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Imposto de fronteira: mais um capítulo da guerra fiscal do ICMS.

03/05/2013 às 14:58
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O Estado de São Paulo inovou ao criar uma espécie de “imposto de fronteira”, segundo a qual fica o Poder Executivo autorizado a exigir na entrada do território paulista o imposto equivalente ao valor do benefício ou incentivo, nas operações interestaduais sem amparo de convênio firmado no âmbito do CONFAZ.

Em artigo recentemente publicado, tratamos da forma, bastante duvidosa do ponto de vista moral, através da qual os Estados brigam entre si punindo os contribuintes pela concessão de benefícios fiscais ilegais. Em suma todos condenam a concessão de benefícios fiscais em desacordo com a legislação, mas, ao mesmo tempo, todos os Estados adotam tal prática. E para retaliar uns aos outros a conduta adotada é punir os contribuintes locais que compram de empresas sediadas em outros Estados, tornando assim ineficazes as legislações dos outros Estados através do não reconhecimento do crédito destacado nos documentos fiscais oriundos de outras unidades da federação, quando na origem existir benefício ilegal.

Ocorre que esta prática tem se mostrado de duvidosa eficácia na medida em que exige, por parte do fisco, a conferência da escrita fiscal de todos os contribuinte sujeitos a restrição a fim de verificar se estão ou não aproveitando o crédito restringido. A fim de contornar esta dificuldade e dar efetividade a retaliação o Estado de São Paulo inovou ao criar uma espécie de “imposto de fronteira”, previsto pela lei paulista nº 13.918/09, segundo a qual fica o Poder Executivo autorizado a exigir na entrada do território paulista o imposto equivalente ao valor do benefício ou incentivo, nas operações interestaduais beneficiadas ou incentivadas sem amparo de convênio firmado no âmbito do CONFAZ.

Significa dizer que quando um contribuinte gaúcho, por exemplo, que goze no Estado de origem de benefício fiscal concedido sem amparo do CONFAZ equivalente por hipótese a 5% do valor da operação, remeter a um cliente paulista determinada mercadoria destacando na nota fiscal um crédito de 12%, ficará o destinatário da mercadoria sujeito ao recolhimento imediato de 7% (12% - 5%) no momento do ingresso da mercadoria no território paulista.

  A medida é uma espécie de autotutela, ou exercício arbitrário das próprias razões, através da qual o fisco paulista, para não depender do agir do Poder Judiciário, lança mão de uma inconstitucionalidade com o fito de coibir outra. Do ponto de vista da política pública, ou da guerra fiscal, fica evidente que o Estado de São Paulo com a adoção da medida fica um passo à frente dos demais Estados, pois sendo ele o maior mercado consumidor torna-se menos atraente para as empresas de uma maneira geral aceitar benefícios concedidos por outros Estados para neles se instalarem na medida em que tais benefícios serão anulados, e punidos, no momento do ingresso da mercadoria em solo paulista. A manutenção do equilíbrio e isonomia concorrencial entre os Estados na briga pela atração de investimentos, passará, pois, pelos demais Estados adotarem medida idêntica.

Por outro lado, na defesa de investimentos já realizados, cabe aos contribuintes insurgirem-se contra a medida. O Poder Judiciário, nas instâncias superiores, tem reconhecido de forma reiterada que o direito ao crédito devidamente destacado no documento fiscal, independe do efetivo pagamento do tributo feito na origem (REsp 1125188/MT, ministro Benedito Gonçalves, julgado em 18 de maio de 2010). De igual forma o STF, em decisões monocráticas, já manifestou o entendimento de que não cabe aos Estados fazer as vezes do Poder Judiciário para declarar ilegais os benefícios fiscais concedidos por outros Estados (AC 2611 MC, ministra Ellen Gracie, julgado em 07 de maio de 2010), decisão esta que o STJ não tardou em seguir (RMS 31.714-MT, Min. Castro Meira).

Conclui-se assim que as empresas tem direito ao creditamento integral do ICMS destacado nas operações interestaduais com as mercadorias adquiridas outras Unidades da Federação que recebem benefícios e concessões sem amparo do CONFAZ, ainda que tal prática seja vedada pela Lei Complementar 24/75 em seus artigos 1º, parágrafo único e incisos e art. 8º, I, II e parágrafo único, devendo para tanto recorrer ao Poder Judiciário a fim obter o devido amparo. Tal direito baseia-se no fato do imposto vir destacado na nota fiscal, que é o instrumento que determina a relação tributária,  desde que emitido de acordo com normas tributárias aplicáveis e pela Resolução do Senado nº 22/89.

Caso o Estado de destino se sinta lesado com a prática do Estado de origem de concessão de benefícios fiscais de ICMS sem observâncias das regras da Lei Complementar 24/75, não pode ele prejudicar o contribuinte que está agindo de acordo com as normas tributárias válidas e vigentes, cabendo àquele Estado obter junto ao Supremo Tribunal Federal, a inconstitucionalidade da lei do Estado de origem das mercadorias. Qualquer restrição, como a recentemente instituída pelo Estado de São Paulo, vai de encontro ao Princípio da não-cumulatividade disposto no artigo 155, § 2º, I da Constituição Federal, e artigo 19 da Lei Complementar 87/96.

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Sobre o autor
Ricardo Paz Gonçalves

Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS; Advogado inscrito na OAB-RS sob nº 75.209; Extensão em Gestão Tributária Empresarial pela FEEVALE, Consultor externo do Sebrae-RS nas áreas de Políticas Públicas e Desenvolvimento de Metodologias; Membro ativo da Fundação Escola Superior de Direito Tributário (FESDT).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Ricardo Paz. Imposto de fronteira: mais um capítulo da guerra fiscal do ICMS.. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3593, 3 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24326. Acesso em: 22 dez. 2024.

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