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Confissão no processo civil

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SUMÁRIO: I INTRODUÇÃO; 1 – ORIGEM HISTÓRICA; 2 – CONCEITO; II DESENVOLVIMENTO; 1 – DISTINÇÃO DE CONFISSÃO E RENÚNCIA AO DIREITO DE AÇÃO; 2 – DISTINÇÃO DE CONFISSÃO E RECONHECIMENTO JURÍDICO DO PEDIDO; 3 – ELEMENTOS DA CONFISSÃO; 3.1 – ELEMENTO OBJETIVO; 3.2 – ELEMENTO SUBJETIVO; 3.3 – ELEMENTO INTENCIONAL; 4 – REQUISITOS DA CONFISSÃO; 5 – ESPÉCIES DE CONFISSÃO; 5.1 – CONFISSÃO JUDICIAL; 5.1.1 – Confissão Judicial real; 5.1.2 – Confissão judicial ficta; 5.1.3 – Momento da confissão judicial; 5.2 – CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL; 5.3 – RESUMO DAS ESPÉCIES DE CONFISSÃO; 6 – FORMA DA CONFISSÃO; 6.1 – FORMA DA CONFISSÃO JUDICIAL; 6.2 – FORMA DA CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL; 7 – EFEITOS DA CONFISSÃO; 7.1 – EFEITOS DA CONFISSÃO NO LITISCONSÓRCIO; 8 – CONFISSÃO E DIREITOS INDISPONÍVEIS; 9 – INDIVISIBILIDADE DA CONFISSÃO; 10 – IRRETRATABILIDADE DA CONFISSÃO; 11 – REVOGAÇÃO DA CONFISSÃO; III CONCLUSÃO; CONFISSÃO;


I INTRODUÇÃO

1 - ORIGEM HISTÓRICA

A confissão de que trata ordenamento jurídico brasileiro tem suas raízes no Direito Romano Clássico. Ocorria, a confissão (confessio in iudicio), quando o réu, levado à presença do pretor pelo autor, confessava o pedido, sendo que o processo não chegava a se instaurar para o julgamento da actio pelo judex, valendo a confissão, admitida pelo pretor, como título para ter lugar a execução contra o réu, que condenara a si mesmo : "confessus pro iudicato est, qui quodammodo sua sententia damnatur, assim afirmou Paulo (Dig. 42, 2, 1.)"[1]

Essa construção, pertinente ao período da separação do processo em duas fases, in iure e apud iudicem do ordo iudiciorum privatorum, e que desapareceu na época imperial da cognitio extraordinem, veio, não obstante, através das vicissitudes por que passou o direito processual, a partir da queda do Império Romano conseqüente à invasão dos bárbaros, a projetar-se no direito processual civil alemão contemporâneo.

Wetzell, ao ordenar em sistema os princípios esparsos sobre o processo comum, que afloravam na vasta e desordenada obra dos autores alemães da primeira metade do século XIX, estabeleceu nítida definição de confissão (confessio in iudicio), como sendo aquela que diz respeito apenas aos fatos sobre que se funda a pretensão, não se confundindo com o reconhecimento pelo réu da pretensão (confessio in iure). A confissão (confessio in iudicio) tem por efeito excluir a necessidade de prova do fato confessado. Assim, de par com a confissão judicial (confessio in iudicio), regulada pelo § 288 (Gestandnis), que estabelece a desnecessidade de serem provados os fatos alegados por uma parte quando sejam confessados pela parte contrária, no curso do debate oral da causa perante o Tribunal. Vale ressaltar que a confissão (confessio in iudicio), não exime o juiz de proferir sentença de mérito, decidindo a lide de acordo com o direito e com as provas, bem como não vincula o seu pronunciamento em favor da parte beneficiada com a confissão. A admissão da verdade do fato alegado não importa em submissão à pretensão exercitada.

2 - CONCEITO

A lide é qualificada por um conflito inter-subjetivo de interesses protegidos pela ordem jurídica. Esse conflito deriva do fato de duas ou mais pessoas manifestarem interesse por um bem ou uma utilidade da vida, sem que uma ou mais delas renuncie a essa pretensão. O que justifica, pois, de modo geral, a presença das pessoas em juízo é a existência de um antagonismo entre os seus interesses, além de esse conflito ser solucionado pelo Poder Judiciário em nome da pacificação. Das relações jurídicas.

Com frequência, os pedidos formulados pelas partes decorrem de fatos, que são acontecimentos do mundo sensível, capazes de produzir repercussão na ordem, jurídica. A existência desses fatos deve ser comprovada pela parte que os alegou, segundo a distribuição legal do correspondente ônus (CPC, art. 333, caput, I e II).

Todavia em determinados casos, uma das partes acaba admitindo como verdadeiro um fato contrário ao seu interesse externado na causa e favorável ao adversário : com isso, estará configurada a confissão, à luz do art. 348 do CPC. A regra contida neste dispositivo legal, aliás, foi inspirada na lição de Chiovenda, para quem "confissão é a declaração, por uma parte, da verdade dos fatos afirmados pelo adversário e contrários ao confitente"(2). No mesmo sentido são válidos os ensinamentos de João Monteiro, citado por Humberto Theodoro Júnior : " confissão é a declaração, judicial ou extrajudicial, provocada ou espontânea, em que um dos litigantes, capaz e com animo de se obrigar, faz da verdade, integral ou parcial, dos fatos alegad0os pela parte contária, como fundamentais da ação ou da defesa"(3) Em rigor, contudo, esse conceito de Chiovenda não se ajusta à denomada ficta confessio, em que, não há declaração da parte, senão que, ao contrário, um silêncio, do qual se extrai a presunção de aceitação dos fatos narrados pelo adversário.

Se a parte confessar, os fatos deixam de ser controvertidos e, por esse motivo, não necessitam ser objeto de prova ( CPC, art 334, II) – precisamente porque a confissão já é um meio de prova. Essa particularidade da confissão faz com que a doutrina a ela se referisse como a "a rainha das provas" ( regina probationum; probatio probatissima) e a proclamar que não existe maior prova do que a confissão pela própria boca (nula est maior probatio quam proprio ore confessio), pois confessar em juízo é o mesmo que se condenar (confessus in iure pro condemnato habitur). Porém, esta concepção, que considera confissão a própria condenação, deve ser vista com ressalvas em face do poder discricionário e livre convencimento do juiz. Devemos repisar, entretanto, a observação de que a confissão será inadmissível quando tiver como objeto fatos relativos a direitos disponíveis (CPC, art. 320, II e 351), como se dá nas ações de investigação de paternidade, de guarda, educação e alimentos dos filhos etc.

Conforme escreveram Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Nery, a confissão, como meio de prova, "tem natureza de negócio unilateral, não receptício, processual ou não, conforme seja realizada fora do processo ou não."(4)

A confissão fictícia (assim como qualquer outra), entrementes, não é "pena", a despeito de assim ser considerada por quase toda a doutrina e pela própria lei (CPC, art. 342, § 2º). Ora, como afirmamos em outras linhas, a pena pressupõe o inadimplemento de uma obrigação – e o que a parte tem, apenas, é o dever de comparecer em juízo e de responder ao que lhe foi indagado (CPC, art. 340, I). A palavra pena (do latim poena) designa, no plano do direito, qualquer tipo de "imposição, de castigo ou de aflição, a que se submete a pessoa por qualquer espécie da falta cometida"4. Só podemos cogitar de "pena", portanto, em tema de confissão, se tomarmos o vocábulo como sinônimo de "consequência": a parte deve vir a juízo para prestar depoimento pessoal, sob consequência de serem presumidos verdadeiros os fatos alegados pela parte contrária.

Vale lembrar que a confissão é apenas um meio de prova, que, como os demais, se presta a formar a convicção do julgador em torno dos fatos controvertidos na causa. Por isso, um fato pode vir a ser demonstrado inveraz, ou mesmo pode o juiz desconsiderar a confissão, se entender inverossímil o fato confessado. Ademais, pelo princípio do livre convencimento motivado, nada obsta que o julgador afaste, na sentença, a confissão.

Sendo a confissão um meio probatório, não deve ser entendida além dessa limitação, pois, caso contrário, se abriria perigosa brecha para colusão, permitindo que processos fraudulentos fossem iniciados com um único intuito de, através da confissão, obstar ao julgador a possibilidade de amplamente perquirir os elementos da causa, como por exemplo, se a parte confessasse dívida inexistente apenas para, judicialmente, transferir seus bens a outrem, em prejuízo à seus verdadeiros credores.


II DESENVOLVIMENTO

1 - DISTINÇÃO DE CONFISSÃO E RENÚNCIA AO DIREITO DE AÇÃO

A renúncia ao direito em que se funda a ação, mencionada no art. 269, V, difere da confissão. É um ato que só pode ser praticado de acordo com a produção processual, ou seja, pelo autor, enquanto qualquer das partes podem confessar, independentemente do pólo processual que assuma. Também é ato de disposição, e por isso vincula o juiz, ou seja, se o autor renuncia ao direito, não cabe ao magistrado desconhecer o ato, pois, representando disposição de direito, a natural consequencia é a homologação pelo juiz; já a confissão não é ato de disposição, mas declaração de ciencia de que o fato é verídico, e, por isso, não tem efeito vinculante. Além disso, a renúncia, alcança as consequencias jurídicas do fato, enquanto na confissão há a admissão apenas da veracidade do fato, cabedo ao juiz determminar as consequencias que do fato resultam, podendo, aliás, julgar favoravelmente ao confitente.

2 - DISTINÇÃO DE CONFISSÃO E RECONHECIMENTO JURÍDICO DO PEDIDO

A confissão não se confunde com o reconhecimento jurídico do pedido, de que fala o art. 269, II, CPC.

São as seguintes as principais diferenças :

A – Somente a confissão é meio de prova; o reconhecimento jurídico do pedido é uma renúcia à resistência oferecida à pretensão.

B – Apenas a confissão pode ser tácita; o reconhecimento do pedido há de ser sempre expresso. Em outras palavras, enquanto o reconhecimento é sempre intencional, por refletir a manifestação volitiva da parte, a confissão pode ser inadivertida, pois nem sempre será produto da vontade do confitente, como na ficta confessio.

C – O reconhecimento do pedido é ato exclusivo do réu; já a confissão pode ser feita tanto pelo autor quanto pelo réu.

D – Só o reconhecimento jurídico do pedido é causa de extinçaão do processo ( CPC, art. 269, II); a confissão, como meio de prova, deve ser codsiderada na oportunidade do proferimento da sentença.

E – O objeto da confissão são os fatos; o do reconhecimento, o direito invocado pela parte contrária.

F – A confissão nem sempre faz com que o confitente fique vencido na demanda, ao passo que o reconhecimento ju´ridico do pedido, em regra, conduz a uma solição do conflito em favor da outra parte.

3 - ELEMENTOS DA CONFISSÃO

Podemos identificar na confissão, segundo o magistério de Arruda Alvim, três elementos, que se encontram intimamente interligados, a saber : A – elemento objetivo ( que diz respeito ao seu objeto); B – elemento subjetivo (que diz respeito ao seu sujeito); C – elemento intencional ( que refere-se à intenção)(6).

3.1 – Elemento objetivo

O objeto da confissão são os fatos desfavoraveis ao confitente e favoráveis ao adversário. É óbvio que esses fatos devem Ter sido alegados pela parte e ser, além de relevantes, pertinetes à causa.

Moacyr Amaral Santos indica as seguintes condições para que o fato possa ser confessado : (7)

1 – Que seja própria e pessoal do confitente; desse modo, se o fato disser respeito à terceiro, o seu reconhecimento pela parte não poderá valer como confissão, mas como testemunho.

2 – Que seja favorável à parte que o envoca e desfavorável ao confitente, a siguinificar com isso que a confissão prejudicará, apenas, o confitente e não os terceiros ou os compartes (no caso de litisconsórtes – CPC, art. 350), pois os litisconsórtes são considerados, em suas relações com a parte contrária, como litigantes distintos, motivo por que, em princípio, os atos e omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os outros ( CPC, art. 48).

3 – Que o fato seja suscetível de renúncia. A confissão só é possível se os fatos se referirem à direito a que o confitente poderia renunciar ou sobre ele transigir, porquanto a confissão incidente em direitos indisponíveis é ineficaz ( CPC, art. 351).

4 – Que o fato seja de tal natureza que a sua prova não exija forma especial. Em determinados casos a lei exige que a prova do fato ou do ato seja especial, como acontece com os pactos antenupciais : o art. 134, I, CC, afirma ser da substância do ato a escritura pública. Vale Lembrar a regra escrita no art. 366 do CPC, segundo aqual, quando a lei impuser, como da substância do ato, o instrumento público, nenhuma outra prova, por mais especial que seja, poderá suprir-lhe a falta.

3.2 – Elemento subjetivo

O ponto de referência aqui não é o fato confessado, mas a pessoa do confitente, de quem se requer possuir capacidade e legitimação. Capacidade, porque se há de verificar se ele é capaz; sendo incapaz, a doutrina divide-se quanto a possibilidade de haver confissão. Embora a confissão constitua ato da própria parte, a lei consente que seja efetuada por intermédio de mandatário, desde que dotada de poderes específicos para isso ( CPC, art. 349, § único). Também o advogado poderá confessar em nome de seu constituinte, bastando que da procuração conste o necessário poder ( CPC, art. 38).

3.3 – Elemento intencional

O elemento intencional é aquele leva a parte a confessar, ou seja, a consciência do que faz, livre de pretensões ilegítimas e de equívoco tipificável como vício ( de ato jurídico). Entretanto, se houver confissão maculada pelo erro, pela coação ou pelo dolo, esta poderá ser anulada (art. 352, I), enqunto pendente o processo, ou, se transitada em julgado a sentença de mérito, nela fundada, poderá ensejar direito à ação rescisória (arts. 352, II e 485, VIII).

Vem afirmando a doutrina, de maneira praticamente pacífica, que a confissão pressupõe a vontade de o confitente reconhecer como veradeiros os fatos contrários ao seu interesse e favoráveis ao advers´rio, de tal arte que nesse ato volitivo se assentaria o animus confitendi.

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4 – REQUISITOS DA CONFISSÃO

Os requisitos da confissão nada mais seriam do que os elementos da confissão, porém tratados de maneira mais sucinta e objetiva)

Como a confissão importa verdadeira renúncia de direitos (os possíveis direitos envolvidos na relação litigiosa), só as pessoas maiores e capazes podem confessar. E, assim mesmo, apenas quando a causa versar sobre direitos disponíveis ou quando o ato não for daqueles cuja eficácia jurídica reclama forma solene.

Destarte, podem-se arrolar os seguintes requisitos para a eficácia da confissão, segundo Humberto Theodoro Júnior(8)

I – capacidade plena do confitente; os representantes legais de incapazes nunca podem confessar por eles;

II – inexigibilidade de forma especial para a validade do ato jurídico confessado (não se pode confessar um casamento sem demonstrar que ele se realizou com as solenidades legais; ou a aquisição da propriedade imobiliária sem a transcrição no Registro de Imóveis);

III – disponibilidade do direito relacionado com o fato confessado.

5 - ESPÉCIES DE CONFISSÃO

De acordo com o lecionado por José Carlos Barbosa Moreira(9), a confissão pode ser judicial ou extrajudicial (art. 348, 2ª parte).

5.1 - Confissão judicial

A confissão judicial (obtida dentro do processo, como meio de prova) pode ser real ou ficta.

5.1.1 - Confissão judicial real

A confissão real é aquela surgida por manifestação da vontade do confitente. Ela subdivide-se em :

a- Espontânea, quando requerida pelo confitente, sendo admissível a qualquer tempo e podendo ser feita pela própria parte, pessoalmente, ou por procurador investido de poderes especiais (arts. 38 e 349, parágrafo único); deve ser reduzida a termos nos autos (art. 349, caput, 2ª parte). De modo geral, é feita por meio de petição, daí por que também é denominada confissão por petição. É preciso entender, porém, que essa petição não se restringe à forma escrita (conquanto esta seja a mais frequente), pois petição significa o ato de pedir – e isso pode ser realizado sob a forma oral, em audiência. Nessa modalidade de confissão o elemento intencional está presente, pois o ato de reconhecer um fato contrário ao seu interesse e favorável ao adversário decorre da vontade do confitente. Logo, essa confissão é sempre expressa. Estabelece o art. 348 do CPC que a confissão espontânea, desde que requerida pela parte, constará de termo que será juntado aos autos. Entretanto, nada impede que essa confissão conste da própria ata da audiência. A prudência sugere que o juiz procure saber as razões pelas quais a parte confessou de modo voluntário. Afinal, se a parte, em seu articulado (petição inicial ou resposta), impugnou os fatos alegados pelo adversário, é no mínimo sensato buscar saber por que motivo ela agora aceita, com espontaneidade, como verdadeiros esses mesmos fatos essa preocupação, em que o juiz procure saber as razões conducentes a essa confissão, prende-se à particularidade de que esse ato da parte pode ser sintomático de eventual concluio com a parte contrária, com o objetivo de prejudicar terceiros ou de fraudar a lei.

b Provocada, quando obtida mediante interrogatório da parte, em seu depoimento pessoal (art. 349, caput), na audiência de instrução e julgamento ou noutra especialmente designada para tomá-lo. Segundo o sistema do CPC, é a que se origina do depoimento pessoal do litigante. Aqui não há a intenção, a vontade da parte em confessar; a sua confissão é provocada por meio de perguntas que lhe são formuladas pelo juiz, pela parte contrária, pelo Ministério Público. Trata-se, por outro lado, de confissão expressa porquanto foi manifestada pelo depoente. Muitas vezes o juiz, por força de sua experiência ou natural habilidade, ao formular perguntas às partes, acaba fazendo com que estas admitam, ainda que de maneira inadvertida, acidental, como verdadeiro um fato contrário aos seus interesses e favorável ao adversário, configurando com isso, a confissão provocada. Pouco importa, para isso, que a pergunta tenha sido formulada pela parte contrária, pelo Ministério Público ou por iniciativa do próprio juiz; o que conta, para que a confissão se caracterize, é o fato de a parte acabar expedendo uma declaração que se coloca em antagonismo com a que formulara na inicial ou na contestação, e, acima de tudo, em harmonia com o que foi afirmado pelo adversário.

5.1.2 - Confissão judicial ficta

A confissão ficta é aquela que resulta, como sanção, da recusa da parte cujo depoimento foi requerido, a comparecer ou a depor. "Consiste numa consequência jurídica de ônus processual não cumprido. Se a parte, regularmente intimada ao depoimento pessoal, deixa de comparecer ou se furta às perguntas, aplica-se-lhe a consequência da presunção de confissão, admitindo-se como verdadeiros os fatos, a respeito dos quais esta deveria depor. Admite-se, evidentemente, a contraprova." (10)Nessa modalidade de confissão não existe o elemento intencional, ou seja, vontade de a parte confessar, nem mesmo qualquer manifestação desta capaz de permitir a conclusão de que aceitou os fatos alegados pelo adversário. É, portanto, uma confissão sem palavras (tácita), que decorre de três situações específicas:

1. ausência injustificada da parte à audiência em que deveria prestar depoimento pessoal;

2.recusa, sem justificativa legal, em responder às perguntas que lhe são formuladas;

3.fazer uso de desculpas ardilosas, ao responder às perguntas (arts. 343, parágrafo 2ª, e 345, CPC).

Como se nota, no primeiro caso, a confissão ocorre sem depoimento pessoal, já nos dois últimos, a confissão ocorre sem depoimento pessoal. Mister se faz afirmar novamente que em todas essas situações não existe a intenção de confessar.

5.1.3 - Momento da confissão judicial(11)

1) espontânea:

a)a qualquer tempo: desde que assim requeira a parte. A respeito desse ato, será lavrado termos no auto do processo;

b)durante o depoimento: também espontaneamente pode a parte confessar enquanto depõe, tudo constatando do termo do depoimento da parte.

2) provocada: por provocação do juiz inquiridor, pode a parte confessar durante o depoimento ou interrogatório. Será a confissão tomada no termo do depoimento ou do interrogatório.

5.2 - Confissão extrajudicial

A confissão extrajudicial é aquela que ocorre fora do processo, por escrito, diretamente à parte adversa ou seu representante, e não no curso do processo ou dentro deste. Possui o mesmo valor probante que a confissão judicial. Se feita a terceiros, todavia, deve ser recebida com reservas, pois será objeto de análise, pelo juiz, em conjunto com as demais provas existentes, principalmente se oral, situação na qual só é admissível caso inexista a exigência legal de outro meio de prova. A confissão fora dos autos do processo pode ser realizada de modo:

a)espontâneo, quando:

a.1. formulada por escrito, perante testemunhas, em que a parte firme declaração acerca da veracidade de fato que é alegado pela parte contrária, ou mesmo oralmente (art. 353, parágrafo único, CPC). Nesta última hipótese só terá eficácia nos casos em que a lei não imponha prova literal, como se dá com os pactos antenupciais (art. 34, CC);

a.2. efetuada espontaneamente em outros autos, mediante termo.

b)provocado, quando obtida em outros autos do processo, por termo, sem que a parte tenha tido a intenção de confessar.

5.3 - Resumo das espécies de confissão

A confissão pode ser: 

     real   >>> espontânea
1) judicial  >>> provocada
     ficta     
              
2) extrajudicial >>>  espontânea     
provocada     

            6 - FORMA DA CONFISSÃO

6.1 - Forma da confissão judicial(12)

O CPC disciplina a forma como a confissão judicial pode se dar. Pode vir por escrito para os autos e, se feita oralmente, é tomada por termo. Não existe, para a confissão judicial, a restrição que o CPC 353 par. único impõe para a extrajudicial. Entretanto, os termos incisivos e genéricos do CPC 366 afastam a possibilidade de se fazer por confissão, judicial ou extrajudicial, a prova daquilo que só por escritura pública se pode provar. O que se permite fazer por confissão oral judicial e a lei não permite por confissão oral extrajudicial (CPC 353 p. único) é a prova de negócio jurídico que exige instrumento por escrito. Nesse sentido, não se admite por confissão oral, quer judicial ou extrajudicial, por força do CPC 366, a prova de pacto antinupcial, que exige escritura pública (CC134,I). Mas a lei admite, por confissão oral judicial, mas não extrajudicial (por causa do CPC 353 p. único), a prova do depósito voluntário, que deve ser feita por escrito (CC 128, I).

6.2 - Forma da confissão extrajudicial(13)

Se feita por escrito, a confissão extrajudicial merece a mesma credibilidade da judicial. Se for feita oralmente ou no bojo do testamento, será apreciada livremente pelo juiz. Na verdade, todas as confissões serão valoradas e apreciadas livremente pelo juiz. A lei quer aqui significar, apenas, que a própria existência da confissão extrajudicial, nos casos que especifica, será considerada pelo juiz. A lei não impõe ao magistrado, nesses casos (confissão oral e confissão feita em testamento), o dever legal de reconhecer esses atos como de confissão.

7 - EFEITOS DA CONFISSÃO

O efeito essencial da confissão reside no reconhecimento quanto a serem verdadeiros os fatos alegados pela parte contrária. Esse reconhecimento pode ser expresso, como nas confissões espontânea e provocada, ou não expresso, como se dá na confissão ficta. No primeiro caso (espontânea), a confissão possui eficácia plena, absoluta, uma vez que emana da vontade da pessoa (desde que a sua intenção tenha sido externada sem nenhum vício); no segundo (provocada), a eficácia também é plena, pois embora a confissão não tenha provindo da vontade da parte, foi por esta manifestada, ainda que de maneira inadvertida; no terceiro (ficta), porém, a eficácia da confissão é relativa, porquanto a parte não manifestou nenhuma palavra capaz de espelhar a sua vontade de confessar. Aqui, a confissão, como já foi dito anteriormente, é tácita e decorre da ausência da parte à audiência em que deveria prestar depoimento, ou da sua recusa em responder o que lhe foi perguntado ou do fato de utilizar evasivas nas respostas dadas. A confissão ficta traduz uma solução de ordem prática que o sistema processual encontrou para superar os problemas decorrentes das atitudes das partes, acima referidas. A presunção da veracidade, como o próprio vocábulo está a indicar, não significa que o fato seja efetivamente verdadeiro. A propósito, já se disse, com ironia, que quase tudo vem para os autos do processo em decorrência de um conflito de interesses: tudo, menos a verdade...

O art. 350 do CPC diz que a confissão judicial faz prova contra o confitente, não prejudicando, todavia, os litisconsortes. Este dispositivo está em perfeita harmonia com o disposto no art.48 do CPC. Não entraremos em detalhes, agora, em relação à confissão junto ao litisconsórcio, porque este tema será objeto de apreciação em um tópico específico.

Se uma das partes estiver sendo assistida por terceiro, nada impede que aquela confesse (CPC, art.53). Na oposição, se um dos opostos reconhecer o direito em que se funda o pedido do adversário, ou confessar, contra o outro prosseguirá o opoente (CPC, art.58). Na nomeação à autoria presume-se aceita a nomeação se o nomeado não comparecer, ou, comparecendo, nada alegar (CPC, art.68, II). Na denunciação da lide, se o denunciado confessar os fatos alegados pelo auto, poderá o denunciante prosseguir na defesa (CPC, art. 75, III).

Nas ações concernentes a bens imóveis ou direitos sobre imóveis alheio, a confissão de um dos cônjuges não valerá sem a da outro (CPC, art.350, p. único). O legislador procurou, com isso, evitar que um dos cônjuges pudesse prejudicar, de maneira intencional ou não, a sociedade conjugal. Em face disso, para que a confissão seja eficaz, nas opções acima mencionadas, é imprescindível que seja manifestada por ambos os cônjuges.

No entanto, poderá a parte pleitear revogação de confissão. Mas isto, somente poderá ocorrer se se provar vício de consentimento (erro, dolo ou coação).(14) Para furtar-se aos efeitos da confissão assim viciada, o confitente terá, segundo o art. 352, de recorrer a :

I – ação anulatória, se o processo em que confessou ainda estiver pendente;

II – ação rescisória, se já houver sentença passada em julgado e a confissão constituir seu único fundamento.

A legitimidade para propor estas ações é apenas do próprio confitente. Mas se, depois de iniciada a causa, vier a falecer o autor, seus herdeiros poderão dar-lhe prosseguimento (art. 352, p. único).

7.1 - Efeitos da confissão no litisconsórcio

Os efeitos da confissão se limitam ao confitente, na forma do art. 350 do CPC, não atingindo, absolutamente, os litisconsortes do processo, visto que os litisconsortes são considerados autonomamente (art. 48 e 350 do CPC). Assim, os fatos de um litisconsorte não poderão prejudicar os demais, ou seja, "não há aproveitamento de atos entre litisconsortes se tratar-se de disposição de direito (confissão, por exemplo), que é atitude que só se reflete na esfera jurídica daquele que de seu direito dispõe."(15). Por outro lado, tratando-se de litisconsórcio unitário, e, justamente porque a decisão deverá ser igual para todos, a confissão de um litisconsorte será ineficaz em relação à determinação do resultado da decisão da causa, conquanto possa ser considerada válida em si mesma, desde que esteja revestida das formalidades. O fato de se dizer que a confissão do litisconsorte unitário é válida significa que não poderá ser revogada pelo litisconsorte confitente e, somente nos casos do art. 352 do CPC, pode ser anulada. Não será, todavia eficaz. Dessa forma, porque válida, mas ineficaz, ela poderá gerar efeitos fora do processo, em relação ao confitente e à parte contrária, mas nenhum efeito poderá gerar em relação à decisão a ser proferida no processo em que foi feita. Para que se verifique a eficácia no processo, necessário será que todos os litisconsortes unitários igualmente confessem, de forma válida.

8 - CONFISSÃO E DIREITOS INDISPONÍVEIS

Adverte o art. 351 do CPC não ser admissível em juízo a confissão que tenha como objeto fatos relativos a direitos indisponíveis.

Direitos indisponíveis são todos aqueles que respeitam aos direitos fundamentais da pessoa, como a vida, a liberdade, a cidadania, a saúde, a segurança, a igualdade, a família, a proteção à maternidade e infância.

Tem-se entendido que são também indisponíveis os direitos da Fazenda Pública, levando-se em conta a necessidade de preservação do interesse público e de sua permanência, em cotejo com o interesse particular.

Há controvérsia doutrinária, no entanto, sobre ser possível, ou não, a confissão nas separações litigiosas : alguns juristas entendem que essa separação não constitui direito indisponível, argumentando com o fato de poder ser objeto de mútuo consentimento, a que outros objetam. Uma solução intermédia a que se tem procurado estabelecer, é a de que se devam considerar disponíveis apenas os direitos diretamente ligados à dissolução da sociedade conjugal, considerando-se indisponíveis os atinentes, por exemplo, à guarda, educação e alimentos dos filhos.

O Código Civil, por sua vez, declara não ser suficiente a confissão materna para excluir a paternidade (art. 346).

O curador especial, de que trata o art. 9º do CPC, não pode confessar. Esse curador deve ser designado para atender : ao incapaz que não possuir representante legal, ou cujos interesses conflitem com o deste; ao réu preso e ao réu citado por edital ou com hora certa. Aliás, o art. 302, § único do CPC, afirma ser inaplicável ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Ministério Público o princípio da impugnação especificada dos fatos contidos no caput desta norma legal e de acordo com o qual o réu deve contestar, de maneira especificada, todos os fatos alegados pelo autor, sob pena de tais fatos serem presumidos verdadeiros.

9 - INDIVISIBILIDADE DA CONFISSÃO

A confissão, de regra, é indivisível, "não podendo a parte, que a quiser invocar como prova, aceitá-la no tópico que a beneficiar e rejeitá-la no que lhe for desfavorável" (CPC, art. 354, primeira parte). Há, como se pode perceber, uma nítida simetria entre essa disposição lega e a contida no art. 373, § único, do mesmo diploma lega, segundo o qual o documento particular, admitido expressa ou tacitamente, é indivisível, "sendo defeso à parte, que pretende utilizar-se dele, aceitar os fatos que lhe são favoráveis e recusar os que são contrários ao seu interesse, salvo se provar que esses não se verificam." Mais : a escrituração contábil é indivisível, pois se dos fatos provenientes dos lançamentos uns forem favoráveis ao interesse do autor e outros desfavoráveis, "ambos serão considerados em conjunto como unidade."(CPC, art. 380)

Dessa forma, tanto a confissão quanto o documento ou a escritura contábil são legalmente caracterizados pela indivisibilidade; no tocante à primeira, é vetusta a advertência de que não deve ser dividida (confessio dividi non debet). "Portanto, o que a norma quer dizer é que, ao fundamentar suas alegações, não pode a parte requerer ao juiz que desconsidere a parcela que não atende a seu interesse, e julgue com base apenas na parte que lhe tenha sido favorável."(16)

O mesmo art. 354 do CPC, todavia, prevê, em caráter excepcional, a divisibilidade da confissão quando o confitente lhe aduzir fatos novos, suscetíveis de constituir fundamentos de defesa de direito material ou de reconvenção. Normalmente, a regra legal da indivisibilidade da confissão parte do pressuposto de que esta incide em fatos já relatados no processo; no entanto, há situações em que, após a fase dos articulados, são trazidos aos autos outros fatos (fatos novos), justificando, com isso, a sua separação, no tocante aos fatos primitivos, para efeito de definição dos limites horizontais da confissão. É que esses fatos, por serem novos, não podem, à evidência, ser alcançados pela confissão. Tanto isso é certo que, nos termos da lei, poderão constituir fundamento de defesa de direito material, ou, até mesmo, de reconvenção. Por isso, Humberto Theodoro Júnior argumenta que "a questão de indivisibilidade da confissão, no entanto, não pode ser examinada sem se atentar para as regras do ônus da prova. Assim, se o réu, ao confessar, tem o ônus de provar fato extintivo ou modificativo do direito do autor, sua confissão pode ser perfeitamente cindida. Isto porque, ao proferir tese de defesa indireta, o réu admite a veracidade do fato constitutivo do direito do autor e assume o ônus processual de provar o outro fato impeditivo, extintivo ou modificativo (CPC, art. 333, II)."(17)

Em termos concretos, o que o art. 354, parte final, do CPC, está a dizer é que, em se tratando de fatos novos, a confissão não produzirá efeitos com relação a estes, mas apenas, quanto aos fatos anteriores, alegados pela parte contrária. Nesse sentido, destaca Humberto Theodoro Júnior : "É que esses fatos novos só poderiam ser levados em conta pelo julgador, se o confitente os provasse, segundo a regra legal do onus probandi. Há, pois, de distinguir entre confissão pura (a que se relaciona apenas com os fatos arrolados pelo autor) e a confissão qualificada (a que reconhece alguns fatos do autor mas aduz outros que lhe cessam ou restringem a eficácia)"(18)

10 - IRRETRATABILIDADE DA CONFISSÃO

Não consta do Código atual a irretratabilidade da confissão. Porém, é da essência da confissão o ser irretratável, por conter ela um elemento subjetivo, qual seja, a vontade de confessar. É ilógico alguém reconhecer como verdadeiro um fato que lhe é desfavorável, e posteriormente pretender que esse reconhecimento seja desconsiderado.

11 - REVOGAÇÃO DA CONFISSÃO

A confissão, em princípio, é irretratável; apesar disso, poderá ser revogada quando emanar de erro, dolo ou coação.

Na fase de elaboração do Projeto do atual CPC, a Comissão chegou a propor emenda ao então art. 356, com a seguinte redação : "Retratando-se confitente, sob a alegação de erro, dolo ou violência, o Juiz apreciará a retratação de acordo com seu livre convencimento." Essa emenda, entretanto, foi rejeitada, prevalecendo a regra da irretratabilidade da confissão, conquanto esta possa ser revogada, nos casos já mencionados e que serão a seguir apreciados.

Erro. Já constava do direito antigo o reconhecimento de que a pessoa induzida em erro era destituída de vontade (cum errantis nulla voluntas sit). Não é, contudo, qualquer erro que autorizará o desfazimento da confissão, mas somente o erro substancial, assim considerado o que interessa à natureza do ato, o objeto principal da declaração, ou algumas das qualidades a ele essenciais (CC, art. 87). Erro substancial será igualmente o que disser respeito à qualidades essenciais da pessoa a quem se referir a declaração de vontade (CC, art. 88). Por isso, erros inexpressivos, sem nenhuma influência no resultado do julgamento, ainda que tenham existido, não podem ser invocados como fundamento para invalidar a confissão.

Temos que o denominado erro de direito, mesmo que relevante, também não pode constituir fundamento para revogar a confissão, exatamente porque esta só compreende fatos.

Dolo. Originário do latim dolus, o vocábulo significa, na linguagem jurídica, "toda espécie de artifício, engano ou manejo astucioso promovido por uma pessoa, com a intenção de induzir outrem à prática de um ato jurídico, em prejuízo deste e proveito próprio ou de outrem."(19)

Os atos jurídicos provenientes de atividade dolosa da parte são, por isso, anuláveis (CC art. 92). Pelas mesmas razões, a confissão, quando oriunda de dolo, pode ser revogada.

Coação. A coação, como causa do desfazimento da confissão, há de ser tal que incuta no espírito da parte fundado receio de dano à sua pessoa, à sua família, ou à seus bens, iminente e igual, pelo menos, ao receável do ato extorquido (CC, art. 98). Ao apreciar a coação, o juiz deverá levar em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do confitente e todas as demais circunstâncias que podem influir na gravidade (CC, art. 99). Por outro lado, não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial (CC, art. 100).

A coação, capaz de invalidar a confissão, tanto pode ser física quanto moral.

Estabelece o art. 352 do CPC que a confissão poderá ser revogada :

A – Por ação anulatória, se pendente o processo em que foi praticada (inciso I);

B – Por açào rescisória, depois de transitada em julgado a sentença da qual constituir o único fundamento (inciso II).

Pontes de Miranda entende existir erro de terminologia no emprego, pelo legislador, do verbo "revogar", na redação do caput do art. 352 do CPC, porquanto correto seria anular. "Anulação não é revogação; quem pode revogar retira a voz, não anula."(20) Na verdade, o dispositivo legal mencionado não poderia fazer referência genérica à anulação, pois, se é certo que revogar não é o mesmo que anular, não menos exato é que anular não significa rescindir, embora ambos os vocábulos digam respeito ao desfazimento judicial da confissão.

A – Acão anulatória. Para logo é oportuno recordar que o Projeto do atual CPC recebeu emenda, proposta pelo Deputado José Camargo, destinada a suprir a parte do texto que condicionava o desfazimento da confissão ao ajuizamento da ação anulatória, sob o argumento de que seria duvidoso que essa ação declaratória incidental trouxesse vantagem à entrega da prestação jurisdicional. Essa emenda, no entanto, foi rejeitada.

Nos termos do art. 352, I, CPC, a ação anulatória pressupõe que o processo em que a confissão foi realizada se encontre em curso, ou seja, não tenha ainda recebido sentença. Trata-se, portanto, de uma declaratória incidental, para cujo julgamento será competente o juiz da causa principal (CPC, art. 109). Sendo anulada a confissão, a consequência será permitir à parte, que havia confessado, produzir as provas necessárias à demonstração dos fatos por ela alegados na causa. Mantida, porém, a confissão, a sentença apreciará a lide sob o pano de fundo das consequências desse ato da parte.

B – Ação rescisória. Havendo a sentença transitada em julgado (e produzido, em razão disso, a coisa julgada material – CPC, art. 467), os efeitos da confissão somente podem ser revogados mediante o exercício de ação rescisória.

É importante observar que só se justificará a ação rescisória se a confissão figurar como único fundamento da sentença rescindenda (CPC, art. 352, II). O inciso VIII do art. 485 do CPC prevê o uso da ação rescisória quando houver fundamento para invalidar a confissão "em que se baseou a sentença", mantendo, desse modo, harmonia com o inciso II do art. 352 do mesmo diploma legal. Assim sendo, se, por exemplo, a sentença rescindenda baseou-se na confissão e em outras provas dos autos, a ação rescisória não terá êxito, pois, como dissemos, ela só se justifica, ao rigor da lei, quando a confissão constituir o único fundamento da decisão, de tal maneira que o resultado julgamento poderia ter sido diverso se não tivesse ocorrido a confissão. Percebe-se, portanto, que o exercício da ação rescisória, nesse caso, está umbilicalmente submetido à influência que a confissão exerceu no resultado da entrega da prestação da tutela jurisdicional.

A legitimidade para ajuizar a ação, seja anulatória, seja rescisória, é do confitente, pois, como a consequência da confissão só alcança ao confitente, não estendendo seus efeitos a terceiros, cabe a ele a iniciativa de propor a demanda visando revogar tal ato e, evidentemente, o ônus de demonstrar a ocorrência do vício de vontade. Todavia, se este falecer no curso do processo, a ação passará a seus herdeiros (CPC, art. 352, § único). É importante ressaltar esta particularidade da lei : a ação só se transmitirá aos herdeiros do confitente se este vier a falecer durante o processo, ou seja, se a ação já tivesse sido proposta. Se a morte do confitente acontecer antes do ajuizamento da ação, esta não poderá ser exercida pelos herdeiros, motivo porque a confissão se tornará, em princípio, definitivamente imutável.

Em face disso, podemos afirmar que a confissão é irretratável (art. 352). Entretanto, poderá ser "revogada" quando emanada de erro, dolo, ou coação. Quando o processo em que houve confissão, emanada de erro, dolo ou coação, ainda estiver pendente, o meio adequado para a anulação da mesma é a ação anulatória; se já findo o processo, a ação será a rescisória, lembrando que para que esta surta efeitos é necessário que haja, entre a confissão e a sentença, uma relação absoluta de causa e efeito.


III CONCLUSÃO

A confissão, conceituada no Art. 348 do CPC ("há confissão, quando a parte admite a verdade de um fato, contrário ao seu interesse e favorável ao adversário"), é meio de prova, pois revela ao juiz a verdade de um fato que tenha sido alegado por por uma das partes e, embora contrariando seu interesse, é admitido pelo confitente.

Não se trata de ato de disposição, pois não implica necessariamente procedência do pedido. É meio de prova, alcançando apenas o fato alegado, e não as possíveis consequências que do fato possam resultar.

A confissão se insere no capítulo relativo às provas porque não significa expressar a vontade de favorecer o pólo oposto, mas tão somente admitir como veraz um fato ocorrido, deixando de a ele contrapor outro meio de prova.

Por significar o reconhecimento de um fato contrário ao interesse da parte, esse meio de prova tem sido supervalorizado. Já foi chamado de "a rainha das provas", como se, uma vez ocorrida, se sobrepujasse sobre as demais. Não é verdade. Não há como regra geral, hierarquia entre os meios de prova. Um fato confessado pode vir a ser demonstrado inveraz, ou mesmo pode o juiz desconsiderar a confissão, se entender inverossímil o fato confessado. Ademais, pelo princípio do livre convencimento motivado, nada obsta que o julgador afaste, na sentença, a confissão, porque, por exemplo, teria havido o intuito de acobertar terceiro, e dê a solução fundado em outros elementos probatórios existentes.

Não se pode entender a confissão além de sua limitaçãoprobatória porque, caso contrário, se abriria perigosa brecha para a colusão, permitindo que processos fraudulentos fossem iniciados com o único intuito de, através da confissão, obstar ao julgado a possibilidade de amplamente perquirir os elementos da causa.


NOTAS

1. COSTA, Moacyr Lobo da. Confissão e reconhecimento do pedido. São Paulo : Saraiva, 1983. p. 2.

2.CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. 1.ed. Campinas : Bookseller, 1998. v.3. p. 118.

3.THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 28. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999. v.1. p. 432.

4 NERY JÚNIOR, Nelson. Código de processo civil comentado. 4. Ed. São Paulo : RT,1999, p. 851.

5 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro : Forense, 1967. p. 1138.

6.ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 7. ed. São Paulo : RT, 2000. v.2. p. 562.

7.SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. São Paulo : Saraiva, 1977. v. 2. p. 382.

8.THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 28. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999, v. 1, p. 433.

9.MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 20ª ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999, p. 60.

10.WAMBIER, Luiz Rodriguez; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. 2ª ed. São Paulo : RT, 1999, v.1. p.508.

11.NERY JÚNIOR, Nelson. Código de processo civil comentado. 4. Ed. São Paulo : RT,1999, p. 851.

12.idem

13.idem, p. 853.

14.THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 28. Ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999, v. 1, p. 434.

15. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil. 2. ed. São Paulo : RT, 1999. v.1. p. 243.

16. Idem, p.507.

17. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 28. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999. v. 1. p. 435.

18. Idem, p. 435.

19. SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico. 15. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1999. p. 283.

20. MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro : Forense, 1979. p. 432.

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Sobre os autores
Fabrício Muniz Sabage

acadêmico de Direito das Faculdades de Curitiba

André Wagner Melgaço Reis

Assessor de Ministro do STJ

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SABAGE, Fabrício Muniz ; REIS, André Wagner Melgaço. Confissão no processo civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2517. Acesso em: 23 abr. 2024.

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