S u m á r i o : 1. Introdução; 2. Dados Numéricos; 3. Definições de comércio eletrônico; 4. Cenário Internacional; 5. Questões jurídicas, 5.1. Violação de privacidade, 5.2. Marcas e Domínios, I. pirataria de nomes de domínio, II. Questão de técnica legislativa, 5.3. Compras on-line, I. segurança das transações financeiras, II. formas de pagamento , III. direito do consumidor, IV. contratos de compra e venda, V. Meios de Prova: Código de Processo Civil, VI. Direito Tributário; 6. CONCLUSÕES; 7. Referências Bibliográficas
1Introdução
O presente trabalho foi produzido com o objetivo de fornecer bases jurídicas para a discussão acerca do comércio eletrônico no Brasil, mais precisamente no Estado do Rio de Janeiro. A pesquisa foi realizada com o apoio da FAPERJ, que financiou bolsa de Iniciação Científica, e foi executada em dois setores da COPPE, UFRJ: no ITOI - Área de Inovação Tecnológica e Organização Industrial da Engenharia de Produção, e no Crie - Centro de Referência em Inteligência Empresarial / Inovelab - Laboratório de Inovação e Empreendedorismo.
Devido ao imenso universo trazido pelos problemas jurídicos ligados ao uso da internet, fomos obrigados a restringir nossa análise aos temas mais ligados ao comércio, sem nos aprofundarmos em ramos como crimes, direitos autorais e outros temas.
Sabemos, porém, que tais acontecimentos não são estanques, e em diversas ocasiões poderão estar correndo em paralelo com as questões comerciais (por exemplo, uma fraude no serviço bancário decorrente de uso indevido de cartão de crédito furtado em compra on-line). Porém, a limitação do tema leva a uma separação dos assuntos adequados, ressaltando-se portanto que estas nuances não devem ser ignoradas pelos profissionais do direito.
Em primeiro lugar buscamos delinear um perfil do estado atual da internet no Brasil, através de dados estatísticos. Buscamos também selecionar algumas definições do que vem a ser comércio eletrônico, para situar os leitores no foco de nosso estudo. Descrevemos brevemente o cenário internacional, para destacar a necessidade de mudanças jurídicas, facilitando as trocas comerciais e a solução de conflitos gerados pela internet.
Em seguida, passamos à análise específica de alguns dos problemas práticos gerados pela implantação do comércio eletrônico em diversas economias mundiais, que trouxeram como consequência desafios legais que ainda esperam por respostas efetivas. Buscamos além de fontes doutrinárias, fazer uma espécie de legislação comentada, do que dispomos hoje. O texto legal original fica ao final do artigo, tornando possível ao leitor acompanhar as idéias centrais sem se dispersar com a citação das fontes originárias.
O avanço em larga escala destes tipos de problemas clama por soluções que sejam ao mesmo tempo adequadas aos tempos da nova economia, e mantenham a obediência ao sistema legal vigente em nosso país. Além disso, lembramos que será necessário um entendimento dos governos dos países envolvidos, buscando minimizar os prejuízos e padronizando os acordos internacionais, sempre que possível.
Selecionando algumas estimativas sobre o uso da Internet no Brasil, verificamos que em pesquisa realizada pelo Ibope ( 8ª edição da Pesquisa Internet POP(1)), 19% da população das nove principais regiões do Brasil acessa a Internet, ainda que de vez em quando. Ao todo, são 7,2 milhões de Internautas.
A maior parte, 72%, ainda pertence às classes A e B e é do sexo masculino, 53%. A pesquisa mostra ainda que, de maio a agosto, houve um crescimento tanto na quantidade de computadores, como no número de equipamentos com acesso à Internet. Surge um novo mercado consumidor de produtos e serviços na internet, e com ele os problemas jurídicos daí decorrentes.
Em outra pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, ALBERTIN(2) com aproximadamente 150 empresas entre julho de1999 e março de 2000, informa as amostras obtidas por setor e por faturamento. Estas amostras fornecem um panorama do estado atual dos setores da economia em relação ao comércio eletrônico no Brasil.
Setor |
% |
Serviços |
49 |
Indústria |
41 |
Comércio |
10 |
Faturamento |
% |
Pequenas |
22 |
Médias |
35 |
Grandes |
43 |
3Definições de comércio eletrônico
Selecionamos algumas definições do que se entende por comércio eletrônico, para que possamos restringir nosso artigo a definições acadêmicas precisas, e não a simples orientações genéricas:
1) CASTRO: "Conjunto de operações de compra e venda de mercadorias ou prestações de serviço por meio eletrônico, ou, em outras palavras, as transações com conteúdo econômico realizadas por intermédio de meios digitais".(3)
2) PASSAMONTI E LUCCHI: "Comércio eletrônico corresponde às transações comerciais baseadas na transmissão eletrônica de dados, através de redes de comunicação, como a internet".(4)
3) OECD: "Transações econômicas baseadas no processamento e transmissão de dados digitalizados, envolvendo tanto organizações, como indivíduos, incluindo textos, sons e imagens visuais e que são transportadas em redes abertas (como a internet) ou redes fechadas (como a AOL ou o Minitel) que possue, um gateway para uma rede aberta".(5)
4) ALBERTIN: "Comércio Eletrônico é a realização de toda a cadeia de valores dos processos de negócios em um ambiente eletrônico, por meio da aplicação intensa das tecnologias de comunicação e de informação, atendendo aos objetivos de negócio. Os processos podem ser realizados de forma completa ou parcial, incluindo as transações negócio-a-negócio, negócio-a-consumidor e intra-organizacional, em uma infra-estrutura de informação e comunicação predominantemente pública, de acesso fácil, livre e de baixo custo"(6).
O comércio eletrônico pode ser ainda classificado em direto ou indireto, conforme o tipo de mercadoria comercializada (CASTRO): comércio eletrônico direto, compra e venda de bens intangíveis (softwares, músicas, pesquisas); comércio eletrônico indireto (encomenda de bens tangíveis: livros, cds, brinquedos, equipamentos).
Segundo SEIXAS FILHO(7), estudando documentos da Comissão Européia, com o desenvolvimento do comércio eletrônico, diversas mudanças ocorreram no cenário da internet comercial:
-aumento do mercado potencial
-necessidade de investimentos em estrutura / tecnologia / logística
-necessidade de serviços de atendimento ao cliente adequados à nova realidade
-criação de novas funções profissionais
Ele cita alguns comentários da iniciativa da Comissão Européia em Comunicação ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comitê Econômico e ao Comitê as Regiões (COM - 97/157), que são importantes para situar os profissionais nas necessidades da internet comercial, para um adequado desenvolvimento do comércio eletrônico:
-necessidade de consenso mundial em termos jurídicos, através de tratados e convenções (ex.: Relatório BAR);
-desenvolvimento da infra-estrutura de telecomunicações;
-garantia do ambiente da livre-concorrência, evitando fraudes e monopólios; presença da boa-fé comercial;
-para se ter um ambiente comercial favorável: confiança e segurança;
-garantia dos serviços, desenvolvimento da cultura internet e preparar os consumidores;
-evitar legislação inepta;
-basear a legislação nos usos e costumes comerciais;
-proteger os direitos de propriedade intelecutal;
-melhorar a administração pública, tornando-a dinâmica, capaz de prover serviços
aos cidadãos (ex.: pagamento de dívidas com a união totalmente on-line).
Este levantamento não pretende ser exaustivo, porque novos casos surgem todos os dias, ainda que não divulgados por questões de segurança e privacidade das partes envolvidas. Realizamos uma seleção de hipóteses capazes de ilustrar o que pode ocorrer em comércio eletrônico, classificadas por ramos do direito, e buscamos sempre relacionar estas hipóteses à realidade da legislação brasileira.
Ainda não existe jurisprudência consolidada no Brasil, pois os casos estão, em sua maioria, ainda sendo julgados. Nosso artigo traz além de legislação e jurisprudência, a opinião de diversos profissionais da área jurídica, citados ao final dos trabalhos.
Este tipo de infração legal pode ocorrer com a venda de cadastros de clientes ou com a ou cópia não-autorizada de registro de usuários inscritos em um site. Abrange dois aspectos: o aspecto comercial decorre do compromisso da empresa em assumir uma política de privacidade de dados perante seus usuários; o aspecto técnico surge da necessidade de arquivamento de dados com as devidas preocupações com a segurança, em servidores protegidos contra invasões.
Entre os direitos e garantias fundamentais está a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.
Do mesmo modo ocorre com a correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas (art. 5o, X e XII da Constituição Federal de 1988).
A violação de privacidade pode dar margem a danos causados por leitura não autorizada de e-mails, dados sobre as preferências de determinados consumidores, classe social, nível econômico, etc.
Para obter o registro de uma marca, é necessário apresentar o pedido ao INPI - Instituto Nacional de Propriedade Industrial, que o examinará com base nas normas legais estabelecidas pela Lei da Propriedade Industrial e nas resoluções administrativas.
Para registrar um domínio, a FAPESP adota o princípio de "first come, first get", ou seja: "o Registro de Nome de Domínio adotará como critério o princípio de que o direito ao nome do domínio será conferido ao primeiro requerente que satisfizer, quando do requerimento, as exigências para o registro do nome, conforme as condições descritas nesta Resolução e seus Anexos"(art. 1o da Resolução Nº 001/98).
Os conflitos decorrem da própria definição legal:
A Lei no. 9.279 de 14/05/1996 define suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais (art. 122). Considera ainda:
"I - marca de produto ou serviço: aquela usada para distinguir produto ou serviço de outro idêntico, semelhante ou afim, de origem diversa;
II - marca de certificação: aquela usada para atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinadas normas ou especificações técnicas, notadamente quanto à qualidade, natureza, material utilizado e metodologia empregada; e
III - marca coletiva: aquela usada para identificar produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade" (art. 123).
Por outro lado, de acordo com a Fapesp: "Domínio é um nome que serve para localizar e identificar conjuntos de computadores na Internet. O nome de domínio foi concebido com o objetivo de facilitar a memorização dos endereços de computadores na Internet. Sem ele, teríamos que memorizar uma sequência grande de números" (8)
A lei no. 9.279 de 14/05/1996 garante que "a propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, conforme as disposições desta lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, observado quanto às marcas coletivas e de certificação o disposto nos arts. 147 e 148".
Parágrafo 1o.- Toda pessoa que, de boa fé, na data da prioridade ou depósito, usava no País, há pelo menos 6 (seis) meses, marca idêntica ou semelhante, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, terá direito de precedência ao registro.
Parágrafo 2o.- O direito de precedência somente poderá ser cedido juntamente com o negócio da empresa, ou parte deste, que tenha direta relação com o uso da marca, por alienação ou arrendamento" (art. 129).
Porém, devemos nos recordar de que o direito não é uma ciência exata, e portanto existem outros pontos de vista. Sobre isto, ALMEIDA (9) informa um diferente ponto de vista:
"É interessante reparar que esta postura está de acordo com a jurisprudência dos diversos países (por exemplo, a da França) que têm decidido que o nome de domínio não é um direito de propriedade intelectual convencional, é algo distinto, não previsto nas convenções internacionais de direitos autorais ou de marcas. Sendo assim, e como não convém equalizar realidades heterogêneas, as cortes têm ensinado que não é adequada, ou não basta, a correspondência entre domínios e marcas".
Outro conflito surge quanto à legitimidade, pois segundo a Fapesp, qualquer entidade legalmente estabelecida no Brasil como pessoa jurídica (instituições) ou física (Profissionais Liberais e pessoas físicas) que possua um contato em território nacional pode registar um nome de domínio. Em resumo, parece que as duas normas estão incompatíveis, e a solução dos casos concretos dependerá da interpretação dos tribunais.
Ipirataria de nomes de domínio
A ocorrência de inúmeros casos, inclusive no Brasil, gerou uma nova terminologia: o cybersquatting diz respeito aos posseiros cibernéticos, piratas de nomes de domínio: indivíduos ou empresas que registram em seu nome marcas já conhecidas como nomes de domínio, antes do detentor do direito.
Um exemplo conhecido no Brasil foi o caso do registro indevido do nome do Jornal Nacional e Globo Esporte, onde um escritório carioca usou como solução possível o Centro de Arbitragem da OMPI (WIPO), obtendo vitória para a Rede Globo de Televisão.
IIQuestão de técnica legislativa
Diante dos conflitos citados, teve início o questionamento da autonomia da FAPESP para o registro de domínios: seria constitucional um órgão estadual ter autonomia para registrar domínios em abrangência nacional?
O poder para realizar tais atos administrativos foi outorgado para o Comitê Gestor pela portaria interministerial MC/MCT no. 147/95, de 31 de maio de 1995, que delegou a atribuição à Fapesp através da Resolução 002. Mas segundo a constituição Federal, só a lei pode criar direitos e obrigações (art. 5o, II da CF/88: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei"). Esta nova polêmica surgiu recentemente, mas sem dúvida irá suscitar questionamentos jurídicos em um breve futuro.
ISegurança das transações financeiras
É necessária em transações bancárias e no momento da compra on-line. Para garantir esta segurança, em usando-se assinatura digital, são requeridas a garantia da origem das partes, integridade do conteúdo negociado e certificação da identidade do signatário. As tecnologias aplicadas podem reunir criptografia com chaves públicas e privadas e certificação digital.
No Brasil, o Governo quer controlar o controle da idoneidade das entidades certificadoras e realizar trocas de correspondência (inclusive bancária) utilizando-se da certificação digital. Para isso, o Decreto no 3.587, de 5 de setembro de 2000 estabelece normas para a Infra-Estrutura de Chaves Públicas do Poder Executivo Federal/ICP-Gov, e dá outras providências.
Dentre as formas que são utilizadas para realizar pagamento na web, em compra e venda de produtos e serviços, destacam-se as seguintes: cartão de crédito, depósito em conta corrente, impressão de conta bancária / boleto, e-money / smart cards, autorização do débito on-line no momento da aquisição. Apenas as duas primeiras são usadas em larga escala, as restantes ainda estão sendo usadas de modo experimental.
Este ramo do direito é um dos que, felizmente, possui maior embasamento legal. O Código de Defesa do Consumidor (Lei no. 8.078 / 90) tem definições e mecanismos que protegem efetivamente o consumidor on-line, desde que com as provas cabíveis, e que as transações sejam realizadas em território nacional. Caso contrário, continuamos dependendo de acordo supra-nacionais.
Selecionamos, na Lei, as definições mais importantes para aplicar aos casos concretos:
"Art. 2º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único - Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§ 1º - Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".
A inversão do ônus da prova é uma garantia legal que permite ao consumidor, quando em litígio, ter a seu favor a facilitação da inversão do ônus da prova, ou seja, mesmo que o consumidor alegue que determinado produto é defeituoso, ou que um serviço não foi realizado corretamente, cabe ao fornecedor provar o contrário (art. 6o do CDC).
Em qualquer site de comércio eletrônico, há de se observar o conteúdo oferecido, com páginas atualizadas, pois a proposta vincula o proponente. Significa dizer que, caso um produto seja vendido, e não localizado no estoque, a empresa tem obrigação de localizá-lo e entregá-lo ao consumidor (art. 30 do CDC).
A publicidade enganosa ou abusiva é crime por definição legal, e deve ser evitada a qualquer custo. O problema é identificar o que pode ser considerado publicidade enganosa (art. 6o, IV, art. 37, 61 e 66 do CDC).
Em caso de acordo on-line (agreement), todo o acordo deve vir em fontes grandes, pois caso contrário não obrigarão os consumidores (art. 46 e 47 do CDC). Além disso, a leitura de todos os termos é imprescindível para a conclusão dos contratos. As empresas devem estar habilitadas a receber qualquer consumidor, sem fazer distinção.
O tempo de reflexão (art. 49 do CDC) é um dos temas mais polêmicos em relação às compras on-line, pois já é Aplicado em compras por telefone, domicílio ou catálogo; mas pode ser alegado também nos casos de internet.
"Art. 49 - O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.
Parágrafo único - Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados".
Em caso de litígio o foro poderá ser aquele do consumidor (art. 101 do CDC). Além do fabricante, o fornecedor também poderá ser penalizado (cadeia de responsabilidade – art. 18 do CDC).
Por fim, outros problemas que ocorrem nas vendas pela internet são a demora na entrega das compras, além do prazo indicado no site, e as compras realizadas por terceiros em nome do titular do cartão ou conta bancária (fraude). Percebe-se que, em caso de direito do consumidor, a legislação já é bem abrangente, e portanto os cuidados na criação de um site de comércio eletrônico devem ser redobrados, evitando a ocorrência de litígios.
O Código Comercial (Lei nº 556, de 25 de junho de 1850) traz alguns princípios que podem ser aplicados à formação dos contratos, quando combinados com outros dispositivos mais modernos. O art. 191 afirma que são elementos essenciais do contrato: coisa, preço e condições(10). As teorias sobre o momento de formação dos contratos adotada pelo Brasil estão previstas no art. 127 do Código Comercial (11).
O problema da jurisdição e territorialidade, presente nas transações internacionais, foi objeto de estudo do Relatório da American Bar Association (12). Foram apresentadas como hipóteses cabíveis para a escolha do foro de eleição em caso de problemas legais:
a ) o foro de eleição pode ser no país de destino, onde reside o consumidor; como consequência as empresas de comércio eletrônico teriam que se sujeitar às leis do país de cada consumidor, a cada compra realizada;
b ) o foro de eleição pode ser no país de origem, onde a empresa está legalmente sediada; como consequência o consumidor estaria desprotegido e teria que conhecer a legislação de diversos países;
c ) estabelecimento de um acordo entre comprador e vendedor no momento da transação, para decidirem sobre o foro de eleição; como consequência o governo não participaria do acordo e perderia o controle sobre as transações on-line (pode ser problemático se as mercadorias são medicamentos ou softwares).
A solução técnica proposta pelo Relatório foi a criação de robôs, agentes inteligentes, que negociariam os termos de cada transação, com base em parâmetros pré-estabelecidos, de acordo com os endereços ip de origem e de destino.
Em caso de compras no território nacional, os elementos de conexão (local de formação do contrato, local de execução do contrato e residência das partes) podem seguir alguns artigos do Código Civil Brasileiro:
Declaração de vontade das partes:
Art. 129. Código Civil: "a validade das declarações de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir (art. 82)". Esta declaração tem que ser clara e expressa.
Art. 131. Código Civil; "as declarações constantes de documentos assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários".
Validade dos contratos:
O Ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Ruy Rosado de Aguiar, afirmou em nota publicada no Jornal do Commercio de 27/09/2000 que a maioria dos contratos firmados via internet não podem ter valor jurídico. A simples impressão do comprovante do negócio pelo consumidor não vale como prova, apenas como indício. Só com o uso da criptografia é possível, segundo ele, controlar a autenticidade e a veracidade de informações contidas nas cláusulas do documento eletrônico. Do contrário, sempre haverá a possibilidade de desfazer o negócio por falta de provas.
Sobre este tema, ALMEIDA (13) comenta o momento em que o pronunciamento do Ministro foi divulgado, e seu efeito no mundo jurídico:
"Na última semana, dois fatos atraíram a atenção da opinião pública com relação a contratos eletrônicos e assinatura digital. O primeiro foi a entrada em vigor da lei norte-americana sobre assinatura digital. O segundo foi o pronunciamento de um ministro do STJ afirmando que contratos on-line são inválidos como prova se não forem criptografados. O que ambos têm em que afasta um do outro?
O denominador comum é de que tratam de documentos eletrônicos como meios de prova de contratos realizados via Intemet. Ou seja, a pergunta recorrente: "contrato eletrônico, pode"? Em última análise, aqui falamos da çonfluência entre a segurança de dados e o Direito.
O divisor de águas é que o ministro do STJ não menciona, ou não admite, outras alternativas de prova de contratos eletrônicos que não a criptografia. Com isso, descarta a validade da prova de contratos eletrônicos não criptografados - que ainda constituem a larga maioria do mercado".
VMeios de Prova: Código de Processo Civil:
No comércio eletrônico, em caso de litígio, um dos aspectos mais importantes é a questão da prova. Ela pode ser essencial para a conclusão do processo. No caso das operações on-line, a prova é de difícil obtenção, e depende de perícia técnica. A legislação atual fornece algumas pistas para dar início a uma ação.
Art. 135. Código Civil: "O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na disposição e administração livre de seus bens, sendo subscrito por 2 (duas) testemunhas, prova as obrigações convencionais de qualquer valor. Mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros (art. 1.067), antes de transcrito no Registro Público".
Art. 136. Código Civil: "Os atos jurídicos, a que se não impõe forma especial, poderão provar-se mediante:
I - confissão;
II - atos processados em juízo;
III - documentos públicos ou particulares;
IV - testemunhas;
V - presunção;
VI - exames e vistorias;
VII - arbitramento".
Meios de prova da verdade dos fatos:
Art. 332.CPC: "Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa" (mas nos casos de internet dependem de perícia técnica).
Art. 334. CPC: "Não dependem de prova os fatos:
I - notórios;
II - afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária;
III - admitidos, no processo, como incontroversos;
IV - em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade".
Art. 335. CPC: "Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial".
Art. 389. CPC: "Incumbe o ônus da prova quando:
I - se tratar de falsidade de documento, à parte que a argüir;
II - se tratar de contestação de assinatura, à parte que produziu o documento".
O comércio B2B, e suas formas (cadeia de suprimentos, etc) dependem de relações entre empresas; estas não são consideradas de natureza consumerista, mas cada contrato terá uma natureza própria (compra e venda à vista, a prazo,etc.)
Em caso de execução, o contrato pode valer como título executivo extrajudicial, de acordo com o art. 585. Código de Processo Civil: "São títulos executivos extrajudiciais:
I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;
II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores;
Dois destaques merecem ser dados aqui: em primeiro lugar, o documento eletrônico por si só não é ainda reconhecido por lei; BLUM(14) comenta o problema:
"A questão da validade do documento eletrônico movimentará o meio jurídico. Basta afirmar que uma simples mensagem enviada por e-mail dificilmente tem plena validade jurídica. Em tese, por meio de recursos técnicos, é possível alterar documentos sem deixar vestígios. Por outro lado, através da técnica da assinatura digital, toma-se possível garantir a autenticidade e a veracidade de um documento eletrônico e, por conseqüência, atribuir validade jurídica ao mesmo. A assinatura digital é, em síntese, uma codificação, garantida e atribuída por uma terceira pessoa, demonstrada por um certificado que identifica a origem e protege o documento de qualquer alteração sem vestígios. Aqueles que dispõem da assinatura digital já podem efetuar troca de documentos e informações pela rede com a devida segurança física e jurídica".
Por último, as compras em sites estrangeiros merecem atenção redobrada, pois em alguns casos podem se transformar em um contrato de importação, e dependerão de outra legislação.
Um dos princípios gerais do direito tributário é que não se pode cobrar tributo sem que seja criado por lei (art. 150. CF/88): "Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça."
Além disso, toda a questão acerca de cobrança de tributos está relacionada à natureza do produto comercializado. Segundo a definição de mercadoria do art. 191 do Código Comercial: "mercadoria é aquilo que está à venda, que constitui objeto do comércio."
Por exemplo, em caso de software, este pode ser classificado como sendo de prateleira, produto disponível em quantidade e pré-fabricado (ex.: Office 2000): incidiria o ICMS. Por outro lado, sobre um software específico, feito sob encomenda para uma determinada empresa pode incidir o ISS.
De um modo geral, a cobrança vai depender da definição de outros fatores, como estabelecimento comercial e atividades realizadas. A noção de ponto comercial está prevista no art. 11 da Lei complementar no. 87, de 13/09/96, definindo o estabelecimento para fins de incidência de ICMS.
Especificamente sobre internet, há duas questões que merecem destaque: o livro eletrônico é protegido pela Constituição Federal (art. 150 CF/88). Não importa a base física, mas sim o conteúdo (ex.: CD-ROM). Portanto, o livro que é comercializado pela internet também não pode ser tributado:
"Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI - instituir impostos sobre: d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão".
Referente à tributação das atividades do provedor de acesso, há várias tendências (correntes doutrinárias), mas por enquanto os doutrinadores não chegaram a um consenso:
-Pode incidir o ICMS pois seria serviço de telecomunicações;
-Pode incidir o ISS pois seria serviço de valor adicionado;
-não é tributável pois tem natureza diversa da previsão legal, e não está previsto na lista de atividades do ISS.