OS RECURSOS
Os recursos vão buscar seus fundamentos na necessidade psicológica, ínsita ao homem, de não se conformar perante uma única decisão. É ele incapaz, em regra, de se submeter á imposição de outrem, quando esta lhe pode trazer, de uma ou de outra forma, algum gravame ou prejuízo. Além disso, a precariedade dos conhecimentos dos seres humanos pode causar um erro de julgamento e ao confiar-se o poder de decidir apenas uma pessoa habilitada para o arbítrio. Por isso, os recursos foram sempre admitidos na história do Direito, em todas as épocas e em todos os povos. O sentido de sua existência é possibilitar o reexame das decisões proferidas no processo. A palavra recurso, aliás, deriva do latim – recursus, us – que significa retrocesso, do verbo recurro, ere – devoltar, retornar, retroceder. Seus fundamentos são, portanto, a necessidade psicológica do vencido, a falibidade humana do julgador e as razões históricas do próprio Direito.
No entendimento do renomado autor Fernando da Costa Tourinho Filho[1]:
" A palavra recurso vem do vocábulo recursus, que significa corrida para trás, caminho para voltar, volta. Por outro lado, o termo recursus, recurris, recurso, recorreri, que se traduz por voltar correndo. Tal expressão, pois, dá a idéia de um novo curso daquilo que estava em curso. Daí o seu emprego para traduzir aquele ato por do qual a parte pode pedir ao Órgão Jurisdicional que reexamine a questão decidida, retornando, assim, ao ponto de onde se partiu. A palavra recurso é, também, empregada numa acepção ampla, mas, aí, tem ela o sentido de auxilio, de proteção, de meio de defesa. Mas, na técnica processual a palavra recurso tem um sentido bem diferente. No seu sentido estrito recurso nada mais é do que o meio, o remédio jurídico – processual pelo qual se provoca o reexame de uma decisão. De regra, esse reexame é levado a cabo por um órgão jurisdicional superior. A parte vencida, por meio do recurso, pede a anulação ou reforma total ou parcial de uma decisão."
A existência dos recursos tem sua base jurídica no próprio texto constitucional, quando este organiza o Poder Judiciário em duplo grau com a atribuição primordialmente recursal dos Tribunais. O princípio do duplo grau de jurisdição dá maior certeza à aplicação do Direito, com a proteção ou restauração do direito porventura violado e é por isso que se encontra assente nas legislações. Um segundo exame de relação jurídica posta em litígio é necessário para uma justa composição do conflito de interesse. O que se busca, em verdade, outra coisa não é senão a efetiva garantia da proteção jurisdicional. Se não houver recursos, a incerteza cessará com a decisão única, mas haverá o risco de consagrar-se uma injustiça. Daí a orientação maleável seguida pelo Direito: ensejar um ou mais recursos, mas considerar que, esgotados os concedidos por lei, a causa está julgada, pelo menos naquele processo.
De regra, conforme acentuamos, o recurso exige dualidade de instância, dualidade de jurisdições, vale dizer, uma jurisdição inferior e outra superior. Uma da qual se recorre, e outra para qual se recorre. Todavia, no Direito brasileiro, o recurso não supõe, necessariamente, tal dualidade, uma vez que há alguns casos em que o recurso é dirigido ao próprio órgão prolator da decisão recorrida, vale dizer, caberá ao próprio órgão que a prolatou reexaminá-la por meio dele. Isso se dá, por exemplo, com os embargos declaratórios e com o protesto por novo Júri. Dir-se-á que, nesses casos, não haveria recurso. Responda-se, entretanto, com Carnelutti[2]:
"Los procedimientos de reparación no exigen um órgano distinto Del que há pronunciado la sentencia impugnada por que, elimina la anomalía Del procedimiento impugnado, el mismo juez está em situación de corrigir su próprio error; em cambio, em el procedimiento de reexamen es conveniente aunquee no necesaria, la diversidad Del órgano..."
E. Magalhães Noronha[3] define o recurso como a :
"providência legal imposta ao juiz ou concedida à parte interessada, objetivando nova apreciação da decisão ou situação processual, com o fim de corrigi-la, modificá-la ou confirmá-la".
Mais sucintamente, como já visto, no ensinamento de Tourinho Filho, já citado, " recurso nada mais é do que o reexame de uma decisão". Seu fim, em regra, é sanar os defeitos substanciais da decisão, ou seja, suas injustiças decorrentes da má apreciação da prova, bem como da errônea interpretação das pretensões da parte ou dos fatos e das circunstancias.
Assim, na teoria geral dos recursos, há um órgão jurisdicional contra o qual se recorre, que é denominado juízo a quo, e outro órgão jurisdicional para o qual se recorre, chamado juízo ad quem.
Sendo o recurso matéria de ordem pública, envolvendo interesse público, atende a interesses não só do indivíduo, como da própria sociedade, não sendo possível ter sua ordem alterada por convenção ou acordo entre as partes.
A natureza jurídica do recurso está sujeita a discussões doutrinárias, mas pode ele ser encarado de várias maneiras, como diz Hélio Tornaghi[4]: a) como desdobramento do direito de ação que vinha sendo exercido até a decisão proferida; b) como ação nova dentro do mesmo processo; c) como qualquer meio destinado a obter a "reforma"da decisão, quer se trate de ação como nos recursos voluntários, quer se cogite de provocação da instância superior pelo juiz que proferiu a decisão, como nos recursos de ofício.
Assim, para que haja recurso, embora seja conveniente que o reexame fique a cargo de outro Órgão Jurisdicional, nem por isso deixa ele de existir, quando interposto para o mesmo órgão que prolatou a decisão de que se recorre.
A generalidade dos casos, os recursos são dirigidos a órgãos superiores, constituídos de Juízes mais velhos, mais experimentados, mais vividos, e tal circunstância oferece-lhes maior penhor de garantia. Dessa forma, sabendo os Juízes que suas decisões podem ser reexaminadas, procurarão ser eles mais diligentes, mais estudiosos, tentando fugir do erro e de má-fé. Somente essa circunstância seria suficiente para se justificar o recurso. Não houvesse a possibilidade de reexame, os Juízes, muitas e muitas vezes, se descuidariam, decidiriam sem maior meticulosidade, pois estariam seguros de que seu erro, sua displicência, sua má-fé não seriam objeto de censura pelos órgãos superiores. Então, seriam eles acomodados e, prafraseando Luiz XIV, poderiam dizer: "Le juge c’est moi..."
PRESSUPOSTOS E REQUISITOS
Assim como a ação, o recurso está sujeito a determinados pressupostos processuais. São comuns a todos os recursos os pressupostos de: a) previsão legal; b) forma prescrita em lei; c) tempestividade.
Para ser interposto, um recurso deve estar previsto em lei e, também, ser adequado a decisão que se quer impugnar, embora se admitia eventualmente a interposição de um por outro no fenômeno de fungibilidade. Regem-se os recursos, quanto à admissibilidade, pela lei vigente ao tempo em que a decisão recorrida é proferida.
No entendimento de Tourinho Filho:[5]
"pressuposto lógico de qualquer recurso é a existência de um despacho ou decisão. Para que alguém possa interpor um recurso, presume-se, logicamente, haja uma decisão. Por outro lado, há o pressuposto fundamental, de todo e qualquer recurso, que é a sucumbência".
Em tese, a lei prevê para cada decisão o recurso cabível. Mas não há limitação genérica na lei para a unicidade de recurso e o lesado poderá impetrar dois deles desde que sejam adequados à decisão proferida. É o que ocorre, por exemplo, quando se trata de protesto por novo júri e apelação por crime conexo; com a interposição simultânea de apelação e pedido de hábeas corpus etc. Assim, o denominado princípio da irrecorribilidade das decisões é mitigado pelas exceções legais e também pelo da variabilidade dos recursos, que permite desistir-se de um para interpor outro, se no prazo.
Interpondo o recurso previsto em lei e adequado à espécie, deve o recorrente, ainda, obedecer às formalidades que as normas legais impõe à impetração, além de observar o prazo por ela fixado, o que se denomina tempestividade
Além desses pressupostos gerais existem requisitos próprios de cada recurso, como será visto oportunamente.
Para que o recurso possa ser examinado pelo juízo ou tribunal ad quem é necessário que se cumpram todos os seus pressupostos, que são as exigências legais para que seja ele conhecido.
Para Vicente Grecco Filho, numa classificação própria existem os pressupostos objetivos (cabimento, adequação, tempestividade, regularidade procedimental e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e os subjetivos (sucumbência e legitimidade para recorrer). São fatos impeditivos a renúncia e o não acolhimento à prisão nos casos em que a lei exige e fatos extintivos a desistência e a deserção. Sendo o recurso conhecido, no chamado juízo de admissibilidade, é provido ou improvido pelo órgão julgador de segundo grau. Assim, um recurso pode ser conhecido (quando presentes os pressupostos exigidos) ou não-conhecido (quando ausente um ou mais dos pressupostos exigidos) e, se conhecido, pode ser provido (reformando-se a decisão no todo ou em parte) ou improvido (mantendo-se a decisão).
Como pressupostos objetivos dos recursos temos: a) autorização legal, isto é, o recurso interposto deve ser adequado. Assim, se o Juiz julga improcedente a exceção da litispendência, de nenhum valor seria a interposição do agravo no auto do processo, porque inexiste no Direito Processual Penal, essa modalidade de recurso; b) tempestividade, o recurso deve ser interposto dentro no prazo legal. De regra, no Processo Penal, o prazo para interposição dos recursos é de cinco dias. Todavia há prazos maiores e menores; c) observância das formalidades legais, quando se pretende interpor um recurso, deverá o interessado, antes de tudo, analisar a decisão da qual quer recorrer, para ver se existe autorização legal. Sabido qual o recurso oponível, deverá o recorrente observar as formalidades exigidas por lei para sua interposição, tais como prazo, forma de interposição etc.
Temos ainda como pressupostos subjetivos dos recursos: a) interesse, a parte não pode recorrer se não houver interesse na reforma. Assim, da sucumbência exsurge o interesse na modificação do ato jurisdicional; b) legitimidade, isto é, a pertinência subjetiva dos recursos, vale dizer, somente a parte lesionada pela decisão, a parte que sofreu o gravame, é que poderá recorrer.
Quando há a existência de um prejuízo que a parte entenda ter-lhe produzido a decisão contra a qual recorre, ou, como acertadamente diz Vicente Greco Filho[6]: " haverá sucumbência, se a decisão não atendeu à expectativa juridicamente possível"
Assim, se o Promotor postula a condenação do réu, e este é absolvido, houve sucumbência; se o Juiz proferiu sentença condenatória, mas impôs a pena mínima, e o Promotor entendeu devesse ela ser um pouco exasperada, houve sucumbência, uma vez que a decisão lesionou o interesse do Ministério Público em ver a pena aplicada como lhe pareceu acertado. Em ambas as hipóteses houve uma desarmonia, uma desconformidade entre o que a parte pretendia obter e o que lhe foi dado. Sim, porque, nos termos do parágrafo único do art. 577, não se admite recurso da parte que não tiver interesse para recorrer exsurge se houve uma desconformidade entre o que se esperava receber e o que foi dado pela decisão, e, uma vez que essa desconformidade existiu, evidente estar satisfeito o pressuposto fundamental do recurso, que é a sucumbência.
Dispõe o artigo 578 "caput" do Código de Processo Penal:
"O recurso será interposto por petição ou por termos nos autos, assinado pelo recorrente ou por seu representante."
Há casos, porém, em que a petição é instrumento privativo, ou único, do recurso, como no extraordinário (art. 633), no habeas corpus (art. 654, parágrafo único) etc. Não há obrigação alguma que determine ao recorrente, no ato de interposição da petição ou termo, de dar seus motivos para a interposição, bastando que declare sua inconformidade com a sentença. A motivação será exposta nas razões do recurso.
A petição de interposição de recurso, com o despacho do juiz, será, até o dia seguinte ao último do prazo, entregue ao escrivão, que certificará no termo da juntada a data da entrega (art. 578, § 2º)
Quanto ao termo, diz a lei que, "não sabendo ou não podendo o réu assinar o nome, o termo será assinado por alguém,a seu rogo, na presença de duas testemunhas" (art. 578, § 1º). Tem-se admitido como termo, com razão, o desejo manifestado pela parte, no julgamento pelo júri, constante da ata, assinada pelo recorrente.
Tratando-se de termo, o escrivão, sob pena de suspensão por dez a trinta dias, deve fazer conclusos os autos ao juiz, até o dia seguinte ao último do prazo. É o que determina o artigo 578, § 3º.
A lei exige que o recurso seja interposto por petição ou termo nos autos para que fique, de maneira inequívoca, assegurado o direito que tem a parte de recorrer.
Embora a lei se refira à "petição", nada impede que o recurso seja interposto por meio de telex ou fax, ao menos por analogia com o artigo 374 do Código de Processo Civil. Entretanto, por força desse dispositivo, é necessário que o original constante da estação expedidora seja autenticado, o que implica a assinatura do remetente e o reconhecimento de sua firma.
Havendo erro no endereçamento do recurso, quanto ao juízo ou tribunal, deve aquele a que foi endereçado (juiz ou relator) remetê-lo ao competente para apreciá-lo.
Impetrado o recurso, cabe ao Órgão Jurisdicional a quo o juízo da sua admissibilidade, que poderá ser positivo ou negativo. Satisfeitos todos os pressupostos (objetivo e subjetivos), o juízo a quo recebê-lo-á. Do contrário, proferirá despacho liminar negativo.
O julgamento da admissibilidade do recurso no juízo a quo não vincula o órgão ad quem. Este, antes de apreciar o mérito, verifica se estão satisfeitos os pressupostos recursais. Em caso positivo, passa ao mérito; em caso negativo, deixa de tomar conhecimento do recurso.
Interposto o recurso, e uma vez admitido pelo juízo a quo, será ele encaminhado ao órgão ad quem. Aí, se conhecido for, será levado a julgamento, podendo o órgão julgador dar-lhe ou negar-lhe provimento. Diz-se, então, que o recurso se extinguiu normalmente, e tal ocorre quando o órgão ad quem sobre ele emite um juízo de valor, provendo-o ou improvendo-o, vale dizer, dando-lhe ou negando-lhe provimento.
Às vezes, ocorre certos fatos que extinguem anormalmente as vias recursais, impedindo, assim, que o órgão competente para o reexame possa apreciá-lo.
CLASSIFICAÇÃO DOS RECURSOS
Pelo Código de Processo Penal, os recursos são: a) em sentido estrito; b) apelação; c) protesto por novo júri; d) embargos; e) revisão; f) recurso extraordinário; g) carta testemunhável; h) habeas corpus. Deve ser mencionado, além dos recursos regimentais, o recurso especial, criado pela Constituição Federal de 1988. Há, porém, discussões doutrinárias sobre o protesto por novo júri, embargos de declaração, carta testemunhável, habeas corpus e revisão, que muitos doutrinadores não incluem na categoria de recursos, como será visto.
Pelo critério de sua motivação, os recursos classificam-se em ordinários e extraordinários. Os primeiros baseiam-se no mero inconformismo (exs.: apelação, recurso em sentido estrito). Os segundos exigem requisitos próprios.
Para Tourinho Filho, os recursos são classificados em extraordinário, especial e ordinário.
O recurso extraordinário, está previsto no art. 102, III, a, b, c, da Magna Carta e que tem por finalidade levar à Excelsa Corte, órgão de cúpula do nosso Poder Judiciário, o conhecimento de uma questão federal de natureza constitucional, e isto em virtude de haver a nossa Constituição atribuído ao mais alto Tribunal do País, a função de Corte Constitucional.
O recurso especial, é o recurso previsto no art. 105, III, a, b, c, da Constituição, tendo por finalidade levar ao conhecimento do Colendo STJ, órgão de cúpula da Justiça Comum, uma das questões federais elencadas no inciso III, do art. 105 da Lei Maior, propiciando ao STJ " o controle da legalidade do julgado proferido pelo Tribunal a quo".
Todo e qualquer outro recurso é ordinário. Não importa a sua natureza, se apelação, agravo, embargo etc., todos são recursos ordinários.
RECURSOS CABÍVEIS NO TRIBUNAL DO JÚRI
1.RECURSO DE OFÍCIO
Como o recurso objetiva a reforma de uma decisão, deve ficar na dependência da parte sucumbente, ou seja, daquela que foi lesada por ela. Em princípio somente a essa parte deve ser conferida ampla liberdade para interpor o recurso, demonstrando assim, sua concordância ou não com o pronunciamento jurisdicional. Por isso se fala em recurso voluntário.
Na visão do doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho[7]:
" recursos voluntários são aqueles cujo ônus de interpô-los cabe exclusivamente àquele que sucumbiu. É apenas um ônus: recorre, se quiser."
Esse recurso pode também ser interposto pelo Ministério Público, quer como representante da parte (Estado), quer como custus legis. É seu direito e dever a interposição quando, como titular da ação penal ou fiscal da lei, discordar da decisão. É um ônus das demais partes, que recorrem se quiserem.
Mas a esse princípio, da voluntariedade do recurso, a lei abre exceções, prevendo o denominado recurso de ofício (recurso obrigatório, recurso necessário). Apresenta-se o recurso ex offício como uma providência imposta por lei no sentido do reexame de sentenças e decisões pelos órgãos judiciários superiores, quando versem determinadas matérias e Segundo a decisão adotada.
Nesse mesmo sentido analisa o professor Tourinho Filho[8]:
"os recursos necessários, também denominados ex offício, são aqueles que, necessariamente, obrigatoriamente, devem ser interposto pelo próprio Juiz."
São recursos que obrigatoriamente devem ser interpostos pelo Juiz, na decisão, não transitando em julgado a sentença em que tiver sido omitido.
Dispõe, assim, o art. 574 do C.P.P:
"os recursos serão voluntários, excetuando-se os seguintes casos, em que deverão ser interpostos de ofício, pelo Juiz:
I – da sentença que conceder habeas corpus ;
II – da que absolver desde logo o réu com fundamento na existência de circunstância que exclua o crime ou isente o réu da pena, nos termos do art. 441".
Não cabe recurso de ofício da decisão que julga extinta a punibilidade ante a prescrição da ação penal, que não se confunde com a hipótese de absolvição sumária. Por exclusão implícita do art.574, I, não cabe recurso de ofício que denega o writ. Quanto ao recurso da decisão que concede habeas corpus, não tem ele efeito suspensivo, ex vi do disposto no art. 584, mas simplesmente devolutivo. Tem efeito suspensivo, porém, o recurso da sentença de absolvição sumária no processo do júri, conforme disposição expressa (art. 411 in fine). Referindo-se ao art. 411, o art. 574, II, não tem aplicação quando se trata de absolvição nos processos de competência do Juiz singular ou dos processos especiais.
Tratando-se de recurso de ofício, desnecessário é que seja ele fundamentado, ou seja, o Juiz não precisa dizer das razões que o levaram a recorrer. Também não se deve intimar as partes para o arrazoarem. Não esta sua interposição sujeita a prazo, podendo o Tribunal tomar dele conhecimento em qualquer momento em que os autos cheguem ao Tribunal, mesmo porque, como já visto, se considera interposto ex lege.
Diante da Constituição Federal de 88 que estabelece como função institucional do Ministério Público promover privativamente a ação penal pública, já se entendeu que os dispositivos que obrigam ao recurso ex offício foram revogados. Entendeu-se que a apelação de ofício é forma de iniciativa da ação penal, agora exclusiva do Ministério Público, estando revogadas pelo art. 129, I da C.F., as normas que obrigam os juizes a recorrer. Como diz, porém Antônio Scarance Fernandes[9]:
"não há nas hipótese legais, nova acusação, nem alteração daquela originariamente oferecida pelo Ministério Público na denúncia, pois o reexame necessário pelo Tribunal, assim como ocorre com o recurso voluntário, somente instaura uma nova fase procedimental, não outro processo."
2.RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Em matéria penal, temos variedade imensa de recursos. O recurso em sentido estrito oponível nas hipótese previstas nos vários incisos do art. 581 do C.P.P..
O recurso em sentido estrito, que, em linguagem forense, era conhecido como recurso criminal, na expressão primitiva era o recurso de agravo, denominação que no direito processual civil se abreviou para agravo. No processo penal, passou a ter o nome de recurso em sentido estrito, para ser distinguido da designação genérica de recurso.
A Lei de Execução Penal (Lei n.º 7.210, de 11-7-84) refere-se ao recurso de agravo, chamado na doutrina e na jurisprudência de agravo em execução. O recurso de agravo era criado e regulamentado no projeto do novo Código de Processo Penal, aprovado na Câmara dos Deputados mas não apreciado pelo Senado Federal.
No recurso em sentido estrito procede-se ao reexame da decisão do juiz, nas matérias especificadas em lei, permitindo- se – lhe novo pronunciamento antes do julgamento pela instância superior. Cabe ele tanto nas sentenças, em sentido estrito, como em despachos, podendo o seu prolator obstar seu julgamento pelo tribunal com a retratação da decisão impugnada.
Conforme o doutrinador Tourinho Filho[10]:
"o recurso em sentido estrito corresponde ao agravo de petição e ao agravo de instrumento e é oponível nos casos taxativamente preestabelecidos nos vinte e quatro incisos do art. 581 do C.P.P. O prazo para sua interposição é de 5 dias, consoante a regra do art. 586, salvo a hipótese prevista no inc. XIV, quando, então, será de 20 dias, nos termos do parágrafo único do art. 586. Nessa hipótese, o termo a quo do recurso vem fixado no art. 439, parágrafo único, do mesmo estatuto."
Relaciona o art. 581 do C.P.P. quais as decisões passíveis de serem impugnadas pelo recurso em sentido estrito, discutindo-se na doutrina e na jurisprudência se se trata de uma enumeração taxativa ou exemplificativa.
Tal recurso é inominado. De fato. Se a palavra recurso, em sentido amplo, é qualquer meio de defesa e, em sentido estrito, é remédio jurídico processual pelo qual se provoca o reexame de uma decisão, segue-se que todos os recursos de nosso Código são recurso em sentido estrito, com denominações variadas: apelação, protesto por novo Júri, embargos etc.. Este de que cuidamos ficou sem denominação. Por isso mesmo, muitos Códigos de Processo Penal dos Estados preferiam usar a expressão recurso. E era o bastante, E. Florêncio de Abreu[11] justifica:
"o recurso stricto sensu, no crime correspondente ao agravo no cível: são ambos cabíveis nos casos taxativamente previstos em lei e, em geral de despachos interlocutórios; por outro lado, tem rito semelhante, podendo ser a decisão de que se recorre ou agrave reformada pelo próprio Juiz que a proferir. Essa identidade de característicos justificaria o nome, teve, porém, a comissão de abandonar a idéia, pois, nos casos de recurso necessário, de ofício, o Juiz se veria na extravagante contingência de desagravar-se do seu próprio ato, o que seria incurial. E o recurso stricto sensu continuou inominado".
O recurso em sentido estrito pode ser interposto nos termos dos art. 578 e 587 do C.P.P., tal recurso poderá ser interposto que por petição, quer por termo nos autos.
Embora o prazo normal para a sua interposição seja aquele de cinco dias, convém ponderar que, se o recorrente, no crime de ação pública, for a vítima ou qualquer daquelas pessoas enumeradas no art. 268 do C.P.P., tenha ou não se habilitado como assistente, seu prazo será de quinze dias, uma vez que o parágrafo primeiro do art. 584 determina que se observe o disposto no art. 598, e, como este estabelece o prazo de quinze dias, conclui-se também, seja esse prazo para a vítima interpor, quando permitido o recurso em sentido estrito.
Dessa forma entende o renomado doutrinador Júlio Fabbrini Mirabete[12]:
"o prazo para a interposição do recurso em sentido estrito é de cinco dias (art. 586), considerado o termo inicial conforme a hipótese (art. 798, § 5º). A lei, porém, faz exceções a tal regra. Tratando-se do caso previsto no art. 581, XIV, o prazo será de 20 dias contados da data da publicação definitiva da lista de jurados (art. 586, parágrafo único). Será de quinze dias o prazo, que correrá a partir do dia em que terminar o do Ministério Público, quando se tratar de recurso interposto da impronúncia pelo ofendido ou por qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que, não se tenha habilitado como assistente, quando a lei permitir (art. 584, § 1º, c. c o art. 598 e seu parágrafo único)."
Poder-se-á dizer, ainda, como tal fez Tornaghi[13]:
"que o § 1º do art. 584 do CPP manda que se aplique o disposto no art. 598, não fazendo nenhuma alusão ao seu parágrafo... Assim, na hipótese de o recurso ser interposto pelo assistente, o prazo continua sendo de cinco dias"
O recurso da pronúncia suspende tão somente o julgamento e o art. 595 veda a interposição do recurso em sentido estrito nessa hipótese se o réu não estiver preso, salvo se prestar fiança, nos casos em que a lei a admitir. Possibilita-se ao pronunciado, também, interpor o recurso com o beneficio da liberdade provisória. De outro lado, o recurso interposto da sentença de impronúncia, pelo Ministério Público ou pelo ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, não impede que o réu seja posto imediatamente em liberdade (art. 584, § 1º, c. c. o art. 596).
Discute-se se é necessária a intimação do acusado para contra – arrazoar o recurso quando se tratar de impugnação ao despacho que não recebe a denúncia ou a queixa. Não se tendo instaurada a relação processual, essa intimação não é devida, não se podendo aplicar por analogia o art. 296 do CPP, pois nesta hipótese a lei determina expressamente a citação do réu para acompanhar o recurso, o que não ocorre no que tange a ação penal.
No recurso em sentido estrito, a faculdade de arrazoar em Segunda instância não existe, já que o art. 600, § 4º, que faculta tal procedimento, refere-se somente a apelação. Aliás, não teria sentido jurídico fossem deixadas as razões para a Segunda Instância quando o juiz a quo deve manifestar-se a respeito do recurso antes do julgamento pelo Juízo ad quem.
Como o Ministério Público tem a faculdade de retirar os autos de cartório para arrazoar, o prazo concedido ao assistente, que também pode fazê-lo (art. 271), só se inicia após a apresentação da manifestação do parquet, seja este recorrente ou recorrido.
Neste sentido ensina Hermínio Alberto Marques Porto:
"o direito a recurso do assistente habilitado, ou do ofendido não habilitado antes da sentença (art 598 do CPP), é de ser aferido com atenção especial ao asseguramento da repercussão cível da sentença penal que identifica "o interesse na reforma ou na modificação da decisão" (parágrafo único do art 577); assim a legitimidade somente é identificável no "interesse direito" do assistente que não estará ausente quando o recurso formulado contra decisão condenatória almeja – na independência de debates sobre o elemento subjetivo, dolo ou culpa – classificação penal diversa ou elevação da pena".
Ainda que interposto o recurso pelo querelante, o M.P. se manifesta no prazo de dois dias após aquele, já que deve intervir em todos os termos da ação penal, inclusive na de iniciativa privada.
Havendo dois ou mais réus, o prazo será comum para os respectivos defensores, pois os autos, nesta hipótese, permanecem em cartório.
Segundo orientação do Supremo Tribunal Federal e da própria doutrina, não obsta à subida do recurso em sentido estrito a falta do oferecimento de razões do recorrente. O recurso fica enfraquecido, mas não é eliminado. É indispensável, porém, que sejam apresentadas as razões do representante do Ministério Público, quando recorrente, já que não pode ele desistir do recurso após a sua interposição, e, portanto, enfraquecê-lo com a omissão.
Como característica própria do recurso em sentido estrito do processo penal, admite-se o chamado efeito regressivo, ou seja, o reexame pelo juiz da sua decisão. Recebendo os autos conclusos o juiz, "dentro de dois dias, reformará ou sustentará o seu despacho, mandando instruir o recurso com o translado que lhe parecerem necessários"(art. 589, Segunda parte). Pode o juiz retratar-se ou manter a mesma decisão. Neste sentido nos ensina Tourinho Filho[14]: "cabe ao magistrado, em decisão fundamentada, manter ou alterar a decisão combatida."
O pronunciamento judicial deve ser fundamentado, quer o juiz mantenha a decisão, que a altere, total ou parcialmente.
Se o juiz reformar o despacho recorrido, a parte contrária, por simples petição, poderá recorrer da nova decisão, se couber recurso, não sendo lícito ao juiz modificá-la (art. 589, parágrafo único, primeira parte). O prazo para provocação da parte é de cinco dias da publicação da resposta do juiz a quo, podendo ser apresentada ao juiz ou Tribunal ad quem ou entregue ao Correio dentro do mesmo prazo (art. 591).
Interposto o recurso da decisão de reexame, o recurso subirá nos próprios autos ou em translados, independentemente de novos arrazoados. Ao contrário do que ocorre com a apelação, a fuga do réu preso que interpôs o recurso da decisão original ou do reexame não acarreta a deserção.
Publicada a decisão do Juiz ou do Tribunal ad quem, deverão os autos ser devolvidos, dentro de cinco dias, ao Juiz a quo (art. 592). Tal prazo, como deixa claro o dispositivo, corre não da data de decisão, mas da publicação que tratando-se de Tribunal, é realizada pela imprensa oficial.
O recurso em sentido estrito, inicialmente, apresenta o efeito regressivo, pois, uma vez interposto, os autos em que ele se processa são encaminhados ao juízo prolator da decisão guerreada, para mantê-la ou reforma-la, consoante a regra do art. 589 do CPP. Se a reformar e a parte ex adversa fizer o usos da faculdade que lhe confere o parágrafo único do citado preceito dá-se-a o efeito devolutivo, isto é, o exame da decisão impugnada transfere-se ao juízo ad quem, que normalmente é o Tribunal, salvo nas hipótese previstas no inciso XIV do art. 581 (Presidente do Tribunal de Justiça).
Além do efeito devolutivo que existe em todos os recursos, e do efeito regressivo, que permite o reexame da decisão, o recurso em sentido estrito provoca, em algumas hipótese, o efeito suspensivo, ou seja, de não se executar a decisão impugnada até o seu julgamento. Este efeito, por força do art. 584, esta presente nos casos em que se julgue perdida a fiança, que se denegue a apelação ou se a julgue deserta, e que decida sobre unificação de penas. Entretanto, os efeitos que ficam suspensos por força da interposição do recurso contra o ato que denegue apelação são os que decorrem do despacho recorrido e não os da sentença condenatória, entre os quais se encontra a expedição do mandado de prisão.
Os recursos interpostos da sentença de impronúncia e da decisão que declara extinta punibilidade não impedem que o réu seja posto imediatamente em liberdade e o promovido pelas pessoas enumeradas no art. 31 não tem qualquer efeito suspensivo. O recurso da pronúncia suspende tão somente o julgamento pelo júri (art. 584, § 2º), permanecendo os demais, como por exemplo, a prisão do acusado decorrente da decisão impugnada ou confirmada por esta. O recurso do despacho que julga quebrada a fiança suspende unicamente o efeito de perda da metade de seu valor.
Dessa forma entende Fernando da Costa Tourinho Filho[15]:
"há quem entenda que a decisão do Juiz, desclassificando o crime da alçada do júri para a do Juiz singular, nos termos do art. 410 do CPP, não comporta o recurso em sentido estrito previsto no inciso II do art 581 do CPP, "por envolver decisão de mérito". O juiz nesse caso limita-se dizer que o crime não é da competência do júri. Decisão eminentemente processual, igual ou quase igual àquela em que ele se abstém de receber a denúncia, declinando da sua competência, por entender que o crime não é da sua competência, mas da alçada da Justiça Militar, por exemplo."
3.APELAÇÃO
A palavra apelação deriva do latim appellatio, que significa ação de dirigir a palavra. E, na verdade, bem sugestivo é o termo para expressar e traduzir o pedido que se faz à instância superior no sentido de reexaminar a decisão proferida pelos órgão inferiores. Por meio da apelação, a parte que sofreu o sucumbimento, o prejuízo, dirige a palavra ao Tribunal competente. Para que este reexamine a decisão, reparando possível injustiça cometida na inferior instância.
Assim, nos ensina Júlio Fabbrini Mirabete[16]:
"como se verifica do art. 593, a apelação é um recurso genérico, cabível nas sentenças definitivas ou com forças de definitivas do Juiz singular e das decisões do Tribunal do Júri nas hipóteses mencionadas expressamente nesse mesmo dispositivo"
Neste sentido, o professor Hermínio Alberto Marques Porto[17], também nos ensina:
" o entendimento é identificado por predominante corrente jurisprudencial, na independência do fundamento da primeira apelação e da parte que tenha, anteriormente, exercido com sucesso pelo provimento no mérito o direito recursal. Não oferece, pois, a lei processual, na redação adotada no citado parágrafo, amparo à segunda apelação pelo mérito, assim porque a expressão "pelo mesmo motivo" tem igual significado ao da expressão "pelo mesmo fundamento"".
É um recurso amplo porque possibilita devolver à instância superior o pleno conhecimento do feito, e também preferível, por ser o adequado quando parte de decisão impugnada poderia ser atacada por meio de recurso em sentido estrito, que fica afastado para que seja nela apreciado todo o objetivo da sentença (princípio da unirrecorribilidade).
Ao contrário do que ocorre com o recurso em sentido estrito, embora a apelação seja interposta perante o Juízo em que se proferiu a decisão impugnada, não se admite a sua apreciação pelo próprio prolator. Por isso, deve ser endereçada ao Tribunal ad quem competente para aprecia-la.
De todos os recursos, a apelação é o mais difundido. Todas as legislações o conhecem. Apelación, appello, appeal, Berufung, apelação é sempre o pedido que se formula ao Tribunal para reexaminar a causa com maior ou menor amplitude.
Em regra, a apelação devolve ao conhecimento do Tribunal ad quem toda matéria decidida em primeira instância, falando-se então, em apelação plena, ou ampla. O próprio recorrente, porém, pode delimitar o objeto da apelação, pedindo apenas o reexame de parte da decisão, no que se denomina de apelação limitada, ou parcial, ou restrita. Mesmo na hipótese de julgamento pelo Júri, é possível a apelação parcial, com referência a uma das ações criminosa e, se provido o recurso repete-se o plenário tão somente em relação à decisão reconhecida contrária à prova dos autos.
Dessa maneira, entende o renomado autor Damásio E. de Jesus[18]:
"a apelação, no Júri, tem natureza restrita, não devolvendo à superior instância o conhecimento integral da causa criminal. O conhecimento do Tribunal fica circunscrito aos motivos invocados na interposição."
Como em qualquer recurso, o exame dos pressupostos de admissibilidade da apelação, subjetivos ou objetivos, incumbe, inicialmente, ao próprio Juiz da sentença. Deve fazê-lo assim que for ela interposta e uma vez admitida e processada a apelação, com a apresentação da respectivas razões, não há mais lugar no Juízo a quo para o reexame de seus pressupostos. Sua remessa à instância superior não só verificará nos casos de deserção. O Juiz deverá verificar se estão preenchidos os pressupostos gerais de admissibilidade dos recursos, que são a previsão legal, a forma prevista em lei e a tempestividade. Além disso, a apelação só pode ser interposta por quem tenha sucumbido e, em conseqüência, tenha interesse, bem como legitimidade, o que também deve ser apurado pelo Juiz a quo.
A admissibilidade da apelação está submetida também à legitimidade do apelante. Quanto ao Ministério Público, é orientação pacífica que o mesmo não pode apelar da sentença absolutória proferida em ação de iniciativa privada, faltando-lhe para isso a titulariedade jus accusationes. Entretanto, assinala Nelson Neri Júnior[19]:
"como tem ele o dever de fiscalizar aplicação da lei, oficiando como custos legis cabe-lhe apelar da sentença condenatória proferida na ação penal privada se entender que o réu deve ser absolvido".
O recurso do assistente tem caráter supletivo. Não pode, pois, recorrer se o Ministério Público interpõe apelação plena, nem se tem o seu apelo o mesmo conteúdo daquele proposto pelo órgão acusatório oficial. Dessa forma haveria dualidade de recursos com o mesmo objetivo.
O próprio réu pode, por escrito, apelar da sentença penal condenatória, cabendo ao seu defensor arrazoar o recurso. Se tal não for feito, a omissão não prejudica o recurso, que deve ser submetido à Segunda instância, mesmo sem elas.
Não há necessidade de outorga de poderes especiais para que o defensor exerça o direito de recorrer. Assim, mesmo tratando-se de defensor público ou advogado dativo, pode ele interpor o recurso sem anuência expressa do acusado.
Não pode ser conhecida apelação por advogado não constituído ou nomeado para o réu. Embora já se tenha decidido em contrário.
Ao contrário do que por vezes, se tem decidido, o defensor público também não é obrigado a recorrer de qualquer decisão, ainda que em casos de sentença condenatória, já que a jurisprudência tem resguardado o princípio da voluntariedade do recurso
O prazo para a interposição do recurso de apelação, excetuando-se a hipótese do art. 598 por força da regra contida no seu respectivo parágrafo, começa a fluir a partir da ciência da decisão impugnada.
O recurso extingue-se, normalmente, com o provimento ou desprovimento da instância superior. Apreciada a decisão pelo Tribunal, lavrar-se-á o acórdão, extinguindo-se deste modo o recurso de apelo.
Porém, nada impede que o acusado renuncie ao direito de interpor o recurso ou desista daquele já interposto. Uma vez exercida, a renúncia ou a desistência é ato irrevogável, no sentido de que se consome o direito renunciado, que não pode ser revivido por ulterior manifestação da vontade do renunciante, só podendo ser nulificada se o corrente vício de vontade. No preciso momento em que é manifestada, produz seus efeitos consultivos sobre o objeto do direito e preclusivo do mérito.
A renúncia ou desistência do recurso não necessita ser homologada, eis que a decisão homologatória é de natureza meramente declaratória, não deferida ao arbítrio do juiz, não podendo deixar de produzir seu efeito quando validamente manifestada.
Embora na ausência de determinação expressa na lei, quando se trata de renúncia ou desistência exercida pelo próprio réu, tem se manifestado a jurisprudência pela necessidade de ser ela tomada por termo, perante o próprio ou por petição própria.
Discute-se se no confronto entre a vontade do defensor que apela e do condenado que afirma não desejar apelar qual deve prevalecer. Como a titulariedade do direito de recorrer pertence ao réu, havendo desistência deste não se deve conhecer do recurso interposto pelo defensor, que deve cingir-se aos limites do mandato.
O inciso III, §§ 1º e 3º, do artigo 593, cuida do cabimento da apelação das decisões proferidas pelo Tribunal do Jurí. Neste caso, o recurso de apelação tem caráter restrito, não se devolvendo à superior instância o conhecimento pleno da causa criminal decidida fica o julgamento adstrito exclusivamente emotivos invocados pelo recorrente para interpor. Deve o apelante portanto, mencionar na petição ou termo em qual ou em quais das hipóteses do art.; 593, III, se fundamenta o apelo sob pena de não conhecimento aliás, é defeso ao Tribunal dar provimento à apelação por um fundamento quando o apelo é fundado em outro.
A primeira hipótese mencionada no art. 593, III é a da ocorrência de nulidade posterior à pronúncia (alínea a). Assim, a falta de intimação da sentença de pronúncia a irregularidade do libelo, a falta de prazo para a contrariedade, a falta de intimação do réu para a sessão de julgamento etc., podem ser impugnadas na apelação. Porém, tratando se de nulidade relativa, deve ser ela alegada logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes sob pena de preclusão (art. 447, V). Na hipótese de não ser admitida a impugnação pelo juiz presidente pode ser ela renovada na apelação da decisão do júri. Tratando-se de nulidade absoluta, a não impugnação durante o julgamento não impede seja ela apresentada em apelação. Dado provimento ao recurso nessa hipótese, o julgamento é anulado, devendo ser renovados os atos declarados nulos pela Superior Instância.
Cabe também apelação da decisão do tribunal do Júri "for a sentença do juiz presidente contrária a lei expressa ou à decisão dos jurados" (alínea b). Nessa hipótese dando provimento ao recurso "o tribunal ad quem fará devido retificação" (artigo 593 § 1º), ou seja, ajustará a decisão à lei ou ao veredito dos jurados. Não há portanto, anulação do julgamento, respeitando o regular pronunciamento dos jurados isto porque o defeito se encontra apenas na sentença lavrada pelo presidente.
È cabível apelação, ainda, quando "houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança" (item III).Ocorre a hipótese, em primeiro lugar, quando o juiz, embora tendo em conta as respostas dos jurados comete algum equivoco na aplicação da pena, ou na aplicação da medida de segurança. Também se pode impugnar a "injustiça" na fixação da sanção penal, estabelecida em grau mais ou menos elevado do que o justo para a espécie.
Em respeito à soberania dos veredictos o juizo ad quem não poderia, a pretexto de corrigir injustiça na aplicação da pena, afastar a decisão dos jurados no referente aos quesitos sobre qualificadora, causas de aumento ou redução de pena, agravantes e atenuantes, cabendo na hipótese apenas a anulação do julgamento por ser a decisão manifestamente contraria à prova dos autos.
Por fim o art. 593, III, prevê apelação para decisão do Tribunal do Júri quando "fora a decisão do jurado manifestamente contrária à prova dos autos" (alínea d). Trata-se de hipótese em que se fere justamente o mérito de causa em que o error in judicando é reconhecido somente quando a decisão é arbitrária, porque se dissocia integralmente da prova dos autos, é contrária "manifestamente" à verdade apurada no processo que representa uma distorção da função judicante do Conselho de Sentença. Assim, não é qualquer dissonância entre o vereditos e os elementos de convicção colhidos na instrução que autoriza a cassação do julgamento.
Apelação por ser a decisão manifestamente contraria à prova dos autos é admissível ainda que a justiça verse sobre matéria secundária como ocorre com as qualificadoras e causas de aumento ou diminuição de penas especiais. Por isso se tem anulado julgamentos do júri pelo reconhecimento devido de ter sido o crime praticado por violenta emoção logo após injusta provocação da vítima por relevante valor moral, por motivo torpe ou fútil etc. Há, porém, decisões no sentido de que se deve julgar improcedente à apelação, que somente seria cabível com relação ao fato principal (existência do crime, autoria, responsabilidade), e não quanto à matéria secundária ou incidental.
Se a apelação se fundar no inc. III, letra d, do art. 593, e o Tribunal ad quem se convencer de que a decisão dos jurados é manifestamente contrário a prova dos autos deve dar-lhe provimento para sujeitar o réu a novo julgamento (art. 593, § 3º). Não pode, portanto modificar a decisão diante do princípio da soberania dos veredictos como já vistos.
Com muita propriedade, Geraldo Batista de Siqueira, Rinaldo Pedreira Martins e Marina da Silva Siqueira defendem a tese de que:
"na hipótese de sucumbência da parte apenas quanto a matéria secundária o apelo deve versar somente sobre esta que lhe foi adversa, permanecendo intocado o restante da decisão que lhe foi favorável."
Dispõe a lei que não se admite, pelo mesmo motivo, segundo apelação (art. 593, §3º, in fine).
Anulado o julgamento por ser a decisão manifestamente contrária a prova dos autos, e repetindo-se a mesma decisão não se permite nova anulação.
Havendo hipóteses de crimes conexos de competência do Tribunal do Júri, com quesitos formulados em série apartadas, independentes, pode o tribunal, em grau recursal, reconhecer a nulidade parcial do julgamento em relação apenas a um dos delitos, com realização de novo julgamento quanto a ele, mantido a decisão no que respeita ao outro.
Em caso em que o tribunal ad quem não examinou todos os pontos indicados de interesse do acusado decidiu o STF por conceder habeas corpus no sentido de que prosseguisse o julgamento da apelação quanto aos pontos que omitira.
A possibilidade de anulação de julgamento efetuado pelo Tribunal do Júri, mesmo na hipótese de decisão manifestamente contrária á provas dos autos não fere a soberania dos vereditos (art. 5º, XXXVIII, "c", da C.F).
A anulação pelo Tribunal de Justiça, da decisão absolutória proferida pelo Tribunal do Júri, para que o denunciado seja submetido a novo julgamento não implica automático restabelecimento da custódia decorrente de pronúncia.
Em regra, o prazo para a apelação é de cinco dias (art. 593, "caput"). Porém, há necessidade de ser intimados o réu e seu defensor e curador, considerando-se termo inicial do prazo recursal á última intimação. Quando se trata de julgamento perante o Tribunal do Júri, o prazo começa a contar da publicação da sentença na própria sessão de julgamento.
Na dúvida quanto à tempestividade do recurso deve ser ele conhecido.
Dispõe-se na lei que se da sentença não for interposta apelarão pelo Ministério Público no prazo lega, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no art. 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor a apelação (art. 598 "caput") e que " o prazo para interposição desse recurso será de quinze dias e correrá do dia em que terminar o do Ministério Público" (art. 598, parágrafo único).
O prazo, se habilitado o assistente por ocasião da sentença, não é de quinze, mas de cinco dias, pois não há razão para Ter ele o triplo do prazo do Ministério Público ou do acusado.
A jurisprudência tem aceitado a antecipação do recurso apresentado pelo assistente antes de vencido o prazo legal do Ministério Público, cuja desvantagem seria apenas a perda de sua eficácia se o Ministério Público vem a apelar.
Como qualquer recurso a apelação deve ser interposta por termo ou petição, mas se tem admitido outras formas de impetração. Além disso, a não apresentação da petição de recurso ou assinatura de termo não invalida o apelo quando as razões de recurso são apresentadas no qüinqüídio legal.
É obrigatório a intimação do apelante para que se passe a correr o prazo para o oferecimento das razões de apelação, segundo o art. 798, §5º, sob pena de nulidade. Da mesma forma, evidentemente, a parte apelada deve ser intimada sob a interposição do recurso e para oferecer as contra-razões.
Se houver assistente, este arrazoará, no prazo de três dias, após o Ministério Público (art. 600, § 1º).
Para oferecer suas razões, o advogado da parte pode retirar os autos de cartório, face ao que dispõe os artigos 2º e 3º da Lei nº 3.836, de 14.12.60. Quando, porém, forem dois ou mais os apelantes ou apelados, os prazos serão comuns (art. 600 § 3º), e nessa hipótese os autos devem permanecer em cartório. O Ministério Público, em qualquer caso, terá sempre vista dos autos fora de cartório.
Permite alei que as razões ou contra-razões sejam oferecidas no Tribunal.
Embora não expressa a lei, deve se entender, tendo em vista o princípio do contraditório, que também ao apelado se permite arrazoar em Segunda instância, ainda que não o tenha feito o apelante devendo ser apresentado o pedido quando intimado do apelo ou para oferecer contra0-razões.
Manifestando o apelante tempestivamente o desejo de arrazoar em Segunda instância, os autos serão remetidos ao Tribunal, incumbindo ao procurador geral da república, ou ao membro do Ministério Público por ele designado, oferecer as contra-razões.
Referindo-se a lei genericamente à parte apelante, tem também o Ministério Público a faculdade de protestar pelo oferecimento de razões junto ao Tribunal ad quem.
Ao contrario do que ocorre no recurso em sentido estrito não há na apelação o juízo de retratação. Apresentadas as razões ou findos os prazos para este fim os autos devem ser remetidos à superior instância no prazo de cinco dias. Uma vez recebida a apelação não pode o juiz de 1º grau reconsiderar a anterior decisão para impedir a subida dos autos à superior instância.
Diz o art. 601 que findo os prazos para razões os autos serão remetidos à instância superior "com as razões ou sem elas’. Mais a determinação comporta exceções.
O não oferecimento de razões de recurso como regra, entretanto, como dá a entendeu o dispositivo em recurso não impede o seu conhecimento e julgamento, já que a omissão não é apontada como causa de nulidade, a não ser que se demonstre prejuízo para a defesa.
A apelação da sentença absolutória do Júri não tem mais efeito suspensivo, conforme a redação dada pelo art. 596 do CPP pela Lei n7 5.941/73 (TJSP, RT 527/347). Em face disto a apelação do Ministério Público não impede seja imediatamente solto o réu absolvido (RT 499/296 e 561/304).
A forma normal de extinção da apelação é o julgamento do recurso na instância superior, com o seu provimento ou improvimento. Mas pode dar-se o caso da extinção anormal da apelação pela ocorrência da deserção. Dispõe o art. 595 do CPP: "se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada deserta a apelação."
Positivada a fuga do apelante, em qualquer momento da tramitação do procedimento da apelação, esta não mais poderá ser conhecida, transitando em julgado a sentença. Com fundamento na por vezes inócua medida, na discriminação entre condenados e no princípio da ampla defesa já se sustentou a inconstitucionalidade do dispositivo.
A deserção ocorre apenas quando a apelação for interposta pelo réu, e não pelo Ministério Público quando, como custos legis, recorrer em favor do condenado.
A declaração do Juiz de que ocorreu a deserção é mera formalidade, por ser meramente declaratória, e a sua simples omissão não permite o julgamento do recurso. Empreendida a fuga do condenado, após a interposição do recurso é automática a sanctio juris. Por isso, é pacífico na jurisprudência que a captura do preso condenado não torna sem efeito a deserção, não podendo ser conhecido o apelo. Tendo caráter definitivo e irrevogável, nem mesmo a apresentação do réu foragido possibilita o conhecimento do recurso.
Quais os efeitos do recurso de apelo, se a sentença for condenatória?
Para o professor Tourinho Filho[20]:
"em primeiro lugar o devolutivo, dentro nas limitações ditadas pelo princípio do tantum devolum quantum appellatum. Em segundo o suspensivo. Quer dizer, então, que, interposta a apelação de uma sentença condenatória, fica em suspenso a executoriedade da decisão impugnada. É a regra que se vê no art. 597. Todavia, em face das exceções que este dispositivo enumera e em virtude das alterações sofridas pelo art. 594, por força da Lei n.º 5.941, de 22-11-1973, podemos concluir que a apelação da sentença condenatória terá efeito suspensivo nas seguintes hipóteses: a) se a infração permitir livrar-se solto ( CPP, art. 321); se a infração for inafiançável e o réu primário e de bons antecedentes (CPP, 594); c) com melhor razão, se a infração for afiançável (nesse caso a fiança não será prestada – CPP. Art. 596); d) se o réu não for primário (ressalvada a hipótese do art. 323, III do CPP), nem tiver bons antecedentes, se a infração for afiançável, uma vez prestada a caução, seu apelo terá, também, efeito suspensivo."
Nos demais casos, não terá efeito suspensivo. Aliás, melhor seria indagar quando é que o recurso de apelo não tem efeito suspensivo. Ele não o tem nas seguintes hipóteses: a) se a infração for inafiançável e o réu não for primário, ou ainda que o seja, não tiver bons antecedentes; b) se a infração for afiançável e o réu não tiver bons antecedente, ou não for primário (ressalvada a hipótese do art. 323, III, do CPP), e não prestar fiança; c) nos crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecente e terrorismo, ressalvada a hipótese prevista no § 2º do art. 2º da Lei n.º 8.072/90; d) nos crimes praticados em organizações criminosas é vedado o apelo em liberdade, ex vi do art. 9º da Lei nº 9.034, de 3-5-1995; e) nos crimes referidos na Lei nº 9.613/98, que versam sobre "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores, de acordo com seu art. 3º.
Em rigor de lógica, o Tribunal deveria poder julgar com inteira liberdade, decidindo sempre pelo mais justo. Mas, como visto, o art. 617, em seu final, proíbe que se aumente a pena do réu em recurso exclusivo da defesa, fato que configuraria a majoratio in pejus, espécie de reformatio in pejus.
Assim nos fala o renomado Doutrinador Hermínio Alberto Marques Porto[21]:
" condenado o réu pelo Tribunal do Júri e, apelando somente a defesa, o sucesso do apelo, e representado pela anulação do julgamento popular, impede, sob pena de identificação de reformatio in pejus, receberá o réu, em novo julgamento, pena mais grave, por Ter, com a anulação do julgamento que motivou o recurso, sido restaurada a classificação penal dada pela decisão de pronúncia e articulada pelo libelo, os quesitos obrigatórios, serão, no julgamento, os mesmos, e, por ser assim, é possível venha o acusado a receber pena mais grave (por exemplo, se, no primeiro, anulado por vício substancial, tenha sido reconhecido o homicídio simples e repelida qualificadora, enquanto, no novo julgamento, esta recebeu identificação pelos jurados), resultando, por conseguinte, como solução, no interesse da defesa em revisão criminal, pleitear, amparada no princípio processual que impede reforma prejudicial de quem tenha recorrido, a diminuição da pena. Reafirmado é, por atenção à obrigatória vinculação entre pronúncia, libelo a questionário, que no novo julgamento a classificação penal fixada pela decisão de pronúncia a de ser levada à livre apreciação do Conselho de Sentença."
4.PROTESTO POR NOVO JÚRI
Regula os arts. 607 e 608 do CPP o protesto por novo júri, recurso que é um simples pedido de reexame do julgamento do tribunal popular diante da aplicação de pena de reclusão igual ou superior a 20 anos. O principal fundamento apresentado para existência de tal recurso era o de possibilitar sem formalidades o reexame da causa quando aplicadas as penas de morte ou de prisão perpetua face a gravidade de tais sanções. Hoje, diante da abolição de tais sanções, com a única exceção da pena de morte para os crimes militares em tempo de guerra, há várias críticas por manter-se tal espécie de recurso, que revelaria, inclusive, a diminuta crença no julgamento efetuado pelo tribunal popular.
O protesto por novo júri, mas um favor libertatis, por ser exclusivo da defesa e pela desnecessidade de se invocar qualquer erro da decisão, é, nos termos legais, o recurso da pena imposta independentemente de qualquer formalidade. Deve ser sempre deferido quando a pena aplicada na sentença condenatória for de reclusão por tempo igual ou superior a 20 ano. Trata-se, pois, de um direito liquido e certo dos condenados que preencham os pressupostos legais e tem como única finalidade a de desconstituir o julgamento anterior, com a realização de outro, em lugar do primeiro, para todos os efeitos. Ele torna inexistente o primeiro julgamento mas não interfere com a sentença de pronúncia ou com o libelo acusatório. Dispõe, assim o art. 607, 1ª parte:
"o protesto por novo júri é privativo da defesa, e somente se admitirá quando a sentença condenatória for de reclusão por tempo igual ou superior a 20 anos, não podendo em caso algum ser feito mais de uma vez."
O protesto por novo júri é recurso exclusivo da defesa, que se dirige ao próprio julgador para o reexame em novo julgamento por ter sido aplicada ao acusado uma pena igual ou superior a 20 anos de reclusão. Mas o condenado só pode utilizar-se dele uma vez. Novamente imposta uma pena do mesmo nível, não mais poderá utiliza-se de tal remédio, devendo interpor, quando presente o fundamento necessário, o recurso de apelação.
Pena prevista no art. 607, como pressuposto do processo por novo júri, deve resultar de um só crime. Desde que o réu seja acusados pela prática de mais de uma infração penal, em concurso material, não importa que a soma das sanções de todos os crimes atinja ou ultrapasse o quantum mencionado no texto legal. Desde de que a pena de um só deles não seja igual ou superior a 20 anos de reclusão, inadmissível será o protesto. Mas, se a pena for resultante de crime continuado ou concurso formal, admite-se o protesto porque em ambos os casos se considera, ao menos por ficção, que a um todo unitário em que se houve uma exasperação de sanção.
O recurso não abrande os demais delitos pelos quais foi aplicada pena inferior ao limite mínimo estabelecido na lei, transitado em julgado a decisão quanto a eles se não for interposta a regular apelação.
Deve-se assinalar que a pena a que se refere a lei é a que foi imposta pelo júri e não pelo tribunal ad quem como resultado de recurso de acusação em que se reconheceu ter havido erro do juiz presidente na aplicação da sanção.
Característico do protesto por novo júri, previsto pelo art. 607, §2º, e que le invalida qualquer outro recurso interposto, como corolário lógico do efeito que tem de tornar inexistente o julgamento anterior, com a provocação do segundo. Isso não impede, porém, a apelação do réu ou do Ministério Público quanto ao delito conexo em que não caiba o protesto.
Não se impede também que o condenado, embora tenha direito ao protesto por novo júri, interponha, em vez desse recurso, a apelação, sob o fundamento da ocorrência de nulidade, reservando a possibilidade do simples pedido de reexame para o novo julgamento se a pena então aplicada comporta-la.
O protesto por novo júri deve ser feito na forma e nos prazos estabelecidos para a interposição da apelação, segundo determina o art. 607, § 2º, 2ª parte. Assim, deve ser interposto por petição ou termo, dirigido ao Juiz Presidente do Júri, e no prazo de cinco dias. Não há necessidade, porém, de apresentação de razões ou contra-razões, já que o seu deferimento, independente de qualquer erro de julgamento.
Não admitido o protesto do novo júri pelo juiz, cabe carta testemunhável, com fundamento no art. 639, I, pois se trata de recurso denegado.
A fuga do réu após o deferimento do protesto por novo júri não importa em deserção do recurso interposto já que não se trata de recurso de pronúncia, quando o recolhimento é obrigatório por não se Ter concedido a liberdade provisória, nem se aplica o art. 595, que se refere somente à apelação.
De acordo com o art. 607, § 3º, no novo julgamento, não podem servir jurados que tenham tomado parte no anterior.
Já se tem entendido que, no novo julgamento, não se pode aplicar pena superior à imposta no primeiro, principalmente quando a primeira decisão transitou em julgado para o M.P., porque o Protesto por Novo Júri é um favor dispensado à liberdade, caracterizando o fato a reformatio in pejus indireta. Entretanto, tratando-se de julgamento do Júri, há que se respeitar o princípio da soberania dos vereditos, elevado novamente ao nível constitucional, nada impedindo que no novo julgamento, em decorrência da decisão dos jurados, deva o juiz aplicar pena mais grave que a anterior.
NOTAS
1.Processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, p.299.
2.cf. Institucionis, p. 416, apudi Aclides de Mendonça Lima, Recuros Cíveis, p. 127.
3.Curso de direito processual penal. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. P. 338.
4.Ob. cit. p. 322 – 3.
5.Processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4, p.303.
6.Manual de processo penal, Saraiva, 1991, p. 314.
7.Processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4 p. 321.
8.Processo penal. 11. ed. São Paulo. v. 4. p. 321.
9.Constituição da República. Código de processo penal e sua reforma. Justiça penal, críticas e sugestões. RT, 1994. p. 70. No mesmo sentido quanto à reabilitação: JTAERGS89/28; J.Cat. 59/266, 66/467.
10.Processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4.
11.Cf. Comentários, cit., v.5, p. 179, nota 233.
12.Processo penal.11. ed. rev. e atual. até dezembro de 2000. São Paulo: Atlas, 2001.
13.Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 1998. v.1.
14.Processo penal. 11. ed.. São Paulo: Saraiva, v. 4, p.338.
15.Processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v.4. p. 340.
16.Processo penal. 11. ed. rev. e atual. até dezembro de 2000, São Paulo: Atlas, 2001. p. 631.
17.Júri: procedimentos e aspectos do julgamento: questionário. 10. ed. ampl. e. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 309.
18.Código de processo penal anotado. 15. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 421.
19.A legitimidade recursal do Ministério Público na ação privada e a interrupção da prescrição na Lei nº 5.250, de 9-2-67, RT 553/305 – 12 e Justitia 109/55 – 66.
20.Processo penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4. p. 350.
21.Júri: procedimentos e aspectos do julgamento: questionário. 10. ed. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 356.
BIBLIOGRAFIA
DELMANTO, Celso. Código penal anotado. 5. ed. São Paulo. Saraiva, 1984.
GRECCO, Vicente. Manual de processo penal. São Paulo: Saraiva, 1991.
JESUS, Damásio E.. Código de processo penal anotado. 15. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1998.
MARREY, Adriano. Teoria e prática do júri. 1. ed. São Paulo: RT, 1989.
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo penal. 11. ed. rev. e atual. até dezembro de 2000. São Paulo: Atlas, 2001.
PORTO, Hermínio Alberto Marques. Júri: procedimentos e aspectos do julgamento. 10. ed. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2001.
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