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Assédio sexual nas relações de trabalho

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01/11/2001 às 01:00
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IV. CONCLUSÃO

Avaliadas as diversas concepções sobre o assédio sexual e as primeiras apreciações sobre a nova lei, a conclusão mais acertada seja, provavelmente, a de que as questões básicas para as quais a lei deveria trazer solução permanecem um tanto em aberto. Assim é que para a maior dificuldade de amenizar o problema - a facilitação da denúncia pela vítima - permanece inalterada, dado que a iniciativa da ação penal competente continua dependendo da vítima do assédio (art. 225 do Código Penal).

A ausência de uma sistematização do tema no Direito do Trabalho é outra barreira a ser enfrentada pelos doutrinadores, em busca de soluções que possam caracterizar o crime como justa causa cristalina a motivar a rescisão indireta do contrato, pela empregada, ou empregado assediado, pois que a inclusão como incontinência de conduta ou de ato lesivo à honra ou à boa fama do empregado (CLT, art. 483, e).

Mas nenhuma das questões abordadas até aqui se assemelha à gravidade da precariedade do texto novo provocada pelo veto do Executivo ao Parágrafo Único do art. 216-A, que no projeto original, aprovado pelo Congresso, estendia a figura do crime de assédio sexual quando praticado com prevalecimento de relações domésticas, de cohabitação ou de hospitalidade (inciso I), e ainda, com abuso de dever inerente a ofício ou ministério (inciso II). A supressão, no entender dos doutrinadores que se debruçaram sobre o assunto até aqui, abre brechas para a impunidade de parentes dos assediados, assim como padres, pastores, professores ou outras atividades em que haja superioridade hierárquica não motivada por exercício de emprego, cargo ou função, como se previu no art. 216-A do CP.

A matéria está ainda em fase de amadurecimento, não resta dúvida. Mas a lei está posta e, por mais que se deseje escapar à tentativa do olhar positivista extremado, é forçoso reconhecer que não se pode fugir do princípio da anterioridade da lei, que cerca as garantias fundamentais do homem em todo o nosso sistema jurídico, com maior razão no campo penal. E isto implica numa repercussão no âmbito das relações trabalhistas, onde a matéria ainda não está normatizada. Um projeto de lei da deputada Iara Bernardi aguarda tramitação no Congresso Nacional, mas sem nenhuma previsão de avaliação pelos parlamentares, muito menos após a tipificação do assédio como crime.

Enquanto tratar-se de superior hierárquico que não seja propriamente o patrão do assediado, não parece haver grandes dificuldades. Basta a responsabilização do superior, que pode ser demitido por justa causa com base em pelo menos duas alíneas do art. 482 da CLT (b ou j) e o contrato de trabalho da vítima poderá ser mantido, desde que o empregador providencie mudanças que permitam a necessária adequação em função da ocorrência. O problema parece mais complexo quando tratar-se do empregador mesmo, como autor do crime.

Rescindir o contrato por despedida indireta, por atentado a boa fama ou à honra do empregado parece ser a solução, por ora, mais adequada. Entretanto, não se pode esquecer do poder de direção do empregador- e aí, sim, muito mais representativo como fator de influência na decisão do assediado. Na esteira da denúncia aparecerão inúmeros outros problemas, o mais grave dos quais, a premência de ter de abandonar o emprego por força do clima tenso nascido com o desafio ao empregador.

Tais questões devem ser objeto de reflexão para os operadores do Direito e também para empregadores, à medida em que a empresa também pode ser responsabilizada objetiva e subsidiariamente, e arcar com a indenização ao ofendido por danos morais, além das verbas rescisórias - em sede de rompimento do contrato - caso o assediador não esteja em condições de fazê-lo, conforme se deduz da aplicação subsidiária do art. 1.521 do Código Civil, combinado com a Súmula 341 do Supremo Tribunal Federal. Isso faz com que as empresas tenham que assumir desde logo uma política de prevenção à prática do assédio, como algumas já vinham desenvolvendo antes mesmo da aprovação da nova lei.


NOTAS

1. COSTA, Sílvia Generali da. Assédio sexual - uma versão brasileira. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1995, p. 44.

2. MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2001, p. 63.

3. VIANA, Márcio Túlio. Os dois modos de discriminar e o futuro do direito do trabalho. In VIANA, Márcio Tulio, RENAULT, Luiz Otávio Linhares et al. (coords.). Discriminação. 2000, p. 325.

4. In Manual de Direito Civil. 1975, p. 411.

5. MARTINS, Sérgio Pinto. Práticas discriminatórias contra a mulher e outros estudos. São Paulo: LTr, 1996, p.103

6. DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998, v. 2, p. 191.

7. DELGADO, Maurício Godinho. Proteções contra discriminação na relação de emprego. In VIANA, Márcio Tulio, RENAULT, Luiz Otávio Linhares et al. (coords.). Discriminação. 2000, p. 97-108.

8. SÜSSEKIND, Arnaldo. Convenções da OIT. São Paulo: LTr, 1994, p. 532.

9. Idem. Direito internacional do trabalho. 2º ed. atual., ampl. São Paulo: LTR, 1987, p. 556

10. O texto integral do parágrafo 2º é o seguinte: A adoção pelos Estados-Partes de medidas especiais, inclusive as contidas na presente Convenção, destinadas a proteger a maternidade, não será considerada discriminatória.

11. SIMÓN, Sandra Lia. A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado. São Paulo, LTr, 2000, p.172.

12. Não faz parte dos objetivos deste trabalho a avaliação de todas as formas de discriminação que ocorrem em razão de sexo, não apenas no acesso ao emprego mas a outras atividades igualmente importantes na vida humana, como à educação e ao lazer, entre outros. O presente estudo fixar-se-á na discriminação por sexo no trabalho, provocada pelo assédio sexual.

13. BARROS, Alice Monteiro de. Discriminação no emprego por motivo de sexo. In VIANA, Márcio Tulio, RENAULT, Luiz Otávio Linhares et al. (coords.). Discriminação. 2000, p. 48-49.

14. SÜSSEKIND, Arnaldo. Os princípios do direito do trabalho e a Constituição de 1988. In GIORDANI, Francisco Alberto da Motta Peixoto et al. (coords.) Fundamentos do direito do trabalho: estudos em homenagem ao ministro Milton de Moura França. São Paulo: LTr, 2000, p. 210-220.

15. In Fundamentos do direito do trabalho. Op. cit., p. 210-211.

16. In BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 47.

17. In BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p.44.

18. PIMENTEL, Sílvia, PANDJIARJIAN, Valéria. Globalização e direitos das mulheres. Folha de São Paulo Online. Opinião.08.06.2001. Internet. www.folhasp.com.br. 22.07.2001.

19. NOGUEIRA, Eliana dos Santos Alves. A disciplina jurídica do trabalho na União Européia e no Mercosul. In GIORDANI, Francisco Alberto da Motta Peixoto et al. (coords.) Fundamentos do direito do trabalho. Estudos em homenagem ao ministro Milton de Moura França. São Paulo: LTr, 2000, p. 181.

20. Trecho do interrogatório de uma vítima de assédio sexual, pressionada pelo advogado de uma empresa seguradora norte-americana, relatado pelo juiz Luis Carlos Teixeira Bonfim, do TRT-RJ, e transcrito por SANTOS, Aloysio. Assédio sexual nas relações trabalhistas e estatutárias. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

21. DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998, v. 3, p. 122.

22. In Direito Penal. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1992, v. 3, p. 99.

23. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Orientação sexual e discriminação no emprego. In VIANA, Márcio Tulio, RENAULT, Luiz Otávio Linhares et al. (coords.). Discriminação. 2000, p. 377.

24. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. São Paulo: Nova Fronteira/Folha de São Paulo, 1995, p. 66.

25. In Dicionário Jurídico. Op. cit., v. 1, p. 285.

26. FERREIRA SOBRINHO, José Wilson. Assédio sexual e justa causa. In repertório IOB de Jurisprudência. São Paulo: IOB, fev./1996, n. 4, p. 62. Grifos do original.

27. FERREIRA SOBRINHO, José Wilson. Op. cit., p. 61. Destaques do original.

28. In Assédio sexual. Tribuna do Advogado. Rio de Janeiro: OAB, maio/1998, p. 10-11.

29. ARRUDA, Hélio Mário de. O assédio sexual no direito do trabalho. Repertório IOB de jurisprudência. n. 14/98, jul..98, caderno 2, p. 289.

30. Os dois modos de discriminar e o futuro do direito do trabalho. In VIANA, Márcio Tulio, RENAULT, Luiz Otávio Linhares et al. (coords.). Discriminação. 2000, p. 325.

31. Globalização e direitos das mulheres. In Folha de São Paulo Online. Internet. www.folhasp.com.br 08.06.2001.

32. Cf. DINIZ, José Janguiê Bezerra. O assédio sexual para com a mulher trabalhadora e o conseqüente pedido de indenização por danos morais. In Repertório IOB de jurisprudência. São Paulo: IOB, set./1995, n. 17/95, p. 240.

33.In GOMES, Luiz Flávio. Buraco na lei. Revista Consultor Jurídico. Internet. www.conjur.com.br. 15.07.01, p. 1-6. Sem grifos no original.

34. DINIZ, José Janguiê Ferreira. Assédio sexual para com a mulher trabalhadora e o conseqüente pedido de indenização por danos morais. Op. cit., p. 240.

35. Os dados são de JESUS, Damásio Evangelista de. Assédio sexual: primeiros posicionamentos. In Repertório IOB de Jurisprudência. São Paulo: IOB, jul./2001, n. 13/2001, caderno 3, p. 265.

36. Assédio sexual: primeiros posicionamentos. In Repertório IOB de Jurisprudência. São Paulo: IOB, jul./2001, n. 13/2001, caderno 3, p. 265.

37. SROUR, Deborah R. Assédio Sexual. Revista Consultor Jurídico. Internet. www.conjur.com.br. 10.06.2001, p. 1.

38. SROUR, Deborah R. Assédio sexual. Op. cit. p. 1.

39. Lei do assédio sexual (10.224/01): primeiras notas interpretativas. Repertório IOB de jurisprudência. São Paulo: IOB, jul./2001, n. 13/2001, caderno 3, p. 264. O autor critica a violação do princípio da subsidiariedade do Direito penal, que o legislador cometeu ao construir a norma de sanção. Diz o doutrinador que esta jamais poderia ser a prisão e, ainda que fosse, deveria ser inferior a um ano, para permitir as soluções transacionais dos juizados especiais criminais.

40. GOMES, Luiz Flávio. Lei do assédio sexual. Op. cit., p. 263. Grifos do original.

41. Críticas à lei de assédio sexual - Lei n. 10.224/01. Boletim IBCCRIM. São Paulo: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Jun./2001, n. 103, p.12. Colaboraram VALENTE, Maria Inês Trefiglio e SILVEIRA, Renato de Mello Jorge.

42. Cf. SROUR, Deborah. Assédio Sexual. In Revista Consultor Jurídico. Op. cit., p. 1.

43. Buraco na lei. In Revista Consultor Jurídico. Op. cit., p. 3.

44. GOMES, Luiz Flávio. Buraco na lei. Op. cit., p. 4.

45. Buraco na lei. Revista Consultor Jurídico. Internet. www.conjur.com.br. 15.07.2001. p. 2.

46. Disponível através de pedido ao gabinete da deputada, por e-mail, no endereço: dep.iarabernardi@ camara.gov.br.

47. Lei do assédio sexual (10.224/01): primeiras notas interpretativas. Repertório IOB de Jurisprudência. São Paulo: IOB, jul./2001, n. 13/2001, p. 261.

48. Assédio sexual: primeiros posicionamentos. Op. cit., p. 265.

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49. Cf. decisão do TACRIM-SP, Ac 1.216.785/0, relator des. Luis Soares Mello Rolo. DJ-SP I 24.11.00, p. 141. Para caracterizar o tipo, por falta de outras provas, o Tribunal considerou a palavra da vítima como verdadeira, tendo em vista o passado do patrão acusado e as circunstâncias do fato, comentado pela vítima com a própria sobrinha do réu.

50. Lei do assédio sexual (10.224/01): primeiras notas interpretativas. In Repertório IOB de Jurisprudência. Op. cit.,.. p. 262-261.

51. SIMÓN, Sandra Lia. A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado. São Paulo: Ltr, 2000, p. 173.

52. SIMÓN, Sandra Lia. Op. cit., p. 173.

53. Idem, ibidem.

54. Cf. BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: Ltr, 1997, p. 140.

55.BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 140.

56. In Assédio sexual nas relações trabalhistas e estatutárias. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 19-20.

57. Orientação sexual e discriminação no emprego. In VIANA, Márcio Tulio, RENAULT, Luiz Otávio Linhares et al. (coords.). Discriminação. 2000, p. 380-381.

58. Cf. PIMENTEL, Sílvia, PANDJARJIAN, Valéria. Globalização e direitos das mulheres. In Folha de São Paulo Online. Internet. www.folhasp.com.br. 08.06.2001.

59. Proteção à intimidade do empregado. Op. cit., p. 177-178.

60. Lei do assédio sexual (10.224/01): primeiras notas interpretativas. Op. cit., p. 264-265.

61. Dano moral na relação de emprego. In Jornal Trabalhista. Ano XII, n. 560, p. 612.

62. MENEZES, C. A. C. Citado por SANTOS, Enoque Ribeiro dos. Dano moral na dispensa do empregado. 2. ed. São Paulo: Ltr, 2000, p. 119.

63. ARRUDA, Hélio Mário de. O assédio sexual no direito do trabalho. Op. cit., p. 288.

64. TEIXEIRA FILHO, João de Lima. O dano moral no direito do trabalho. In GIORDANI, Francisco Alberto da Motta Peixoto et al. (coords.) Fundamentos do direito do trabalho. Estudos em homenagem ao ministro Milton de Moura França. São Paulo: LTr, 2000, p. 647

65. ARRUDA, Hélio Mário de. O assédio sexual no direito do trabalho. Op. cit., p. 288-287.

66. Idem, ibidem.

67. ARRUDA, Hélio Mário de. O assédio sexual no direito do trabalho. Op. cit., p. 288.

68. Dano moral na justiça do trabalho. In Trabalho & doutrina. Março/1998. n. 16, p. 61.

69. Cf. Revista Consultor Jurídico. Internet. www.conjur.com.br. 01.07.2001, p. 2.

70. Cf. Revista Consultor Jurídico. Internet. www.conjur.com.br. 01.07.2001, p. 2.

71. SIMÓN, Sandra Lía. A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado. Op. cit., p. 176.

72. RO 2.211/94 - 1ª t. Rel. Juiz Maurício Godinho Delgado - DJMG, 23.04.94.

73. FERREIRA SOBRINHO, José Wilson. Assédio sexual e justa causa. In Repertório IOB de jurisprudência. São Paulo: IOB, fev/1996, n. 04, p. 60.

74. RUSSOMANO, Mozart Victor. CLT anotada. 3. ed. São Paulo: Forense, 2001.

75. FERREIRA SOBRINHO, José Wilson. Op. cit., p. 60.

76. RUSSOMANO, Mozart Victor. Op. cit.


BIBLIOGRAFIA

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Sobre a autora
Maria Goretti Dal Bosco

advogada, professora da Faculdade de Direito das Universidades Federal e Estadual de Mato Grosso do Sul, e da Unigran, em Dourados (MS), mestranda em Direito pela UNESP/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DAL BOSCO, Maria Goretti. Assédio sexual nas relações de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2430. Acesso em: 22 nov. 2024.

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