A retórica, segundo Boaventura de Sousa Santos, consiste na “(...) produção da persuasão e de adesão voluntária através da mobilização do potencial argumentativo de sequências e artefatos verbais e não verbais socialmente aceitos.” [1]
Observa-se que a retórica é um elemento inerente à formação do compromisso de ajustamento de conduta, pois há necessariamente um processo de negociação entre os órgãos legitimados e o agente que está a lesar os interesses metaindividuais ou está na iminência de fazê-lo, a fim de se encontrar as obrigações que, ao serem pactuadas, melhor tutelarão os interesses em conflito; é claro, com o respeito ao que se pode transigir ao firmar um termo.
A solução negociada é possível, em grande parte, em virtude de não haver um procedimento obrigatório a ser seguido na formação do compromisso. Portanto, a todo tempo as partes poderão ter uma comunicação direta. Com isso, o compromissário poderá expor seu ponto de vista e a construção do termo levará em conta particularidades do caso concreto que não são levadas ao processo judicial. Geisa de Assis Rodrigues[2] traz um rol de aspectos em que há uma cognição mais profunda em uma negociação e que, dessa forma, permitem a elaboração de cláusulas que protegem os interesses transindividuais de forma plena e, além disso, são menos passíveis de descumprimento por parte do transgressor da norma. São estes:
(...) o conhecimento efetivo da situação a ser ajustada, v.g, a condição econômica do obrigado, as causas que o levarão ao não cumprimento da norma, os óbices que precisa superar para cumpri-la, assim como a urgência em que a adequação à lei precisa ser feita, os anseios da comunidade que se sente lesada pela transgressão da norma, etc.
A negociação, ao levar em conta a condição financeira do agente degradador, permitirá aplicação do princípio do acesso à justiça, visto que, se possível no caso concreto, o legitimado ativo optará por firmar obrigações menos onerosas a outra parte; fato este que não seria considerado ao se produzir o pedido em sede de ação civil pública.
A flexibilidade do processo de negociação é um ponto positivo do termo de compromisso, visto que se a negociação estiver indo em determinada direção, contudo, surgir uma opção mais vantajosa para as partes, nada impede que esta seja a alternativa adotada; fato que este que não poderia ocorrer em sede judicial, haja vista que em uma ação, o órgão legitimado faz o pedido em sua análise unilateral da questão. O réu tentará de todas as formas demonstrar a improcedência da ação. O juiz, por sua vez, ao decidir, estará totalmente adstrito ao pedido, sob pena de proferir uma sentença extra petita.
Por fim, é certo que a decisão não será consensual, mas será participativa. Portanto, melhor para o compromissário do que uma fria e dura sentença imposta. Dessa forma, o lesionador se empenhará muito mais em cumprir algo que, voluntária e conscientemente firmou, que executar uma sentença que lhe foi imposta. Cumpre ressaltar a lição de Daniel Fink[3] de que diante da composição negociada: “(...) ao final, cada parte terá certeza de que cada obrigação é resultado daquilo que cada um pode dar e na forma que pode dar. É a realização do possível.” (grifo nosso).
Ademais, nota-se a educação ambiental promovida pelo compromisso. Daniel Fink aponta que no início da negociação o único interesse do infrator é o financeiro. No entanto, cabe ao órgão legitimado demonstrar que a preservação do meio ambiente, por exemplo, poderá trazer benefícios diretos à atividade realizada pelo degradador.[4]
Outras vantagens advêm da pactuação do ajuste, como os custos, visto que não haverá taxas judiciais a serem pagas e despesas com advogados, pois, ainda que o compromissário contrate um advogado, é certo que seu custo será menor se contratado por um curto período de tempo (os meses que costumam durar a negociação do ajuste) do que se contratado por um longo tempo (os anos que costumam durar as ações judiciais).[5]
Inclusive, é outra vantagem que decorre do prazo de duração do TAC.
Para abordar este tema, primeiramente, é importante lembrar que o ajuste permite a materialização do princípio da prevenção, visto que é uma solução célere ao problema que surge. Geisa de Assis Rodrigues[6] ao analisar a teologia do TAC ensina que “A possibilidade de o ajuste ‘antecipar-se à sentença de cognição’ existe justamente para ampliar esse seu atributo preventivo.”
Dessa feita, observa-se que a morosidade do Judiciário diante da formalidade dos ritos e da quantidade de recursos existentes pode fazer com que uma ação civil pública leve anos para ser julgada e, assim, o pedido feito no início do processo poderá restar inútil.[7]
Por esta razão que Geisa de Assis Rodrigues[8] ressalta que a “(...) informalidade presente na possibilidade de negociação é altamente compatível com a construção da forma mais efetiva de proteção dos direitos transindividuais.”
Há, ainda, um fator que faz a pactuação do ajuste ser extremamente interessante para o lesionador, ou potencial lesionador, dos direitos metaindividuais. É possibilidade da marca e da empresa do mesmo ter sua imagem preservada, visto que o fato de o empreendedor voluntariamente decidir pela proteção do objeto do conflito, o afastará de críticas acaloradas e manchetes de jornal.[9]
Outra vantagem, já abordada neste trabalho, é a possibilidade daquele agente que degradou o meio ambiente e firmou um compromisso de ajustamento de conduta, ter a aplicação da lei penal, em seu caso, atenuada.
Diante de tantos aspectos positivos inerentes ao ajuste de conduta e da necessidade e importância do desafogamento do Judiciário, Daniel Fink[10] patrocina a tese de que a ação civil pública somente deverá ser proposta uma vez que reste impossível a solução negociada. De forma similar se manifesta Consuelo Yoshida que preceitua que somente devem ser judicializados os conflitos que se configurarem insuperáveis, a autora explica que: “É a otimização necessária, que pode preceder a judicialização ou ocorrer no curso do processo, abreviando seu final e contribuindo para a realização concreta do direito com maior presteza, em consonância com a atual tendência de efetividade do processo.” [11]
Notas
[1] Apud RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação civil pública e termo de ajustamento de conduta: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 130.
[2] RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação civil pública e termo de ajustamento de conduta: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 131.
[3] FINK, Daniel Roberto. Alternativa à ação civil pública ambiental: reflexões sobre a vantagem do termo de ajustamento de conduta. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação civil pública: lei 7.347/1985 – 15 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 132.
[4] Ibidem. p. 133.
[5] Cf FINK, Daniel Roberto. Alternativa à ação civil pública ambiental: reflexões sobre a vantagem do termo de ajustamento de conduta. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação civil pública: lei 7.347/1985 – 15 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 133. e RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação civil pública e termo de ajustamento de conduta: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.118.
[6] RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação civil pública e termo de ajustamento de conduta: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 116.
[7]Cf. FINK, Daniel Roberto. Alternativa à ação civil pública ambiental: reflexões sobre a vantagem do termo de ajustamento de conduta. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação civil pública: Lei 7.347/1985 – 15 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 134.
[8] RODRIGUES, Geisa de Assis. Ação civil pública e termo de ajustamento de conduta: teoria e prática. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 131.
[9] Cf. FINK, Daniel Roberto. Alternativa à ação civil pública ambiental: reflexões sobre a vantagem do termo de ajustamento de conduta. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação civil pública: lei 7.347/1985 – 15 anos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 133.
[10] Ibidem. p. 114.
[11] YOSHIDA, Consuelo Yatsuda Moromizato. Ação civil pública: judicialização dos conflitos e redução da litigiosidade. In: MILARÉ, Édis (Coord.). Ação civil pública após 20 anos: efetividade e desafios. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 112.