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Não incidência do ISS sobre a atividade de produtoras e distribuidoras de conteúdo audiovisual:

a relevância do REsp 1.308.628 para a indústria do audiovisual

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5 – DO DIREITO A RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE

Pacificado o entendimento a respeito da não incidência de determinado tributo, restando-se declarada a cobrança realizada em outrora, nasce o direito do contribuinte a restituição do valor pago indevidamente, por meio das ações repetitórias, sob pena de enriquecimento ilícito sem causa, como estipula o Código Tributário Nacional:

Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:

Na mesma esteira, preleciona o civilista Caio Mário (2012, pág. 211).

“No direito brasileiro como no alienígena a doutrina inclina-se neste sentido, e a jurisprudência, após vacilações, tem-no seguido. Entende-se que o fundamento do pedido de restituição do imposto indevidamente pago não é o erro do solvens, mas a ilegalidade ou a inconstitucionalidade da cobrança ou, em termos genéricos, da falta de causa. “

Aliomar Baleeiro (2003; pág. 881) segue afirmando que os casos em que o sujeito ativo da obrigação tributária recorre ao uso das ações repetitórias em face de ato ilegal ou arbitrário do Fisco é o tema mais recorrente destas causas nos Tribunais: “Os tributos resultantes de inconstitucionalidade ou de ato ilegal e arbitrário, são os casos mais frequentes de aplicação do inciso I do art. 165”.

Cabe ao contribuinte lesado pela atuação arbitrária do Fisco pleitear a restituição dos valores pagos indevidamente de forma retroativa, dentro do prazo retroativo de 5 anos a contar da cobrança indevida ou de dois anos da decisão administrativa que denegar a restituição, que prescreve em 2 anos, consoante disposição do CTN:

Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:

I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; (Vide art 3 da LCp nº 118, de 2005)

II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.

Art. 169. Prescreve em dois anos a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.

Parágrafo único. O prazo de prescrição é interrompido pelo início da ação judicial, recomeçando o seu curso, por metade, a partir da data da intimação validamente feita ao representante judicial da Fazenda Pública interessada.

   Os valores pagos indevidamente podem ser restituídos das seguintes formas ou pela devolução (por meio de precatórios) ou da compensação, quando o Estado permite que o sujeito passivo compense, de imediato ou em recolhimentos futuros eventuais débitos.

 Eventuais débitos inscritos em dívida ativa municipal, com base na exação indevida, também podem ser revistos, como afirma Aliomar Baleeiro (2003; pág. 881):

“O crédito fiscal, mesmo depois de encerrada a instância administrativa e transformado em dívida ativa do Tesouro pela inscrição, que lhe imprime certeza e liquidez, pode ter essa presunção elidida pelo sujeito ativo ou terceiro a quem isso aproveite”.

Contudo, nem tudo são flores, o maior problema enfrentado pelos contribuintes é a restituição de tributos indiretos, uma vez sendo necessária a autorização daquele que assumiu, de fato, o encargo financeiro do pagamento do tributo:

”Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la”.

O Supremo Tribunal Federal assentou ser possível a repetição de tributo pago indevidamente, por meio da Súmula 546, ex vis:

“Cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte "de jure" não recuperou do contribuinte "de facto" o "quantum" respectivo”.

   Como afirma Cristiano Rogério Candido, em seu artigo Repetição do Indébito Tributário Nos Tributos Indiretos, há verdadeira manifesta injustiça sob o argiloso império da legalidade tributária:

“Sob o ponto de vista do contribuinte, tais mecanismos revelam-se injustos, pois permitem ao fisco o enriquecimento ilícito em virtude de um erro do contribuinte de direito ou da própria instituição de tributos por meio de normas posteriormente julgadas ilegais e/ou inconstitucionais. Desta forma, muitos acreditam que são necessárias reformas no Código Tributário Nacional que reflitam a realidade dos empreendedores brasileiros, que, ao recolherem tributos indevidamente, veem-se impossibilitados de reaver os valores pagos”.

 A sistemática que une o Direito como um todo harmonioso é desafiada pelo verniz de lógica destas exigências, uma vez que a repercussão financeira dos tributos indiretos apenas pelo tomador é mais que incorporada aos custos do contribuinte, como leciona Cristiano Rogério Candido (2011):

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“De outra forma, qualquer tributo seria indireto, pois é evidente que as empresas incorporam todos os seus custos ao preço de seus produtos e serviços, caso contrário sua atividade seria deficitária e com o tempo se mostraria inexeqüível. Assim, conforme o STJ, comportam transferência os tributos cujo fato gerador envolva uma dualidade de sujeitos, ou seja, o fato gerador é uma operação; tributos cujo contribuinte é pessoa que impulsiona o ciclo econômico podendo transferir o encargo para o outro partícipe do mesmo fato gerador (STJ, 1ª. T., REsp 118488, rel. Min. José Delgado, DJU 06/10/1997)”.

A resistência da repetição de indébito, sobretudo, nos casos em que ocorre a frustrante modulação dos efeitos da decisão é algo teratológico em termos de justiça tributária e precisa ser revisto, sob pena de continuarmos chancelando a atuação irresponsável do Fisco.


6 – CONCLUSÃO

Com este paradigmático precedente, futuras ações em face de exações indevidas e cobrança indevida do ISS poderão ser ajuizadas como forma de se reaver tributos pagos indevidamente ante a atuação abusiva do fisco, mesmo com todos os óbices aqui expostos. Contudo, a decisão do STJ merece ser festajada, não há previsão legal ou interpretação analógica que ampare a incidência do ISS sobre a atividade de produção, gravação e distribuição de filmes – as atividades de produção cultural certamente saíram fortalecidas desta batalha.

Além dos efeitos práticos do referido julgado, fortaleceu-se também a força de determinados princípios de proteção ao contribuinte em face da ânsia arrecadatória dos Municípios que são, em termos de aparelhamento fiscal, um dos mais avançados entes. 


7 - REFERÊNCIAS

AFONSO, José Roberto Rodrigues; ARAÚJO Erika Amorim. A Capacidade de Gasto dos Municípios Brasileiros: Arrecadação Própria e Receita Disponível. São Paulo: Cadernos Adenauer, 2000. Acesso em 09 de outubro de 2013: http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/bf_bancos/e0001530.pdf

BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Ed. Forense, 11ª Ed Rio de Janeiro: 2003.

CANDIDO, Cristiano Rogerio. Repetição do indébito tributário nos tributos indiretos. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2997, 15 set. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/20000>. Acesso em: 01 de novembro de 2013.

BRASIL. Lei Nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htmt. Acesso em: 09 de outubro de 2013.

BRASIL. Decreto-Lei nº. 406, de 31 de dezembro de 1968. Estabelece normas gerais de direito financeiro, aplicáveis aos impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre serviços de qualquer natureza, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0406.htm>. Acesso em: 04 de outubro de 2013.

BRASIL. Mensagem nº. 362, de 31 de julho de 2003 da Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos. Mensagem de Veto Parcial da Lei Complementar 116/03. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/Mensagem_Veto/2003/Mv362-03.htm>. Acesso em: 09 de outubro de 2013.

BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp116.htm>. Acesso em: 04 de outubro de 2013.

CARRAZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 22. Ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

HOUAISS, A. e Villar, Mauro de Salles, Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: 2003.

HOFFMANN, Suzy Gomes. Curso de Especialização em Direito Tributário: estudos anal[íticos em homenagem a Paulo de Varros Carvalho. Coordenador: Eurico Marcos Diniz de Santi. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Dorense, 2005.

TORRES, Ricardo Lobo. A Proibição de Analogia no Direito Tributário. Disponível em: http://download.rj.gov.br/documentos/10112/928861/DLFE48168.pdf/Revista43Doutrina_pg_109_a_114.pdf Acesso em 09 de outubro de 2013.

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Sobre o autor
Matheus dos Santos Buarque Eichler

Graduado em Direito pela Universidade Cândido Mendes Centro. Sócio Fundador do escritório Eichler e Eichler. Diretor Jurídico de Empresas de Energia. E-mail: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

EICHLER, Matheus Santos Buarque. Não incidência do ISS sobre a atividade de produtoras e distribuidoras de conteúdo audiovisual:: a relevância do REsp 1.308.628 para a indústria do audiovisual. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3803, 29 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25955. Acesso em: 26 abr. 2024.

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