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Da hipoteca: análise crítica do instituto

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12 DA EXTINÇÃO DA HIPOTECA

A extinção da hipoteca dar-se-á por vários fatores, sendo que os mais comuns se encontram dispostos objetivamente no artigo 1.499 do Código Civil. No referido artigo, contudo, não estão todas as formas possíveis de extinção, de tal maneira que se entende que seu rol seja exemplificativo.

Com a extinção ou desaparecimento da obrigação principal, a hipoteca deixará de existir, posto que ela possui a característica de acessória, bem como os efeitos perante terceiros, lembrando que isso somente ocorrerá a partir do cancelamento do registro. A hipoteca se extinguirá com o pagamento da obrigação, que se trata de uma modalidade normal e prevista nas obrigações, revelando-se essa prática a causa mais comum de extinção, embora existam outros meios capazes de dar cabo à hipoteca (VENOSA, 2.006, p. 581).

A hipoteca será extinta com o perecimento da coisa, pelo fato de que ela ficará sem objeto. A destruição deverá ser total, pois não serão admitidas uma simples desvalorização ou perda parcial do bem hipotecado. Caso a desvalorização ou perda parcial ocorra com a hipoteca constituída, o credor poderá solicitar o reforço da garantia, sob pena de ter a hipoteca antecipadamente vencida (DINIZ, 2.009, p. 591).

A resolução da propriedade extinguirá a hipoteca, pelo vencimento do termo ajustado ou pelo implemento da condição. Se o credor aceitar, estará correndo o risco da condição se implementar e os direitos reais sobre o imóvel se resolverem. Há, também, a causa de resolução de propriedade por motivo superveniente, oportunidade na qual subsistirá o vínculo hipotecário anterior (GONÇALVES, 2.009, p. 606-607).

A hipoteca se extinguirá pela renúncia expressa do credor. Sobre a renúncia tácita, há manifestações que dizem ela não é compatível com a hipoteca. O Supremo Tribunal Federal, em julgamento, decidiu não contemplar a renúncia tácita como forma de extinção, por não ser possível inferir das circunstâncias a plena vontade do credor. Outro ponto importante é que a renúncia é um ato unilateral, não necessitando, assim, o consentimento do devedor (MONTEIRO, 2.007, p. 440-441). A renúncia da hipoteca não pode se confundir com a renúncia do crédito, pois ambos são independentes, presumindo-se que a obrigação que a gerou ainda exista (RUGGIERO, 2.005, p. 733).

Volta à tona, no referido artigo, a questão da remição como forma de extinção. A remição poderá ser realizada pelo credor da segunda hipoteca, pelo adquirente, pelo executado, seu cônjuge, descendente ou ascendente. O ato de remição pelo segundo credor hipotecário liberará o bem da primeira hipoteca, vinculando-o, contudo, à hipoteca realizada pelo credor que exerceu o resgate (GONÇALVES, 2.009, p. 608).

Pela arrematação ou adjudicação a hipoteca será extinta por quem efetuar o maior lance ou por quem requerer o imóvel. Com o praceamento, o ônus real se extinguirá, oportunizando a quem o adquirir a liberdade e o desimpedimento do imóvel. De acordo com o artigo 1.501 do Código Civil, a hipoteca não será extinta, mesmo que devidamente registrada, se os credores hipotecários não tiverem sido notificados judicialmente para compor o pólo processual na execução (DINIZ, 2.009, 593-594).

Isto posto, a hipoteca se extinguirá através de várias maneiras, o que impossibilitou ao legislador prever todas as situações. Dentre alguns exemplos de formas de extinção da hipoteca não previstos taxativamente no Código Civil encontram-se a sentença que anula o ônus, a prescrição aquisitiva, a consolidação da figura de credor e proprietário do imóvel ou confusão patrimonial, a perempção em vinte anos, além de outras.


13 CONCLUSÃO

Ante todo o exposto, conclui-se que a hipoteca é uma garantia muito versátil e muito tradicional no direito, cuja utilização ao longo dos tempos possibilitou sua boa reputação entre as garantias à disposição do credor, conferindo-lhe predileção em função da segurança que ela dá, o que contribuiu para seu desenvolvimento teórico e prático.

Embora a hipoteca e o penhor tenham historicamente a mesma gênese eles são inconfundíveis devido à especialidade de cada um, principalmente quando diz respeito aos tipos de bens e a posse deles. Não se pode, contudo, dizer que o emprego dos referidos institutos seja equivalente, pois o penhor a cada dia é menos usado, ao contrário da hipoteca, que mantém sua aplicação, e ainda mais pela ampliação do instituto em 2.007.

A doutrina manifesta concordância em definir a hipoteca como garantia real e acessória que recai sobre um bem imóvel a partir do registro do título, continuando o devedor na sua posse, garantindo ao credor preferencial direito no caso de inadimplência. A partir dessa definição básica, ficam evidentes os principais elementos da hipoteca: sua classificação no direito, os tipos de bens, a publicidade alcançada pelo registro, a posse e a estabilidade conferida ao credor.

Dos tipos de hipoteca existentes, a convencional é a mais utilizada por ser aplicada acessoriamente a um grande número de contratos. Além disso, ela é a forma mais comum e permite que qualquer pessoa ofereça ou a tenha como garantia de maneira bem prática, bastando que sejam observados alguns requisitos legais. Quanto à hipoteca do tipo legal e processual há restrições na quantidade de casos nos quais elas podem ser empregadas, fazendo com que elas sejam tão úteis atualmente.

O direito de sequela que a hipoteca dá ao credor é sobremaneira importante pois, ao mesmo passo que garante a hipoteca, permite a mobilidade do crédito. Mesmo que o imóvel seja alienado pelo devedor, o credor o perseguirá, e poderá executar o crédito hipotecário caso exista a disposição de vencimento antecipado. Associa-se ao direito de sequela a preferência, e ambos contribuem para a formação da base da hipoteca.

Os bens que podem ser hipotecados são os mais variados, não se limitando aos imóveis. Embora a essência do instituto diga respeito a bens imóveis, é perfeitamente possível que a hipoteca seja constituída sobre bens móveis, desde eles tenham algum tipo de registro formal, sem o qual a propriedade não se transmita. Há, também, que destacar que a hipoteca recairá sobre qualquer tipo de melhoria acrescentada à coisa. O legislador não pode prever todos os bens que poderiam servir como garantia hipotecária e, dessa forma, nada mais correto em afirmar que os requisitos objetivos previstos no Código Civil são exemplificativos, assim como as formas de extinção da hipoteca.


REFERÊNCIAS

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2.009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das coisas. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2.009.

GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 10 ed. São Paulo: Rideel, 2.009.

HOUAISS, Antonio. Dicionário Antonio Houasiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2.007.

LISBOA, Roberto Senise. Manual de Direito Civil: Direitos Reais e Direitos Intelectuais. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2.005.

MARINONI, Luis Guilherme; MITIDIEIRO, Daniel. Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2.008.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privad: Direito das Coisas. 2 ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1959. Vol. 20.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das Coisas. 38 ed. São Paulo: Saraiva, 2.007.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direitos Reais. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2.004.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito das Coisas. 2 ed. São Paulo: Saraiva,  2.006.

RUGGIERO, Roberto de. Instituições de Direito Civil. 2 ed. Campinas: Bookseller, 2.005. Vol. 2.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2.006.


Notas

[1] Flávio Pedro Sabácio Justiniano (483-565 a.c). Imperador bizantino responsável pela compilação de leis, comparada ao Código de Hamurabi em sua importância para o Direito moderno.

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[2] Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda (1.892-1.979), autor da teoria segundo a qual o negócio jurídico é dividido em três planos ou, senão, em três degraus. O primeiro degrau dessa escada é o plano da existência, no qual se encontram os elementos mínimos, sem os quais o negócio jurídico é inexistente. O segundo degrau é o plano da validade que, em uma contextualização, representa as partes e suas vontades não viciadas, o objeto lícito determinado ou determinável, além da forma prescrita ou não defesa em lei. Já o terceiro degrau é o plano da eficácia, do qual advirão as consequências do negócio jurídico, tendo como elementos incidentais a condição, o termo e o encargo ou modo. No caso da hipoteca que se materializa de forma autônoma, a mesma será considerada inexistente, carecendo de validade e, por conseguinte, não produzirá nenhum efeito jurídico.

[3] Com esse entendimento, Washington de Barros Monteiro desconsidera a hipoteca sobre bens futuros. Cabe ressaltar que o artigo 138, do Código Brasileiro de Aeronáutica, Lei 7.565/1.986, dispõe que as aeronaves, “inclusive aquelas em construção”, poderão ser objeto de hipoteca. Dessa forma, a hipoteca poderá ser constituída apenas sobre a parte já construída para que esteja de acordo com a realidade material do bem.

[4] In verbis: Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

...

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

...

II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;

[5] Prelatício: referente a prelado: título honorífico de alguns dignitários eclesiásticos. Certamente a autora utilizou o termo no sentido conotativo da palavra, ao passo que ela sugere superioridade entre os demais, embora sua etimologia faça referência a adiantamento.

[6] Canalização à longa distância de gases naturais ou derivados de petróleo.

[7] Segundo Deocleciano Torrieri Guimarães (2.009, p. 535), “modo derivado de adquirir a o domínio de coisa móvel, pela transferência do alienante para o adquirente”. Todavia, o domínio apenas estará consolidado se não houver o cumprimento da obrigação. Portanto, os juristas editores do Código Civil de 2.002 acertaram em utilizar o termo transferência.

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Sobre o autor
Diego Alexandre Rodrigues Ferreira

Bacharel em Direito pela Universidade Norte do Paraná, especialista em Direito civil e processo civil pela Universidade Estadual de Londrina, presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Tamarana, ensaísta, advogado na comarca de Londrina, estado do Paraná, e região.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Diego Alexandre Rodrigues. Da hipoteca: análise crítica do instituto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3562, 2 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24082. Acesso em: 25 abr. 2024.

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