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Os Juizados Especiais Federais e as comunicações processuais eletrônicas.

Aspectos da Lei nº 10.259/2001

01/01/2002 às 01:00
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Súmario:1. NOTA DE INTRODUÇÃO. 2. AUTONOMIA VERSUS SUBSIDIARIEDADE. 3. COMUNICAÇÕES PROCESSUAIS: CONVENCIONAIS E ELETRÔNICAS. 3.1. As comunicações processuais escritas como regra. 3.2. Viabilidade das demais intimações por via eletrônica. 3.3. Compulsoriedade ou faculdade da organização, pelos TRFs, de serviço de comunicações eletrônicas? 4. ENDEREÇO E DOMICÍLIO ELETRÔNICOS. 5. A CITAÇÃO. É POSSÍVEL POR MEIO ELETRÔNICO? 6. OS TRIBUNAIS VIRTUAIS. 7. POR CONCLUSÕES.


1. NOTA DE INTRODUÇÃO.

A Lei 10.259, de 12 de julho de 2001, com vacacio de seis meses, instituiu os Juizados Especiais Federais, transpondo para o âmbito da Justiça Comum da União, com as devidas adaptações, a experiência haurida na sua congênere estadual com os juizados criados pela Lei 9.099/95.

Óbvio que não é a Lei 10.259/01 um mero pasticho daqueloutro diploma acima referido, senão um edito com força e finalidades próprias, sem, entretanto, ter a mesquinhez de olvidar o sucesso obtido no mundo jurídico nacional com a atuação dos Juizados Especiais das Justiças Estaduais.

Cuida-se de uma lei advinda de ampla discussão no âmbito da Justiça Federal, tendo por gérmen evento com esse fim patrocinado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no Recife, de 24 a 27 de novembro de 1999, precedido de estudos elaborados por comissão constituída por magistrados federais, nomeados por ato da presidência daquela casa para esse específico fim, conforme lembra AGAPITO MACHADO, em oportuno artigo. A Associação dos Juízes Federais do Brasil aprimorou os ensaios legislativos, coadjuvada pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Conselho da Justiça Federal, desenvolvendo em seguida, um aguerrido trabalho de convencimento de setores do Poder Legislativo, dando conta da importância do projeto posto em discussão, culminando com a sua aprovação e sanção.

O universo dos trabalhadores do Direito tem natural curiosidade acerca da efetividade do funcionamento dos mencionados juizados, já que muitas são as inovações carreadas, especialmente no que diz respeito a aspectos procedimentais. Um desses pontos de particular interesse pertence à seara das comunicações processuais operadas por meios eletrônicos e é justamente este o móvel das presentes anotações.


2. AUTONOMIA VERSUS SUBSIDIARIEDADE

Apontei linhas acima o caráter utilitário – inclusive – da Lei 10.259/01, que procurou albergar as vantagens comprovadas da Lei 9.099/95, sem deixar de implementar significativas inovações. E a homenagem às positividades da chamada Lei dos Juizados Especiais Estaduais está consagrada logo no pórtico do novel diploma, que assim soa: "Art. 1º. São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei nº 9.099/95, de 26 de setembro de 1995." (Grifo acrescido).

Pelo pioneirismo da sua vigência no ordenamento jurídico nacional (uma vez que a Lei dos Juizados de Pequenas Causas – Lei 7.244/84 configurou mais um triste exemplo daquilo que os americanos chamam de law on the books, dada a sua inservibilidade prática), a Lei 9.099/95 foi tomada como "locomotiva" de um moderno sistema de processo, de procedimento e de prestação jurisdicional mais ágil, malgrado os defeitos que o tempo já cuida de apontar, a exemplo dos equívocos do processo de execução de sentença. Tem-se, é repetido, um novo sistema (ou subsistema, como prefiram os puristas), que adota o modelo já confirmado na seara penal, onde a Parte Geral do Código Penal é obedecida em todas as outras áreas afins que cuidam de matéria criminal, a partir da regra insculpida logo nos primeiros dispositivos do diploma-mor, assim: "Art. 12. As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso." (Grifo acrescentado).

Destarte, preservando as suas idiossincrasias e sem perder a missão de capitanear, no âmbito da Justiça Federal, a implementação e a regulamentação dos Juizados Especiais, a Lei 10.259/01 curva-se, com elegância e respeito, às regras gerais pré-traçadas na Lei 9.099/95.


3. COMUNICAÇÕES PROCESSUAIS: CONVENCIONAIS E ELETRÔNICAS.

3.1. As comunicações processuais escritas como regra.

A Lei 10.259/01, após usar o seu art. 7º para adotar o rol de atribuições para o recebimento das citações e das intimações da União, que "serão feitas na forma prevista nos arts. 35 a 38 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993", estabeleceu, no parágrafo primeiro do mesmo art. 7º, que a citação "das autarquias, fundações e empresas públicas será feita na pessoa do representante máximo da entidade, no local onde proposta a causa, quando ali instalado seu escritório ou representação; se não, na sede da entidade."

Quanto à intimação da sentença, há regra especial, lançada no art. 8º da LJEF: "As partes serão intimadas da sentença, quando não proferida esta na audiência em que estiver presente seu representante, por ARMP (aviso de recebimento em mão própria).". Frise-se que essa intimação com comprovante de recebimento firmado pelo destinatário (cf. art. 7º) está reservada à ciência do teor da sentença, já que as demais intimações serão procedidas nas pessoas dos advogados ou procuradores que oficiem nos respectivos feitos, "pessoalmente ou por via postal" (art. 8º, § 1º).

3.2. Viabilidade das demais intimações por via eletrônica.

Consectário do que acima afirmado, surge a dúvida: será que essa intimação "por via postal" prevista no § 1º do art. 8º da LJEF também contempla a comunicação feita por modo eletrônico, a exemplo do e-mail? Ou a lei refere apenas ao correio convencional, que manuseia documentação "real"?

Necessária se faz, nesta quadra, uma visita ao campo da telemática, para a rememoração do que em vernáculo chamamos de "correio eletrônico". É assim que leciona SÉRGIO CHARLAB: "O correio eletrônico é o bloco de base da arquitetura da Internet, e deverá permanecer nesta posição por mais algum tempo. Tanto tempo quanto decidirmos que o mais importante ainda é o relacionamento e a troca de informações entre as pessoas...". Mais adiante enfatiza SÉRGIO CHARLAB: "Você deve considerar o e-mail como uma categoria à parte na expressão da linguagem humana, embora esteja naturalmente próximo da linguagem escrita, pressupõe um tempo de efetivação (período entre o momento que se escreve, a leitura do destinatário e sua subseqüente ação – eventualmente, de resposta) muito menor do que uma correspondência enviada tradicionalmente pelo correio."

Tem-se, portanto, uma correlação de gênese entre a correspondência tradicional, firmada com tinta em papel, e a correspondência virtual, igualmente portadora de signos que são transmitidos pela via eletrônica. Assim, desde que resguardada a segurança da informação digital, tanto quanto deve ser preservada a segurança da correspondência tradicionalmente entregue pelo carteiro, têm ambas a mesma credibilidade para veicular comunicações processuais, inclusive intimações.

Uma interpretação sistemática do dispositivo reclama a análise do segundo parágrafo do mencionado art. 8º, verbis: "§ 2º Os tribunais poderão organizar serviço de intimação das partes e de recepção de petições por meio eletrônico.". Ora, se a lei sinaliza a possibilidade de organização, pelos Tribunais Regionais Federais no âmbito das suas respectivas jurisdições, de serviço de intimação das partes por meio eletrônico, parece acertada a conclusão de que a intimação por esta via (inclusive e prioritariamente por e-mail) é cabível também aos procuradores ou aos advogados da União e aos demais legitimados (autarquias, empresas públicas e fundações). Pensar em intimação eletrônica apenas da parte particular seria negar atenção a vários dos princípios norteadores da LJEF, mormente os princípios da economia e da celeridade do processo, assim como seria dar costas à busca da mens legis e da mens legislatoris, de equilibrar os integrantes da liça, dando a ambos a oportunidade de ver abreviado o fim da querela, através da compactação do tempo do processo.

ALEXANDRE JEAN DAOUN e RENATO OPICE BLUM afirmam, em uníssono, que "temos, hoje, uma sociedade virtual parcialmente constituída, onde os personagens, ou melhor, os sujeitos, não só atuam como também dependem direta ou indiretamente da rede, sociedade essa fruto do galopante avanço da tecnologia...". Nesse universo, é claro, estão incluídos os advogados, e a propósito da importância do e-mail na vida do causídico (público ou privado) moderno, com imenso reflexo positivo na qualidade da defesa dos litígios postos a julgamento, é oportuna a citação de ALEXANDRE ATHENIENSE: "Assim, o uso do correio eletrônico torna a comunicação do advogado com o mundo jurídico mais eficiente por vários motivos.". Prosseguindo, diz o comentarista mineiro algumas das vantagens do uso do e-mail, especialmente sob o ângulo do exercício da advocacia, máxime em razão da comunicação escrita ser "mais compreensível do que a verbal, além de ser menor o tempo gasto para enviar uma mensagem por meio de correio tradicional. O seu custo é inferior ao selo e à transmissão via fax. Além disso a confiabilidade de que a mensagem vai ser realmente entregue ao destinatário final, em poucos segundos, qualifica este meio de comunicação como o mais apropriado para os profissionais que lutam contra o relógio."

3.3. Compulsoriedade ou faculdade da organização, pelos TRFs, de serviço de comunicações eletrônicas?

Outro ponto que carece de reflexão, ainda no âmbito do § 2º do art. 8º da LJEF, diz respeito à organização, pelos Tribunais Regionais Federais, de um serviço de intimação das partes por meio eletrônico. A dicção legal optou pelo verbo no futuro do presente: "Os tribunais poderão organizar serviço de intimação das partes...por meio eletrônico". Assim, avulta a questão: e se o tribunal não organizar o tal serviço de intimação eletrônica das partes, ficará inviabilizada essa forma de comunicação? E se uma determinada Seção Judiciária Federal dispuser, sozinha, de meios materiais para implementar a comunicação eletrônica, ficará obstada de fazê-lo em decorrência da atribuição da tarefa, pela lei, ao tribunal? A resposta está no próprio texto da lei, conforme acima transcrito e observado sob a lente da gramática. Com efeito, diz o preceptivo que os tribunais "poderão organizar" os mencionados serviços, não atuando compulsoriamente em relação às cortes. Não obriga e nem veta; apenas faculta. Mas se o tribunal não achar conveniente ou não dispuser de meios para tanto, isto não inviabilizará a ação isolada de seções judiciárias ou mesmo de varas federais, no sentido de manejar as comunicações processuais eletrônicas. A propósito, veja-se que quando quis ser incisiva no que diz respeito às obrigações dos órgãos do Judiciário, a Lei 10.259/01 assim fez, conforme pode ser visto no art. 18 ("Os Juizados Especiais serão instalados por decisão do Tribunal Regional Federal" ou "O Juiz presidente do Juizado designará conciliadores...").

Rememore-se que com o advento da Lei 9.800/99, popularizada como Lei do Fax, a efetiva implantação de serviços de recepção de petições e documentos pela via eletrônica (tema que ainda será ferido no curso do presente trabalho) não dependeu de provimento regulamentador centralizado nos tribunais. Ao que consta, o pioneirismo desses serviços, no âmbito da Justiça Estadual, à 1ª Vara Criminal da Comarca de Campinas, São Paulo, sob a presidência do Juiz EDISON APARECIDO BRANDÃO e na seara da Justiça Federal de Primeira Instância à Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, pelo então Diretor do Foro em exercício, Juiz MANUEL MAIA DE VASCONCELOS NETO.


4. ENDEREÇO E DOMICÍLIO ELETRÔNICOS.

Como já foi dito, a LJEF atrelou o seu texto e os seus objetivos ao que similarmente está disposto na Lei 9.099/95 para os Juizados Especiais da Justiça dos Estados. Este último diploma, entretanto, não registrou expressamente o Código de Processo Civil como lei subsidiária, o que pode gerar uma equivocada interpretação de divórcio (ou auto-suficiência) dos editos especiais em relação ao C. P. Civil.

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É evidente que tanto a Lei 9.099/95 como a Lei 10.259/01 guardam peculiaridades e princípios que são próprios de um processo moderno e ágil, diferentes das generalidades encartadas no Código de Processo Civil. Entretanto, nem por isto fogem do sistema processual como um todo, este, sem dúvida, capitaneado pelo CPC, pois assim é da tradição romana. Acerca do assunto, JOEL DIAS FIGUEIRA JÚNIOR, ao comentar a Lei 9.099/95, mesmo reconhecendo não haver determinação acerca da aplicabilidade do atrelamento aqui defendido, "essa constatação preliminar não serve para excluirmos, de antemão a aplicação subsidiária do macrossistema Processual Civil, sobretudo aquelas regras estatuídas no Livro I que fixam as linhas mestras do processo de conhecimento, funcionando como espinha dorsal sustentadora dos demais, como se fosse a ‘Parte Geral’. E justifica logo adiante, dizendo que "deixamos de rechaçar a inaplicabilidade absoluta das normas gerais de processo insculpidas na referida codificação; há que se observar, isto sim, que elas só terão incidência na hipótese de omissão legislativa do macrossistema e desde que se encontrem em perfeita consonância com os princípios orientadores dos Juizados Especiais". As afirmativas servem, em tudo e por tudo, aos Juizados Especiais Federais.

Com ser assim, são aplicáveis aos casos submetidos aos Juizados Especiais Federais, os regramentos genéricos do processo civil, digamos, convencional, inclusive no que diz respeito à obrigatoriedade de o advogado, público ou privado, fazer constar na petição inicial ou na contestação o endereço em que receberá intimações, devendo também comunicar ao escrivão do processo qualquer eventual mudança de endereço (CPC, art. 39, incisos I e II).

Se no processo tradicional, regulamentado nos idos de 1973, quando impensável era o avanço da tecnologia a serviço da prestação jurisdicional, impõe-se ao advogado o dever de declinar o seu endereço "real" (escritório, rua, número, bairro, cidade etc.), é evidente que no processo moderno, entremeado de serviços eletrônicos, é razoável que o advogado decline, desde o início da sua participação no feito, o seu e-mail. Se esse item não constar da exordial ou da resposta, deverá haver provocação, por parte do Judiciário, para que o advogado decline esse seu especial domicílio para fins de comunicação eletrônica. Aliás, é de bom alvitre que no âmbito dos Juizados Especiais Federais sejam expedidas instruções aos serventuários, para que procedam de ofício à intimação de complementação das petições, à guisa de ato ordinatório (CPC, art. 162, § 4º, não sendo demais lembrar que o rol de hipóteses ali consignado é meramente exemplificativo).

Merece destaque, ainda, a possibilidade de o ajuizamento da causa prescindir da intermediação de advogado, já que a Lei 9.099/95 confere ao próprio interessado o jus postulandi (art. 9º). Em casos como tais (com valor da causa de até vinte salários mínimos), é à própria parte (ou ao representante desta, cf. art. 10 da Lei 10.259/01) que deverá ser feita a intimação para que se complete a peça de propositura da ação, com a declinação do endereço eletrônico para fins de comunicações processuais.


5. A CITAÇÃO. É POSSÍVEL POR MEIO ELETRÔNICO?

A Lei 10.259/01 foi silente no que diz respeito à citação por via eletrônica. Aliás, nada dispôs acerca dos instrumentos de citação, reservando-se apenas para listar as pessoas que podem receber citação em demandas da sua competência, ao fazer remissão aos artigos 35 a 38 da Lei da Advocacia Geral da União, conforme já foi acima comentado.

Tendo-se o Código de Processo Civil e a Lei 9.099/95 como suplementares da LJEF, naquilo que com esta não colidirem, é certo que estão valendo as formas de citação previstas naqueles dois diplomas, resguardadas as peculiaridades dos Juizados Especiais e dos princípios que destes são norteadores. Assim, a prioridade é para a citação postal, passando pela citação tradicional (via oficial de justiça), sendo vedada a citação editalícia, tudo conforme está no art. 18 da Lei 9.099/95.

Mas, repisa-se, é possível a citação por via eletrônica, a exemplo do e-mail? Penso que no estágio legislativo atual, ainda não é possível a adoção da citação por e-mail para o processo cognitivo, já que o dispositivo mais ousado a regular a matéria é o art. 18, inciso I, da Lei 9.099/95, que prevê o chamamento à defesa pelo caminho postal convencional, já que reclama "aviso de recebimento em mão própria". De lege ferenda, no entanto, por iniciativa da AJUFE, está posto em discussão um largo conjunto de atos processuais possíveis de concretização via Internet, dentre estes a citação, desde que a pessoa (física ou jurídica pública ou privada) tenha cadastrado o seu endereço eletrônico, para tal fim, junto ao órgão judiciário.

Sem ânimo para enfrentar a querela acerca dos limites da autonomia da fase de execução em relação à fase cognitiva do processo, parece ser razoável a citação do executado de título judicial haurido no âmbito dos Juizados Especiais Federais através de correspondência eletrônica, desde que este meio de comunicação processual tenha sido manejado, sem oposição, durante a fase de conhecimento. Seria o caso de dar primazia ao princípio da instrumentalidade das formas, reconhecendo vigência ao ato praticado de maneira diversa daquela estatuída em lei, desde que atinja a finalidade jurídica perseguida. Para tanto, é razoável que tenha sido respeitado o devido processo legal (CF, art. 5º, inciso LV).

Mas, porque é aconselhável a citação via e-mail na fase de execução e não o é na fase de conhecimento? Resposta rápida: no conhecimento, há um dispositivo legal expressamente exigindo a aposição de assinatura, pelo próprio punho, da parte citada. Já na fase de execução, inexiste essa exigência, o que autoriza a flexibilização do procedimento, de sorte a ser dado prosseguimento ao uso do e-mail que já vinha sendo manejado na cognição da causa.


6. OS TRIBUNAIS VIRTUAIS.

Ao disciplinar o pedido de uniformização de interpretação de lei federal, quando houver divergência entre decisões sobre questões de direito material proferidas pelas Turmas Recursais na interpretação da lei, estabelece o art. 14 da LJEF que essa divergência será resolvida em reunião conjunta das turmas (§ 1º) e que se juízes domiciliados em cidades diversas compuserem esses colegiados, a reunião será feita pela via eletrônica (§ 3º).

Mas a informática, em que pese muito agilizar a prestação jurisdicional, pode ser uma armadilha para princípios muito caros à cidadania. É indiscutível que o princípio da publicidade dos atos processuais só cede a situações excepcionais, quando, por decisão fundamentada, o processo (ou algum ato deste) tem curso em segredo de justiça. É o que reza a Constituição Federal, art. 93, IX: "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei, se o interesse público assim exigir, limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes".

Não havendo justificada razão para que as partes sejam afastadas da sessão de julgamento do tal colegiado especial, a regra é que a publicidade seja plena. Outrossim, por imperativo constitucional, sempre o advogado participará dos atos de julgamento, mesmo que regimentalmente possa ser impedida a sua voz. Apresenta-se, assim, um problema operacional para a compatibilização da garantia estatuída na Carta Política e a realização da reunião virtual dos juízes domiciliados em lugares distintos (LJEF, art. 14, § 3º). Parece ser razoável a adoção, em sede de regulamentação da lei, de mecanismo informático igual ou similar aos chamados chats moderados, nos quais terão a palavra os juízes envolvidos na apreciação do incidente, laborando como operador o presidente do órgão, que em questões de ordem poderá permitir o registro requerido pelos advogados que acompanham a sessão.

Outro ponto ainda pendente de esclarecimento é a documentação da sessão virtual de julgamento. Bastará a gravação do ato em meio magnético? Ou será necessário a redução a peça escrita (imprensa gutemberguiana) do que ali foi passado? É de ser lembrado que a Lei 9.099/95, comprometida com o princípio da simplificação e da celeridade dos atos processuais, dispõe em seu art. 13, § 3º, que somente "os atos considerados essenciais serão registrados resumidamente, em notas manuscritas, datilografadas, taquigrafadas ou estenotipadas. Os demais atos poderão ser gravados em fita magnética ou equivalente, que será inutilizada após o trânsito em julgado da decisão.". Assim, o registro da sessão virtual de julgamento será feito apenas com a gravação em meio magnético, inclusive com o apoio legal do "ou equivalente" previsto no § 3º acima mencionado, que será mantida até o trânsito em julgado da sentença.


7. POR CONCLUSÕES.

A efetividade dos Juizados Especiais Federais muito dependerá do bom uso dos meios de informática postos a serviço da simplificação do processo e dos procedimentos, especialmente no que toca às comunicações expedidas pelo órgão que presidir os feitos.

Nada obstante a excelência da telemática, para fins de desburocratização do processo no âmbito dos Juizados Especiais Federais, é necessário que os trabalhadores do Direito atentem para que o exagero ou o incorreto manejo dos instrumentos de informática não venham a toldar direitos e garantias constitucionais das partes, que são também sustentáculo da própria ciência processual.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ATHENIENSE, Alexandre. Internet e o Direito. Belo Horizonte: Inédita Editoria de Arte Ltda, 2000.

BLUM, Renato Opice. DAOUN, Alexandre Jean. Cybercrimes. Direito & Internet – Aspectos jurídicos relevantes, São Paulo, Edipro, Org. DE LUCCA, Newton. SIMÕES FILHO, Adalberto p. 118. 2000.

CARVALHO, Ivan Lira de. A Internet e o acesso à Justiça. Doutrina, n° 10. Rio de Janeiro, Instituto de Direito, 2000.

CHARLAB, Sérgio. Você e a Internet no Brasil. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.

FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. LOPES, Maurício Antonio Ribeiro. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. São Paulo: RT, 1995.

MACHADO, Agapito. Juizados especiais federais. Diário do Nordeste, Fortaleza, 19 jul.2001. Opiniões, p. 1.

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Sobre o autor
Ivan Lira de Carvalho

juiz federal, professor de Direito na UFRN

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Ivan Lira. Os Juizados Especiais Federais e as comunicações processuais eletrônicas.: Aspectos da Lei nº 10.259/2001. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2501. Acesso em: 19 dez. 2024.

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