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Voto secreto

01/01/2002 às 01:00
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Tanto no Congresso Nacional como nas Assembléias Legislativas dos vários Estados, e até nas Câmaras de Vereadores dos mais diversos municípios do país, desenvolvem-se campanhas preconizando a extinção do voto secreto.

A tese defendida pelos que fazem tais campanhas, e que ganhou a simpatia da opinião pública, fundamenta-se no direito do eleitor de conhecer o voto de seu representante, não se justificando, portanto, o voto secreto. Essa tese, porém, é válida apenas até certo ponto. Deve prevalecer como regra geral, mas há de comportar exceções porque em certos casos o voto secreto é exatamente a garantia concedida ao povo de que o seu representante terá condições de votar livremente, sem o constrangimento das pressões espúrias.

Por força de dispositivos da Constituição Federal de 1988, o voto dos deputados e senadores no Congresso Nacional é secreto para:

a) aprovar a escolha de magistrados nos casos estabelecidos na Constituição, e de titulares de outros cargos públicos que indica (art. 52, inciso III);

b) aprovar a indicação de chefes de missão diplomática em caráter permanente (art. 52, inciso IV);

c) aprovar a exoneração "de ofício", do Procurador Geral da República (art. 52, inciso XI);

d) resolver sobre a prisão em flagrante e a formação da culpa no caso de crime inafiançável praticado por membro do Congresso Nacional (art. 53, § 3º);

e) decidir pela perda do mandado do deputado ou senador (art. 55, § 2º);

f) decidir sobre a derrubada de veto do Presidente da República a projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional (art. 66, § 4º).

Entende-se que, nesses casos, deputados e senadores precisam de proteção contra pressões que lhe retirariam a liberdade de votar segundo sua consciência.

O voto aberto é, sem dúvida, aparentemente mais democrático. Mas só aparentemente. Permite, é certo, o controle do eleitor, mas deixa o membro do Congresso Nacional exposto ao controle por parte do Poder Executivo, geralmente interessado nas decisões por motivos alheios aos interesses do povo. Controle que é muito mais efetivo do que o controle popular.

Sem precisarmos invocar o exemplo de outros países, basta que examinemos as nossas próprias Constituições. A de 1937, sabidamente a mais antidemocrática, estabelecia que as sessões do Congresso deviam ser públicas (art. 40 ), e não permitia em nenhuma hipótese o voto secreto, sendo relevante notar-se que em se tratando da rejeição de veto presidencial a Carta de Vargas exigia votação nominal. Já a de 1934, sabidamente a mais democrática de nossas Constituições, pelo menos até 1988, previa o voto secreto nas eleições e nas deliberações sobre vetos e contas do Presidente da República (art. 38 ), e para aprovar as nomeações de magistrados nos casos indicados, dos Ministros do Tribunal de Contas, do Procurador Geral da República e dos chefes de missões diplomáticas no exterior (art. 90).

A história demonstra que as votações abertas nos parlamentos, como o plebiscito, são democráticas apenas na aparência. Servem mais aos poderosos do que ao povo. Já o voto secreto, embora não o pareça aos menos avisados, pode ser, em certos casos, uma salvaguarda da democracia.

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Sobre o autor
Hugo de Brito Machado

professor titular de Direito Tributário da UFC, presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET), juiz aposentado do Tribunal Regional Federal da 5ª Região

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Hugo Brito. Voto secreto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 53, 1 jan. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2560. Acesso em: 29 mar. 2024.

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