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Relação de emprego: da estrutura à função

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27/12/2013 às 07:08

Resumo:


  • A não-eventualidade não é um requisito indispensável para a configuração do vínculo de emprego, sendo uma característica acidental que pode estar presente ou não.

  • A subordinação, em sua dimensão objetiva, é o único elemento distintivo e necessário para configurar a relação de emprego, pressupondo a inserção da atividade do trabalhador na dinâmica da empresa.

  • A onerosidade do trabalho prestado é uma decorrência necessária da configuração da relação de emprego em um sistema capitalista, não sendo um requisito ou uma característica, mas sim uma consequência desse vínculo.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

CONCLUSÃO

Partindo das lições de Ribeiro de Vilhena e buscando refletir criticamente sobre os elementos que a tradicional doutrina tem considerado como requisitos, ou pressupostos para a configuração da relação de emprego, apresentamos, no presente trabalho, uma tentativa de reclassificação de tais elementos – pessoalidade, subordinação, não-eventualidade e onerosidade – sob a perspectiva da função que cada um deles exerce na relação em que são verificados (relação de emprego) e, de forma mais ampla, na função que deve desempenhar o próprio Direito do Trabalho.

Tal esforço reflexivo nos levou a considerar que tais elementos não podem mais ser considerados (em seu conjunto estrutural) como condições necessárias para a configuração de uma relação de emprego, passando a assumir funções distintas não só na caracterização desse específico vínculo jurídico, mas também na própria forma de aplicar o Direito.

Nesse passo, na pessoalidade foi identificado o relevante papel de destacar a importância do homem-que-trabalha, superando, inclusive, tradicionais formas de pensamento que, em tempo não muito distante, reconhecia o trabalho (e o próprio homem, que dele não se desprende enquanto realiza o ato de trabalhar) como mercadoria a ser utilizada e explorada pelo sistema capitalista de produção.

A subordinação, perde o seu viés subjetivo-sujeitador e adquire uma nova compreensão sob o ponto de vista objetivo/estrutural, que retira do trabalhador a carga de sujeição que lhe era imposta e faz com que o homem seja compreendido como pessoa que presta sua força ao capital e, justamente por isso, tem de ser respeitado e valorizado.

A não-eventualidade perde a sua nota de essencialidade para a configuração do vínculo e passa a ser considerada como uma característica contingente e, até certo ponto, irrelevante. Limita-se a potencial função de elemento identificador de distintas formas de prestação de serviço, sem contudo retirar a proteção que merece o vínculo empregatício, quando não se verificar presente.

A onerosidade, por fim, se apresenta como uma decorrência necessária da exploração de trabalho alheio no contexto capitalista de produção, fazendo com que o trabalhador seja pecuniariamente recompensado pela utilização (emprego) de sua força de trabalho. Revela, por outro lado, o caráter imperfeito do sinalagma existente nessa relação jurídica que permite que o homem troque a sua força, o seu intelecto, o seu tempo, enfim, parte do seu ser por dinheiro.

Somente quando superarmos uma percepção meramente estrutural do vínculo de emprego é que conseguiremos perceber que a função dos elementos aqui estudados se confunde com a própria função do Direito do Trabalho: garantir de forma integral o respeito à dignidade do homem-trabalhador.


REFERÊNCIAS

BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução Daniela Beccaccia Versiani. Barueri-SP: Manole, 2007.

BRASIL. Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e seu anexo. Disponível em http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/decent_work/doc/constituicao_oit_538.pdf.

BRASIL. Teses aprovadas no XVI CONAMAT. Disponível em http://www.conamat.com.br/tesesaprovadasconamat.asp.

COUTINHO, Aldacy Rachid. Poder Punitivo Trabalhista. São Paulo: LTr, 1999.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 7 ed. São Paulo: Ltr, 2008.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho: história e teoria geral do direito do trabalho: relações individuais e coletivas do trabalho. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

SEVERO, Valdete Souto. O Dever de Motivação da Despedida na Ordem Jurídico-constitucional brasileira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011.

SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de direito do trabalho. 22 ed. São Paulo: Ltr, 2005.

VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005.


Notas

[1] “A conceituação de empregado, no Direito do Trabalho, assenta-se em determinados supostos, um agregado de suportes-de-fato (tatbestandem), que atraem a incidência da regra legal.” VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr,  2005, p. 383.

[2] BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução Daniela Beccaccia Versiani. Barueri-SP: Manole, 2007.

[3] Nesse sentido, Riberiro de Vilhena fala em pressupostos de conceituação in VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, passim. Delgado faz referência a elementos fático-jurídicos inarredáveis in DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 7 ed. São Paulo: Ltr, 2008, p. 290 et seq.

[4] Por todos, ver VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, passim.

[5] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 7 ed. São Paulo: Ltr, 2008, p. 290 et seq..

[6] O texto em vigor da Constituição da Organização Internacional do Trabalho foi aprovado na 29ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Montreal, no ano de 1946, e tem, como anexo, a Declaração referente aos fins e objetivos da Organização, que fora aprovada na 26ª reunião da Conferência, na Filadélfia, no ano de 1944. Verifica-se desta última declaração, dentre os princípios fundamentais sobre os quais repousa a Organização o de que “o trabalho não é uma mercadoria”. Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e seu anexo. Disponível em http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/decent_work/doc/constituicao_oit_538.pdf. Acesso em 08/05/2012.

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[7] Nesse sentido, Riberio de Vilhena fala no “princípio da pessoalidade”. VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 404.

[8] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 22.

[9] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 397.

[10] Nesse sentido, inclusive, foi aprovada tese no XVI CONAMAT (Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, ocorrido em João pessoa-PB, de 1º a 04 de maio de 2012, nos seguintes termos: “Empresa individual. Vínculo de emprego. Prevalência da primazia da realidade. O fenômeno da ‘pejotização’ em suas diferentes formas é uma espécie de precarização do trabalho. Haverá vínculo de emprego entre o trabalhador, que constituiu empresa individual de responsabilidade limitada nos termos da Lei n. 12.441/2011 e o tomador de seus serviços quando estiver configurada a subordinação jurídica. Aplica-se, no particular, o princípio da primazia da realidade em detrimento da formalidade da criação da pessoa jurídica.” Disponível em http://www.conamat.com.br/tesesaprovadasconamat.asp. Acesso em 20/05/2012.

[11] Ribeiro de Vilhena acentua que “à atividade como objeto de uma relação jurídica, não pode ser assimilado o trabalhador como pessoa. Qualquer acepção em sentido diverso importará em coisificá-lo”. VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 465.

[12] GODINHO DELGADO, Maurício. Direitos Fundamentais na Relação de Trabalho. In Revista Legislação do Trabalho. Ano 70, n. 06, São Paulo: LTr, 2006, p. 667.

[13] "A retirada desse ‘poder social’ destruiria a própria noção de contrato de trabalho, engendrada pelo sistema capitalista e liberal de produção. Disso se extrai que o poder presente na relação de trabalho e que justifica o ‘dever de proteção’, em nada se relaciona às qualidades pessoais de quem trabalha. Diz com as qualidades genéticas dessa relação privada”. SEVERO, Valdete Souto. O Dever de Motivação da Despedida na Ordem Jurídico-constitucional brasileira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 154.

[14] Nosso Ordenamento Jurídico em momento algum autoriza a aplicação de penas ao empregado. Não há previsão da possibilidade de advertir ou suspender. O único artigo da CLT que se refere à suspensão por mais de trinta dias, está no capítulo das hipóteses de suspensão ou interrupção do contrato (nenhuma delas de caráter disciplinar) e constitui direito do trabalhador.

[15] Aldacy Rachid Coutinho refere que “mediante o exercício do poder diretivo materializa-se a subordinação, elemento caracterizador da própria relação de emprego, traduzindo-se na indicação e detalhamento das modalidades técnicas de execução da obrigação principal de prestar trabalho em face da existência de um contrato de trabalho. O empregador dá ordens sobre o modo, tempo e lugar da prestação de trabalho”. COUTINHO, Aldacy Rachid. Poder Punitivo Trabalhista. São Paulo: LTr, 1999, p. 52.

[16] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 414-415.

[17] SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANA, Segadas; TEIXEIRA, Lima. Instituições de direito do trabalho. 22 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 311.

[18] Idem.

[19] Idem, ibidem.

[20] RUSSOMANO, Mozart Victor. Comentários à CLT. Vol. I. 13 ed. Rio de janeiro: Forense, 1990, p. 12.

[21] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho: história e teoria geral do direito do trabalho: relações individuais e coletivas do trabalho. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 320.

[22] Idem, p. 323.

[23] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 406.

[24] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 418.

[25] Idem, p. 407-8.

[26] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 415.

[27] VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Relação de emprego: estrutura legal e supostos. 3 ed. São Paulo: Ltr, 2005, p. 740.

[28] Idem, p. 746.

[29] Idem, ibidem.

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Sobre o autor
Almiro Eduardo de Almeida

Juiz do Trabalho Substituto no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Professor de Graduação no Centro Universitário Metodista - IPA. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidad de la República Oriental del Uruguay. Mestre em Direitos Sociais e Políticas Públicas pela Universidade de Santa Cruz do Sul - UNISC. Doutorando em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo – USP. Membro-pesquisador do Grupo de Pesquisa Direitos Humanos, Centralidade do Trabalho e Marxismo. Membro-pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Teoria e Prática da Greve no Direito Sindical Brasileiro Contemporâneo. Coordenador do Grupo de Pesquisa em Direito do Trabalho do Centro Universitário Metodista – IPA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Almiro Eduardo. Relação de emprego: da estrutura à função. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3831, 27 dez. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26259. Acesso em: 24 dez. 2024.

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