Doutor Angélico a Summa Theologica, IIa. IIae.., qu. 57 et s.), a virtude que tem por objeto a partilha do meu e do teu, dentro de um grupo social.

[2] Segundo Chris Rohmann (Rohmann, 2000/339) “Rawls acredita que a sociedade justa não é simplesmente aquela que garante ”o melhor bem para o maior número de pessoas”, na qual os atos são julgados pelas consequências, mas também aquela que leva em conta o interesse próprio e as aspirações pessoais, Postula um acordo entre partes isoladas atrás de um hipotético “véu da ignorância” de seus próprios atributos, posição social e convicções morais. Em tal situação, em vez de tentar elevar ao máximo a própria vantagem, já que não sabem qual seria ela, procuram diminuir ao mínimo a sua possível desvantagem, A essa “postura original”, diz Rawls, seguem-se dois princípios inevitáveis: primeiro, cada pessoa precisa ter o máximo de liberdade individual que seja compatível com a liberdade dos outros de desfrutar dos mesmos privilégios; e, segundo, quaisquer desigualdades sociais e econômicas devem oferecer a maior vantagem possível para os menos privilegiados e deve provir de ocupações e cargos oficiais a cujo acesso deve haver oportunidades igualitárias.

[3] A Bíblia Cristã noticia que Moisés recebeu de Deus diversas Leis, muitas delas constantes no Livro Levítico, e no Deuteronômio encontram-se os Dez Mandamentos, os quais estatuem não apenas normas religiosas, como a devoção incondicional a Deus, mas também outras, de convivência social, tais como: não matar, não furtar, não desejar a mulher do próximo e não levantar falso testemunho.

[4] Conveniente é destacar as seguintes afirmações de Fustel de Coulagens: Devemos reconhecer que os antigos, salvo algumas raras inteligências superiores, jamais representaram Deus como um ser único exercendo sua ação sobre o universo. Cada um de seus inumeráveis deuses tinha o seu pequeno domínio; uma família, uma tribo, uma cidade; esse era um mundo que bastava à providência de cada um. (Coulagens, 2002/165). “Ordinariamente, com efeito, os deuses tinham grande desvelo na proteção à sua urbe; observe-se, em Virgílio, como Juno “se esforça e trabalha” para que sua Cartago alcance o império do mundo. Cada um dos deuses, com a Juno de Virgílio, cuidava só do engrandecimento de sua cidade. Os deuses tinham os mesmos interesses dos homens seus concidadãos”. (Coulagens, 2002/167).

[5] Segundo Hobbes (Hobbes, 2001/101): Lei natural — lex naturalis — é um preceito ou regra geral, estabelecido pela razão, mediante o qual se proíbe a um homem fazer tudo o que possa destruir sua vida, privá-lo dos meios necessários para preservá-la ou omitir aquilo que pense poder contribuir melhor para preservá-la.

[6] Montesquieu também vai se valer desta idéia afirmando que (Montesquieu 2002/22) “A lei em geral, é a razão humana, uma vez que ela governa todos os povos da terra; e as leis políticas e civis de cada nação devem representar apenas os casos particulares em que se aplica essa razão humana”.

[7] Em uma definição simples, porém, contundente podemos, com Paulo Dourado de Gusmão (GUSMÃO, 1997/370) definir o positivismo jurídico como sendo a “corrente do pensamento jurídico para qual não existe outro direito senão aquele positivo”.

[8] Para Kelsen (KELSEN, 2000/33) “uma ordem jurídica é um sistema de normas gerais e individuais que estão ligadas entre si pelo fato de a criação de toda e qualquer norma que pertença este sistema ser determinada por outra norma do sistema e, em última linha, pela sua norma fundamental.

[9] Bobbio define o sistema dinâmico como sendo (BOBBIO, 1999/72) “aquele no qual as normas que o compõem derivam umas das outras através de sucessivas delegações de poder, isto é, não através de seu conteúdo, mas através da autoridade que as colocou; uma autoridade inferior deriva de uma autoridade superior, até que chega à autoridade suprema que não tem nenhuma outra acima de si. Pode-se dizer que a relação entre as várias normas é, nesse tipo normativo, não material, mas formal”.

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[10] Para Bobbio (BOBBIO, 1999/113): “A coerência não é condição de validade, mas é sempre condição para a justiça do ordenamento. É evidente que quando duas normas contraditórias são ambas válidas, e pode haver indiferentemente a aplicação de uma ou de outra, conforme o livre-arbítrio daqueles que são chamados a aplicá-las, são violadas duas exigências fundamentais em que se inspiram ou tendem a inspirar-se os ordenamentos jurídicos: a exigência da certeza (que corresponde ao valor da paz ou da ordem), e a exigência da justiça (que corresponde ao valor da igualdade). Onde existem duas normas antinômicas, ambas válidas, e portanto ambas aplicáveis, o ordenamento jurídico não consegue garantir nem a certeza, entendida como possibilidade, por parte do cidadão, de prever com exatidão as conseqüências jurídicas da própria conduta, nem a justiça, entendida como o igual tratamento das pessoas que pertencem à mesma categoria”.

[11] O Mestre italiano ensina que (BOBBIO, 1999/115) ” Por “completude” entende-se a propriedade pela qual um ordenamento jurídico tem uma norma para regular qualquer caso. Uma vez que a falta de uma norma se chama geralmente “lacuna” (num sentido do termo “lacuna”), “completude” significa “falta de lacunas”. Em outras palavras, um ordenamento é completo quando o juiz pode encontrar nele uma norma para regular qualquer caso que se lhe apresente, ou melhor, não há caso que não possa ser regulado com uma norma tirada do sistema.”

[12] São fontes do direito aqueles fatos ou atos aos quais um determinado ordenamento jurídico atribui a competência ou a capacidade de produzir normas jurídicas. (BOBBIO, 1999/161)

[13] Segundo Maria Garcia (Garcia, 2003/142): “A desobediência civil, segundo Bobbio, é uma forma particular de desobediência, na media em que é executada “como fim de mostrar publicamente a injustiça da lei e como fim de induzir o legislador a mudá-la. Como tal, é justificada pelo transgressor de justificativas que levem à sua considerarão não apenas como lícita, mas como obrigatória e seja admitida pelas autoridades públicas, diversamente do que ocorre com outras transgressões. Habermas chama a desobediência civil de “pedra de toque do Estado Democrático de Direito: todo Estado Democrático de Direito que está seguro de si mesmo considera que a desobediência civil é uma parte componente normal da sua cultura política, precisamente porque é necessária”. E anota a definição de Rawls, em sua Teoria da Justiça: “um ato público, não violento, consciente e político, contrário á lei, cometido com o propósito de ocasionar uma mudança na lei ou nos programas de governo”.

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Sobre o autor
Silvio Wanderley do Nascimento Lima

Mestre em Direito. Juiz Federal. Professor universitário no Rio de Janeiro (RJ).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Silvio Wanderley Nascimento. A pretensão cientificista do juspositivismo e seu afastamento do ideal de justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3225, 30 abr. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21636. Acesso em: 22 nov. 2024.

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