Sumário: 1. Introdução; 2. Análise comparativa entre as desapropriações e a definida no artigo 243 da Constituição da República, 3. Natureza jurídica da desapropriação de glebas que cultivam plantas psicotrópicas; 4. Finalidade da expropriação de terras que cultivam plantas psicotrópicas; 5. A definição legal das plantas psicotrópicas; 6. O inquérito; 7. O processo judicial de expropriação, 7.1. Imissão de posse; 8. Os recursos; 9. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
Estudando-se as diversa espécies de desapropriação, encontra-se uma espécie inédita, que não se verificava nas Constituições anteriores à 1988. A desapropriação das glebas nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas.
A curiosidade desse instituto é que, diferentemente das demais espécies de desapropriações, esta não é indenizável, surgindo diversas discussões sobre a sua natureza jurídica.
Esse é um tema de poucos pronunciamentos doutrinários, mas que tem se consolidado na jurisprudência dos Tribunais, principalmente no TRF da 5º Região, onde possui jurisdição na área do ciclo da maconha.
A desapropriação de glebas que cultivam ilegalmente plantas psicotrópicas encontra-se presente na Constituição de 1988 no art. 243, que possui regulamentação na Lei 8.257 de 26 de novembro de 1991 e no Decreto 577, de 24 de junho de 1991.
Ao analisar o artigo 243 da Constituição, bem como a lei e o decreto supracitados, encontraremos pontos interessantes sobre: a destinação que deve ser dado ao imóvel, objeto da desapropriação que estudaremos, e a definição legal do que vem a ser essas plantas ditas psicotrópicas.
O inquérito e o processo judicial são fases que compõem o procedimento expropriatório, que culminará na desapropriação do imóvel de cultura ilegal. E ao adentrarmos nesse assunto, teremos um claro conhecimento sobre as peculiaridades dessa nova espécie de desapropriação
Quanto ao processo judicial da desapropriação do art. 243 da Constituição Federal, aplica-se subsidiariamente o Código de Processo Civil, principalmente no que se refere aos recursos, mas é na prática dos Tribunais que encontramos questionamentos como: a culpa in vigilando do proprietário do imóvel que foi encontrado a cultura ilegal, a área da propriedade que realmente deve ser desapropriada, entre outros temas que versaremos nesse trabalho.
2. ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE AS DESAPROPRIAÇÕES E A EXPROPRIAÇÃO DEFINIDA NO ARTIGO 243 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
A doutrina dominante[1] define a desapropriação como sendo, um procedimento pelo qual o Poder Público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, retira compulsoriamente a propriedade de alguém, mediante prévio e justo pagamento de indenização.
A Constituição de 1988 instituiu as seguintes espécies de desapropriação: as declaradas de utilidade pública, necessidade pública e a de interesse social, mediante prévia e justa indenização (art. 5º, XXIV); efetuada em nome da política urbana, nome dado por Celso Antônio Bandeira de Mello[2], em que a indenização é justa, mas não prévia, porque pagável através de título de dívida pública (art. 182 e seus parágrafos); a realizável para fins de reforma agrária, mediante justa indenização e não prévia, pois pagável em títulos de dívida agrária (art. 184), e ainda, a desapropriação de glebas devido ao cultivo ilegal de plantas psicotrópicas (art. 243).
A desapropriação do artigo 243 da Constituição Federal não é considerada por alguns autores uma nova espécie de desapropriação, mas um confisco ou penalidade àqueles que praticarem a atividade criminosa de cultivar ilegalmente plantas psicotrópicas[3].
Não entendemos dessa forma, apesar das peculiaridades dessa espécie de desapropriação não podemos deixar de considerar que o Poder Público retira a propriedade de terceiros mediante atos consecutivos, realizados nas esferas administrativa e judicial, em fim, haverá restrição ao direito de propriedade chamado de desapropriação.
Acreditamos que o que deveria mudar é a maneira de conceituar o instituto da desapropriação, que com o decorrer do tempo incluiu novas espécies, necessitando de definição mais atualizada e em consonância com a Constituição vigente.
Na desapropriação do art. 243 da Constituição Federal o proprietário ao sofrer a perda compulsória da propriedade, não obterá direito à indenização, nem a quaisquer valores decorrentes da extinção deste direito.
O procedimento dessa expropriação é sui generi em relação às demais espécies de desapropriação, pois a fase declaratória não se inicia com o ato declaratório, mas limita-se a atos de polícia e atividades de preparação à ação expropriatória ou fase executória. Sepultando assim, a declaração de utilidade pública, necessidade pública ou interesse social.
Com a localização do cultivo de plantas psicotrópicas, a Polícia Federal, após efetuar o inquérito e o recolhimento de dados necessários, comunicará ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e ao representante judicial a União, para promoverem a ação judicial de expropriação, disciplinada pela Lei nº 8.257, de 26 de novembro de 1991e regualada pelo Decreto nº 577, de 24 de junho de 1992. Inexistindo qualquer declaração expropriatória antecedente.
Nem mesmo para que a autoridade policial efetue a sua verificação não será necessário ato declaratório, pois é típico do poder de polícia, e protegida pela Lei 8.257/91, a competência da Polícia Federal para a verificação da localização de culturas ilegais de plantas psicotrópicas.
Nessa nova espécie de desapropriação não há o pagamento de indenização à perda da propriedade; decorre do descumprimento de preceito legal. O cultivo de plantas psicotrópicas, sem a devida autorização da autoridade sanitária competente, caracteriza-se por ilícito que acarretará na desapropriação sem direito à indenização.
Se o proprietário, o possuidor ou ocupante por qualquer título que cultivar plantas psicotrópicas não tem direito à indenização; não há que se falar em pagamento prévio, ou através de TDAs ou TDPs. Nem a pagamento de juros, de honorários ou benfeitorias.
Outra peculiaridade desse instituto é quanto a sua destinação. Nas demais espécies de desapropriação, o ato declaratório de desapropriação deverá conter a destinação que será dada ao imóvel, enquanto que nesta espécie não há ato declaratório, a sua destinação já está definida na Constituição Federal de 1988, na Lei 8.257, de 26.11.91 e no Decreto nº 577, de 24.06.92, que regulam a matéria, ou seja, "para o assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos".
A retrocessão ocorre quando o expropriado reivindica o imóvel expropriado por não ter sido dado a destinação determinada no ato expropriatório ou outra de fim público. Os imóveis expropriados por cultivarem plantas psicotrópicas, após o trânsito em julgado da sentença expropriatória serão incorporados provisoriamente ao patrimônio da União para depois ser transferida, definitivamente, a terceiros, mas que se não lhes for dado à destinação legalmente determinada, não sofrerão o instituto da retrocessão, visto que, a própria Lei 8.257, de 26.11.91 no parágrafo único do artigo 15 diz que, se não puder ter, em cento e vinte dias, após o trânsito em julgado da sentença de expropriação, a destinação prevista no art. 1º desta lei, o imóvel ficará incorporado ao patrimônio da União, reservado, até que sobrevenham as condições necessárias àquela utilização.
Ademais que, a lei que regula a matéria não prevê a possibilidade da utilização da retrocessão pelo expropriado, ficando o imóvel incorporado ao patrimônio da União até quando presentes a possibilidade daquela utilização.
Não haverá caducidade no que tange ao prazo de promoção da desapropriação do art. 243 da Carta Magma, posto que a Lei que regula essa espécie de expropriação silencia a respeito.
A competência para legislar sobre a desapropriação é unicamente da União, como dispõe o art. 22, inciso II da Constituição Federal (TJDF, RDA 39/208). Mas no que tange a competência para promover a desapropriação cada espécie terá a sua peculiaridade.
Na desapropriação, objeto de nosso estudo, quem terá competência para promovê-la será apenas a União, uma vez que, nem a lei que regula a matéria, nem a Constituição delegam essa competência. Ao contrário sempre se refere à União na feitura de seus atos.
3. NATUREZA JURÍDICA DA DESAPROPRIAÇÃO DE GLEBAS QUE CULTIVAM PLANTAS PSICOTRÓPICAS
A desapropriação, segundo Maria Sylvia Zanella de Pietro, é forma originária da propriedade[4].
A propriedade é originária quando, conforme dispõe Rubens Limongi França, "nasce de uma relação direta entre o sujeito e a coisa"5, em outras palavras é quando a transferência do título de propriedade independe de relação precedente ou conseqüente.
A desapropriação é originária, principalmente no caso estudado, pelos seguintes motivos:
Para que o juiz declare a desapropriação da gleba que cultiva ilegalmente plantas psicotrópicas não será analisado, em nenhum momento, se o título é justo ou injusto, se é de boa ou de má-fé;
Após o trânsito em julgado da sentença expropriatória estudada, o imóvel será incorporado ao patrimônio da União, sem que ocorra a impugnação do oficial do registro de imóveis no ato de transcrição do imóvel, pois trata - se de cumprimento de preceito legal (art. 7º do Decreto nº 577, de 24/06/92 e art. 15 da Lei 8.257, de 26/11/91);
A desapropriação não será invalidada se após o trânsito em julgado verificada que fora proposta contra quem não era o proprietário. Esse é o entendimento do artigo 4º da Lei 8.257/91, quando permite que, para que se processe a expropriação, prevista no art. 243 da Constituição vigente, basta a comprovação da responsabilidade da cultura de plantas psicotrópicas pelo possuidor de qualquer título.
Os ônus reais e obrigacionais, que recaem sobre a gleba expropriada, extinguem-se com a desapropriação. Esse entendimento encontra - se na própria Lei 8.257/91, art. 17, quando diz que a expropriação de glebas que cultivam plantas psicotrópicas prevalecerá sobre direitos reais de garantia, sendo assim, é clara a extinção desse direito no processo expropriatório. Quanto aos direitos obrigacionais a Lei silencia, não deixando qualquer possibilidade de discussão a respeito da reivindicação ou de proliferação desses direitos após o processo expropriatório.
Como a desapropriação incide sobre o bem, a sua natureza jurídica é indiscutivelmente de direito real. A desapropriação estudada incide sobre glebas (terreno próprio para cultura[5]), portanto, incide sobre um bem imóvel e é de direito real.
A desapropriação estudada é uma forma de confisco ou sanção. O douto José dos Santos Carvalho Filho a nomeou de desapropriação confiscatória[6]. A jurisprudência também tem entendido desta maneira, como podemos observar no seguinte julgado: "A expropriação de terras previstas no art. 243 da Constituição Federal tem natureza jurídica de pena, visando sancionar o uso da propriedade para o cultivo de plantas ilícitas" [7], bem como em outras decisões dessa mesma Corte[8].
4. FINALIDADE DA EXPROPRIAÇÃO DE TERRAS QUE CULTIVAM PLANTAS PSICOTRÓPICAS
A expropriação de glebas devido ao cultivo ilegal de plantas psicotrópicas possui duas finalidades: uma mediata e outra imediata.
A primeira ocorre quando a lei destina as terras expropriadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos. Dando assim, uma função social à terra, com a produção de alimentos e medicamentos. E a distribuição dessas terras entre os colonos, contribuindo com a reforma agrária.
A finalidade mediata dessa espécie de desapropriação está em reprimir o cultivo, produção e tráfico ilícito de entorpecente, crimes definidos na Lei nº 6368, de 21 de outubro de 1976.
A repressão e a transformação desse crime em benefício da sociedade atinge também os bens apreendidos em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, que devem ser confiscados para serem revertidos em benefício ao tratamento e recuperação de viciados, bem como, para o aparelhamento e custeio de atividades de fiscalização, controle prevenção e repressão desse crime, conforme versa o parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 8.257/91.
É àquela finalidade que resguarda a Constituição Federal de 1988, ao atribuir função social ao direito de propriedade. Além de combater a cultura ilegal de plantas psicotrópicas.
5. A DEFINIÇÃO LEGAL DAS PLANTAS PSICOTRÓPICAS
Plantas psicotrópicas são aquelas que possuem em sua composição substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, segundo versa o artigo 2º da Lei 8.257/91 e o artigo 2º do Decreto nº 577.
Órgão do Ministério da Saúde será o competente para determinar, através de portaria, quais são as plantas consideradas de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica.
A lei define as plantas psicotrópicas de forma limitada, dizendo apenas que são entorpecente e que causam dependência física e psíquica, mas delega ao Ministério da Saúde, através do Departamento Técnico do Ministério da Saúde – Divisão de Vigilância Sanitária de Medicamentos, competência para dizer quais são essas substâncias entorpecentes.
A portaria de n. 28, de 13 de novembro de 1986 enumera as substâncias psicotrópicas.
6. O INQUÉRITO E O LAUDO TÉCNICO
Antes de discorrer a respeito do inquérito, será necessário tecer algumas considerações essenciais a investigação policial para que se caracterize, verdadeiramente, o ilícito.
A cultura dessa plantas não se caracteriza apenas pelo plantio, mas também, pelo preparo da terra para a sua semeadura ou para a colheita (art. 3º da Lei 8.257/91).
A cultura dessas plantas psicotrópicas não será considerada ilegal quando obtiver prévia autorização, através de licença, do órgão sanitário do Ministério da Saúde (Serviço Nacional de Fiscalização e Farmácia do Ministério da Saúde), que só permitirá quando a finalidade for terapêutica ou científica (artigo 2º, §2º da Lei 6.368/76). Assim sendo, não incidirá a expropriação das terras cujo cultivo dessas plantas obtenham permissão prévia do Ministério da Saúde e cumpra com os preceitos legais e regulamentares.
Essas observações são importantes para a caracterização do ilícito e incidência dos efeitos da expropriação, com o início do inquérito policial.
Com a localização da cultura ilegal de plantas psicotrópicas, que hoje é feita de diversas formas, como a utilização do GPS, da localização via satélite, a Polícia Federal deverá proceder ao inquérito policial e ao recolhimento de dados que a autoridade policial julgar necessária, cujo prazo a lei não fala e na prática também não é observado qualquer exigência a esse respeito.
O relatório técnico, a cópia do inquérito policial e as demais documentações, formarão processo que será remetido ao órgão da Procuradoria da União, representante judicial da União, a fim de ser ajuizada ação expropriatória.
O inquérito policial contém o dia da localização, o local da propriedade, a área do plantio ou semeadura, a quantidade da colheita, espécie da planta, vias de acesso, qualificação e nome das pessoas encontradas no local, fotocópia e mapa da localidade, ou outras documentações necessárias.
As documentações que normalmente acompanham o inquérito são: o termo de declaração das pessoas encontradas (geralmente são pessoas que trabalham, com carteira assinada, para o proprietário ou possuidor), auto de incineração, auto de apreensão dos bens móveis encontrados, solicitação ao tabelião do cartório de imóvel as informações necessárias à especificação e registro do imóvel, laudo de exame de constatação da substância vegetal.
A autoridade policial deverá incinera a plantação, após recolher quantidade suficiente para o exame pericial, lavrando-se o auto circunstanciado.
O relatório técnico deverá ser elaborado no prazo de oito dias e conterá:
a) a caracterização do imóvel onde foi localizada a cultura ilegal de plantas psicotrópicas, mediante indicação, pelo menos, da denominação e das confrontações das vias de acesso;
b) descrição da área onde localizada a cultura;
c) comprovação da existência de cultivo ilegal;
d) indicação e qualificação do proprietário ou do possuidor do imóvel, bem como de todos os seus ocupantes e de outras pessoas nele presentes no momento da lavratura do auto de apreensão;
e) relação de bens móveis encontrados na área e apreendidos.
A caracterização da área de localização do imóvel foi objeto de discussão na jurisprudência do TRF da 5º Região[9], quando aquela honrada Corte determinou que a expropriação da gleba é toda a extensão de terra pertencente ao responsável pelo cultivo de plantas psicotrópicas, e não apenas a faixa onde fora encontrado o plantio. Pautando-se na argumentação de que "se o constituinte pretendesse restringir a extensão da norma que dispõe a cerca da expropriação de terras onde encontrados plantios de cannabis sativas, teria utilizado expressões usuais, como "a porção da gleba onde foram localizadas plantas psicotrópicas", ou designação semelhante".
Mais adiante esse mesmo Tribunal[10] decide pela "expropriação das glebas onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas e não de toda a área de terras pertencentes ao responsável... ". Surgindo assim, novo entendimento de que a expropriação só se daria na porção de terra onde foi cultivado o plantio das plantas psicotrópicas e não de toda a propriedade do responsável pelas culturas.
O entendimento que adotamos é o mesmo adotado pelo ilustríssimo José dos Santos Carvalho Filho que diz: "a desapropriação deve alcançar a propriedade integralmente, ainda que o cultivo se dê apenas em parte dela" [11].
As indicações das vias de acesso têm importância fundamental para que se dê a expropriação do imóvel correto, bem como para indicar ou não a culpa in vigilando do proprietário do imóvel quando, por exemplo, a área que foi localizada o plantio ilegal, por circunstâncias ambientais diversas, encontra-se em local de difícil acesso para o proprietário ou possuidor, mas para o seu vizinho de terreno limítrofe essa impossibilidade não existe. A culpa in vigilando será tema de nosso trabalho mais adiante, porém esse exemplo é uma das formas de se demonstrar a importância de se determinar a localização do imóvel onde foi encontrado o cultivo de plantas psicotrópicas, bem como a sua descrição e acesso para servir de matéria de defesa do réu.
A relação dos bens encontrados na área, e apreendidos, será necessário para a concretização do confisco dos mesmos que será revertido para o tratamento de viciados, fiscalização, controle, prevenção e repressão do tráfico de substâncias entorpecentes, como preceitua o parágrafo único do artigo 1º da Lei 8.257/91.
7. O PROCESSO JUDICIAL DE EXPROPRIAÇÃO
O procedimento é de rito especial e está disciplinada pela Lei n.º 8.257/91 com a subsidiariedade do Código de Processo Civil.
A petição inicial além de obter os requisitos próprios desse instituto de expropriação deverá atender aos requisitos do artigo 282 do CPC.
O juízo competente para decidir as desapropriações de glebas que cultivam plantas psicotrópicas será a Justiça Federal no foro da localidade da coisa, conforme o artigo 95 do Código de Processo Civil e art. 109, inciso I da Constituição Federal.
O sujeito ativo será sempre a União, representada pela Advocacia – Geral da União, através de suas Procuradorias Regionais da União, localizadas nos Estados, segundo disposto no artigo 9º da Lei Complementar nº 73, 10/02/93 e art. 131 da Constituição Federal.
O sujeito passivo será o possuidor, posseiro ou ocupante por qualquer título que cultive ilegalmente plantas psicotrópicas. Verifica-se então, que essa desapropriação não será apenas da propriedade mas também da posse.
Se não for comprovada a posse ou propriedade do imóvel não constituirá óbice ao procedimento expropriatório de terras utilizadas para o cultivo de ervas psicotrópicas, consoante jurisprudência do TRF 5ª região/REO – 16814.
O objeto da expropriação do art. 243 da Constituição vigente será o imóvel em que for localizada a cultura ilegal de plantas psicotrópicas.
O pedido nessa espécie de desapropriação deverá conter:
I – o pedido de deferimento da desapropriação,
II – o pedido de imissão na posse,
III – o chamamento do Incra ao processo e
IV – o requerimento para citação do réu.
Os documentos indispensáveis à propositura da ação serão: o inquérito, o laudo técnico e o registro do imóvel.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra não tem legitimidade para figurar na relação processual como parte ou assistente, porque mediante o artigo 6º do Decreto nº 577/92, o Incra apenas terá o poder de imitir-se na posse do imóvel expropriado, em nome da União, para executar a reforma agrária, bem como indicar assistente técnico. O chamamento do Incra será apenas para imitir-se na posse e efetuar a reforma agrária.
Recebida a petição inicial pelo juiz, este, mandará citar o réu no prazo de cinco dias, nomeará perito judicial para que elabore laudo de resposta aos quesitos no prazo de oitos dias e poderá, liminarmente, mandar intimar o Incra para, em nome da União, imitir-se na posse do imóvel.
A lei omite-se a despeito da presença do Ministério Público no processo de desapropriação por cultura ilegal de plantas psicotrópicas. Defendemos o entendimento de que não será necessário, pois se contrário fosse a lei não teria silenciado a respeito. Mesmo assim, alguns entendem ser obrigatória a presença do parquet, por entender que a desapropriação é matéria de fundamento constitucional, sendo indiscutível o interesse público, baseando-se no artigo 82, III do CPC7.
A citação se processará na forma do Código de Processo Civil, que será por carta com aviso de recebimento, oficial de justiça ou edital, casos elencados no artigo 221.
A citação por carta é muito raro devido a localização do réu ser em área rural, que não atende aos serviços de correio. Nesses casos a citação far-se-á por oficial de justiça.
É muito comum a utilização de carta precatória para a execução da citação.
O edital far-se-á quando o réu estiver em lugar incerto ou não sabido. O edital obedecerá a regra do artigo 232, incisos III e IV do CPC.
A contestação, nesse tipo de desapropriação, não terá restrição quanto a matéria que deve servir de defesa, vez que a lei silencia a respeito. No entanto não terá cabimento a reconvenção nessa espécie de desapropriação.
"O prazo para a contestação e indicação de assistente técnico será de dez dias, a contar da data da juntada do mandado de citação aos autos"(art. 8º da Lei 8.257, de 26/11/91).... "Não se aplicam, nas desapropriações, os efeitos da revelia previstos no artigo 319 do CPC, pois o juiz, mesmo na falta de contestação, está adstrito à norma constitucional"...
A culpa in vigilando, que é passível de argumentação, é matéria que discute se o proprietário ou possuidor teve ou não a culpa pelo cultivo ilegal, visto que, ficou impossibilitado de exercer o poder de vigia sobre as terras apontadas pelo cultivo ilegal ou se houve a negligência, que por desleixo ou desinteresse deixou de vigiar a terra ou de dar a função social a mesma.
A jurisprudência do TRF da 5ª Região[12] decidiu pelo improvimento da desapropriação, por considerar que deve ser observado o dolo e a culpa do proprietário, uma vez que a natureza jurídica dessa espécie de expropriação é de pena. In caso, o cultivo estava sendo realizado sem o conhecimento do proprietário, agricultor do sertão, que em face da escassez de água, em certo período do ano, em virtude de sua condição financeira, se deslocava para outras regiões, ficando impossibilitado de suportar os encargos de manter um empregado para vigiar suas terras durante sua ausência. Assim sendo, a decisão daquela corte foi pelo improvimento da desapropriação, já que não poderia impingir a culpa in vigilando ao proprietário, necessária para aplicar tal sanção.
Entendemos que a natureza jurídica dessa expropriação é punitiva, porém deve-se separá-la do juízo penal. A matéria sendo processada no juízo cível, que considera a responsabilidade objetiva do proprietário, por mais que o proprietário prove não ter sido culpado pelo cultivo ilegal de plantas psicotrópicas, deve-se processar a desapropriação do imóvel. O proprietário tem o dever de vigilância, presumindo-se a sua culpa, o máximo que o proprietário pode fazer é comprovar que o cultivo de deu por terceiros, isentando-se de pena no juízo penal.
Será marcada a data para a audiência de instrução e julgamento para os quinze dias seguintes da data da juntada da contestação (art. art. 9º da Lei 8.257, de 26 de novembro de 1991). Não havendo contestação, esse prazo começará a ser contado da preclusão do tempo dado ao réu para contestar.
Para a audiência de instrução e julgamento cada parte poderá indicar até cinco testemunhas. Sendo vedado o adiamento da audiência, salvo motivo de força maior, devidamente justificado. Se a produção da prova oral não poder ser exibida na mesma audiência, o adiamento não poderá ser para data posterior a três dias (art. 11, 12 e seu parágrafo único da Lei 8.257/91).
A sentença será prolatada no prazo de cinco dias (art. 13 daquela lei). Essa sentença terá a natureza condenatória e põe termo à desapropriação no primeiro grau de jurisdição.
7.1. IMISSÃO DE POSSE
Imissão de posse, na definição de Celso Antônio Bandeira de Mello, "é a transferência da posse do bem objeto da expropriação" [13]. Não será a transferência da propriedade, mas apenas da posse.
No caso da Lei e Decreto em apreço a imissão será requerida pelo representante judicial da União, na petição inicial, e será concedida, ou não, pelo juiz, liminarmente, no ato de recebimento da exordial.
Note-se que não há, na lei, prazo para o juiz conceder a liminar, nem menciona urgência na imissão de posse. Assim, creio que nesse caso, o juiz ao mandar imitir a União na posse não terá muita discricionariedade, apenas com o pedido da União este deverá conceder.
Para que o juiz conceda a imissão na posse não se fará necessário o pagamento de depósito prévio.
A decisão liminar que conceder a imissão de posse é decisão interlocutória, que caberá embargos infringentes, consoante dispõe o artigo 522 do CPC. Porém, no caso estudado o artigo 10 da lei que regula a matéria, ao referi-se na liminar que concede a imissão da posse garante ao expropriado o direito ao contraditório e audiência de justificação, descaracterizando aquele recurso. Acreditamos que o legislador quis dá maior agilidade ao processo de discussão sobre a imissão da posse
A imissão na posse será feita pelo Incra, órgão que recebe os poderes legais, para em nome da União, imitir-se na posse, bem como, adotar as medidas cabíveis e indicar assistente técnico
O Incra será responsável em apresentar relatório circunstanciado da situação do imóvel, inclusive após o trânsito em julgado da sentença de desapropriação, onde tomará as providências necessárias à incorporação do imóvel à União e a posterior reforma agrária.