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União entre homosexuais:aspectos gerais e patrimoniais

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01/11/2001 às 01:00
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5. ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE O PROJETO E O SUBSTITUTIVO

O substitutivo apresentado trouxe algumas alterações ao projeto original, sendo que estudaremos as que entendermos ser de alguma relevância.

A primeira delas diz respeito à matéria disciplinada, pois o projeto inicial tratava de "união civil entre pessoas do mesmo sexo", e o substitutivo passou a tratar como "parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo"

Foi acrescentado pelo substitutivo, no artigo segundo, o parágrafo segundo, que no nosso entendimento é uma redundância com o citado artigo, uma vez que repetiu aquilo que já está disciplinado no "caput".

Temos ainda, um aspecto que entendemos ser de interesse, e também essencial para o projeto, quando vedou expressamente no artigo 3º, § 2º a adoção, tutela ou guarda de crianças ou adolescentes em conjunto, mesmo que sejam filhos de um dos parceiros.[12](9)

Além desses aspectos, foi o substitutivo que ampliou a questão da sucessão, bem como acrescentou o estabelecimento da curatela a favor do companheiro.


6. ANÁLISE CRÍTICA DO PROJETO

Pelo que pudemos observar, embora tanto o projeto como o substitutivo tenham tentado deixar transparecer que não objetivam dar à relação entre pessoas do mesmo sexo um status de casamento, não é o que está acontecendo, pois em uma leitura mais acurada do projeto, constata-se que de uma forma indireta, acaba por equiparando esse tipo de união ao casamento, que nas palavras da própria autora do projeto, são institutos divergentes, pois possui o casamento "implicações ideológicas e religiosas"[12](10) que lhe são próprias.

Demonstraremos nossas razões para chegarmos a tal conclusão.

Logo no artigo 1º, assegura o direito a propriedade e à sucessão. Quanto a propriedade não fazemos qualquer questionamento, pois como se sabe, o nosso atual sistema nunca proibiu que pessoas do mesmo sexo adquirissem em condomínio qualquer tipo de bem, seja ele móvel ou imóvel. O problema encontra-se na sucessão, pois somente o cônjuge ou companheiro é que entram na ordem da vocação hereditária. Assim, ao estender esse direito às relações entre pessoas do mesmo sexo, começaríamos a equiparar as duas instituições, oferecendo os mesmos direitos.

Quando trata dos requisitos necessários para o registro da união ou parceria em livro próprio do Cartório de Registro Civil e Pessoas Naturais, estabelece formalidades a serem cumpridas, da mesma forma que se exige para o casamento, embora de uma maneira mais simplificada.

O contrato deverá ainda versar sobre disposições patrimoniais, deveres, impedimentos e obrigações mútuas, as quais sabemos serem questões que o Código Civil preceitua para a realização do casamento. Mais uma vez dando os mesmos direitos a estes.

No caso da dissolução, assim como no casamento, o projeto estabelece que a extinção da união civil somente poderá ocorrer com decisão judicial da extinção dessa união. Sendo consensual, deverá ser homologada pelo juiz, caso contrario, deverá haver o pedido judicial de extinção da união.

Acrescentamos ainda, neste aspecto, que pode qualquer das partes requerer a extinção, caso demonstre a infração contratual em que se funda o pedido.

Vemos, com as observações feitas, que mais uma vez está estendendo os mesmos direitos e obrigações que nascem quando do casamento à relação homossexual, prevendo até casos de "separação consensual, litigiosa, fundada ou não na culpa do outro".

Assim, por essas razões, entendemos que o presente projeto busca equiparar essas uniões ao casamento, mas com outra denominação. "Data vênia", ousamos dizer que o projeto apresentado não podendo expressamente equiparar as relações entre pessoas do mesmo sexo ao casamento, pois levaria a paz social e a coletividade a rejeitar liminarmente a idéia, procurou faze-lo de forma mais branda, dando um outro nome, mas concedendo os mesmos direitos, e quem sabe até mais.


7. Direito Estrangeiro

Esse é tema vem sendo tratado nos mais diversos países, e das mais diversas formas, conforme veremos a seguir.

Em alguns países já existem leis regulamentando a união entre homossexuais, como é o caso da Groelândia, Hungria, Islândia, Noruega, Suécia, Holanda e Dinamarca, sendo que esta admite inclusive a adoção de filhos do seu parceiro.

Já a Hungria, reconhece tão somente a união de fato entre homossexuais.

No Brasil, Bélgica, Finlândia e República Checa, a lei está em discussão pelo Congresso.

A Espanha, Canadá, Bélgica, Estados Unidos e França (234 prefeituras), reconhecem o contrato de união civil.

Alguns países proíbem expressamente a discriminação por motivo de orientação sexual, como é o caso da África do Sul, Canadá, Dinamarca, Eslovênia, Espanha, França, Holanda, Noruega, Nova Zelândia, Polônia e Suécia. "No Brasil, a Câmara dos Deputados está apreciando a Proposta de Emenda a Constituição nº 139/95, da ex-deputada Marta Suplicy."[12](11)

Existe ainda países que concedem asilo político por motivo de orientação sexual: Alemanha, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, Finlândia, Holanda, Irlanda, Noruega e Suécia.

Outros concedem nacionalidade por motivo de união civil entre homossexuais, como quer fazer o Brasil, são eles, Austrália, Dinamarca, Holanda, Noruega, Nova Zelândia e Suécia.

Por fim, alguns países proíbem oficialmente que o homossexual sirva às forças armadas: Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estônia, Finlândia, Holanda, Israel, Nova Zelândia, Noruega e Suécia.

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Embora tratando neste capítulo de direito estrangeiro, achamos interessante salientar que "no Brasil, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em julgamento datado de 13 de fevereiro de 1992, reputou legal a exclusão das fileiras da corporação de componente homossexual, por comprometer a honra e o decoro da classe."[12]


8. CONCLUSÃO

Ao terminarmos o estudo que nos propusemos, chegamos a uma conclusão provisória.

No momento, diante do contexto social em que vivemos, não pode ser o projeto apresentado convertido em lei, mesmo porque contrariaria os princípios morais e éticos de nossa sociedade.

As justificativas apresentadas, entendemos serem frágeis, pois o nosso ordenamento jurídico nunca proibiu a constituição de patrimônio comum, existindo formas legais de se resguardar tais direitos.

Quanto aos outros direitos que busca-se proteger, pensamos serem direitos inerentes ao matrimônio, não podendo serem estendidos a qualquer outro tipo de relação que não sejam as legalmente permitidas.

Retomo aqui o aspecto tratado anteriormente, pois o direito positivo não pode exclusivamente encontrar sua justificativa tão somente no direito natural, devendo ir além, perquirindo se antes de atender a direitos inerentes a uma dada coletividade, está indo de encontro aos princípios morais e éticos, não podendo nos valer, para legislarmos, somente de critérios políticos, estes jamais devem prevalecer sobre a justificativa que procura o direito positivo.

Finalmente, digo que esta é uma conclusão provisória, por não ser neste mundo nada definitivo, e a constante evolução do ser humano e da sociedade em que vivemos, pode levar a novas conclusões. No mais, não existe nenhum impeditivo que alguém venha a propor um projeto que seja adequado, atenda às reais necessidades dos homossexuais, e não fira institutos há muito protegidos.


Notas

1.Código de Direito Canônico, Codex Iuris Canonici, p. 465.

2.Clovis Bevilaqua, Direito da Família, p.34.

3.Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil – Direito de Família, p. 9.

4.Domingos Sávio Brandão Lima, in Enciclopédia Saraiva de Direito, verbete Casamento, p. 394.

5.Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Minidicionário de língua portuguesa, p. 289.

6.De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, vol. II, p. 390.

7.Deputada Marta Suplicy, Justificativa ao projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

8.Deputada Marta Suplicy, Justificativa ao projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

9.Substitutivo adotado pela comissão. Projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

10.Deputada Marta Suplicy, Justificativa ao projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

11.Luiz Salem Varella, Homoerotismo no direito brasileiro e universal – Parceria civil entre pessoas do mesmo sexo. p. 98.

12.Luiz Salem Varella. op. cit. p. 99.


9. BIBLIOGRAFIA

BEVILAQUA, Clóvis. Direito da Família. 7. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1943.

Código de Direito Canônico. Codex Iuris Canonici. 7. ed. rev. e amp. São Paulo: Loyola, 1983.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

LIMA, João Batista de Souza. As mais antigas normas de direito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1989-1990. v. 2.

MOTTA, José Barros. Casamentos nulos na Igreja Católica: nova dimensão explícita do atual Código de Direito Canônico. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989. v. 1 e 2.

VARELLA, Luiz Salem. Homoerotismo no direito brasileiro e universal: parceria civil entre pessoas do mesmo sexo. Campinas, SP: Agá Júris, 2000.

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Sobre o autor
Reinaldo Mendes de Assis

advogado em São Paulo

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSIS, Reinaldo Mendes. União entre homosexuais:aspectos gerais e patrimoniais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2432. Acesso em: 24 abr. 2024.

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