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Responsabilidade do Estado decorrente de atos judiciais

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01/11/2001 às 01:00
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7. Excludentes da responsabilidade do Estado-Juiz pelo

exercício da atividade judicial

Nosso sistema adota a responsabilidade objetiva do Estado, assim sendo, este somente não será responsabilizado, total ou parcialmente, se for rompido o nexo de causalidade.

7.1.Culpa exclusiva da vítima

Eis o magistério de Oreste Nestor de Souza Laspro:

"Se um determinado indivíduo sofreu um dano oriundo de uma ação ou omissão de um agente do estado, em princípio, estaria formado o liame entre a causa e o prejuízo e, portanto, nasceria o direito ao ressarcimento. Ocorre que, muitas vezes, pode ser que o resultado danoso somente tenha ocorrido em razão da culpa da vítima, ou seja, esta, por ação ou omissão, contribuiu definitivamente para que assumisse a condição de vítima. Nessas situações, em princípio, temos o rompimento do nexo causal com o ato do agente estatal, não existindo direito ao ressarcimento. Com efeito, é indispensável se verificar o fenômeno das concausas. Isso significa que precisamos examinar se a culpa constitui a causa fundamental e exclusiva do dano ou se, por algum modo, ainda subsiste o nexo causal com a ação do agente estatal. Dessa maneira, sempre que o dano não for resultado somente da culpa da vítima, mas também da ação do agente estatal, não temos a exclusão completa do dever de ressarcir, mas sim, uma redução do valor a ser pago, de modo proporcional à responsabilidade de cada um dos envolvidos" (2000:82)

7.2. Força maior

Vale a lição de Clóvis Beviláqua (Código Civil, Liv. Francisco Alves, 10ª ed., vol. IV/173):

Caso fortuito "é o acidente produzido por força física ininteligente, em condições que não podiam ser previstas pelas partes"

Força maior "é o fato de terceiro, que criou, para a inexecução da obrigação, um obstáculo, que a boa vontade do devedor não pode vencer".

Assim, a força maior é uma causa conhecida de um evento certo, mas que pelas suas características é irresistível; embora todos saibam que um determinado fato possa ocorrer, não se é capaz de evitá-lo.

Já o caso fortuito é um acontecimento também incontrolável, mas desconhecido na sua origem, ou seja, enquanto a força maior é um fato externo, o caso fortuito está inserido no ato do agente estatal, razão pela qual o nexo causal não é rompido e persiste a responsabilidade, eis a lição do Prof. Laspro.

Segue o ilustre autor: "Importante notar, contudo, que também aqui a questão das concausas é importante. Com efeito, muito embora, como regra geral, o dano oriundo da força maior não seja passível de ressarcimento, muitas vezes a omissão ou a ação culposa ou dolosa do Estado contribui para que o dano ocorra. Nessas situações, o nexo causal persiste e, portanto, o Estado é responsável.

Com ênfase, conclui o Prof. Laspro:

"De fato, o rompimento do nexo de causalidade não está simplesmente na mera força maior, mas sim, na presença de seus dois requisitos, quais sejam, necessidade e inevitabilidade. Segundo a necessidade, o dano deve ser produto direto e exclusivo da força maior. Já a inevitabilidade relaciona-se à impossibilidade de serem afastados os efeitos danosos" (2000:83).


8. A indenização por danos morais

Consubstanciado o dano atribuído ao Estado, no exercício da atividade judiciária, a indenização pelos prejuízos causados deve ser a mais completa. Nessa seara, vem à tona a discussão sobre o cabimento do dano moral.

A honra é um valor imanente à personalidade, de manifestações complexas e dificilmente redutíveis a um conceito unitário. De um lado, compõe-se na auto-estima, no sentimento pessoal da própria dignidade. D’outro lado, define-se como a consideração, o respeito que cercam o cidadão no meio em que vive, a sua reputação. Define-se a primeira como honra subjetiva e a segunda como honra objetiva.

A consideração, o respeito a que toda pessoa tem direito - acentua Roberto H. Brebbia - constituindo uma espécie de atmosfera moral que circunda os indivíduos que observam uma conduta correta, tomam o nome de honra, ressaltando um dos bens pessoais, ou personalíssimos, que, em maior ou menor medida, todos os sistemas jurídicos protegem.

Georges Rippert - "A Regra Moral nas Obrigações Civis", Saraiva, 1937 - já assinalava inexistir qualquer hesitação na jurisprudência francesa face à admissibilidade da reparação ao prejuízo moral. E arremata : "Se a lei menciona o dever moral de não prejudicar outrem no corpo e nos bens, como poderia ficar indiferente diante do insulto à alma? ".

O patrimônio moral é o mais perene dos legados, "não se esvai e nem é corroído pela passagem dos tempos". Nestes termos o Ministro Pedro Lessa afirmou : "Deixar de admitir a indenização por dano moral significa a recusa da proteção jurídica às mais nobilitantes condições do desenvolvimento humano, as puramente morais".

Em igual sentido a indagação do Mestre Aguiar Dias : "O espírito da lei, não deixa nenhuma dúvida - quer salvaguardar todos os direitos do homem, todos os seus bens; ora, nossa honra, nossa consideração não serão os mais preciosos dos bens ?".

Eis o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

"Direito Constitucional e Administrativo. Responsabilidade Objetiva. Prisão Ilegal. Danos Morais.

1.O estado está obrigado a indenizar o particular quando, por atuação dos seus agentes pratica contra o mesmo, prisão ilegal.

2.Em caso de prisão indevida, o fundamento indenizatório da responsabilidade do Estado deve ser enfocado sobre o prisma de que a entidade estatal assume o dever de respeitar integralmente, os direitos subjetivos constitucionalmente assegurados ao cidadão, especialmente de ir e vir.

3.O Estado, ao prender indevidamente o indivíduo, atenta contra os direitos humanos, provoca dano moral ao paciente, com reflexos em suas atividades profissionais e sociais.

4.A indenização por danos morais é uma recompensa pelo sofrimento vivenciado pelo cidadão, ao ver, publicamente, a sua honra atingida e o seu direito de locomoção sacrificado.

5.A responsabilidade pública por prisão indevida, no direito brasileiro, está fundamentada no art. 5º, LXXV, da CF".

(STJ, Resp. nº 220.982/RS, Rel. Min. José Delgado, DJU 03.abr.2000)

No mesmo diapasão, a indevida constrição judicial, seja cível ou penal, pode gerar a obrigação de indenizar pela ocorrência de danos morais, inobstante o pleito referente aos danos materiais.

9. Conclusão

Com o costumeiro acerto, eis a síntese do Prof. Cretella Júnior:

"a) a responsabilidade do Estado por atos judiciais é espécie do gênero responsabilidade do Estado por atos decorrentes do serviço público;

b)as funções do Estado são funções públicas, exercendo-se pelos três Poderes;

c)o magistrado é órgão do Estado; ao agir, não age em seu nome, mas em nome do Estado, do qual é representante;

d)o serviço público judiciário pode causar dano às partes que vão a juízo pleitear direitos, propondo ou contestando ações (Cível); ou na qualidade de réus (Crime);

e)o julgamento, quer no Crime, quer no Cível, pode consubstanciar-se no erro judiciário, motivado pela falibilidade humana na decisão;

f)por meio dos institutos rescisório e revisionista é possível atacar-se o erro judiciário, de acordo com a s formas e modos que a lei prescrever, mas, se o equívoco já produziu danos, cabe ao Estado o dever de repará-los;

g)voluntário ou involuntário, o erro de conseqüências danosas exige reparação, respondendo o Estado civilmente pelos prejuízos causados; se o erro foi motivado por falta pessoal do órgão judicante, ainda assim o Estado responde, exercendo a seguir o direito de regresso sobre o causador do dano, por dolo ou culpa;

h)provados o dano e o nexo causal entre este e o órgão judicante, o Estado responde patrimonialmente pelos prejuízos causados, fundamentando-se a responsabilidade do Poder Público, ora na culpa administrativa, o que envolve também a responsabilidade pessoal do juiz, ora no acidente administrativo, o que exclui o julgador, mas empenha o Estado, por falha técnica do aparelhamento judiciário" (RDA 99:13)

Vale ressaltar que não se pode responsabilizar o magistrado pelas decisões que

tome quando se trata de simples erro de apreciação ou de interpretação. Os únicos casos nos quais sua responsabilidade pode ser admitida, em ação regressiva, são os que demonstrem uma culpa qualificada (grosseira, no dizer do mestre Canotilho) ou mesmo dolo, situações que um magistrado sério e razoavelmente diligente não cometeria.

Por derradeiro, transcrevo a manifestação do Ministro José Augusto Delgado, exemplo de magistrado e professor:

"A realidade mostra que não é mais possível a sociedade suportar a morosidade da Justiça, quer pela ineficiência dos serviços forenses, quer pela indolência dos seus juízes. É tempo de se exigir uma tomada de posição do Estado para solucionar a negação da Justiça por retardamento da entrega jurisdicional. Outro caminho não tem o administrado, senão o de voltar-se contra o próprio Estado que lhe retardou justiça e exigir-lhe reparação civil pelo dano, pouco importando que tal via também enfrente idêntica dificuldade. Só o acionar já representa uma forma de pressão legítima e publicização do seu inconformismo com a Justiça emperrada, desvirtuada e burocrática" (Revista Jurídica 226 / 5).

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Bem assim, de modo a espancar dúvidas, a sugestão do Prof. João Sento Sé:

"Convém que o inc.LXXV do art. 5º, da Constituição de 1988 passe a ter a seguinte redação: ‘O Estado indenizará danos causados por erro judiciário e também por funcionamento defeituoso do serviço judiciário" (1976:66)

O cidadão pois, precisa fazer valer o seu direito à uma prestação jurisdicional célere e justa. Para tanto é necessário responsabilizar civilmente o Estado pela má prestação do serviço judiciário, como a única forma de melhorá-lo.


BIBLIOGRAFIA

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Sobre o autor
José Barroso Filho

magistrado da Justiça Militar da União, professor universitário, doutorando em Administração Pública pela Universidad Complutense de Madrid (Espanha), mestre em Direito pela UFBA, especialista em Direito Público pela UNIFACS, pós-graduado pela Escola Judicial Edésio Fernandes/MG e pela Escola de Formação de Magistrados/BA, conferencista da Escola de Administração do Exército (ESAEX), diretor científico do Centro de Cultura Jurídica da Bahia (CCJB), membro do Núcleo de Ação Social (CORDIS), ex-juiz de Direito em Minas Gerais e Pernambuco, ex-promotor de Justiça na Bahia

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROSO FILHO, José. Responsabilidade do Estado decorrente de atos judiciais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2454. Acesso em: 22 dez. 2024.

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