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A legitimidade democrática para além do voto popular

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Conclusão

Foi esse novo sentido de “povo”, agora indeterminável, que conferiu ao sistema eleitoral, conforme já mencionado acima, um conceito restrito à escolha dos dirigentes governamentais. Embora o mecanismo eleitoral-majoritário continue a ser o árbitro pragmático da vida democrática, atribuindo “legitimidade instrumental” aos governantes eleitos, a necessidade de refundação dos paradigmas de legitimidade democrática se fez sentir em todos os meandros da administração pública(ROSANVALLON 2008, p.118).

Valores como a imparcialidade, a pluralidade e a proximidade tornaram-se objeto de atenção pelo Estado, que passou a experimentar novos arranjos institucionais dedicados a comtemplar esses novos vieses e a revitalizar as modalidades de legitimidade democrática(ROSANVALLON 2008, pp. 16-18).Embora os novos modelos institucionais experimentados pelos Estados contemporâneos estejam ainda em sua primeira infância, sujeitos a equívocos e perigos decorrentes de seus inacabamentos, mostra-se relevante para o futuro do Estado democrático de direito uma maior teorização sobre esse novo universo em gestação.


Bibliografia

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Notas

[1] Embora Rosanvallon mantenha o foco de sua análise nas modificações do ideal de unanimidade decorrentes da aplicação prática do princípio do sufrágio majoritário a partir da Revolução Francesa, CASTRO (2005) observa que desde Maquiavel a aspiração pelo consenso tem opositores. Nesse sentido, Castro afirma que Maquiavel rejeitou as ideias renascentistas que pregavam a necessidade de preservação pacífica da ordem, para ressaltar a qualidade de um regime político que permitisse a “cisão política”, qual caracterizaria o sentido de mudança radical e de inovação, em contraste com a uniformidade e a inércia.

[2] Nos Estados Unidos da América, o sistema de despojos foi eliminado a partir da última década do século XIX, por meio da adoção de um modelo de administração objetiva, que procurava distanciar os órgãos públicos da ação maléfica do partidarismo. Nesse sentido, instituíram-se: (i) mecanismos de controle social, como a iniciativa popular e a revogação de mantados; (ii) autoridades administrativas independentes de regulação, a exemplo da Comissão Interestadual de Comércio; e (iii) modelos de administração mais racionais e autônomos (ROSANVALLON 2008, p. 65).

[3]A crescente demanda social pela prestação de serviços públicos não deveria ser atrelada, contudo, a um inevitável inchaço da máquina estatal, impulsionado pela assunção da responsabilidade direta pela prestação de tais serviços pelo próprio Estado. Ao contrário, já em fins do século XIX multiplicavam-se os instrumentos de descentralização do exercício dessa primordial função estatal, por meio de atos de delegação do Estado, em favor de agentes privados, para fins de prestação de serviços públicos destinados à sociedade, a exemplo das “concessões de serviços públicos”(DUGUIT 1913, p. 56).

[4] Em verdade, essa expressão foi tomada de empréstimo de Pierre Bourdieu, para designar uma espécie de corporativismo dedicado a universalizar e defender ideias consideradas republicanas, em detrimento da apropriação estatal por interesses pessoais e partidários (ROSANVALLON 2008, p. 67).

[5] Nos Estados Unidos da América, o modelo da administração racional também objetivou resultados semelhantes ao do modelo francês. Por meio da construção de uma burocracia moderna, inspirada na impessoalidade e na racionalidade pregada por Max Weber, os americanos buscaram aprofundar sua democracia desde o início do século XX, tendo sido o doutrinador e presidente Woodrow Wilson um dos principais defensores desse modelo. (ROSANVALLON 2008, pp. 75-85)

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Sobre o autor
Victor Epitácio Cravo Teixeira

Procurador Federal em exercício na Procuradoria Federal Especializada junto à ANATEL, em Brasília (DF). Bacharel em Direito pela UFPE. Pós-graduado em Regulação das Telecomunicações pelo INATEL. Mestre em Direito pela UnB.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TEIXEIRA, Victor Epitácio Cravo. A legitimidade democrática para além do voto popular. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3464, 25 dez. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23252. Acesso em: 18 abr. 2024.

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