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A desnecessidade de participação do sócio gerente no processo administrativo fiscal na hipótese de redirecionamento da execução fiscal por dissolução irregular

30/11/2012 às 13:13
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Configura-se prova diabólica ou impossível a participação dos sócios administradores da sociedade no processo administrativo fiscal no caso de dissolução irregular.

No ano de 2011, o Supremo Tribunal Federal trouxe um importante precedente para as hipóteses de reconhecimento de responsabilidade tributária nos autos do Ag Reg no RE 608.426-PR, de relatoria do i. Ministro Joaquim Barbosa tendo ficado assentada a necessidade do respeito aos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal nos processos administrativos tributários para a inclusão de co-devedor.

O referido julgado vem sendo utilizado pelos co-devedores e pelo Judiciário de forma indiscriminada, sendo aplicado indevidamente nas hipóteses de dissolução irregular da sociedade. Vejamos o entendimento do i. Magistrado da 10ª Vara Fiscal Federal do Estado de São Paulo:

Processo nº 0002875-50.2010.4.03.6182

Entendo que inclusão dos sócios de empresa executada no polo passivo sem a devida comprovação de que contra eles deve, realmente, prosseguir a execução é medida extremamente perigosa, uma vez que atenta contra o patrimônio das pessoas. Muitas vezes, sequer tiveram contato com a empresa executada, ou se faziam parte dela, não tinham participação em decisões.

Assim, para o redirecionamento do feito contra os supostos responsáveis tributários, faz-se necessária a comprovação por parte da exequente dos seguintes pressupostos:

a) a existência de um fato que não seja o inadimplemento (STJ, Súmula 430);

b) a dissolução irregular da sociedade (STJ, Súmula 435);
c) que o(s) apontado(s) como responsável(eis) estava(m) na direção, gerência ou representação quando do fato gerador do tributo e que era(m) sócio(s) da empresa executada (STF, RE 562.276/PR, rel. Min. Ellen Gracie) e

d) o respeito aos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal (STF, Ag Reg no RE 608.426-PR, rel. Min. Joaquim Barbosa). Para tanto, deveria apresentar cópia do processo administrativo de responsabilização.

Considerando que a exequente deixou de comprovar todos os pressupostos acima mencionados, indefiro o pedido de inclusão dos sócios no polo passivo por entender que não está configurada a responsabilidade tributária da(s) pessoa(s) indicada(s) e mantenho a suspensão do feito nos termos do artigo 40 da Lei 6.830/80.

Int.

É assente no STJ que o redirecionamento da execução fiscal, e seus consectários legais, para o sócio-gerente da empresa, é cabível quando reste demonstrado que este agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa. Precedentes: REsp n.º 513.912/MG, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ de 01/08/2005; REsp n.º 704.502/RS, Rel. Min. José Delgado, DJ de 02/05/2005; EREsp n.º 422.732/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 09/05/2005; e AgRg nos EREsp n.º 471.107/MG, deste relator, DJ de 25/10/2004.

Assim, a não localização da empresa em seu endereço gera a presunção de encerramento irregular da sociedade, possibilitando o redirecionamento da execução em face dos sócios-gerentes, por infração à lei.

Nesse sentido, entende o C. Superior Tribunal de Justiça, como se observa dos  julgados:

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EMPRESA NÃO LOCALIZADA. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. REDIRECIONAMENTO. RESPONSABILIDADE. SÓCIO-GERENTE. ART. 135, III, DO CTN.

1. A não-localização da empresa no endereço fornecido como domicílio fiscal gera presunção iuris tantum de dissolução irregular. Possibilidade de responsabilização do sócio-gerente a quem caberá o ônus de provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. Entendimento sufragado pela Primeira Seção desta Corte nos EREsp 716.412/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 22.09.08.

2. Embargos de divergência conhecidos em parte e providos.

(STJ, EREsp 852437 / RS, 1ª Seção, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, j. 22/10/2008, DJe 03/11/2008)

PROCESSUAL CIVIL - TRIBUTÁRIO - EXECUÇÃO FISCAL - INCLUSÃO DE SÓCIO-GERENTE NO PÓLO PASSIVO - RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA - DISSOLUÇÃO IRREGULAR - MUDANÇA DE DOMICÍLIO FISCAL SEM COMUNICAÇÃO À FAZENDA PÚBLICA - AUSÊNCIA DE REGISTRO EM JUNTA COMERCIAL - POSSIBILIDADE - PRECEDENTES - AGRAVO REGIMENTAL - ALEGAÇÃO DE REEXAME PROBATÓRIO - VALORAÇÃO DOS FATOS.

1. O mero inadimplemento do tributo não é causa de responsabilização tributária do terceiro para imputar-lhe a obrigação tributária por transferência.

2. A infração à lei, hipótese que autoriza a transferência da responsabilidade tributária, deve ser compreendida como o comportamento antijurídico do empresário e deve ser aferida em cada caso.

3. Há inúmeros precedentes desta Corte que consideram a dissolução irregular da pessoa jurídica como hipótese de infração à lei e, por conseguinte, causa suficiente para o redirecionamento da execução fiscal.

4. Trazendo o acórdão em seu corpo a descrição dos elementos de fato, a análise (valoração) da suficiência destes para a configuração ou não da responsabilidade tributária não implica no reexame do acervo probatório. Precedentes.

5. Agravo regimental não provido.

(STJ, AgRg no REsp 866082 / RS, 2ª Turma, Rel. Ministra ELIANA CALMON, j. 16/09/2008, DJe 14/10/2008)

No mesmo sentido é o entendimento constante da Súmula 435 do STJ, pacificando a questão, vejamos:

Súmula 435: "Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente". 

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Ao analisar atentamente o julgado do Supremo Tribunal Federal, percebemos que a situação fática é completamente diversa da hipótese de redirecionamento da execução fiscal por dissolução irregular.

No caso levado ao conhecimento da Egrégia Corte Constitucional, a inclusão do contribuinte, na qualidade de co-responsável, se deu na oportunidade da constituição do crédito tributário, ou seja, ainda na fase administrativa, para que seu nome constasse diretamente da Certidão de Divida Ativa.

Nesta senda, verifica-se que no precedente a constituição do crédito do tributário decorreu da lavratura de auto de infração, onde necessariamente deve ser oportunizado aos administrados a sua impugnação, tendo a autoridade administrativa visitado a empresa e analisado os livros próprios, ocasião em que verificou a irregularidade

Contudo, quando estamos diante de hipóteses de dissolução irregular não há na fase administrativa qualquer interesse no redirecionamento do feito, uma vez que a empresa, em regra, encontra-se em funcionamento, tendo cumprido suas obrigações acessórias de apresentar as devidas declarações que são aptas a constituição do crédito tributário.

Ademais, a dissolução da sociedade, conforme entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça, deve ser comprovada prioritariamente por meio do Oficial de Justiça, oportunidade em que nasce o interesse de redirecionar o feito executivo.

Ainda, é oportuno salientar que nas hipóteses de redirecionamento da execução fiscal em face da dissolução irregular, em regra, o crédito tributário já está devidamente constituído por meio de Termo de Confissão Espontânea/Declaração/DCTF, realizada pelos próprios sócios administradores, que participam do procedimento administrativo com o ato da formalização da entrega destes ao Fisco.

Por fim, a conduta dos sócios gerentes que implicou sua responsabilização ocorreu depois da constituição do crédito tributário, por meio da dissolução irregular da sociedade, não tendo nenhum nexo de causalidade com o crédito tributário que se encontra devidamente constituído.

Desta forma, exigir a participação dos sócios administradores da sociedade no processo administrativo fiscal no caso de dissolução irregular, configura-se prova diabólica ou impossível, uma vez que é impossível, no âmbito administrativo, comprovar a dissolução irregular de uma empresa que cumpre suas obrigações tributárias assessórias, por meio da entrega regular de suas Declarações e DCTFs e promover sua responsabilização por fato que ainda não ocorreu, devendo ser realizado o “distinguishing” entre o caso concreto e a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, reconhecendo sua inaplicabilidade nestes casos.


REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5ª ed. São Paulo: Método 2011.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 7. ed. Salvador: Juspodium, 2007, t. I.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

SABBAG, Eduardo. Manual do Direito Tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

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Sobre a autora
Janaina Machado Conceição

Bacharel em direito pela Universidade Federal da Bahia, médica pela Universidade Federal do Paraná, com especialização em psiquiatria, analista judiciária do Tribunal Regional do Estado da Bahia, pós graduanda em direito processual penal pela Universidade Gama Filho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONCEIÇÃO, Janaina Machado. A desnecessidade de participação do sócio gerente no processo administrativo fiscal na hipótese de redirecionamento da execução fiscal por dissolução irregular. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3439, 30 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23134. Acesso em: 29 mar. 2024.

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