A produção do consumo moderno segundo Grant McCracken
WILLIAM CORNETTA[1]
Resumo: O presente artigo estuda a produção histórica do consumo moderno segundo a teoria de Grant McCracken.
O Grant McCracken é um antropologista Norte Americano que fez um interessante estudo no inicio do consumo moderno no seu livro “Cultura e Consumo. O autor afirma que o consumo moderno acima de tudo é um produto histórico, sendo resultado de vários séculos de profunda mudança social, econômica e cultura no Ocidente.
O autor coloca que o marco inicial para a sociedade do consumo ocorre no século XVI, época na qual novos hábitos, bens e práticas de consumo surgem, principalmente na Inglaterra e França.
Apesar da falta de consenso sobre seu inicio, curiosamente pela negligência das ciências sociais que ignoraram o fato da ocorrência da “Revolução do consumo” , como também pelo quantidade limitada de estudos com tal enfoque, o Autor dedica seu estudo de Neil McKendrick, Rosalind H. Williams e Chandra Mukerji, que se dedicaram a analisar tal fenômeno.
O autor ainda argumenta que o consumo é um fruto histórico identificando três momentos históricos.
O primeiro momento histórico apresentado ocorre no final do século XVI, na chamada Inglaterra Elizabetana, quando ocorre um boom do consumo principalmente causado por dois importante desenvolvimento no período.
Primeiro, Elizabeth I utilizou a despesa como um instrumento de governo com o objetivo de fazer da corte uma espécie de desfile, de espetáculo teatral. Alem disso, Elizabeth foi bem-sucedida em persuadir a nobreza a pagar uma boa parte da conta por toda esta cerimônia. Ela acabou forçando a nobreza a gastar extravagantemente em seu lugar e esbanjar recrusos neste processo.
O segundo fator foi a competição social que tomou lugar entre a nobreza elizabetana. Como eles dependiam dos favores reais para sua sobrevivência, este fato gerou indiretamente uma despesa adicional feita em nome de si próprios, pois os nobres disputavam entre si a atenção da rainha. Desta forma, os nobres passaram a consumir mais com o objetivo de se destacar na corte entre seus pares.
A escalada do consumo gerada pela monarquia e pela nobreza deram origem a importantes mudanças na família e na localidade. As demandas de consumo tornaram as obrigações em relação a família e à localidade muito mais difíceis de serem cumpridas. A unidade de consumo deixou de ser a família para ser o indivíduo, o que gerou uma grande mudança no processo de decisão de consumo.
Esta nova decisão de consumo levou uma mudança da compra tradicional pátina, ou seja, a compra familiar com o objetivo de que o bem permanecesse na família por diversas gerações, tornando tais bens valiosos pela sua antiguidade e história na família, pela compra impulsionada pela moda.
Os nobres passaram a realizar um consumo exagerado enquanto os subordinados observavam atônicos seus gostos e excessos. Estes gastos excessivos mudaram a natureza da família elizabetana, a localidade e iniciaram uma série de transformações que viriam a consolidar a história do consumo.
O segundo momento histórico ocorre no século XVIII, quando ocorre a própria explosão do consumo, criando novas oportunidades para a compra de móveis, cerâmicas, pratas, espelhos, tecidos, etc. O consumo então passa a ser mais presente na sociedade e seus reflexos redefinem a sua organização e o papel do status dos grupos sociais.
Os bens de consumo deixam de ser simplesmente objeto de status e começam a ter um significado próximo do atual, ou seja, o consumo é instalado na sociedade de modo mais freqüente.
Esta explosão do consumo integrou os grupos subordinados, gerando o fenômeno do “tickle-down”, ou seja, a popularização do consumo para as classes de mais baixa renda, que passou a ser explorado pelos comerciantes da época.
Outro ponto de destaque é que o consumo “pátina” foi integralmente substituído pelo consumo ditado pela moda. Este fenômeno pode ser atribuído pela evolução das técnicas de marketing, pelo entendimento da dinâmica social, pela compreensão e manipulação do mercado realizados pelos produtores.
Nesta segunda fase podemos dizer que o mundo do consumo estava se consolidando firmemente no contexto social.
A terceira e última fase apontada pelo autor é o consumo no século XIX. Neste momento, o consumo já estava enraizado na sociedade e fazia parte da estrutura da vida social. As transformações na sociedade tornaram o fenômeno do consumo em um fato social permanente, e ao mesmo tempo que ele causava uma mudança na sociedade, a sociedade por sua vez mudava seus hábitos, forma e desejos de consumo.
Não houve nesta época um boom de consumo, pois já existe uma relação dinâmica, contínua e permanente entre as mudanças no consumo e na sociedade.
Merece destaque nesta época o surgimento das lojas de departamento, que mudou o hábito de consumo. Nas lojas de departamento todas as classes passaram a ficar mais próximas dos objetos de desejos, passando então a ter contato direto com eles, a democratização do consumo como diz o autor.
Além disso, não mais passava-se a negociar os preços, pois eles eram fixo e estavam presente nos produtos, o consumidor aceitava ou não o valor deles pela decisão da compra ou não.
As lojas de departamento mudaram definitivamente o local onde as pessoas consumiam e também forneciam todas as informações necessárias para a realização do consumo. Outro ponto que merece destaque é a criação do fenômeno do crédito, as lojas de departamento passaram a realizar vendas a prazo ou em parcelas aos consumidores, fato este que expandiu a possibilidade do consumo.
As técnicas de marketing tornaram-se mais presentes e persuasivas para os consumidores, criando cada vez mais novos objetos de desejos e ditando a moda e a obsolescência dos produto.
A revolução do consumo é um produto histórico que teve seu início no século XVI. Sua histórica não é clara e também não existe um consenso sobre seu inicio como também de sua evolução. Contudo, o consumo é fato presente na sociedade e já desde o século XVIII está consolidado na sociedade.
O autor ainda considera que o consumo pode ser visto sim como um instrumento político. Como fundamento ele apresenta o exemplo de Elizabeth no século XVII, que aprendeu a governar a Inglaterra através de objetos e de seu consumo.
Primeiramente, pode-se notar o consumo na corte de Elizabeth pelo fato da corte ter se tornado uma espécie de desfile e de espetáculo teatral. Tais objetos tinham o objetivo de mostrar a qualidade do governo, seu status, sua capacidade de hospitalidade, e, por fim, mostrar a posição de divindade da monarca.
Elizabeth também foi bem sucedida em persuadir a nobreza a pagar por parte da conta de seu consumo como também forçou a nobreza a gastar extravagantemente em consumo.
Pelos gastos excessivos da nobreza, Elizabeth conseguiu uma posição de domínio, pois os nobres passaram a necessitar do quinhão da generosidade real. Os nobres passaram a ter a necessidade de se destacar na corte, o que era realizado através do consumo, e ao mesmo tempo das benesses da rainha, que era limitada aqueles que demonstravam lealdade a ela.
Este ciclo vicioso significou a ruína dos recursos dos nobres e a dependência cada vez mais da rainha.
O resultado do processo foi o fortalecimento da rainha e ao mesmo tempo em que significou a ruína dos nobres e sua dependência em relação à Elizabeth.
[1] Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUCCAMP, especialista em Direito da Economia e da Empresa pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e em Administração e Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing - ESPM, Extensão em Direito Americano pela Boston University. Mestre e Doutorando em Direito das Relações Sociais, sub-área de Direitos Difusos e Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP. Intercâmbista na Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE do Ministério da Fazenda em 2005. Membro da Comissão de Aparelhos Celulares – Direito do Consumidor da Abinee - Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica de 2006 a 2010. Membro do Comitê Estratégico Jurídico da Amcham Campinas. Advogado da Motorola Solutions em São Paulo.