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O princípio da eficiência na administração pública brasileira

Leia nesta página:

Demonstra-se como é feita a mensuração da eficiência segundo o entendimento do Tribunal de Contas da União e do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, diferenciando-a de eficácia, economicidade e efetividade.

Estrutura:1) Introdução; 2) O princípio da eficiência na doutrina; 3) Mensuração da eficiência segundo o entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG); 4) Exemplo concreto do princípio da eficiência e diferenciação entre eficiência, eficácia, economicidade e  efetividade; 5) Considerações Finais.


1) Introdução:

O princípio da eficiência é o mais recente dos princípios constitucionais da Administração Pública brasileira, tendo sido adotado a partir da promulgação, pela Mesa do Congresso Nacional, da Emenda Constitucional nº 19, de 1998 (EC 19/98). Estávamos no final do primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) e no auge da adoção, no Brasil, da idéia da administração pública gerencial, cuja característica principal é o controle por resultados, e não por processos, como ocorre na administração pública burocrática. O documento contendo a proposta de administração pública gerencial para o Brasil foi o Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado, o qual norteou a política administrativa da gestão  FHC, implementada pelo então Ministro da Administração e Reforma do Estado, Luís Carlos Bresser Pereira.


2) O princípio da eficiência na doutrina:

Di Pietro (2005) destaca o aspecto duplo pelo qual o princípio da eficiência pode ser analisado, referente tanto à maneira pela qual atua o agente público quanto à forma pela qual é estruturada a Administração Pública. Sobre o assunto escreve a autora:

“O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público” (Di Pietro, 2005:84).

Rosa (2007:17), assim como Di Pietro (2005), também assinala a questão dos dois entendimentos possíveis sobre o significado do princípio da eficiência, sendo um aspecto referente à forma de atuação do agente público, e o outro atinente ao modo de organização da Administração Pública, a qual deve se estruturar de acordo com os mais modernos padrões de gestão.

 Di Pietro (2005) salienta que o princípio da eficiência já era adotado no Brasil antes da EC 19/98, estando presente em alguns dispositivos do Decreto Lei 200, de 1967. A mesma autora informa, sobre o assunto, que o princípio da eficiência encontra-se contemplado no referido normativo no trecho em que este último “submete toda a atividade do Executivo ao controle de resultado (...), fortalece o sistema de mérito, (...), sujeita a administração indireta à supervisão ministerial quanto à eficiência administrativa (...), e recomenda a demissão ou dispensa do servidor comprovadamente desidioso”, Di Pietro (2005:84). Modesto (2000:111) também salienta que a própria Constituição Federal de 88 tem dispositivos originários que representam a influência do princípio da eficiência no Direito Administrativo brasileiro, sendo um desses dispositivos o artigo 175 da Carta Política, o qual faz menção expressa à obrigação de manter serviço adequado, a qual teria relação com o princípio da eficiência.

Outro aspecto examinado por Di Pietro (2005) é o relativo ao relacionamento entre os princípios da legalidade e da eficiência; a autora ressalta a necessidade da preponderância, da prevalência do primeiro sobre o segundo. Desta forma, se o ato administrativo praticado pelo gestor público primar pela eficiência, mas não obedecer à legalidade, ele não poderá subsistir no ordenamento jurídico. O referido ato terá que ser invalidado, anulado pela própria Administração Pública no exercício da autotutela ou pelo Poder Judiciário em caso de este último ser provocado para tal.

Carvalho Filho (2004:19) menciona o fato de que, para efetivar e dar concretude ao princípio constitucional da eficiência da Administração Pública brasileira, é essencial que seja elaborada a legislação infraconstitucional que regulamenta o dispositivo da Carta Magna contido no artigo 37, parágrafo 3º da Carta Política. O citado dispositivo diz respeito “às reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, externa e interna, da qualidade dos serviços; (...), e à disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na administração pública”.

Meirelles (1999:89) considera que “O princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros”. O mesmo autor considera, também, que outras modificações promovidas pela Emenda Constitucional nº 19/98 são decorrências da adoção do princípio da eficiência, destacando a possibilidade de dispensa de servidor público estável mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho e a necessidade de aprovação, em avaliação especial de desempenho, para aquisição da estabilidade no serviço público por parte do servidor público que está em estágio probatório.

Rosa (2007:17) defende que há dois dispositivos constitucionais que consagram expressamente o princípio da eficiência da Administração Pública, sendo eles o que prevê a avaliação periódica a que está submetido o servidor público (artigo 41, parágrafo primeiro, inciso III) e o que prevê a possibilidade de formalização de contrato de gestão envolvendo órgãos e entidades da Administração Pública (artigo 37, parágrafo oitavo).

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3) Mensuração da eficiência  segundo  o entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG):

Segundo publicação do Tribunal de Contas da União (TCU, 2000:15), a eficiência pode ser conceituada como sendo a “Relação entre os produtos (bens e serviços) gerados por uma atividade e os custos dos insumos empregados para tal em um determinado período de tempo. Se a quantidade de produto está predeterminada, procura-se minimizar o custo total; se o gasto total está previamente fixado, procura-se otimizar a combinação de  insumos para maximizar o produto; em ambos os casos a qualidade deve  ser mantida. Essa dimensão, portanto, mede o esforço  do processo  de transformação de insumos em  produtos.” Desta forma, a eficiência na gestão pública, para o TCU, é obtida por meio da maximização do produto e simultânea minimização dos custos.

De acordo com o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG, 2009:20 e 21), o conceito de eficiência é o seguinte: “Eficiência é a relação entre os produtos/serviços gerados (outputs) com os insumos utilizados, relacionando o que foi entregue e o que foi consumido de recursos, usualmente sob a forma de custos ou produtividade. Por exemplo: uma campanha de vacinação é mais eficiente quanto menor for o custo, ou seja, quanto menor for o custo da campanha, mantendo?se os objetivos propostos. Indicadores de eficiência podem ser encontrados na Carta de Serviços com seus elementos de custos e em informações de sistemas estruturantes do Governo, como o SIAFI;”. Assim, para o MPOG, a eficiência na gestão pública é obtida por intermédio da maximização dos “outputs” e minimização dos “inputs”, ambas simultaneamente.


4) Exemplo concreto do princípio da eficiência e diferenciação entre eficiência, eficácia, economicidade e  efetividade:

Como exemplo concreto do conceito de eficiência, podemos mencionar o da construção de um hospital público em dois distritos diferentes de um mesmo município. Consideremos que o gestor público municipal, o prefeito, é auxiliado por dois gestores públicos distritais, cada um deles atuando num distrito diferente. Em princípio, consideraremos que os custos dos insumos são os mesmos. O produto seria o hospital construído funcionando. No distrito A, o hospital construído funcionando custou R$ 300 mil, e no distrito B, onde o gestor público conseguiu obter alguns descontos com fornecedores de insumos, o mesmo hospital custou R$ 280 mil. Desta forma, tem-se que o gestor público do distrito B foi mais eficiente do que o gestor público do distrito A, tendo em vista que o hospital do distrito B teve um custo de construção inferior ao do seu congênere do distrito A. Neste caso específico, a mensuração da eficiência diz respeito à minimização do custo, tendo em vista que o exemplo se refere à obtenção de um mesmo produto, qual seja, a construção de uma unidade de hospital público.

Tomando como base esse mesmo exemplo, e supondo que no plano plurianual e no orçamento anual do mencionado município foram previstas as construções dos dois hospitais, um em cada distrito, pode-se considerar que o gestor público municipal, o prefeito, foi eficaz, na medida em que os hospitais foram efetivamente construídos, ou seja, o que foi planejado foi executado conforme a previsão.

No caso da economicidade, a variável a ser considerada é unicamente o custo. Assim sendo, como o custo de produção do hospital no distrito B foi menor do que o do hospital no distrito A, o gestor público do distrito B foi mais econômico do que o seu congênere do distrito A.

Para analisar a questão da efetividade, que mede o impacto real da gestão pública na população da sociedade, suponhamos que o índice de mortalidade infantil no distrito A tenha sido reduzido em 10%, e que o percentual de redução da mortalidade infantil no distrito B tenha sido de 15%. Desta forma, temos que o gestor público distrital de B foi mais efetivo do que o gestor público distrital de A.


5) Considerações Finais:

Em decorrência dos argumentos apresentados, podemos concluir que o princípio da eficiência adquiriu estatura constitucional apenas com a edição da Emenda Constitucional nº 19/98. Entretanto, tal princípio já estava contemplado no ordenamento jurídico brasileiro em dispositivos do Decreto Lei 200/67 e em alguns dispositivos constitucionais originários da Carta Magna de 1988, tais como o que estabelece a obrigação de o Estado ou o delegatário (concessionário ou permissionário) prestarem serviço público adequado. Além disso, merece destaque o aspecto de que a eficiência na gestão pública deve sempre se subordinar ao princípio da legalidade, que é o princípio basilar mais relevante da Administração Pública brasileira, de observância compulsória.


Referências Bibliográficas:

Di Pietro, M. “Direito Administrativo”, São Paulo, Editora Atlas, 2005;

Meirelles, H. “Direito Administrativo”, São Paulo, Editora Malheiros, 1999;

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, “GUIA REFERENCIAL PARA MEDIÇÃO DE DESEMPENHO E MANUAL PARA CONSTRUÇÃO DE INDICADORES”, Brasília, 2009;

Modesto, P. “Notas para um debate sobre o princípio da eficiência”, Revista do Serviço Público, ano 51, nº 2, abril a junho de 2000, páginas 105 a 117, Brasília, ENAP;

Rosa, M. “Direito Administrativo”, São Paulo, Editora Saraiva, 2007;

Tribunal de Contas da União, “Técnica de auditoria. Indicadores de desempenho e mapa de produtos”, Brasília, 2000;

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Sobre o autor
Carlos Frederico Rubino Polari de Alverga

Economista graduado na UFRJ. Especialista em "Direito do Trabalho e Crise Econômica" pela Universidade Castilla La Mancha, Toledo, Espanha. Especialista em Administração Pública (CIPAD) pela FGV. Mestre em Ciência Política pela UnB. Analista de Finanças e Controle da Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda. Atua na área de empresas estatais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVERGA, Carlos Frederico Rubino Polari. O princípio da eficiência na administração pública brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3739, 26 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25399. Acesso em: 14 nov. 2024.

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