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Contribuição de melhoria: aspectos controvertidos

28/02/2013 às 13:05
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A isonomia exige que aquele proprietário especificamente beneficiado pela execução de obra pública, com os recursos da comunidade como um todo, arque com a contribuição de melhoria no limite da valorização sofrida pelo imóvel de sua propriedade, independentemente do custo total da obra.

Sumário: 1. Conceito. 2. Normas gerais aplicáveis. 3. Necessidade de lei especifica? 4. Momento da publicação do edital.


1 Conceito

A Constituição Federal de 1988 permite que as entidades políticas componentes da Federação instituam a contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas (art. 145, III). Não mais reproduziu a expressão “valorização de imóveis” ou “imóveis beneficiados” como faziam as Constituições anteriores.

Porém, o STF já decidiu que a valorização diretamente decorrente de obra pública é requisito ínsito dessa espécie tributária.[1] Tanto é que a  valorização do remanescente na desapropriação parcial não pode mais ser compensada com a indenização devida, devendo ser objeto de cobrança de contribuição de melhoria  contra todos os proprietários, expropriados ou não, que tiveram seus imóveis valorizados diretamente em função da implantação do melhoramento público.

Por isso, afirmamos que a contribuição de melhoria de melhoria “tem como fato gerador a atuação estatal mediatamente referida ao contribuinte. Entre a atividade estatal e a obrigação do sujeito passivo existe um elemento intermediário que é a valorização do imóvel.” [2]

No nosso entender, a limitação do montante da contribuição a ser cobrada ao custo total da obra, prevista nº art. 81 do CTN, não foi recepcionada pela Constituição de 1988.  De fato, o limite total da despesa realizada que estava na ordem constitucional antecedente (art. 18, II da Emenda nº 1/69) foi abolido na Constituição vigente. O fundamento dessa contribuição não é, ao nosso ver, o alegado princípio do enriquecimento sem causa, mas o princípio da isonomia que exige que aquele proprietário especificamente beneficiado pela execução de obra pública, com os recursos da comunidade como um todo, arque com a contribuição de melhoria no limite da valorização sofrida pelo imóvel de sua propriedade, independentemente do custo total da obra. Por isso, reputamos a contribuição como sendo a espécie tributária mais justa que as demais espécies.

Entretanto, a jurisprudência continua exigindo o respeito do custo total da obra em consonância com a doutrina que se formou em torno da matéria à luz das ordens constitucionais antecedentes. Desde a sua primeira previsão na Constituição Federal de 1946, a cobrança da contribuição de melhoria estava limitada ao custo total da obra (art. 30, parágrafo único). Assim continuou na Constituição de 1967-69 até que na Constituição de 1988 esse limite foi abolido, para se adequar ao princípio da isonomia tributária em que se funda essa espécie tributária.


2 Normas gerais aplicáveis

O CTN contém em seus artigos 81 e 82 normas gerais aplicáveis à contribuição de melhoria. O art. 81 define o fato gerador com aquela limitação ao custo total da obra de que falamos no item anterior, e o art. 82 traça os requisitos mínimos que devem ser observados pelo legislador ordinário.

Pouco tempo após a aprovação do CTN, Lei nº 5/72, de 25-10-1966, sobreveio o Decreto-lei nº 195, de 24-2-1967, dispondo sobre a cobrança de contribuição de melhoria. Esse diploma legal editado à época em que reinava anomalia jurídica (Ato Institucional nº 1 de 1964), contém, ao mesmo tempo, normas gerais aplicáveis à espécie tributária sob exame (normas nacionais) e normas voltadas para o âmbito de União (normas federais), tanto que é que o seu último artigo refere-se à regulamentação pelo Executivo no prazo de noventa dias, o que até hoje não aconteceu.

É nosso entendimento de que não houve revogação dos arts. 81 e 82 do CTN. Eventual incompatibilidade entre as normas contidas nos dois diplomas legislativos deve ser dirimida à luz do princípio lex posterior derogat priori. No sentido da não revogação dos dispositivos do CTN com a aplicação, também do Decreto-lei nº 195/67 é a jurisprudência do STJ.[3] Não discrepa desse entendimento o STF.[4]


3 Necessidade de lei específica?

Existem julgados exigindo a instituição por lei específica relativa à obra à qual se refere o tributo, sob o fundamento de que o Código Tributário Municipal que faça remissão genérica das normas fixadas no art. 87 do CTN não cumpre as exigências nele contidas.[5]

É preciso atentar para o fato de que o chamado Código Tributário Municipal editado pelos diversos municípios, na verdade, contém o Sistema Tributário do Município, instituindo todos os tributos de sua competência constitucional. De todos os Códigos que eu examinei até hoje nenhum deles se limitou a instituir normas gerais aplicáveis no âmbito municipal, mesmo porque essas normas não poderiam ser diferentes das normas gerais previstas no CTN de aplicação no âmbito nacional (art. 146, III da CF). Não faria sentido um Código Municipal que reproduzisse as normas gerais do CTN.

Lei específica para cada melhoramento público não é de ser exigida da mesma forma que não é preciso uma lei específica para cada tipo de taxa. Para legitimar a cobrança da contribuição de melhoria basta que a situação fática, decorrente de execução de determinada obra pública, se subsuma à hipótese legal prevista no Código Tributário Municipal ou na lei específica.

No âmbito do Município de São Paulo  a Lei nº 6.989/66 que instituiu o Sistema Tributário do Município achasse praticamente esvaziada em seu conteúdo por força do desligamento de diversos tributos (taxas, ISS, ITBI, contribuição de melhoria etc.) que passaram a ser regidas por leis específicas, o que não significa que não possam voltar a serem reagrupados em uma única lei, fato, aliás, desejável para facilidade e comodidade dos operadores do direito.

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4 Momento da publicação do edital

O art. 5º do Decreto-lei nº 195/67, pertinente à publicação do edital deixou de fazer referência à “publicação prévia” que consta do art. 82 do CTN. O CTN não esclarece se a previedade refere-se ao inicio da obra ou à cobrança da contribuição, dividindo as opiniões na doutrina e jurisprudência. A jurisprudência do STJ acabou firmando o entendimento de que a publicação deve ser prévia apenas à cobrança do tributo.[6]

Em que pese o fato de o Decreto-lei nº 195/67 ter eliminado a expressão “publicação prévia” a interpretação do disposto em seu art. 11 conduz à tese a publicação prévia do início da obra.

Com efeito prescreve o art. 11:

“Os requerimentos de impugnação da reclamação, como também quaisquer recursos administrativos, não suspendem o início ou prosseguimento das obras e nem terão efeito de obstar a administração a prática dos atos necessários ao lançamento e cobrança da contribuição da melhoria”.

Se o intérprete levar em conta apenas a parte final do art. 11 a tese da publicação prévia do edital somente para a cobrança do tributo estará correta. Mas, se levar em conta a primeira parte do dispositivo não há como negar que a publicação do edital deve ser prévia ao inicio da obra.

Realmente, a impugnação ou recurso tem origem na publicação do edital. Sem ele não há elementos para o exercer a faculdade da impugnação e posterior recurso, se for o caso. E essa impugnação ou recurso não suspendem, o inicio de obra ou seu prosseguimento, diz o texto legal sob exame. Não cabe, por óbvio, a cogitação de início da obra depois de concluída a obra. Daí o aparente confronto que deve ser dirimido pela interpretação mais abrangente que alcança, tanto a hipótese da primeira parte do art. 11, como também da hipótese de sua segunda parte.


Notas

[1] RTJ 89/598, 105/434, 138/600 e 138/614.

[2] Cf nosso Direito financeiro e tributário. 21.ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 320.

[3] Resp nº 671.560. DJ de 11-6-2007; Resp nº 362.788, DJ de 5-8-2002.

[4] RF nº 92.209, DJ de 18-4-1980.

[5] Ap. Civ. nº 200.023825-2, Rel. Des. Anselmo Cerello, TJSC; Ap. Civ. nº 2001.005778-6, Rel. Des. Luiz Cezar Medeiros, TJ SC.

[6] REsp nº 8.417, DJ de 5-6-1995; REsp nº 143.998, de DJ de 13-6-2005.

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Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Contribuição de melhoria: aspectos controvertidos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3529, 28 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23831. Acesso em: 5 nov. 2024.

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