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Lei aplicável ao contrato de compra e venda internacional.

Estudo de caso

Resumo:


  • Estudo de caso hipotético sobre direito aplicável a contrato submetido a Tribunal Arbitral sediado em Zurique.

  • Regras da CCI e poder discricionário do Tribunal Arbitral na escolha do direito aplicável.

  • Aplicação das Convenções de Haia de 1986, de Roma de 1980 e do México de 1995 para determinar o direito venezuelano como aplicável ao contrato em questão.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

PALAVRAS CHAVE: Direito Internacional Privado, arbitragem, CCI, Convenção de Roma de 1980, Convenção do México de 1995, Convenção de Haia de 1986, ´lex mercatoria´, FOB, incoterm, ´lex mercatoria´.


1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente estudo/caso hipotético visa, através de sentença arbitral parcial, determinar o direito aplicável ao contrato submetido à apreciação de Tribunal Arbitral sediado em Zurique (Suíça), consoante designação da Câmara de Comércio Internacional (CCI). Leva-se em consideração que a cláusula arbitral é válida e livremente escolhida pelas partes, tendo sido estabelecida à aplicação das regras da instituição (CCI) como forma para solução de litígios.

Consideramos, ainda, a localização da sede das empresas envolvidas em seus respectivos países de origem, quais sejam: Venezuela a vendedora, e França a compradora; sem contudo especificarmos uma infração específica ao contrato em apreço, mas um desacordo estrutural, onde as obrigações de ambas as partes foram parcialmente cumpridas, desequilibrando a vontade inicialmente externada.

Consideramos também que o contrato foi concluído (assinado) na sede da empresa venezuelana, como já aduzido, na Venezuela. Há também uma cláusula FOB (incoterm: free on board) no contrato.


2. DIREITO

2.1. Regras da CCI quanto ao direito aplicável

Analisando, portanto, a determinação quanto às regras desta Instituição CCI e a validade da cláusula arbitral, que a institui como basilar na solução de litígios, esta Instituição quanto a ausência de determinação expressa das partes, no tocante ao direito aplicável, poderá este árbitro utilizar-se do disposto no art. 17 de seu regulamento onde:

"Article 17

(1) The parties shall be free to agree upon the rules of law to be applied by the Arbitral tribunal to the merits of the dispute. In the absence of any such agreement, the arbitral tribunal shall apply the rule of law which it determines to be appropriate.

(2) In all cases the Arbitral Tribunal shall take account of the provisions of the contract and the relevant trade usages." [grifamos]

Em comentário a este artigo no tocante aos procedimentos arbitrais temos que "...not only are the parties free to agree on the application of the rules of law, but the Arbitral Tribunal is also expressly authorized to decide to apply appropriate ‘rules of law’ in the event that the parties have not otherwise agreed." Continuando sobre o tema regras de direito encontramos o entendimento onde:

"‘Rules of law’ is a obviously broad expression that, over the course of the last two decades, has increasingly crept its way into the international arbitration lexicon. The phrase can be found in the UNCITRAL Model Law (article 28)".

Considerando, portanto, a explanação acima caberá ao árbitro a determinação das regras de direito mais pertinentes ao feito, observando o poder concedido ao Tribunal Arbitral ora instalado.

A prática da CCI é desenvolver sempre o poder discricionário do tribunal arbitral através de sua história, inclusive de igual forma a Convenção Européia de Arbitragem Comercial Internacional já preconizava em 1961 que:

"The parties shall be free to determine, by agreement, the law to be applied by the arbitrators to the substance of the dispute. Failing any indication by the parties as to the applicable law, the arbitrators shall apply the proper law under the rule of conflict that the arbitrators deem applicable..."

2.2. Motivação para a escolha da regra de conflito aplicável

Observando, portanto este poder discricionário conferido ao Tribunal Arbitral, neste ato representado pelo seu árbitro, bem como o poder de apreciar a matéria exposta de forma a buscar uma melhor aplicação das regras de direito ao caso concreto, diferentemente dos juízes nacionais, pode este árbitro se posicionar frente também as regras internacionais de direito que entenda mais aplicáveis à matéria exposta a seu critério.

O próximo passo, então, é de se verificar no direito interno e nas convenções internacionais, quais são as regras de Direito Internacional Privado pertinentes ao caso em apreço, quais sejam, a Convenção de Haia, a Convenção de Roma e a Convenção do México.

2.3. A Convenção de Haia de 1986 sobre a Lei aplicável aos contratos de venda internacional de mercadorias.

Encontramos pois a disposição contida junto a Convenção de Haia sobre lei aplicável aos contratos de venda de mercadorias em consonância com seu art. 1° e art. 4°, permitem o enquadramento na operação efetuada entre as partes contratantes não estando inclusas nas exceções expostas nos arts. 2 e 5 da mesma convenção. Prescreve a Convenção de Haia em seu art. 8.º:

"Article 8 – To the extent that the law applicable to a contract of sale has not been chosen by the parties in accordance with article 7, the contract is governed by the law of the State where the seller has his place of business at the time of conclusion of the contract." [grifamos]

Ressaltamos que a decisão indicada quanto à aplicação do direito Venezuelano ao contrato em apreço, prende-se muito mais ao fato de ter sido um ponto de confluência das vontades de ambos os estados envolvidos, quais sejam França e Venezuela, uma vez que ambos assinaram a presente Convenção de Haia de 1986, mesmo não estando esta em vigor, por falta de ratificação mínima exigida em seu corpo para sua entrada em vigência.

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Conforme dispõe claramente o artigo retro mencionado, considerando também o fato de ter o contrato em apreço sido concluído na Venezuela, sede da vendedora, o direito aplicável ao litígio será o da Venezuela.

2.4. A Convenção de Roma de 1980 sobre a lei aplicável a obrigações contratuais

A Convenção de Roma, ratificada pela França, substituiu as regras nacionais de Direito Internacional Privado dos Estados-Partes. Estipula o art. 4.º da Convenção de Roma:

"Article 4 - Applicable law in the absence of choice

(1) To the extent that the law applicable to the contract has not been chosen in accordance with article 3, the contract shall be governed by the law of the country with which it is most closely connected. (…)

(2) Subject to the provisions of paragraph 5 of this Article, it shall be presumed that the contract is most closely connected with the country where the party who is to effect the performance which is characteristic of the contract has, at the time of conclusion of the contract, his habitual residence, or, in the case of a body corporate or unincorporate, its central administration. (...) "

O critério da prestação mais característica aponta, no caso presente de venda, para a tradição do bem. Nesta situação, o país de laços mais estreitos com a relação jurídica é a Venezuela, local da sede da empresa vendedora da mercadoria.

2.5. A Convenção do México de 1995 sobre a lei aplicável aos contratos internacionais

A Convenção assinada na Cidade do México em 1995 e ratificada pela Venezuela, prevê em seu art. 9.º, que na ausência de escolha, o direito aplicável pelo árbitro será:

"Article 9 – If the parties have not selected the applicable law, or if their selection proves ineffective, the contract shall be governed by the law of the State with which it has the closest ties.

The Court will take into account all objective and subjective elements of the contract to determine the law of the State with which it has the closest ties. It shall also take into account the general principles of international commercial law recognized by international organizations. (…)"

A sobredita convenção, também unificadora do Direito Internacional Privado, adotou o critério dos laços mais estreitos, baseando-se em parâmetros de razoabilidade. Na espécie, os laços mais estreitos são a do Estado de domicílio do vendedor, pois a relação de compra e venda (salvo consumo) foca-se na prestação do vendedor.

2.6. O DIREITO APLICÁVEL AO CONTRATO EM TELA

As três regras de conflito escrutinadas apontam em direção da aplicação do direito venezuelano. Esta cumulatividade apresentada permite assegurar que a escolha do Direito material da Venezuela é imparcial, razoável, fundamentada e não arbitrária.

Quanto à cláusula FOB, esta enquanto sujeita ao regime da lex mercatoria é igualmente aplicável ao concreto. Isto porque existe expressa permissão tanto nas regras arbitrais da CCI, quanto nas convenções do México e Haia. Conquanto a convenção de Roma exclua as práticas comerciais, o art. 1496 do NCPC francês não obsta a incidência de tais normas costumeiras na arbitragem internacional. Nesta quadra, o laudo arbitral poderá ser executado em qualquer um dos países relacionados.


3. DISPOSITIVO

Diante do exposto, este Tribunal Arbitral conclui que:

A cláusula arbitral é válida;

Houve a indicação das regras da CCI, que foram seguidas, consoante entendimento uníssono desta Instituição;

As partes não escolheram o direito aplicável ao contrato, objeto da presente arbitragem parcial;

As empresas tinham sede nos seus países de origem, o que permitiu a aplicação direta do direito venezuelano ao contrato, embasando-se na Convenção de Haia de 1986, na Convenção de Roma de 1980 e na Convenção do México de 1995;

É válida a cláusula FOB, visto que não se exclui a aplicação subsidiária de norma oriundas da lex mercatoria.

As despesas deste Tribunal serão arcadas em proporções iguais para ambas as partes.

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Sobre os autores
Pablo Andrez Pinheiro Gubert

advogado em Curitiba (PR)

Antonio Geraldo Scupinari

mestrando em Direito Econômico e Social pela PUC/PR

Caroline de Araújo

mestranda em Direito Econômico e Social pela PUC/PR

Roseanne Fontana

mestranda em Direito Econômico e Social pela PUC/PR

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUBERT, Pablo Andrez Pinheiro ; SCUPINARI, Antonio Geraldo et al. Lei aplicável ao contrato de compra e venda internacional.: Estudo de caso. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2228. Acesso em: 22 dez. 2024.

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