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Alterações na consolidação das leis do trabalho. Avanços e retrocessos.

(trabalho aos domingos, controle da jornada de trabalho e horas in itinere)

Leia nesta página:

INTRODUÇÃO:

Este trabalho procura discutir, sem encerrar a questão, algumas das atuais alterações, diretas e indiretas, da Consolidação das Leis do Trabalho, um diploma legal com mais de meio século de existência, saudado à sua época como o refúgio do trabalhador e atualmente criticado pela dificuldade que causa no relacionamento entre capital e trabalho.

Apesar de ser um assunto que sempre traz reações antagônicas, uma vez que quase sempre entende-se que alterações à C.L.T. trazem prejuízos à classe trabalhadora com a teórica perda dos chamados "direitos sociais", falaremos sobre o trabalho aos domingos, sobre o controle da jornada de trabalho e sobre o pagamento do que convencionou-se chamar de "horas in itinere".

Algumas dessas alterações, como a experiência tem nos mostrado, podem-se caracterizar como avanços, apesar de tímidos, e outras alterações, como verdadeiros retrocessos.

Tal fato se deve, mesmo que tardiamente e apesar de um sentimento paternalista ainda pugente, ao reconhecimento, por parte de nosso legislador, da mudança no relacionamente entre capital e trabalho, já que estes cada vez mais são representados por entidades que procuram modernizar-se e fortalecer-se, além de possuir um grande poder de mobilização.

Respectivas alterações também decorrem da necessidade de flexibilizar o contrato de trabalho, com o objetivo de aumentar a oferta de vagas de emprego, face ao grande contingente de pessoas que vem sendo lançado anualmente no mercado de trabalho e visa aumentar a competitividade de nossas empresas, face a um mundo cada vez mais globalizado, onde, inclusive, os chamados "encargos sociais" são exportados.


DO TRABALHO AOS DOMINGOS:

Uma das alterações, mesmo que indireta, à Consolidação das Leis do Trabalho, e que pode-se caracterizar como um avanço, apesar de tímido, foi a autorização do trabalho aos domingos pelo comércio varejista em geral, com a promulgação da Lei nº 10.101, de 19 de dezembro de 2.000, nascida para o mundo jurídico através da Medida Provisória nº 1.982-77/2000.

Tal autorização foi um alívio, para o comércio, e um avanço. Alívio, por que a margem de lucro do comércio vem caindo ano a ano, apesar dos recordes de venda; e avanço, por que o comércio poderá, com o aumento no volume de vendas, e mesmo com baixas margens de lucro aumentar o quadro de funcionários, aumentando a oferta de empregos.

A autorização para o trabalho aos domingos vem expressa no artigo 6º e seu parágrafo único, da Lei nº 10.101/00, que determina:

"art. 6º. Fica autorizado, a partir de 9 de novembro de 1997, o trabalho aos domingos no comércio varejista em geral, observando o art. 30, inciso, I, da Constituição.

Parágrafo Único ­ o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de quatro semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho e outras previstas em acordo ou convenção coletiva."

Analisando a norma legal, acima transcrita, vê-se que esta é de aplicação imediata não necessitando, sequer de regulamentação, uma vez que, pura e simplesmente, "autoriza o trabalho em domingos do comércio varejista em geral"

Observe-se, também, que a disposição legal ao autorizar o funcionamento do comércio varejista em geral, não impõe nenhuma condição ou restrição, liberando todo e qualquer tipo de atividade varejista, independentemente de autorização, seja ministerial, seja municipal.

Note-se, ainda, apesar da autorização do trabalho aos domingos o parágrafo único do artigo 6º, determina que sejam respeitadas as normas de proteção ao trabalho, bem como os acordos ou convenções coletivas, dando margens à negociação a nível sindical, o que fortaleçe as entidades representativas patronal e laboral, bem como enaltece os direitos nelas consagrados.

Mencione-se, também, que o "caput" do artigo 6º, da Lei nº 10.101/00, faz referências ao disposto no artigo 30, inciso I, da C.F., que apenas autoriza o Município a legislar sobre assuntos de interesse local.

Contudo, tais interesses locais devem sujeitar-se ao interesse coletivo de alcance nacional, aliás como ficou decido no Recurso Especial nº 297358/PR, da Primeira Turma do C. STJ, em que foi Relator o Ilustre Ministro José Delgado, julgado em 15/03/2001.

Logo, com o advento da Lei nº 10.101/00 o comércio de um modo geral ficou autorizado a funcionar aos domingos, independentemente de qualquer tipo de autorização, competindo apenas aos Municípios legislar sobre assuntos de seu interesse e desde que não entrem em confronto com o interesse nacional.


DA JORNADA DE TRABALHO:

Outro ponto que foi alterado, só que diretamente na Consolidação das Leis do Trabalho, foi a mudança dos parágrafos 1º e 2º do artigo 58, que trata da jornada de trabalho. Estas alterações consagraram entendimentos jurisprudenciais majoritários, que tratavam do assunto.

A mudança do parágrafo 1º, do artigo 58, da CLT, também como a anterior tímida, pode-se considerar como um avanço, autoriza uma variação de horário no registro de ponto de até 05 (cinco) minutos, limitados a 10 (dez) minutos diários.

Tal determinação significa o uso do bom senso, uma vez que reconhece a dificuldade, de milhares de empresas, com relação ao registro de ponto de seus colaboradores, apesar de investirem nas mais altas tecnologias de controle de jornada de trabalho.

Reconhece, ainda, o atual parágrafo 1º do artigo 58, um princípio de física que menciona que dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo, o que, consequentemente, acarreta variações no registro da jornada de trabalho de colaborador para colaborador, ante a precisão cada vez maior dos atuais sistemas de controle de jornada.

Destaque-se, ainda, que tal medida enaltece o Judiciário, como fonte do direito, uma vez que consolida entendimento jurisprudencial dominante que reconheceu com sensibilidade e bom senso as dificuldades que tais flutuações na jornada de trabalho traziam no relacionamento entre empresa e colaboradores, sendo um avanço.Vê-se, assim, que pequenas alterações podem acarretar grandes benefícios, concedendo segurança e tranquilidade, tanto ao setor produtivo empresarial, como ao setor produtivo laboral.

1) das horas "in intinere":

Porém, juntamente com as alterações acima mencionadas, algumas alterações do Diploma Consolidado trouxeram retrocessos visíveis, é o caso do atual parágrafo 2º do artigo 58, que também teve origem em um entendimento jurisprudencial dominante.

Apesar dos entendimentos em contrário, esta mudança vai na contra-mão das necessidades, tanto das empresas como de seus colaboradores.

Estabelece o parágrafo 2º "in fine", alterado pela Lei nº 10.243, de 19 de junho de 2.001, que:

"§ 2º. O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução."

O pagamento pelo empregador do período em que o trabalhador percorre trajeto até o local de trabalho, considerado de difícil acesso ou não servido por transporte público, foi uma construção jurisprudencial baseada na necessidade da empresa na prestação dos serviços daquele profissional.

Contudo, respectivo entendimento jurisprudencial, não analisou o fato de que se é uma necessidade da empresa, a prestação de serviços, também é do interesse do trabalhador e da Nação a abertura de novos postos de trabalho.

A atual redação parágrafo 2º, do artigo 58, não analisou as mudanças ocorridas nas últimas décadas, no relacionamento entre o capital e trabalho, e penalisa, principalmente, o empregador rural, o micro, pequeno e médio empresários, que juntos são os maiores empregadores, inclusive, da chamada mão de obra não qualificada, no País.

Penalisa o empresário rural, por que o local de trabalho deste localiza-se no campo, onde o transporte público é insipiente ou nulo; prejudica os micros, pequenos e médios empresários, já que estes por força da contingência econômica, deslocam suas unidades fabris a distritos industriais que guardam grandes distâncias dos centros urbanos, também encontrando dificuldade no oferecimento de transporte público.

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Destaque-se, ainda, que o prejuízo, também será do trabalhador não qualificado, que econtrará dificuldade em sua colocação ou recolocação no mercado de trabalho, uma vez que as maiores empresas o rejeitarão, e o produtor rural, bem como o micro, pequeno e médio empresário, evitarão contratações ante a penalisação imposta com o pagamento de "horas in itinere".

Nos dias atuais em que o trabalhador dos centros urbanos utilizam-se, não raro, de mais de uma condução para chegar ao serviço e mesmo assim não são beneficiados com a jornada "in itinere" é um contra senso condenar uma empresa que fornece um transporte especial.

Antes da malfadada altreação do parágrafo 2º, do artigo 58 da C.L.T., uma parte significativa de nosso judiciário, "nadando contra a corrente" e utilizando-se do bom senso, vinha reconhecendo o contra senso do pagamento da chamada hora "in itinere", bem como a incompatibilidade da mesma face à ótica do moderno Direito do Trabalho.

Destes entendimento destacamos os acórdãos abaixo transcritos:

"Hora in itinere. O empregador, ao fornecer condução ao empregado, para conduzí-lo ao serviço e para o retorno ao lar, está proporcinando-lhe mais conforto e bem estar pelo que não deve ser penalizado com o ônus das horas in itinere. Além do mais, o Enunciado 90 não contempla os casos em que o empregado paga o transporte ao empregador e em que não há ausência de transporte público, mas apenas insuficiente deste. Revista provida. Ac. TST 1ª T (RR 17379/90.7), Rel. (designado) Min. Afonso Celso, DJU 31/10/91, p. 15538."

"A visão moderna do Direito do Trabalho é incompatível com o reconhecimento de horas in itinere. O transporte assegurado pela empresa ao empregado deve ser aplaudido ao invés de onerá-la ainda mais, o que não se sustenta nem legal nem socialmente, porquanto os lugares de difícial acesso ou ‘não servidos por transporte regular’ deixam de sê-lo diante da condução oferecida. Ademais, conflita com o bom senso jurídico o inexplicável entendimento de que empregados que se valham não raro de mais de uma condução para alcançar o seu local de trabalho não sejam beneficiados com a jornada in itinere, enquanto é reconhecida àqueles que são transportados das suas casas até o local de trabalho, em condução especial. Ac. TRT 12ª Reg. 2ª T (Proc. 3308/91), Rel. Juiz Hemut A. Schaarschimidt, Synthesis nº 16/93, p. 252)"

Por tanto, as medidas adotadas pelo parágrafo 2º, do artigo 58 do Diploma Consolidado ferem o bom senso e caracterizam-se como uma medida paternalista e um retrocesso, frente as atuais necessidades do mercado de trabalho.


CONCLUSÃO:

Das alterações acima discutidas, apesar dos avanços, tímidos, e dos retrocessos, temos a saudar o início de reformas a um Diploma Legal que engessa e dificulta o contrato de trabalho, temos, contudo, a lamentar o sentimento paternalista do legislador, que antes de mais nada deveria procurar fortalecer as entidades representativas tanto laboral como patronal a fim de que estas discutissem diretamente a melhor forma de contratação, com a menor interferência possível do Estado.

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Sobre o autor
Luís Fernando Lavigne de Souza

advogado em Sorocaba (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Luís Fernando Lavigne. Alterações na consolidação das leis do trabalho. Avanços e retrocessos.: (trabalho aos domingos, controle da jornada de trabalho e horas in itinere). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2433. Acesso em: 25 nov. 2024.

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