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A regulação brasileira do registro de nomes de domínios em perspectiva comparada

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03/06/2012 às 08:35
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5. REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS RELATIVOS AO ccTLD “.br”

No Brasil, a responsabilidade – perante a IANA e, posteriormente, também perante a ICANN – pela alocação de endereços IP e pelo registro de domínios sob o ccTLD “.br” foi atribuída, em 18/4/1989, a um grupo de pesquisadores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – Fapesp (NIC.br, 2010a). Esse grupo de pesquisadores da Fapesp, denominado Grupo Operador da Internet, ficou assim responsável pela administração do DNS e pela distribuição de endereços IP no Brasil, ligando o país à internet a partir de 1991.

Em 1995, o Governo Federal, por meio da Portaria Interministerial 14727 do Ministério de Ciência e Tecnologia – MCT e do Ministério das Comunicações – MC, criou o Comitê Gestor Internet do Brasil – CG, com a atribuição, principalmente, de “coordenar a atribuição de endereços IP (Internet Protocol) e o registro de Nomes de Domínio” (art. 1º, inciso V). Fariam parte do Comitê nove representantes – sendo alguns de órgãos estatais e outros de setores da sociedade civil.

Em seu primeiro ato formal, a Resolução-CG 1/1998, de 15/4/1998, o Comitê Gestor acentuou a relevância pública dos serviços relacionados à administração da internet no país, ao afirmar que:

Para conectividade à Internet, com o objetivo de disponibilização de informações e serviços, é necessário o registro de nomes de domínio e a atribuição de endereços IP (Internet Protocol), bem como a manutenção de suas respectivas bases de dados na rede eletrônica.

Por meio dessa Resolução, o Comitê Gestor acabou com a gratuidade do registro de domínios no Brasil, permitindo que fosse cobrado um valor de retribuição por esse procedimento.

Na mesma data, o Comitê Gestor editou outro ato formal de regulamentação, por meio da Resolução-CG nº 2/1998. Nesse momento, ficou plenamente caracterizada a intervenção da União sobre os serviços de gestão do “.br”, pois a citada Resolução delegou competência à Fapesp para que essa entidade de pesquisa continuasse operando o ccTLD brasileiro por meio da realização das atividades de registro de nomes de domínio, distribuição de endereços IPs e sua manutenção na internet. Além disso, autorizou a Fapesp a cobrar valores, fixados pelo Comitê Gestor, e a se ressarcir financeiramente pelos serviços prestados. A instituição acadêmica estaria, a partir de então, obrigada ao cumprimento de condições e regras para o registro e cancelamento de nomes de domínio nos termos definidos pelo Comitê.

Importante alteração regulamentar ocorreu com a edição do Decreto Presidencial 4.829, de 3/9/2003, que procurou ampliar a representatividade dos diversos setores da sociedade civil no Comitê Gestor (que passou a ser denominado Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br), ao prever a nova composição de vinte e um membros e disciplinar mais detalhadamente os critérios de eleição dos representantes (arts. 2º a 9º). O Decreto também estabeleceu a possibilidade de se delegar, a entidade pública ou privada, a gestão do “.br”:

Art. 1º Fica criado o Comitê Gestor da Internet no Brasil - CGIbr, que terá as seguintes atribuições:

(...) II - estabelecer diretrizes para a organização das relações entre o Governo e a sociedade, na execução do registro de Nomes de Domínio, na alocação de Endereço IP (Internet Protocol) e na administração pertinente ao Domínio de Primeiro Nível (ccTLD - country code Top Level Domain), ".br", no interesse do desenvolvimento da Internet no País;

(...) Art. 10. A execução do registro de Nomes de Domínio, a alocação de Endereço IP (Internet Protocol) e a administração relativas ao Domínio de Primeiro Nível poderão ser atribuídas a entidade pública ou a entidade privada, sem fins lucrativos, nos termos da legislação pertinente. (BRASIL, 2003) (grifamos)

Além dessas, outras competências do CGI.br foram delineadas pelo Decreto 4.829/2003, entre as quais se destacam: estabelecer diretrizes estratégicas relacionadas ao uso e desenvolvimento da internet no Brasil; propor normas e procedimentos relativos à regulamentação das atividades na internet; adotar os procedimentos administrativos e operacionais necessários para que a gestão da internet se dê segundo os padrões internacionais aceitos pelos órgãos de cúpula da Internet, podendo, para tanto, celebrar acordo, convênio, ajuste ou instrumento congênere.

Como se pode observar, os dispositivos do Decreto 4.829/2003 realçam o interesse público inerente à administração do domínio de primeiro nível “.br”. Fica evidente no texto do regulamento a preocupação quanto à organização das relações entre o Governo e a sociedade na execução do registro de nomes de domínio, na alocação de endereços IP e na administração do ccTLD “.br”.

Em decorrência da prescrição conferida pelo art. 10, que autoriza a atribuição da prestação desses serviços a entidade pública ou privada, houve uma relevante inovação na gestão do ccTLD brasileiro. Por meio da Resolução 1/2005, editada pelo CGI.br, foram atribuídas ao Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto Br – NIC.br a execução do registro de nomes de domínio, a alocação de endereços IP e a administração dos domínios “.br” (art. 1º). Assim como na Resolução-CG 2/1998, essa normativo também buscou regular diversos aspectos da prestação dos serviços, como ao obrigar o NIC.br à observância das regras estabelecidas pela Resolução-CGI 2/2005 (art. 2º) e ao controlar as tarifas cobradas (art. 3º) e a aplicação dos recursos arrecadados (art. 4º).

O NIC.br é uma associação privada, sem fins lucrativos, criada pelos próprios integrantes do Comitê Gestor da Internet no Brasil à época (BRASIL, 2010b). A Figura 2 apresenta a estrutura do NIC.br, bem como sua vinculação ao CGI.br. De acordo com o próprio CGI.br (2011), a associação é considerada o braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil.

Figura 2

Fonte: (NIC.br, 2011a)

Por meio do seu serviço denominado “registro.br”, a associação efetua os registros de domínios sob o ccTLD “.br”. Todos os domínios na internet com extensão “.br” são registrados, exclusivamente, por meio do “registro.br”, sejam eles destinados a instituições governamentais, acadêmicas ou privadas (como exemplo, respectivamente, www.presidencia.gov.br, www.ufpe.br, www.vale.com.br).

O Brasil adota o modelo verticalizado de prestação de serviços de registro (REGISTRO.br, 2011). Ou seja, o NIC.br é responsável por operar o ccTLD e efetuar os registros por demanda direta dos usuários finais. Exerce, assim, dentro de um modelo de integrado de prestação de serviços, o monopólio de atividades que poderiam ser atribuídas a várias empresas privadas, a exemplo do modelo de múltiplos registradores adotado em diversos outros países28.

Nos últimos nove anos, o número de registros no “.br” cresceu a uma taxa média de aproximadamente 24% ao ano, evidenciando o forte crescimento da demanda por registro de domínios sob o ccTLD brasileiro (CETIC.BR, 2011). Existem hoje mais de 2,6 milhões de domínios registrados sob o “.br”, que atualmente é o sétimo ccTLD com mais registros no mundo (ZOOKNIC, 2011 apud VERISIGN, 2011). O faturamento anual do NIC.br, apenas com receitas decorrentes da prestação dos serviços a ele atribuídos pelo CGI.br, é superior a R$ 80 milhões de reais (NIC.br, 2011b).

Além dos mencionados serviços, o NIC.br desempenha atividades consideradas de fundamental importância para o funcionamento e o desenvolvimento da internet no Brasil, atividades essas, em parte, originalmente atribuídas ao CGI.br por meio do Decreto 4.829/2003. Cite-se, como exemplo, a análise de incidentes de segurança na rede, entre outras atividades relacionadas à segurança da internet no país; a produção de indicadores e estatísticas sobre a disponibilidade e uso da internet no Brasil; e o desenvolvimento de estudos voltados à inovação, à melhoria do nível de qualidade técnica e à universalização do uso da internet.

5.1 A regulação do serviço de registro de nomes de domínio e o ordenamento jurídico

Inicialmente, releva mencionar que não existe lei que defina o marco regulatório para a gestão do ccTLD no Brasil. Daí a dificuldade de se caracterizar essa atividade como um serviço público ou como uma atividade privada29. Além disso, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) nunca expediu norma atribuindo o caráter de serviço de telecomunicações ou de serviço de valor adicionado aos serviços de gestão do “.br”, de modo que não há possibilidade de se enquadrarem tais serviços como serviços de telecomunicações.

Apesar disso, a atuação do CGI.br sobre a gestão do ccTLD brasileiro configura autêntica regulação. Isso porque, por meio da Resolução CGI.br/RES/2008/008/P30, o Comitê Gestor da Internet efetivamente intervém nas relações privadas, ao tempo que: 1) estatui procedimentos a serem cumpridos por uma associação de regime privado por ocasião do registro de nomes de domínios (arts. 1º e 10); 2) estabelece vedações quanto ao uso de determinados nomes de domínios (art. 1º, parágrafo único); 3) determina os critérios para habilitação de pessoas interessadas em registrar sob o “.br” (arts. 2º, 6º e 14); 4) estabelece critérios que afetam os direitos dos usuários sobre os nomes de domínios (arts. 10, 12 e 13); 5) cria procedimentos, responsabilidades e obrigações a serem cumpridos pelos usuários dos serviços (arts. 4º, 5º, 10 e 14).

Segundo a mesma Resolução, o CGI.br estabelece, ademais, o valor a ser cobrado dos usuários pelos serviços prestados pela associação privada (art. 8º). A norma ainda fixa direitos dos usuários sobre os nomes de domínios registrados, bem como estabelece critérios para o cancelamento do registro, como, por exemplo, em caso de não pagamento dos valores cobrados (art. 9º).

A prestação dos serviços de registro de nomes de domínios prestados pelo NIC.br tem amparo em contrato firmado com os usuários registrantes. O contrato é padronizado, e contém cláusulas que também evidenciam a ingerência do CGI.br sobre a prestação dos serviços:

CONTRATO PARA REGISTRO DE NOME DE DOMÍNIO SOB O ‘.br’

O NÚCLEO DE INFORMAÇÃO E COORDENAÇÃO DO PONTO BR-NIC .br, (...), de acordo com a delegação do Comitê Gestor da Internet no Brasil, através da Resolução CGI.br nº 001/2005, e o REQUERENTE do registro de domínio, seja Pessoa Física ou Jurídica, com capacidade jurídica para este ato, resolvem, com base nos regulamentos vigentes, firmar o presente CONTRATO, em conformidade com os termos e condições adiante expostos.

(...) CLÁUSULA PRIMEIRA: DO OBJETO: Este instrumento tem por objeto estabelecer as principais condições e normas para o registro, a publicação e a manutenção de domínio na Internet sob o ".br" e para a utilização da base de dados do REGISTRO, sem prejuízo dos demais regulamentos instituídos pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil.

(...) CLÁUSULA SEXTA: DOS VALORES A SEREM RETRIBUÍDOS: I. Para registro de um domínio, o REQUERENTE deverá pagar até a data de seu respectivo vencimento, a retribuição referente à manutenção, conforme valores estabelecidos pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil; (...) IV. Os valores cobrados poderão ser alterados de acordo com as normas do Comitê Gestor da Internet no Brasil.

(...) CLÁUSULA DÉCIMA PRIMEIRA: DAS DISPOSIÇÕES GERAIS: (...) IV. O REGISTRO seguirá sempre as normas emanadas pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, especialmente as suas Resoluções; V. As demais condições estabelecidas pelo REGISTRO relativas ao registro e manutenção de domínio estão dispostas nas normas do Comitê Gestor da Internet no Brasil e no endereço https://www.registro.br (REGISTRO.BR, 2011) (grifos nossos).

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Ou seja, mesmo na ausência de lei que o autorize a tanto, o CGI.br regula a prestação do serviço de gestão do ccTLD de maneira permanente e sistematizada, interferindo até mesmo em questões que envolvem direitos e obrigações dos usuários dos serviços e sujeitando uma associação privada ao cumprimento de seus regulamentos. A atuação do CGI.br, na prática, configura intervenção estatal no domínio econômico.

Como já visto, a Portaria Interministerial 147/1995 criou o Comitê Gestor Internet do Brasil, que recebeu como atribuição, entre outras, “coordenar a atribuição de endereços IP e o registro de nomes de domínios” (art. 1º, inciso V). A edição dessa Portaria foi fundamentada no art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), segundo o qual “compete ao Ministro de Estado (...) expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos”. Mas não houve, à época, exposição de motivos que explicitasse quais leis ou regulamentos a Portaria Interministerial visava disciplinar.

Albrecht (2000) entende haver inconstitucionalidade material e também formal na Resolução 1/1998 do Comitê Gestor, justificando que há vício de origem na criação do Comitê, pois afronta o disposto no art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal, segundo o qual compete ao ministro de Estado (...) expedir instruções para a execução de leis, decretos e regulamentos, e que há infração ao Princípio da Legalidade. Segundo a autora,

Uma portaria interministerial, como a que serve de fundamento para a validade do Comitê Gestor, pode tão somente determinar procedimentos e formas para facilitar a execução de ato legislativo, e nunca criar novos órgãos em substituição ao legislador próprio. Como no caso em tela não existe tal ato legislativo a ser instruído por portaria ministerial, a Portaria Interministerial MCT/MC 147, de 31/5/1995, não tem fundamento legal, o que a torna inconstitucional, e, por via de consequência, nula. Disso decorre que nenhum ato do Comitê Gestor tem qualquer validade, sendo como se jamais tivesse tal órgão efetivamente existido.

Na mesma linha, Falcão (2003) chama a atenção para a falta da indispensável autorizacão legislativa do Congresso Nacional para que o Poder Executivo pudesse ter instituído um órgão de gerenciamento da internet, inclusive com competência para o registro de nomes de domínio. Segundo o autor, o Poder Executivo delegou ao Comitê Gestor da Internet algo que não tinha, sendo que “a competência normativa objeto da portaria interministerial não está permitida em nenhuma norma superior. É de geração espontânea. Desrespeita a hierarquia das leis” (op. cit, p. 26).

As conclusões de Albrecht (2000) e de Falcão (2003) persistiriam atualmente, já que o Decreto 4.829/2003, que substituiu a Portaria Interministerial 147/1995, não supriu a ausência de disposição legislativa necessária para a intervenção do Comitê no domínio econômico – mesmo com o advento da Emenda Constitucional 32/2001, que modificou o inciso VI do art. 84 da Constituição Federal, aumentando o rol de matérias passíveis de regulamentação por meio de Decreto Presidencial.

A problemática não reside na suposta inconstitucionalidade ocasionada pela criação do Comitê Gestor. Afinal, existem inúmeros comitês e comissões criadas por Decreto, sem que disso resulte qualquer ilegalidade. O que vai de encontro ao ordenamento jurídico pátrio é a incompatibilidade entre a atuação regulatória exercida, na prática, pelo CGI.br e os limites constitucionais de competência do regulamento que estabeleceu as atribuições do Comitê.

Isso porque o Decreto 4.829/2003 é base normativa de inovações jurídicas não fundamentadas de forma explícita por lei, pois prescrevem uma ação estatal – a ser exercida pelo Comitê Gestor da Internet – que visa regular a prestação de serviços e instituir obrigações a particulares, o que caracteriza uma intervenção no domínio econômico. A teor do que leciona Moreira Neto (2005, p.36),

no sistema jurídico brasileiro, o emprego do poder estatal para restringir e condicionar liberdades e direitos individuais é uma exceção às suas correspectivas afirmações constitucionais, daí porque somente possa ser exercido sob reserva legal (grifos dele).

Nessa linha, revela-se expressiva a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 13.357, de 9/1/1950, Rel. Min. Ribeiro Costa, no qual ficou assente que:

o regulamento obriga enquanto não fira princípios substanciais da lei regulada. Se o regulamento exorbita da autorização concedida em lei ao Executivo, cumpre ao Judiciário negar-lhe aplicação (BRASIL, 1950 apud MENDES; COELHO; BRANCO, 2007, p. 870).

De fato, apenas as leis, organicamente consideradas, podem delinear o perfil dos direitos, elastecendo ou reduzindo o seu conteúdo. Entendimento semelhante é esposado pela jurisprudência31 e está pacificado pela doutrina, que fartamente32 aborda essa temática. Não há como cogitar-se, ademais, que o regulamento deriva o seu conteúdo diretamente da própria Constituição Federal, pois isso configuraria a inconstitucionalidade do Decreto, por ausência de lei formal a ser regulamentada, conforme jurisprudência do STF33.

Além disso, a ausência de amparo legal para a continuada atuação no domínio econômico exercida pelo Poder Executivo, no que tange aos serviços de gestão do ccTLD “.br”, resulta em infringência aos princípios gerais da atividade econômica ínsitos na Constituição Federal, em especial os arts. 170, parágrafo único, e 174, caput. Isso porque quaisquer medidas estatais de caráter interventivo devem estar previstas em lei, e o CGI.br não dispõe de autorização legal para praticar atos que criem obrigações e limitem direitos de particulares ou regulem a atuação de uma associação privada.

5.2 A delegação estatal da gestão do ccTLD

Como já visto, inicialmente a IANA, e depois a ICANN (2011), atribuiu ao Comitê Gestor da Internet no Brasil a responsabilidade pelo ccTLD brasileiro. O mesmo fez o Decreto 4.829/2003. Contudo, por meio da Resolução-CGI 1/2005, o CGI.br delegou ao Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto Br – NIC.br, uma associação privada, a execução do registro de nomes de domínio, a alocação de endereços IP e a administração dos domínios sob o “.br” (art. 1º). Pelo disposto na Resolução, o NIC.br deve se sujeitar às regras estabelecidas pelo CGI.br (art. 2º) e cobrar valores pela execução do registro de nomes de domínios mediante aprovação do Comitê Gestor (art. 3º), entre outras atribuições.

Segundo o CGI.br (2011), o NIC.br foi criado pelos próprios integrantes do Comitê Gestor da Internet no Brasil à época, e é o executor de algumas de suas atribuições. Além disso, “sua assembleia geral é sempre idêntica à composição do CGI.br” (BRASIL, 2005, p. 1).

Ocorre que não há outro instrumento destinado a formalizar essa delegação de atribuições que não seja a Resolução do CGI.br. Consultando-se os banco de dados da Imprensa Nacional, que contém o registro dos atos da Administração Pública, constata-se que não foi realizado processo licitatório com o propósito de selecionar a entidade gestora do ccTLD brasileiro. Também não foi firmado qualquer instrumento de gestão (contrato de gestão, convênio, termo de parceria) entre o CGI.br e o NIC.br para formalizar a relação entre as duas entidades – uma pública e outra privada. Ou seja, a delegação recebida pelo NIC.br não tem respaldo legal e não adota nenhuma figura contratual ou instrumento de gestão previsto no Direito Administrativo Brasileiro.

Apesar disso, a Resolução-CGI 1/2005 (art. 4º) atribui competência para que a associação privada utilize parte dos valores arrecadados com registro de nomes de domínios para promover atividades ligadas ao desenvolvimento da internet no Brasil.

Desde a edição da Resolução 1/1998 do Comitê Gestor e, posteriormente, com o Decreto 4.829/2003, a prestação dos serviços de gestão do “.br” da internet brasileira não pôde (e ainda não pode) ser feita por qualquer empresa – a não ser pela Fapesp inicialmente e, depois, pelo NIC.br –, o que consequentemente tolheu a livre iniciativa. Embora a gestão do ccTLD configure um monopólio natural, algumas das atribuições do NIC.br poderiam ser prestados por registradores autorizados em um regime de competição, como se observa em outros países. Em decorrência do modelo verticalizado adotado pelo CGI.br, entretanto, ficou impossibilitada a participação de outras entidades (registradores, ou registrars) na prestação dos serviços de registro, o que acaba por ferir também o princípio da livre concorrência.

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Sobre o autor
Uriel de Almeida Papa

Auditor Federal de Controle Externo no Tribunal de Contas da União. Formação acadêmica: Engenheiro eletricista formado pela Universidade de Brasília (2002) e pós-graduado em Controle Externo da Regulação. Estudante de Direito. Experiência Profissional: Diretor da 3ª Diretoria da 1ª Secretaria de Fiscalização de Desestatização e Regulação - Sefid-1 do Tribunal de Contas da União - TCU, em Brasília-DF. Auditor Federal de Controle Externo no TCU com experiência na fiscalização e avaliação da outorga de serviços públicos e de atividades econômicas dos setores de infraestrutura, da execução dos respectivos contratos e da regulação setorial (2006-2011).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAPA, Uriel Almeida. A regulação brasileira do registro de nomes de domínios em perspectiva comparada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3259, 3 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21888. Acesso em: 26 abr. 2024.

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Orientador: Marcelo Barros Gomes.

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