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A sociedade na Constituição: uma harmonia plurissignificativa

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10/11/2012 às 10:15
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Notas

[1] Sahid Maluf (1995, p. 347), citando J. Credt, afirma que a sociedade “é a união moral de muitos em busca do bem comum.”

[2] “É evidente, pois, que a cidade faz parte das coisas da natureza, que o homem é naturalmente um animal político, destinado a viver em sociedade, e que aquele que, por instinto, e não porque qualquer circunstância o inibe, deixa de fazer parte de uma cidade, é um ser vil ou superior ao homem. [...]

Claramente se compreende a razão de ser o homem um animal sociável em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos. A natureza, dizemos, nada faz em vão. O homem só, entre todos os animais, tem o dom da palavra;

[...] Ora, aquele que não pode viver em sociedade, ou que de nada precisa por bastar-se a si próprio, não faz parte do Estado; é um bruto ou um deus. A natureza compele assim todos os homens a se associarem.” (ARISTÓTELES, 2009, p.16-17)

[3] Dallari (1995, p. 10-11), com precisão, descortina o pensamento contratualista de Hobbes no seguinte trecho: “O contratualismo aparece claramente proposto, com sistematização doutrinária, nas obras de THOMAS HOBBES, sobretudo no ‘Leviatã’, publicado em 1651. Para HOBBES o homem vive inicialmente em ‘estado de natureza’, designando-se por esta expressão não só os estágios mais primitivos da História mas, também, a situação de desordem que se verifica sempre que os homens não têm suas ações reprimidas, ou pela voz da razão ou pela presença de instituições políticas eficientes. Assim, pois, o estado de natureza é uma permanente ameaça que pesa sobre a sociedade e que pode irromper sempre que a paixão silenciar a razão ou a autoridade fracassar. [...]

É neste ponto que interfere a razão humana, levando à celebração do contrato social. Apesar de suas paixões más, o homem é um ser racional e descobre os princípios que deve seguir para superar o estado de natureza e estabelecer o ‘estado social’.

[...]

E é por força desse ato puramente racional que se estabelece a vida em sociedade, cuja preservação, entretanto, depende da existência de um poder visível, que mantenha os homens dentro dos limites consentidos e os obrigue, por temor ao castigo, a realizar seus compromissos e à observância das leis da natureza anteriormente referidas. Esse poder visível é o Estado, um grande e robusto homem artificial, construído pelo homem natural para sua proteção e defesa.”

[4] “A família é a mais antiga das sociedades, e também a única natural: os mesmos filhos só ao pai se sujeitam enquanto necessitam dele para se conservar, e, finda a precisão, desprende-se o laço natural; isentos os filhos da obediência devida ao pai, isento este dos cuidados que requer a infância, todos ficam independentes. Se continuam a viver unidos, não é natural, mas sim voluntariamente, é só por convenção que a própria família se mantém. [...] A família é pois, se assim o quereis, a norma primitiva das sociedades políticas: o cabeça é a imagem do pai, o povo a dos filhos; e havendo todos nascido iguais e livres, só a proveito comum alienam a sua liberdade. A diferença toda é que na família o amor que o pai tem aos filhos paga os cuidados que ele lhes dispensa; e no Estado, o júbilo de governar supre o amor que a seus povos não se dedica o maioral político.” (ROUSSEAU, 2000, p. 24)

[5] Aristóteles informa que esse seria o conceito de Estado e não de sociedade quando assevera que “o Estado significa uma associação de homens que possuem o meio de suprir a sua existência.” (ARISTÓTELES, 2009, p. 41). Mas, em outra passagem, e de certo modo mesclando os conceitos de Estado e sociedade, declina que não é só para viver, ou sobreviver, que os homens estabelecem sociedade entre si, mas para viver felizes. (ARISTÓTELES, 2009, p. 95)

E mais a frente, tomando os termos sociedade, Estado e cidade sem uma diferenciação bem definida, afirma: “Contudo, essa felicidade não será conseguida se não habitarem os homens um só e único lugar, e se não se recorrer aos casamentos. E eis aí o que originou, nos Estados, as alianças de famílias, as fratrias, os sacrifícios comuns e os divertimentos que acompanham tais reuniões. Todas essas instituições são obra de uma benevolência mútua. É a amizade que conduz os homens à vida social. O escopo do Estado é a felicidade na vida. Todas essas instituições têm por fim a felicidade. A cidade é uma reunião de famílias e pequenos povoados associados para gozarem em conjunto uma vida perfeitamente feliz e independente. Mas bem viver, segundo o nosso modo de pensar, é viver feliz e virtuoso. É preciso, pois, admitir em princípio que as ações honestas e virtuosas, e não só a vida comum, são o escopo da sociedade política.” (ARISTÓTELES, 2009, p. 96-97)

[6] Acerca da diferenciação entre sociedade e comunidade, mister transcrevermos trecho da obra Ciência Política, de Paulo Bonavides, assim versado: “Na Sociedade, há solidariedade mecânica, na Comunidade, orgânica. A Sociedade se governa pela razão, a Comunidade pela vida e pelos instintos. A Comunidade é um organismo, a Sociedade, uma organização (Berdeaeff) ou segundo Poch, citado por Agesta, na Comunidade (a Família, por exemplo), a gente é, na Sociedade (uma sociedade mercantil, por exemplo) a gente está. Diz Agesta que ‘simbólica ou alegoricamente a Comunidade é um organismo, a Sociedade um contrato.’” (BONAVIDES, 1998, p. 59)

John Rawls, por sua vez, diferencia sociedade e comunidade da seguinte forma: “É um erro grave não distinguir entre a ideia de uma sociedade política democrática e a ideia de comunidade. Uma sociedade democrática sem dúvida acolhe muitas comunidades dentro dela, e tenta ser um mundo social dentro do qual a diversidade possa florescer num clima de entendimento mútuo e concórdia; mas essa sociedade não é em si uma comunidade, nem pode sê-lo tendo em vista o fato do pluralismo razoável. Isso só seria possível mediante o uso opressivo do poder governamental, o que é incompatível com as liberdades democráticas básicas.” (RAWLS, John. Justiça como Equidade: Uma Reformulação. tradução Cláudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 29.)

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[7] “Somos levados, assim, a nos perguntar se a divisão do trabalho não desempenharia o mesmo papel em grupos mais extensos, se, nas sociedades contemporâneas, em que teve o desenvolvimento que sabemos, ela não teria a função de integrar o corpo social, assegurar sua unidade. É legítimo supor que os fatos que acabamos de observar se reproduzem nelas, mas com maior amplitude; que essas grandes sociedades políticas também só se podem manter em equilíbrio graças à especialização das tarefas; que a divisão do trabalho é a fonte, se não única, pelo menos principal da solidariedade social. Já foi nesse ponto de vista que Comte se colocou. [...] Por isso mesmo, e embora ainda não estejamos em condições de resolver a questão com rigor, podemos porém entrever desde já que, se é esta de fato a função da divisão do trabalho, ela deve ter um caráter moral, porque as necessidades de ordem, de harmonia, de solidariedade social são geralmente tidas como morais” (DURKHEIM, 1999, p. 29-30).

[8] Jorge Miranda (2005, p. 171) aponta que no “pensamento grego e romano não se encontra uma noção autônoma de sociedade fora da polis ou da Civitas. A Cidade Antiga não era constituída por uma sociedade civil que devesse ser governada como coisa distinta do Estado.” Talvez seja essa a maior dificuldade dos tradutores de Aristóteles e Platão, já que o termo usado para designar a sociedade, a cidade e o Estado é o mesmo.

[9] “As crenças dogmáticas são [...] opiniões que os homens recebem em confiança e sem discutir.

[...]

Ora, é fácil ver que não há sociedade que possa prosperar sem crenças semelhantes, ou antes, não há sociedades que subsistam sem elas; porque, sem ideias comuns, não há ação comum, e sem ação comum existem homens, mas não um corpo social. Para que haja sociedade e, com maior razão, para que essa sociedade prospere, é necessário pois que todos os espíritos dos cidadãos estejam sempre reunidos e mantidos juntos por algumas ideias principais; e isso não poderia se dar se cada um deles não viesse de vez em quando extrair suas opiniões de uma mesma fonte e consentisse fazer seu certo número de crenças já prontas” (TOCQUEVILLE, 2004. p. 9).

[10] A expressão “sociedade civil” quando utilizada pelos autores clássicos, inclusive por Rousseau, denota a ideia de sociedade “civilizada”, em contraposição aos bárbaros e selvagens. Já quando utilizada por Bobbio insere-se no contexto da “sociedade política”, ativa e conflituosa.

[11] “Numa primeira aproximação pode-se dizer que a sociedade civil é o lugar onde surgem e se desenvolvem os conflitos econômicos, sociais, ideológicos, religiosos, que as instituições estatais têm o dever de resolver através da mediação ou através da repressão. Sujeitos desses conflitos e portanto da sociedade civil exatamente enquanto contraposta ao Estado são as classes sociais, ou mais amplamente os grupos, os movimentos, as associações, as organizações que as representam ou se declaram seus representantes; ao lado das organizações de classe, os grupos de interesse, as associações de vários gêneros com fins sociais, e indiretamente políticos, os movimentos de emancipação de grupos étnicos, de defesa dos direitos civis, de libertação da mulher, os movimentos jovens etc.” (BOBBIO, 2010, p. 35-36)

[12] “Por outro lado, ocorre que, no Direito contemporâneo, cada vez mais os interesses públicos nem se apresentam homogêneos nem, tampouco, se constituem como um monopólio do Estado. Como agudamente alguns estudiosos da evolução do Direito Público têm observado, passou-se a admitir – com Massimo Severo Giannini, na Europa e, entre nós, com Odete Medauar – a heterogeneidade e a multiplicidade do interesse público, daí decorrendo que sua promoção e defesa, em muitos de seus aspectos, devam ser compartilhadas com a sociedade através de suas próprias organizações, pois, na dicção de Umberto Allegretti, ‘o interesse público não pertence à Administração como seu próprio, mas ao corpo social’.” (MOREIRA NETO, 2009, p. 14)

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Sobre o autor
Filipo Bruno Silva Amorim

Procurador Federal, atualmente exercendo o cargo de Vice-Diretor da Escola da Advocacia-Geral da União. Bacharel em Direito pela UFRN. Especialista em Direito Constitucional pela UNISUL. Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Filipo Bruno Silva. A sociedade na Constituição: uma harmonia plurissignificativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3419, 10 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22995. Acesso em: 22 dez. 2024.

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