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Doutrina prospectiva como Instrumento de defesa da constituição

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01/10/2001 às 00:00
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6. Conclusões.

As questões postas inicialmente mereceram resposta com base em interpretação da doutrina prospectiva como instrumento de defesa da Constituição.

Pode haver divergências quanto as conclusões adotadas.

Divergências ainda mais significativas, entretanto, podem surgir se questionado o ideal interpretativo adotado.

Não devem, porém, ser desconsiderados os riscos à supremacia da Constituição caso a doutrina prospectiva seja interpretada como destinada à persecução de outros fins que não a própria defesa da Constituição, como, por exemplo, a segurança jurídica.

Tais considerações também fornecem adequada base avaliatória da inovação trazida pela Lei n. º 9. 868/99.

Se a prática constitucional revelar que a doutrina prospectiva serve ao incremento da defesa da Constituição, o que será coerente com a melhor interpretação do controle judicial de constitucionalidade, então a inovação é bem vinda. Se o contrário se verificar, então juízo valorativo diferente é cabível.

Assim, o art. 28 da Lei n. º 9. 868/99 não deve ser considerado, por si só, como negativo pelos operadores do Direito, mesmo por aqueles compromissados com a Constituição Federal de 1988.

Resta saber se teremos sabedoria suficiente para realizar as escolhas interpretativas certas quando a ocasião surgir. Essa é a nossa responsabilidade.


Notas:

1. O precedente inicial é" Linkletter v. Walker", de 1965.

2. Em alguns julgados em controle incidental, o Supremo Tribunal Federal preservou da invalidação os efeitos de atos normativos que considerou inconstitucionais (v. g. : RE 122. 202-6-MG - j. 10. 8. 93 - Rel. : Min. Francisco Rezek Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, n. º 9, RT, 1994. ) Em todas as oportunidades que a questão foi levantada em controle abstrato, o Supremo Tribunal Federal insistiu, porém, na invalidação retroativa da lei inconstitucional (v. g. : ADIn n. º 493-0/DF, Rel. Min. Moreira Alves. Lex - Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, v. 168; e ADIn n. º 1. 102-2, Rel. : Min. Maurício Corrêa. Revista Dialética de Direito Tributário, n. º 5, 1996. )

3. DWORKIN, 1999, p. 305.

4. DWORKIN, 1999, p. 306.

5. A idéia de "doutrinas abrangentes e razoáveis" é extraída de John RAWLS (RAWLS, 2000, p. 102-110. )

6. Isso ocorreu em preliminar ao julgamento da ADCon n. º 1-1/DF. Para um relato recomenda-se MENDES e MARTINS, 1994.

7. MENDES, 1994, p. 56.

8. Isso não ocorreria, por exemplo, em Portugal ou na Espanha, segundo relatos de Gomes CANOTILHO (CANOTILHO, 1998, p. 90. ) e de García de ENTERRÍA (ENTERRIA, 1991, p. 139-141. )

9. DWORKIN, dentro de sua concepção de Direito como integridade, defende que o argumento da estabilidade não é decisivo para impedir a revisão da interpretação de determinadas questões constitucionais: "Há uma terceira classe de problemas constitucionais cujo equilíbrio é diferente. Em qualquer interpretação aceitável, algumas cláusulas reconhecem os direitos individuais contra o Estado e a nação: liberdade de expressão, processo legal devido em ações criminais, tratamento igualitário na disposição dos recursos públicos, aí incluída a educação. A estabilidade na interpretação de cada um desses direitos, considerados um por um, tem alguma importância prática. Mas, por se tratar de questões de princípio, a substância é mais importante do que esse tipo de estabilidade. Em qualquer caso, a estabilidade crucial é a da integridade: na medida do possível, o sistema de direitos deve ser interpretado como a expressão de uma concepção coerente de justiça. " (DWORKIN,1999, p. 441.)

10. Sobre a Corte de WARREN existe vasta bibliografia em língua inglesa (entre outros: HORWITZ, 1998; SCHARTZ, 1996; TUSHNET, 1993). Mais acessível ao leitor pátrio é o livro de cunho jornalístico de WOODWARD e ARMSTRONG, 1985. Embora escrito sobre a Corte seguinte, a de BURGER, contém relevantes informações sobre a Corte de WARREN.

11. LOCKHART, 1996, p.386.

12. Em certos casos, a aparência deve prevalecer sobre a realidade. É importante destacar que o erro quanto à situação jurídica deve ser assumir o caráter coletivo, não se tratando, portanto de erro de uma só pessoa. A esse respeito, leciona Vicente RÁO: "A aplicação da máxima "error communis facit jus" equivale, porém, no entender da doutrina francesa, ao saneamento de atos praticados por erro comum, em contraste com alguma regra de direito, quer de erro de fato se trate, quer de erro de direito. Preciso é, porém, que o erro seja invencível, isto é, que não o houvesse podido evitar quem nele incidiu. E é preciso, mais, que a noção errônea seja admitida senão pela totalidade, quando menos pela generalidade ou maior número de pessoas, assumindo como que o caráter de erro coletivo - exigindo-se, ainda, de quem a aludida máxima invoca, que haja procedido razoavelmente sem incidir em qualquer falta. Assim entendida, a máxima "error communis" tem por fundamento o interesse social, corresponde a uma regra de segurança social, tanto assim que os julgados franceses, ao aplicá-la, invocam "graves razões de ordem pública, ou de interesse geral". Não é, pois, a boa-fé de certa ou certas pessoas, mas a boa-fé coletiva, que a aplicação dessa máxima abona e justifica (Henri Mazeaud, Rév. Trim. de Droit Civil 23/929 e ss. ). " (RÁO, 1994, p. 202-203).

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13. Linkletter foi condenado criminalmente com base em provas que a Suprema Corte norte-americana reputou posteriormente inadmissíveis em processo, pela extensão da "exclusionary rule" (vedação de provas ilícitas em processo), regra anteriormente só aplicada em processos criminais federais, aos Estados federados, o que ocorreu em "Mapp v. Ohio", de 1961. A função da "exclusionary rule" não é a de garantir um julgamento justo, do ponto de vista substantivo, mas sim de impedir que o Estado viole a lei na busca de provas para condenação em processo criminal. Dessa forma, a sua não-aplicação retroativa não importa em violação ao direito dos eventuais prejudicados a um julgamento justo, o que seria inaceitável.

14. Ação penal n.º 304-9, Rel .Min. Sepúlveda Pertence, j. 01/10/99, DJU nº 194-E, de 08. 10. 99, p.66.

15. SEN, 2000, p.314.

16. SEN, 2000, p.314-315.

17.RODRIGUES, 1958, p.157.


Bibliografia

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998.

DWORKIN, Ronald. O império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

ENTERRIA, Eduardo Garcia de. La Constitucion como norma y el Tribunal Constitucional. 3 ed. Madrid : Civitas, 1991.

HORWITZ, Morton F. The Warren Court and the pursuit of Justice. New York: Hill and Wang, 1998.

LOCKHART, William B. et al Constitutional law: cases-comments-questions. 18.ed. St. Paul: West Publ. , 1996.

MENDES, Gilmar Ferreira Mendes. A ação declaratória de constitucionalidade: a inovação da Emenda Constitucional n.º 3, de 1993 In:.(coord. ) Ação declaratória de constitucionalidade. São Paulo: Saraiva, 1994.

; MARTINS, Ives Gandra Silva. (coord. ) Ação declaratória de constitucionalidade. São Paulo: Saraiva, 1994.

RÁO, Vicente. Ato jurídico, 3. ed., São Paulo: RT, 1994.

RAWLS, John. O liberalismo político. 2.ed. São Paulo: Editora Ática, 2000.

RODRIGUES, Leda Boechat. A Corte Suprema e o Direito Constitucional Americano. Rio de Janeiro: Forense, 1958.

SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

SCHWARTZ, Bernard. The Warren Court: a retrospective. Oxford: Oxford University Press, 1996.

TUSHNET, Mark (Ed.)The Warren Court in historical and political perspective Charlottesville: University of Press of Virginia, 1993.

WOODWARD, Bob ; ARMSTRONG, Scott.Por detrás da Suprema Corte.2.ed.São Paulo: Saraiva, 1985.

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Sobre o autor
Sergio Fernando Moro

Juiz Federal da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORO, Sergio Fernando. Doutrina prospectiva como Instrumento de defesa da constituição. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2241. Acesso em: 26 abr. 2024.

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