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O fim da justiça

01/06/1999 às 00:00
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No início da humanidade devia ser muito fácil solucionar os conflitos entre as pessoas. Mas a complexidade das causas, o desejo de ver o direito individual respeitado levaram os filósofos a apelarem para criação da justiça. Aristóteles, John Locke já falavam da necessidade de se dividir os poderes, e de termos uma justiça realmente eficaz. Somente com Montesquieu, esse sentimento foi materializado, implantaram-se os três poderes, e a justiça teria o papel de salvaguardar a liberdade individual do cidadão. O ilustre Montesquieu não via com bons olhos o poder judiciário, talvez naquela época (século XVIII) ele já estivesse prevendo os desacertos, que esse poder autoritário e até pouco tempo intocável, viria causar ao povo em geral, que é o verdadeiro legitimador desse poder. A justiça do trabalho, que entrou na história do Brasil, em 1941 como junta de conciliação, e, com a constituição de 1946, passou a fazer parte do poder judiciário, como justiça especial, é anacrônica pela própria idade, inútil, porque não tem mais sentido. Gastará só esse ano a título de orçamento R$ 3,5 bilhões de reais. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que foi aprovada pelo decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943, que é uma cópia na íntegra da ‘carta de lavor’, não reflete mais a realidade brasileira. A justiça militar, que nasceu em 1808, por alvará com força de Lei, assinado por Dom João VI, na constituição de 1934, passa a fazer parte do poder judiciário, também considerada justiça especial é corporativista e inútil, virou um símbolo da impunidade. Gastará esse ano R$ 95 milhões de reais. A justiça eleitoral, aparece após a revolução de 1930, a constituição de 1937, outorgada por Getúlio Vargas, excluiu do poder judiciário, e durante o período de 1937 a 1945, conhecido como Estado Novo, não houve eleições no Brasil. O decreto-lei n. 7.586 de 1945, restabelece a justiça eleitoral no Brasil, também considerada justiça especial, é temporária e caríssima para os cofres públicos. Seu orçamento para esse ano é de R$ 1 bilhão de reais. Vale lembrar que só temos eleições de dois em dois anos.

A Lei n. 9.307, de 23/09/96, que dispõe sobre arbitragem e dá outras providências, cria a figura do ‘juízo arbitral’, é o resultado do apelo da sociedade para solucionar conflitos rápidos, respaldados e reconhecidos por lei. A sociedade quer agilidade e soluções justas. É um nítido sinal que a justiça está sendo posta de lado. Até o presente momento não se conhece uma só pessoa que acredite 100% na justiça. Isto é grave, gravíssimo. Se a CPI do judiciário é ou não constitucional, não importa, o povo quer, e o povo é soberano, o povo está com sede de justiça. O ex-presidente dos Estados Unidos John Kennedy disse: "Ninguém está acima da lei." Por que os juízes não podem ser investigados? Afinal de contas quem não deve não teme, não é?

Com certeza a CPI e a reforma do judiciário serão benéficas para nosso país, será adotado o controle externo, haverá "impeachment" para juízes, a corrupção e o nepotismo diminuirão, os juizes corruptos serão afastados, a justiça do trabalho não mais existirá, e as causas trabalhistas serão da competência da justiça federal, a justiça militar também será extinta, e praticamente a justiça convencional só julgará as causas penais, que são de interesse público. Resta-nos agora recordar e nos conformar com o que disse Jesus Cristo há quase dois mil anos: "Bem-aventurados os que têm sede de justiça, esses sim, serão saciados".

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Sobre o autor
Luís Olímpio Ferraz

acadêmico de Direito na Unifor, empresário em Fortaleza (CE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERRAZ, Luís Olímpio. O fim da justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 32, 1 jun. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/248. Acesso em: 23 abr. 2024.

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