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A tutela jurisdicional diferenciada nos conflitos trabalhistas

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01/02/2002 às 01:00
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5. A negociação trabalhista alternativa Brasil:

O ordenamento jurídico brasileiro prevê, a mediação, a conciliação e a arbitragem como soluções de conflitos coletivos.

A mediação na negociação coletiva de natureza trabalhista possui suas regras previstas no Decreto nº 1.572, de 28 de julho de 1995. O seu artigo 2º prevê que, frustrada a negociação direta entre as partes na data-base, as mesmas poderão escolher um mediador de comum acordo para a solução do conflito.

As partes poderão, inclusive, solicitar ao Ministério do Trabalho a designação de um mediador, caso não entrem em consenso ou caso a parte não se sinta em eqüilíbrio para participar da negociação coletiva.

O mediador poderá fazer parte do quadro de empregados do Ministério do Trabalho ou ser uma pessoa cadastrada ao referido órgão público. No primeiro caso, não haverá ônus de honorários às partes, ao contrário do que ocorre no segundo.

O Ministério do Trabalho deverá manter um cadastro de profissionais habilitados para desempenharem a função de mediador e para possibilitar uma opção às partes.

O mediador deverá inscrever-se pessoalmente na Delegacia Regional do Trabalho, devendo possuir comprovada experiência na solução de conflitos e conhecimentos técnicos, todos de ordem trabalhista. O credenciamento terá validade pelo prazo de três anos, a partir da publicação de despacho do delegado, salvo cancelamento fundamentado do mesmo.

O prazo para a finalização dos trabalhos como mediador é de trinta dias de sua designação, podendo ser menor (caso de ordem pública) ou de maior prazo (acordo entre as partes).

No caso de frustação da negociação direta e da mediação, será lavrada uma ata contendo as causas do conflito e as reivindicações de natureza econômica.

5.1. As Comissões de Conciliação Prévia – Lei n. 9.958/2000.

A Lei 9.958/2000, que institui a possibilidade de criação das Comissões de Conciliação Prévia, trouxe uma grande inovação ao Direito Brasileiro, mas junto com a novidade surgiram as mais diversas posições ora de elogio ou crítica, estabelecendo um clima polêmico em torno da matéria, razão pela qual se faz necessário um abordagem detalhada sobre as origens deste conceito juslaboral.

Em 13 de janeiro de 2000 foi publicada a Lei nº 9.958, de 12.01.2000, que alterou e acrescentou artigos à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, dispondo sobre as Comissões de Conciliação Prévia e, ainda, permitindo a execução de título executivo extrajudicial na Justiça do Trabalho. Com a citada lei, a CLT foi acrescida do Título VI-A. O art. 625 foi acrescido das letras A até H; o art. 876 teve nova redação; e ao art. 877 acrescentou-se uma letra A, adotando-se, assim, uma recente técnica legislativa que evita a renumeração dos dispositivos legais.

É mais um capítulo na Reforma Trabalhista que está em curso. Constittui-se na versão tupiniquim do fact finding americano. Sua atribuição é tentar conciliar os conflitos individuais dos trabalho.

Estas comissões podem ser instaladas nas empresas ou no âmbito sindical. Serão compostas de representantes dos empregadores e empregados, em igual proporção. Agora, para os trabalhadores proporem ações trabalhistas buscando seus direitos, terão necessariamente que se submeter antes às comissões de conciliação prévia, se ela tiver sido instituída na empresa ou no sindicato, na localidade da prestação de serviços.

A solução extrajudicial dos conflitos individuais trabalhistas, por intermédio de comissões de conciliação prévia, portanto, é, em tese, uma alternativa válida para pacificar as questões entre empregados e empregadores, não só após a extinção da relação de emprego, mas também durante o vínculo empregatício.

Contudo, que não basta a simples previsão legal para instituição de meios extrajudiciais de solução dos conflitos entre empregados e empregadores. Faz-se necessário o desenvolvimento de uma cultura motivada para conduzir as partes aos mecanismos alternativos de pacificação das questões entre o trabalho e o capital, o que não se consegue sem que os interessados, sobretudo os trabalhadores, tenham a necessária confiança na atuação desses órgãos, tal como hoje ainda confiam, apesar de tudo, na Justiça do Trabalho.

Neste mesmo diapasão, diversos pensadores e operadores do direito tem-se manifestado em relação ao conteúdo da Lei 9.958/2000, por entenderem que, apesar de não haver mais cabimento para o estabelecimento de barreiras quanto à utilização dos meios alternativos em função da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, pois a situação objetiva das relações sociais e laborais exigem uma justiça que seja muito mais "social"que "jurídica", não se pode, por outro lado, descuidar das garantias mínimas ao trabalho e ao trabalhador.Assim é que se levantam argumentos pela sua inconstitucionalidade.

Jorge Pinheiro Castelo[37], em artigo publicado na Revista LTr, estabelece uma série de questionamentos sobre os interesses ocultos que estariam em jogo e que teriam influenciado a publicação da lei que instituiu as Comissões de Conciliação Prévia, interesses esses que, na opinão do autor, seriam contrários aos dos trabalhadores que, por via de consequência somente terão prejuízos com sua implementação, a começar pela inconstitucionalidade em que se consubstancia o "estabelecimento de artificial condição de ação violando o acesso direto e atual à justiça e a instrumentalidade substancial do processo"[38]. Castelo argumenta que a jurisdição condicionada não está prevista além das elencadas no art. 217, § 1 da Constituição Federal de 1988, configurando-se tal exigência como verdadeiro "pedágio de acesso à Justiça, mediante uma passagem administrativa prévia e obrigatória"[39]. O autor é contundente em afirmar que, em relação ao interesse de agir, o estabelecimento de uma condição de ação de natureza administrativa – o esgotamento da via da negociação na Comissão de Conciliação Prévia - é entulho autoritário ( § 4 do art. 153, CF/69), extirpado pela CF/88.

Considera Castelo que, ao impor a condição de obrigatoriedade ao trabalhador em buscar a conciliação prévia, estaria o dispositivo legal em pareço afrontando o art. 114 da Constituição Federal de 1988, que estabelece atribuição de competência exclusiva da Justiça do Trabalho para conciliar e julgar dissídios individuais ou coletivos.

Comunga desta posição em relação à inconstitucionalidade da jurisdição condicionada prevista na Lei 9.958, o jurista Luis Salvador[40], para quem o direito de ação é absoluto e não pode sofrer qualquer tipo de óbice por parte do legislador ordinário, independente de qualquer condição, sendo bastante que haja a capacidade jurídica, a legitimidade e o direito de agir.

Para Claudio Cordeiro Quiroga Gadelha[41], apesar de o direito de ação ser absoluto para alguns doutrinadores e não ser absoluto para outros, em sua opinião, há um caráter absoluto no tocante a esse direito fundamental do ser humano, mas para ele não é esta a questão em discussão, pois na legislação em análise, não se trata de condição para a ação, mas pressuposto processual inerente ao exercício do direito de ação, para dar-lhe viabilidade, sendo matéria ligada às regras processuais infra-constitucionais. Sendo, portanto, admissível a exigência do esgotamento da via extrajudicial configurada pela Comissão de Conciliação Prévia.

Francisco Ferreira Jorge Neto[42] diverge ao considerar que o direito de ação não é absoluto, pois já está inclusive condicionado aos requisitos previstos no art. 267, VI CPC e agora também a este estabelecido pelas regras da Lei 9.958/2000, que se configura como um acréscimo, a saber:

Portanto, a obrigatoriedade de tentativa de conciliação prévia é pressuposto processual, matéria que está afeta às regras de direito processual, não se atritando com o direito de ação assegurado constitucionalmente, tampouco com as condições da ação, pois estas encontram-se declinadas no art. 267, inciso VI, do CPC.

Para este autor a real violação ao direito de ação é o efeito amplo à demanda. E nesse sentido, parece haver coincidência na posição dos doutrinadores pesquisados, visto que todos têm acordo em apontar os riscos imediatos contra os interesses dos trabalhadores encerrados no parágrafo único do art. 625-E que atribui à transação feita perante a comissão o efeito de coisa julgada, mesmo das parcelas que sequer foram postuladas perante a comissão.

Dispõe o art. 625-E :

Art. 625-E - Aceita a conciliação, será lavrado termo assinado pelo empregado, pelo empregador ou seu preposto e pelos membros da Comissão, fornecendo-se cópia às partes.

parágrafo único - O termo de conciliação é título executivo extrajudicial e terá eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas.

Concordam os autores pesquisados que se configura em violação do direito adquirido e da coisa julgada o disposto no parágrafo único do art. 625-E ao atribuir à transação feita pela comissão o efeito de coisa julgada – eficácia liberatória geral, mesmo das parcelas não apreciadas por ela, consubstanciando-se como verdadeira violação do art. 5. XXXV, da Constituição Federal de 1988. Segundo Luis Salvador[43], o projeto original previa que essa liberação só se daria na Justiça do Trabalho.

Sobre essa questão do poder liberatório do documento produzido na conciliação, assim se pronuncia Francisco Ferreira Jorge Neto[44]:

O título oriundo da conciliação possui eficácia liberatória quanto aos títulos que sejam objeto da demanda, desde que não haja ressalva expressa. Os títulos não citados, como sendo conteúdo da demanda, não precisam ser ressalvados, na medida em que a quitação deve ser entendida de forma restritiva, valendo somente para os títulos demandados junto ao referido órgão extrajudicial.

Quem produz coisa julgada, dentro do ordenamento jurídico nacional, é a sentença de mérito, proferida pelo órgão jurisdicional competente, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário (art. 467, CPC). Ainda, neste sentido temos a Lei de Introdução ao Código Civil, a qual em seu art. 6º, § 3º enuncia: "Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso".

A pretensa equiparação dos termos "terá eficácia liberatória geral" à figura da coisa julgada, em nosso entendimento, reputa-se verdadeira ofensa ao art. 5º, XXXVI, que enuncia: "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".

Luis Salvador[45] reporta-se ao pronunciamento do presidente da AMATRA –IX – Associação dos Magistrados Trabalhistas – Região IX, Juiz do Trabalho em Maringá, Paraná:

"a irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas cogentes devem, portanto, ser assegurados, não se admitindo jamais que a Comissão de Negociação prévia possa legitimar RENÚNCIAS DO TRABALHADOR, seja ela tácita ou expressa, não podendo sequer admitir que a simples expressão "eficácia liberatória geral" tenha o condão de contrariar as dicções do art. 9o., 444 e 468 contidas na mesma Consolidação. Veja-se que até mesmo no que se refere a redução de salário a CF só a admite mediante CCT ou ACT (art. 7º, inciso VI). Ademais da incorreção lexicológica, há nesta regra uma perversidade política imoral" (in "Comissões de conciliação: a lógica do avesso" (GENESIS, Curitiba, 331-409, março/2000).

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E continua:

"na realidade, seria tolerável e até desejável – com organizações sindicais decentes, legítimas e representativas, ou comissões de empresa legitimamente instituídas – que a prática da negociação fosse revestida da maior autoridade. Nada obstante, nunca da forma como posta pelo legislador. A lei deveria estabelecer que a eficácia liberatória só ocorre em relação ao objeto da demanda submetida à comissão. Imagine-se, por exemplo, a hipótese de uma controvérsia banal sobre o acerto de contas na rescisão de um contrato de emprego (muitas vezes marcada por certa intranqüilidade entre os envolvidos). Para a composição acerca de valores ou critérios de cálculo, haverá o trabalhador de ressalvar imediatamente no "termo" de conciliação todas as questões que pretende discutir em juízo. E deverá fazê-lo de inopino, sem consultar advogado, sem meditar sobre os anos passados do contrato ainda não alcançados pela prescrição qüinqüenal, sem trocar idéias com familiares. Se nada lhe vier à memória, haverá quitação geral. A considerar constitucional a referida Lei, por certo, doravante, muitos empregadores passarão a exigir que a "homologação" das rescisões contratuais se realizem perante as comissões. Tal como hoje em dia uns tantos já se valem do artifício do aforamento de uma "demanda" judicial para o pagamento de verbas rescisórias, buscando exatamente a eficácia liberatória genérica agora consagrada na lei como regra, mais e mais empresários passarão a correr às comissões prévias de conciliação. O resultado disso poderá ser o sacrifício dos direitos de milhões de humildes trabalhadores. Por que não estabelecer que a conciliação só implica eficácia liberatória – isto é, só exime o devedor de qualquer obrigação – quando pactuada expressamente? As razões são políticas, e seguramente inconfessáveis, ou são a manifestação da ingenuidade coletiva de pelo menos uma parte dos membros do Congresso Nacional. Até mesmo uma sentença judicial deve estar limitada à chamada res in iudicio deducta (não vamos repisar aqui a teoria da sentença infra, ultra e extra petita, plasmada, grosso modo, no art. 460 do CPC). Como posta na Lei 9.958/2000, o termo de conciliação terá poder maior que aquele conferido à sentença, pois produzirá a mesma conseqüência jurídica, sem qualquer formalidade, sem contraditório, sem ampla defesa e principalmente sem os limites da demanda. (GENESIS, Curitiba, 331-409, março/2000).

Outros senões são levantados em relação ao conteúdo da lei 9.958/2000, com destaque à ausência de previsão da presença de advogado do trabalhador às negociações realizadas no âmbito da Comissão, bem como da inaplicabilidade objetiva do dispositivo diante da realidade nacional do descumprimento da norma que exige o registro formal dos empregados. Se não registrado, o empregado não pode participar do processo de formação da Comissão de Conciliação.

Além das questões já apontadas, alertam os juristas para o fato de que negociação nas comissões de conciliação prévia nas empresas em época de crise é prejudicial aos trabalhadores, pois seria como "colocar a raposa junto com as galinhas para administrar os problemas do galinheiro". A tendência é a de o empregador impor as suas condições e o empregado será obrigado a "aceitar" o acordo nas bases propostas sob a ameaça de perda de emprego, de não pagamento das verbas rescisórias etc. A maior preocupação se concentra no fato de que o termo conciliatório terá "eficácia liberatória geral", isto é, os empregados que não ressalvarem os seus direitos (outros direitos em números e valores não especificados no documento), não poderão mais reclamar estes na Justiça do Trabalho, pois terão dado "quitação" ao seu contrato de trabalho.

Assim, a atenção dos trabalhadores há que ser redobrada, aumentando também a responsabilidade dos sindicatos e advogados, pois a falta de informação sobre os seus direitos, implicará na sua perda.

Dessa forma, as entidades sindicais assumem um papel mais que determinante em esclarecer o trabalhador sobre seus direitos e como melhor defendê-los, atuando diretamente no interior das empresas, indicando seus representantes para compor o quadro das Comissões de Conciliação. No entanto, não se pode olvidar o quadro de profunda disparidade existente no país entre os grandes centros urbanos e o interior.

Nos grandes centros urbanos do país, as grandes categorias profissionais, tanto na indústria ( metalúrgicos, químicos, petroquímicos, vidreiros etc) quanto no setor de serviços ( bancários, securitários, professores particulares etc), dispõem de uma larga tradição de luta e organização no movimento sindical, possuindo sindicatos fortes, ligados à centrais sindicais de âmbito nacional, com grande poder de negociação, consubstanciada em muitas conquistas alcançadas ao longo dos tempos, como também por derrotas inevitáveis ( por exemplo, a categoria bancária que já contou com 800.000 postos de trabalho nos anos 80, atualmente não passa de 350.000 em todo o país).

No interior a organização autônoma dos trabalhadores ainda é incipiente, predominando os chamados "sindicatos de gaveta", meros representantes subservientes do empregador que se perpetuam no poder graças ao baixo nível de consciência e cultura dos trabalhadores e as benesses da patronal.

Diante dessa realidade que se apresenta os instrumentos contidos na Lei 9.958/2000 não servem para contribuir para a solução eficaz das contendas de ordem laboral de forma equânime, pois além de não fortalecerem o principal instrumento de defesa do trabalhador que é o sindicato, ainda impedem-lhe o acesso direto e amplo à via judicial, numa política que não cumpre o objetivo de estimular a credibilidade na forma alternativa de solução de conflitos.

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Sobre a autora
Edna Raquel R. S. Hogemann

advogada no Rio de Janeiro (RJ), professora universitária, mestra em Direito pela Universidade Gama Filho

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HOGEMANN, Edna Raquel R. S.. A tutela jurisdicional diferenciada nos conflitos trabalhistas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 54, 1 fev. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2580. Acesso em: 22 dez. 2024.

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