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A incidência do imposto de renda sobre as indenizações imateriais

Leia nesta página:

A indenização por dano moral, por fazer surgir um incremento no patrimônio material do ofendido, sujeita-se à incidência do imposto de renda.

1. INTRODUÇÃO

A partir da constatação de que cada vez mais os contribuintes estão cobrando e zelando pelo patrimônio público e pelo Erário, a fim de que seus recursos sejam efetivamente investidos em áreas mais carentes, como saúde, educação e segurança pública, torna-se imprescindível o debate acerca das inúmeras formas de tributação.

Com a previsão da Constituição Federal de 1988 da indenização por dano moral, alçando o instituto ao nível de direito constitucionalmente reconhecido, cessaram as discussões relacionadas com a existência desse tipo de ressarcimento.

Por outro lado, nasceu a celeuma a respeito da possibilidade da União tributar o indivíduo que recebeu indenização judicial a título de danos ao patrimônio imaterial.

Tal questionamento existe porque não há disciplinamento legal a respeito da matéria. O Código Tributário Nacional e o Regulamento do Imposto de Renda são omissos quanto ao assunto, restando à doutrina e à jurisprudência o papel de trazer à tona uma solução para a questão.

Pretende-se responder à indagação: As indenizações auferidas a título de dano ao patrimônio imaterial se sujeitam à incidência do imposto de renda?

Pretende-se demonstrar o atual posicionamento da jurisprudência e da doutrina sobre o assunto e, principalmente esclarecer a razão pela qual é correta a tributação pelo imposto de renda quando ocorrer incremento patrimonial em virtude do recebimento de indenização por dano moral.


2.CONCEITO DE RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA

Sabe-se que o regramento do imposto de renda está presente na Constituição Federal de 1988 e no Código Tributário Nacional, nos quais estão estabelecidos a definição do tributo e o seu fato gerador.

A competência para a instituição do imposto de renda e proventos de qualquer natureza é privativa da União, trata-se de um tributo que possui finalidade precipuamente fiscal. Ou seja, seu desiderato principal é o de arrecadar dinheiro para os cofres públicos.

Fala-se em finalidade principal porque há também uma finalidade secundária de natureza extrafiscal, uma vez que o imposto de renda é um tributo que apresenta alíquotas progressivas a depender da renda do contribuinte, portanto, inevitavelmente incide de forma mais onerosa sobre quem auferiu mais renda em determinado período.

Além do aludido princípio da progressividade, o imposto de renda deve atender, ainda, ao princípio da generalidade, segundo o qual a exação deve recair sobre todas as rendas auferidas pelo contribuinte independente da sua natureza. E ao princípio da universalidade, o qual reza que todas as pessoas que aufiram renda num determinado período previamente estabelecido pela legislação estarão sujeitas ao pagamento do tributo.[1]

  De acordo com o artigo 153 da Constituição Federal de 1988:

Compete à União instituir impostos sobre:

(...)

III - renda e proventos de qualquer natureza.

Pela leitura do artigo supra percebe-se que os conceitos utilizados pelo legislador constituinte são indeterminados e necessitam de definição pormenorizada pela lei para que seja possível alcançar o real conteúdo das expressões “renda” e “proventos de qualquer natureza”.

Nessa senda, estabelece o Código Tributário Nacional nos incisos I e II do artigo 43:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos; II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. 

Assim, observa-se que para a incidência do imposto de renda tornar-se obrigatória, faz-se necessária a presença de “acréscimo patrimonial”.

Nesse ponto, insta salientar que de acordo com o que prevê o § 1º do artigo 43 do Código Tributário Nacional a incidência do imposto não depende da denominação conferida à receita ou ao rendimento, bem como da condição jurídica, da localização ou até mesmo da nacionalidade ou origem da fonte, da forma de percepção.

O que implica dizer que os rendimentos oriundos do exterior também estarão sujeitos à incidência da exação. Nesses casos, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza (§ 2º do art. 43 do CTN).

De acordo com José Arthur Lima Gonçalves o conceito de renda “se traduz no saldo positivo resultante do confronto entre certas entradas e saídas, ocorridas ao longo de um dado período”.[2]

Em seguida, o mesmo autor completa que:

Para que haja renda, deve haver um acréscimo patrimonial – aqui entendido como incremento (material ou imaterial, representado por qualquer espécie de direitos ou bens, de qualquer natureza – o que importa é o valor em moeda do objeto desses direitos) – ao conjunto líquido de direitos de um dado sujeito.[3]

Quanto à diferenciação entre renda e proventos de qualquer natureza, Ricardo Alexandre ensina:

O conceito renda compreende o produto do capital (como os rendimentos obtidos com uma aplicação financeira), do trabalho (como salário recebido pelo empregado) ou da combinação de ambos (como o pró-labore recebido pelos sócios de uma empresa).

Já o conceito proventos é definido por exclusão, compreendendo todos os acréscimos patrimoniais não enquadráveis no conceito legal de renda.[4]

Portanto, da leitura da legislação correlata e de acordo com a opinião da doutrina, é imprescindível que haja incremento patrimonial para que determinado ganho seja caracterizado como renda ou provento de qualquer natureza.

Ou seja, renda ou provento de qualquer natureza são espécies do gênero “ganho patrimonial”, portanto esse é o fato gerador do Imposto de Renda.


3.CONCEITO DE INDENIZAÇÃO POR DANO IMATERIAL

Inicialmente cumpre esclarecer o que a doutrina entende por dano moral. Para Savatier:

é qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária, e abrange todo atentado à reputação da vítima, à sua autoridade legitima, ao seu pudor, à sua segurança e tranqüilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de sua inteligência, a suas afeições, etc.[5]

Segundo Yussef Said Cahali:

é a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-se desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)[6]

Pela importância que tem no estudo no tema, importante trazer à baila, ainda, a definição de Maria Helena Diniz:

Dano moral vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo.[7]

Definido o que se entende por dano moral, cabe agora conceituar a indenização quando esse dano for verificado. A reparação moral visa à recomposição da imagem e da honra do ofendido. Enquanto a indenização por dano material tem por finalidade reparar o lucro cessante e o dano emergente que o ofendido deixou de auferir em razão do ato ilegal do qual foi vítima por culpa de outrem.  Esse é o entendimento de Rui Stocco, citando Aguiar Dias:

O dano moral é o efeito não patrimonial da lesão de direito e não a própria lesão abstratamente considerada.[8]

Das definições postas acima, podemos concluir que Indenizar alguém por dano imaterial significa, em outras palavras, consolar o indivíduo que foi atingido em sua honra com pecúnia, conforme leciona Yussef Said Cahali, in verbis:

O instituto atinge agora a sua maturidade e afirma a sua relevância, esmaecida de vez a relutância daqueles juizes e doutrinadores então vinculados ao equivocado preconceito de não ser possível compensar a dor moral com dinheiro.[9]

 Nessa esteira, entende-se que o dano moral não se trata de lesão ao patrimônio material do indivíduo, não há acréscimo nem decréscimo de sua riqueza financeiramente considerada. Os bens atingidos são de caráter imaterial, ou seja, que não podem ser contabilizados em dinheiro. Pode–se citar como exemplo a integridade física, a saúde, a reputação, a imagem, a liberdade. A ofensa que a vítima experimenta quando qualquer desses bens são afetados se traduz na dor ou sofrimento, que podem vir à tona na forma física ou moral.[10]

O fundamento para a reparação por dano moral está presente na Constituição Federal de 1988, quando em seu artigo 5°, inciso V, aduz que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

Assim, à luz da CF/88 já não se discute se o dano à moral merece ser indenizado, posto que foi reconhecido como um direito. Assim, atualmente, a indenização por dano imaterial é um instituto que ganha força a cada dia.


4.DA INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE AS INDENIZAÇÕES IMATERIAIS

Esclarecidos os conceitos pertinentes é que surge a seguinte pergunta: as indenizações em pecúnia que visam a recomposição do patrimônio imaterial lesado são passíveis de tributação pelo imposto de renda?

Viu-se no tópico “2” que o imposto de renda incide apenas quando se verifica um incremento do patrimônio (financeiramente considerado) do indivíduo, ou seja, o fato gerador do tributo se verifica quando ocorre um aumento do patrimônio material do contribuinte.

Nessa senda, tem-se que quando aquele que sofreu um dano imaterial recebe indenização em dinheiro, inevitavelmente, seu patrimônio aumentará, pois, o valor em pecúnia que passou a pertencer ao patrimônio do indivíduo com a indenização por dano imaterial é um acréscimo, já que esse valor nunca lhe pertenceu antes.

De acordo com a Lei n° 8.541/92, os pagamentos decorrentes de decisão judicial estão sujeitos à retenção do imposto de renda na fonte.

Entretanto, quando há a condenação por danos morais alguns juízes acabam por não reter o tributo sob o argumento de que por se tratar de verba indenizatória está isenta de tributação pelo imposto de renda.

Em verdade, muitas são as discussões a respeito do tema, há autores a exemplo de Roque Carraza, cujo entendimento consiste em defender que nas indenizações não se vislumbram renda ou provento de qualquer natureza, haja vista o caráter meramente recompositor do patrimônio lesado. Vejamos:

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Por igual modo, a legislação do IR não prevê isenções de indenizações. A razão disto é patente, já que as indenizações não são rendimentos e, nesta medida, refogem à tributação por via de imposto sobre a renda. Não há porque uma lei isentiva federal vir a ocupar-se com o assunto.

Realmente, as indenizações não são rendimentos. Elas apenas recompõem o patrimônio das pessoas. Nelas não há geração de rendas ou acréscimos patrimoniais (proventos) de qualquer espécie. Não há riquezas novas disponíveis, mas reparações, em pecúnia, por perdas de direitos.

Nas indenizações, como é pacífico, há compensação, em pecúnia, por dano sofrido. Noutros termos, o direito ferido é transformado numa quantia de dinheiro. O patrimônio da pessoa lesada não aumenta de valor, mas simplesmente é reposto no estado em que se encontrava antes do advento do gravame.

Portanto, nas indenizações há simples reparações, em pecúnia, por perdas de direitos. Quem indeniza desfaz o dano que causou a terceiro. Recompõe a situação primitiva, anulando os efeitos da lesão jurídica que praticou.

E, sem riqueza nova, não pode haver incidência do IR ou de qualquer outro imposto de competência residual da União (neste último caso, por ausência de indício de capacidade contributiva, que é o princípio que informa a tributação por meio de impostos).

Logo, as indenizações não são – e nem poderiam ser – tributáveis por meio de IR.[11]

Entretanto, o entendimento exposto acima não condiz com o defendido pela maioria da doutrina. De fato, pelas razões que veremos a seguir, a maioria dos autores convergem no sentido da possibilidade da incidência do imposto de renda sobre as indenizações imateriais.

Primeiramente, o art. 39, XVI do Decreto 3.000, de 26 de março de 1999, que regulamenta a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto de Renda, dispõe:

Não entrarão no cômputo do rendimento bruto: (...) XVI – a indenização reparatória por danos físicos, invalidez ou morte, ou por bem material danificado ou destruído, em decorrência de acidente, até o limite fixado em condenação judicial, exceto no caso de pagamento de prestações continuadas.

Como visto, o Regulamento do Imposto de Renda isenta algumas verbas indenizatórias da incidência do tributo, contudo nada diz a respeito da indenização por dano moral. O uso da analogia é feito por aqueles que defendem a não incidência da exação.

Entretanto, conforme preceito inserto no art. 111, II do CTN a concessão de isenção tributária deve sempre ser interpretada literalmente, assim, são isentas apenas as verbas que a legislação mencionar de forma expressa.

Entre os doutrinadores que defendem a existência de aumento patrimonial quando ocorre a indenização por dano ao patrimônio imaterial, destaca-se Hugo de Brito Machado, o qual observa que:

Se o objeto da indenização é o elemento moral, porque a ação danosa atingiu precisamente o patrimônio moral, não há dúvida de que o recebimento de indenização implica evidente crescimento do patrimônio econômico e, assim, enseja a incidência dos tributos que tenham como fato gerador esse acréscimo patrimonial. (...).[12]"

Ora, é inevitável reconhecer que a indenização por dano moral, ao contrário da indenização por dano ao patrimônio, não visa à recomposição do patrimônio lesado, mas compensar o abalo moral sofrido. Razão pela qual há ingresso novo, que resultará no acréscimo do patrimônio do indivíduo e terá como conseqüência a tributação, a não ser que haja outra razão a impedi-la.[13]

Esse é o entendimento que restou consagrado no julgamento do Resp 748.868/RS, cuja ementa será transcrita a seguir pela importância para a elucidação do tema.

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. NATUREZA. REGIME TRIBUTÁRIO DAS INDENIZAÇÕES. DISTINÇÃO ENTRE INDENIZAÇÃO POR DANOS AO PATRIMÔNIO MATERIAL E AO PATRIMÔNIO IMATERIAL. PRECEDENTES.

1.O imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador, nos termos do art. 43 do CTN, os "acréscimos patrimoniais", assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte.

2.Indenização é a prestação destinada a reparar ou recompensar o dano causado a um bem jurídico. Os bens jurídicos lesados podem ser (a) de natureza patrimonial (= integrantes do patrimônio material) ou (b) de natureza não-patrimonial (= integrantes do patrimônio imaterial ou moral), e, em qualquer das hipóteses, quando não recompostos in natura, obrigam o causador do dano a uma prestação substitutiva em dinheiro.

3.O pagamento de indenização pode ou não acarretar acréscimo patrimonial, dependendo da natureza do bem jurídico a que se refere.

Quando se indeniza dano efetivamente verificado no patrimônio material (= dano emergente), o pagamento em dinheiro simplesmente reconstitui a perda patrimonial ocorrida em virtude da lesão, e, portanto, não acarreta qualquer aumento no patrimônio. Todavia, ocorre acréscimo patrimonial quando a indenização (a) ultrapassar o valor do dano material verificado (= dano emergente), ou (b) se destinar a compensar o ganho que deixou de ser auferido (= lucro cessante), ou (c) se referir a dano causado a bem do patrimônio imaterial (= dano que não importou redução do patrimônio material).

4.A indenização que acarreta acréscimo patrimonial configura fato gerador do imposto de renda e, como tal, ficará sujeita a tributação, a não ser que o crédito tributário esteja excluído por isenção legal, como é o caso das hipóteses dos incisos XVI, XVII, XIX, XX e XXIII do art. 39 do Regulamento do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza, aprovado pelo Decreto 3.000, de 31.03.99. Precedentes.

5."Se o objeto da indenização é o elemento moral, porque a ação danosa atingiu precisamente o patrimônio moral, não há dúvida de que o recebimento de indenização implica evidente crescimento do patrimônio econômico e, assim, enseja a incidência dos tributos que tenham como fato gerador esse acréscimo patrimonial" (Hugo de Brito Machado, Regime Tributário das Indenizações, obra coletiva, Coord. Hugo de Brito Machado, p. 109). Em idêntico sentido, na obra citada: Gisele Lemke, p. 83; Hugo de Brito Machado Segundo e Paulo de Tarso Vieira Ramos, p. 124; Fábio Junqueira de Carvalho e Maria Inês Murgel, p. 74. E ainda: Leandro Paulsen, Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 5ª ed., Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2003, p.655.

6.Configurando fato gerador do imposto de renda e não estando abrangido por norma isentiva (salvo quando decorrente de acidente do trabalho, o que não é o caso), o pagamento a título de dano moral fica sujeito à incidência do tributo.

7.Recurso especial provido.[14]

No Recurso especial em referência, o Relator originário Ministro Luiz Fux acompanhando jurisprudência anterior do STJ entendeu ser incabível a incidência do imposto de renda na hipótese, por entender que:

tendo a verba percebida a título de dano moral a natureza jurídica de indenização - cujo objetivo precípuo é a reparação do sofrimento e da dor da vítima ou de seus parentes, causados pela lesão de direito, torna-se infensa à incidência do imposto de renda, porquanto inexistente qualquer acréscimo patrimonial.

Em seguida, o Ministro Teori Zavasck divergindo do relator proferiu voto-vista que acabou sendo acompanhado pela Ministra Denise Arruda e pelo Ministro José Delgado ao elucidar de forma ímpar a razão pela qual a indenização por dano imaterial deve se sujeitar à incidência do imposto de renda. Vejamos:

Considerado o sentido estrito de patrimônio, o pagamento de indenização, já se percebe, pode ou não acarretar acréscimo patrimonial, dependendo da natureza do bem jurídico a que se refere. Quando se indeniza dano causado ao patrimônio material, o pagamento em dinheiro simplesmente reconstitui a perda patrimonial ocorrida. Nesses casos, evidentemente, a indenização não tipifica fato gerador de imposto de renda, já que não acarreta aumento no patrimônio. Todavia, ocorre inegavelmente acréscimo patrimonial quando a indenização por dano material se destina, não apenas a recompor um prejuízo já ocorrido (= dano emergente), mas também a compensar o ganho que deixou de ser auferido (= lucro cessante). Da mesma forma, há acréscimo patrimonial quando o valor pago a título de indenização é maior do que o dos danos ocorridos (v.g., quando, além da indenização propriamente dita, há pagamento de multa).

Por outro lado, quando a indenização se refere a dano causado a bem jurídico imaterial (= dano que não importou redução do patrimônio material), o pagamento (= entrega de dinheiro, bem material) acarreta, natural e necessariamente, um acréscimo ao patrimônio material e, portanto, configura fato gerador do imposto de renda.

Em suma: a indenização que não acarreta acréscimo patrimonial é apenas aquela que se destina a recompor o dano material efetivamente causado pela lesão (= dano emergente ao patrimônio material). Relativamente a ela, não se configura fato gerador do imposto de renda. Todavia, acarreta acréscimo patrimonial (e, portanto, constitui fato gerador do imposto de renda) a indenização (a) por danos ao patrimônio imaterial (= moral), ou (b) referente a lucros cessantes ou (c) em valor que exceda o da redução patrimonial causada pela lesão.

Em resumo, tem-se que a indenização por dano imaterial faz ingressar no patrimônio do ofendido montante que antes não existia. Dessa forma, o patrimônio –composto de relações jurídicas de caráter econômico e suscetíveis de avaliação pecuniária – recebe um incremento, pois esse tipo de indenização visa a recompor o dano a bens insuscetíveis de avaliação pecuniária, tem como finalidade diminuir o sofrimento da pessoa indenizada.[15]

Aceitar o incremento patrimonial sem a incidência do imposto de renda acarretaria uma ofensa ao princípio da universalidade, assim como levaria à defesa do enriquecimento sem causa. Pois trata-se de hipótese de incidência não elencada entre as isentas. Independente do motivo que gerou a indenização é riqueza nova que ingressa no patrimônio do contribuinte, sem que tenha havido desembolso correspondente em momento anterior.[16]


5.CONCLUSÃO

Ante o exposto, conclui-se que a indenização por dano moral, por fazer surgir um incremento no patrimônio material do ofendido sujeita-se à incidência do imposto de renda. Não procede a vedação genérica que alguns doutrinadores quiseram fazer valer de que qualquer indenização por ter caráter de recomposição do patrimônio atingido não pode servir de fato gerador para o imposto de renda. Faz-se necessário perquerir que esfera patrimonial foi lesada: a material ou a imaterial.

Resta esclarecido que nos dois conceitos está presente a idéia de crescimento do patrimônio material, que pode ser medido em pecúnia, num certo espaço de tempo estabelecido pela legislação. Esse, portanto, é o fato necessário e imprescindível sem o qual não será possível a incidência do imposto de renda: o incremento patrimonial.

Nessa senda, em resposta à problemática apresentada, a principal conclusão do presente estudo é que tanto do ponto de vista do posicionamento da doutrina majoritária, quanto do Superior Tribunal de Justiça, a quem compete conferir interpretação à legislação infraconstitucional, as indenizações por dano ao patrimônio imaterial são tributáveis pelo imposto de renda. Isso porque, trata-se de incremento patrimonial, portanto, enquadra-se no fato gerador do tributo e além disso a hipótese não encontra-se elencada entre as isentas.


6.BIBLIOGRAFIA

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. São Paulo: Método, 2011.

CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 2 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

CARRAZA, Roque. Curso de Direito Constitucional Tributário, 27 ed.,São Paulo: Malheiros.  2011.

CARVALHO, Fábio Junqueira e Maria Inês Murgel. Regime Tributário dasIndenizações. São Paulo: Dialética, 2000.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1998

GONÇALVES. José Arthur lima. Imposto sobre a renda. São Paulo: Malheiros, 2002.

LENKE, Gisele. Imposto de Renda – Os Conceitos de Renda e de Disponibilidade Econômica e Jurídica , São Paulo: Dialética, 1998.

MACHADO, Hugo de Brito. Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética, 2000.

PEREIRA, Caio Mario da Silva.  Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1989.

STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2011.

TELLES, Inocêncio Galvão. Direito das obrigações. 6 ed. Coimbra Editora.


Notas

[1] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. São Paulo: Método, 2011, p. 506.

[2] GONÇALVES. José Arthur lima. Imposto sobre a renda. São Paulo: Malheiros, 2002. pp. 174 e ss.

[3] GONÇALVES. José Arthur lima. Imposto sobre a renda. São Paulo: Malheiros, 2002. pp. 179.

[4] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. São Paulo: Método, 2011. p. 506.

[5] PEREIRA, Caio Mario da Silva.  Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1989.

[6] CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 2 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 20

[7] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 81.

[8] STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2011.  p. 1365

[9] CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 2 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p 17.

[10] TELLES, Inocêncio Galvão. Direito das obrigações. 6 ed. Coimbra Editora, p.375.

[11] CARRAZA, Roque. Curso de Direito Constitucional Tributário, 27 ed.,São Paulo: Malheiros.  2011.  p. 568/569.

[12] MACHADO, Hugo de Brito. Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética, 2000.  p. 109.

[13] CARVALHO, Fábio Junqueira e Maria Inês Murgel. Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética, 2000, pp. 74-76.

[14] REsp 748.868/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28.08.2007, DJ 18.02.2008 p. 24)

[15] LENKE, Gisele. Imposto de Renda – Os Conceitos de Renda e de Disponibilidade Econômica e Jurídica , São Paulo: Dialética, 1998, p.75.

[16] MACHADO, Hugo de Brito. Regime Tributário das Indenizações. São Paulo: Dialética, 2000. pp. 271/272.

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Sobre a autora
Luciana Dias de Almeida Campos

Procuradora Federal da Advocacia-Geral da União. Pós Graduada em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasiliense de Direito Público. Ex-Defensora Pública do Estado de Pernambuco.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Luciana Dias Almeida. A incidência do imposto de renda sobre as indenizações imateriais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3313, 27 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22318. Acesso em: 26 dez. 2024.

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