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Questões polêmicas da suspensão de segurança no ordenamento jurídico brasileiro

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17/07/2012 às 14:21
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6. A SUSPENSÃO DE SEGURANÇA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

 Outro assunto bastante recorrente no cenário jurídico brasileiro refere-se ao suposto conflito existente entre a suspensão de segurança e os direitos fundamentais.

 Parte da doutrina entende que pelo fato do Mandado de Segurança estar previsto como remédio constitucional destinado a assegurar direito líquido e certo do particular, nenhuma outra medida poderia ser imposta com o objetivo de minimizar seus efeitos.

 Nesse sentido é o entendimento de Arruda Alvim:

Do exposto, conclui-se que a liminar em mandado de segurança não pode ser acutilada por leis infraconstitucionais, seja porque não seria concebível o instituto do mandado de segurança sem que fosse aparelhável de medida liminar apta a coarctar de plano os efeitos do ato impugnado, seja porque as liminares cautelares, entre as quais se inclui a liminar em mandado de segurança (que, todavia, pode assumir uma afeição antecipatória sem que isso implique a subtração de sua cautelaridade), encontram respaldo no preceito constitucional que garante o amplo e incondicionado acesso ao Judiciário em caso de lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV).[52]

 Compartilhando do mesmo entendimento, sustenta Sérgio Ferraz:

Já por mais de uma vez nos manifestamos sobre o tema: a suspensão de liminar por autoridade diversa da que a concedeu, ou dos efeitos da decisão concessiva de segurança, é constitucionalmente esdrúxula, à vista dos princípios norteadores da função jurisdicional.[53]

 Entretanto, em que pese o entendimento dos conceituados doutrinadores, imperioso se faz ressaltar que a drástica medida foi introduzida no sistema normativo brasileiro com o intuito de resguardar, em tese, direitos difusos sob o pálio da supremacia do interesse público.

 Daí porque se tem que a suspensão de segurança não pode ser considerada inconstitucional, pois que também visa proteger direito da coletividade previsto no rol dos direitos fundamentais.

 Marcelo Abelha Rodrigues corrobora tal posicionamento:

A nosso ver, portanto, é o próprio texto constitucional que assegura a constitucionalidade do incidente de suspensão de execução de decisão, seja quando assegura a proteção dos direitos individuais e coletivos, seja quando se protegem os direitos sociais do art. 6.º, quando se prevê a ampla defesa, e, principalmente, quando protege o “direito” contra ameaça de lesão, que, no caso, é o que ocorre.[54]

 Cassio Scarpinella Bueno também reconhece a constitucionalidade da medida:

É corrente o entendimento doutrinário de que a suspensão da liminar proferida no mandado de segurança, ex vi do art. 4º da Lei 4.348/64, seria inconstitucional por ser fator de limitação ao mandado de segurança, ao arrepio de sua eficácia potencializada prevista, implicitamente, no inc. LXIX do art. 5º da CF e, explicitamente, no inc. XXXV do mesmo art. 5°. [...] não há como pretender atribuir qualquer estribo de inconstitucionalidade a este dispositivo legal. Trata-se, antes, de pleno exercício de opção legislativa, valorando, em determinados casos concretos, o sacrifício de direito individualmente considerado, e prol de toda coletividade. A tarefa de criar uma ‘interpretação conforme’ destas regras jurídicas aos valores constitucionais, destarte, é mister ao qual não podemos nos negar.[55]

 Partindo-se então do princípio que não há inconstitucionalidade na utilização da suspensão de segurança pela Fazenda Pública, seja por inexistência de incompatibilidade com os princípios constitucionais, e ainda por se tratar de uma análise jurídica do caso concreto, deve-se analisar a forma de ponderação ser exercida pelo julgador quando da existência de conflitos de direitos fundamentais posta em juízo.

 Explica-se.

 Sabendo que o mandado de segurança tutela direito líquido e certo, e que a drástica medida visa impedir grave lesão ao interesse público primário, via de regra, estarão sob apreciação direitos fundamentais de ambas as partes, cabendo ao Presidente do Tribunal Competente, no momento de julgar a medida excepcional realizar a ponderação de valores por intermédio do princípio da proporcionalidade.

 Como ratifica Elton Venturi:

No âmbito dos pedidos de suspensão de liminares e de sentenças contrárias ao Poder Público, a aplicação do princípio da proporcionalidade ganha uma coloração especial, uma vez que, em muitas ocasiões, se estará precisamente diante da contraposição de interesses legítimos, porém inconvivíveis, cabendo ao Poder Judiciário determinar qual prevalecerá, ao menos temporariamente.[56]

 Diante do entendimento posto, imperioso referendar o disposto no art. 5º do Decreto-Lei n° 4.657/42 (Lei de Introdução ao Código Civil), que preleciona que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

 Somando-se tal norma aos princípios da supremacia do interesse público, da razoabilidade e da proporcionalidade, tem-se que a suspensão de segurança não diverge do atual cenário jurídico brasileiro, pois, notadamente, assim como a ação constitucional sobre a qual incide, busca proteger direitos fundamentais, e de maneira mais ampla possível, pois que se deferida, certamente porque foram sopesados os valores postos, e sobressaiu-se o interesse coletivo.

 Para melhor conclusão do assunto, ressaltamos a explanação de Marcelo Abelha:

Entendemos que, em dados casos, mormente em se tratando de proteção de direitos dos consumidores, do meio ambiente, da saúde, da educação, da informação, da liberdade de culto e crença etc., se trata, precipuamente, de proteção e preservação dos interesses difusos pelo Estado e sua comunidade, de modo que o papel do poder de supremacia da Administração, como disse, visa imediatamente à tutela desses interesses difusos. Caso implique, como irá inexoravelmente implicar, limitações ao exercício individual da liberdade e propriedade, este não será o objetivo primeiro. Não apenas se inverte a ordem com que se coloca o problema (de precípua proteção do interesse difuso, ao mesmo tempo em que a limitação administrativa dos particulares assume um caráter secundário), mas também, ao adotar-se a conceituação de direito difuso, se reparte de preservação e proteção de tais interesses entre o Estado e a comunidade, nos moldes estabelecidos pela lei.[57]

 Sendo assim, parece-nos claro que em havendo ameaça de grave prejuízo a direito coletivo, que fira interesse público, necessária será a mitigação, ao menos temporária, dos direitos individuais, desde que sopesadas suas consequências reais em cada caso concreto.


7. CONCLUSÃO

 Diante de todo o conteúdo do presente trabalho, observa-se que a suspensão de segurança foi devidamente recepcionada em nosso ordenamento jurídico, e atualmente encontra-se prevista, principalmente, na Lei n° 12.016/09.

Demonstrados os pontos controvertidos que entendemos mais relevantes acerca da drástica medida, este artigo objetivou debater o assunto de maneira objetiva, demonstrando as divergências existentes, tanto no âmbito dos Tribunais Superiores, quanto no doutrinário, e ao final defender a tese que nos parece mais coerente diante do atual cenário social em que a sociedade humana está vivendo.

 Assim, diante dos muitos impasses existentes entre as linhas de pensamentos adotadas pelos Tribunais e as discordâncias doutrinárias, compete aos estudiosos, através da prática forense, e através de seus argumentos e teses, propagarem os tão valiosos ensinamentos e pensamentos adquiridos e produzidos no desenvolvimento da ciência jurídica para o melhor enfrentamento da matéria e revisão dos valores atualmente impingidos à Suspensão de Segurança.

Entretanto, em que pesem as análises e ponderações realizadas, o presente trabalho não teve a pretensão de esgotar o estudo das questões polêmicas da suspensão de segurança no ordenamento jurídico brasileiro, até porque a cada dia mais se vislumbra o crescimento de discussões acerca dos inúmeros aspectos relevantes ao tema.


8. REFERÊNCIAS

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Notas

[1] BRASIL, Lei n° 191, de 16 de janeiro de 1936.

[2] BRASIL, Lei n° 1.553, de 31 de dezembro de 1951.

[3] BRASIL, Lei n° 4.348, de 26 de junho de 1964.

[4] ARAÚJO, José Henrique Mouta. Mandado de Segurança, Jus Podvim, 2010, p. 146.

[5] Cf. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de Segurança. 2 ed. São Paulo: RT, 2005, p. 103.

[6] BRASIL, Lei n° 8.038, de 28 de maio de 1990.

[7] BRASIL, STJ, MC 4.507/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ 22.09.2006.

[8] BRASIL, STF, Rcl 1705, rel. Min. Carlos Velloso, j. 09.10.2000, p. 97 e STF, Rcl 5082, rel. Min. Ellen Gracie, decisão proferida pelo Min. Gilmar Mendes, j. 03.04.2007, DJ 12.04.2007, p. 30.

[9] VENTURI. Elton. Suspensão de liminares e sentenças contrárias ao poder público. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 53.

[10] ALVIM, Arruda. Mandado de segurança contra decisão que nega ou concede liminar em outro mandado de segurança. Revista de Processo, São Paulo, n. 80, p. 45-47.

[11] SIDOU, J. M. Othon. Do mandado de segurança. 2 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1959 apud RODRIGUES. Marcelo Abelha. Suspensão de segurança: sustação da eficácia de decisão judicial proferida contra o Poder Público. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 92.

[12] VENTURI, op. cit., p. 54.

[13] RODRIGUES. Marcelo Abelha. Suspensão de segurança. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 92

[14] ARAUJO, op. cit., p. 158.

[15] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988.

[16] KLIPPEL, Rodrigo; JUNIOR, José Antônio Neffa. Comentários à Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/09): Artigo por Artigo, Doutrina e Jurisprudência. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 255.

[17] BRASIL, STJ, EDcl no REsp 768480/RJ, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ 22.05.2006.

[18] VENTURI, op. cit., p. 55.

[19] NORTHFLEET. Ellen Gracie. Suspensão de sentença e de liminar. Revista de Processo, São Paulo, ano 25, n. 97, p. 183-184., jan./mar. 2000.

[20] BRASIL, STJ, AgRg na STA 88/DF, rel. Min. Edson Vidigal, Corte Especial, DJ 09.02.2005, p. 164.

[21] TOMBINI, Carla Fernanda Barcellos. Suspensão de segurança na visão dos tribunais superiores. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2009, p. 192.

[22] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988.

[23] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança. 3 ed. op. cit, p. 202.

[24] SCARTEZZINI, Jorge Tadeo Goffi Flaquer. Suspensão de segurança. São Paulo; Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 140.

[25] SCARTEZZINI, op. cit., p. 140.

[26] ARAUJO, op. cit., p. 169.

[27] BUENO, Cassio Scarpinella. A Nova Lei do Mandado de Segurança: Comentários Sistemáticos à Lei n. 12.016, de 7-8-2009. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 101.

[28] VENTURI, op. cit., p. 192.

[29] BRASIL, STF, SS 1983/PE, min. Rel. Marco Aurélio, j. 16.02.2003.

[30] BRASIL, STF, Súmula nº 626 - 24/09/2003 - DJ de 9/10/2003, p. 1; DJ de 10/10/2003, p. 1; DJ de 13/10/2003, p. 1.

[31] BRASIL, Lei n° 8.437, de 30 de junho de 1992.

[32] BRASIL, Lei n° 4.348, de 26 de junho de 1964.

[33] KLIPPEL; NEFFA JUNIOR, op. cit., p 265.

[34] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança. 3 ed. op. cit., p. 187.

[35] BUENO, Cassio Scarpinella. Liminar em mandado de segurança. op. cit., p. 242.

[36] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Ibid, p. 188.

[37] DINAMARCO, Cândido Rangel. Suspensão do mandado de segurança pelo presidente do tribunal. Fundamentos do processo civil moderno. Atual. Antônio Rulli Neto. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2000, t. I apud VENTURI, Elton. Suspensão de liminares e sentenças contrárias ao poder público. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 240.

[38] Ibid, p. 240.

[39]BRASIL, STJ, Rcl 2181/DF, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 20.10.2008, DJ 28.10.2008.

[40] VENTURI, op. cit., p. 242.

[41] TOMBINI, op. cit., p. 109.

[42] BRASIL, Lei n° 12.016, de 07 de agosto de 2009.

[43] BUENO, Cassio Scarpinella. A nova lei do mandado de segurança. op. cit., p. 102.

[44] KLIPPEL; NEFFA JUNIOR, op. cit., p. 284.

[45] BRASIL, Lei n° 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

[46] BRASIL, STJ, AgRg no AgRg na STA 69, rel Min. Edson Vidigal, Corte Especial, DJU 06.12.2004.

[47] SCARTEZZINI, op. cit., p. 158.

[48] BRASIL, STJ, SS 1.466/ES, Presidência, rel Min. Edson Vidigal, j. 02.02.2005, DJ 09.02.2005.

[49] BUENO, Cassio Scarpinella. A nova lei do mandado de segurança. op. cit., p. 103.

[50] VENTURI, op. cit., p. 134.

[51] ARAUJO, op. cit., p. 172.

[52] ALVIM, Eduardo Arruda; BUENO, Cassi Scarpinella, WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Aspectos polêmicos e atuais do mandado de segurança: 51 anos depois. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 250.

[53] FERRAZ, Sérgio. Mandado de segurança. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 359.

[54] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança. op. cit., p. 125.

[55] BUENO, Cassio Scarpinella. Liminar em mandado de segurança. 2 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, p. 213-215.

[56] VENTURI, op. cit., p. 215.

[57] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Suspensão de segurança. 3 ed. op. cit., p. 121.

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Sobre o autor
Vitor Antônio Oliveira Baia

Bacharel em Direito, graduado pela Universidade Federal do Pará - UFPA, Especialista em Direito Processual Civil Individual e Coletivo pela Escola Superior de Advocacia do Estado do Pará - ESA/PA em parceria com o Centro Universitário do Pará - CESUPA, Especialista em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp, advogado militante regularmente inscrito na OAB/PA, Ex-Assessor Jurídico da Comissão Permanente de Licitação da Prefeitura de Belém/PA, e sócio do escritório Baia & Loureiro Advogados Associados

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BAIA, Vitor Antônio Oliveira. Questões polêmicas da suspensão de segurança no ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3303, 17 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22183. Acesso em: 22 dez. 2024.

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