A PRODUÇÃO DO CONSUMO MODERNO SEGUNDO GRANT MCCRACKEN

27/03/2014 às 16:37
Leia nesta página:

O presente artigo estuda a produção histórica do consumo moderno segundo a teoria de Grant McCracken.

A produção do consumo moderno segundo Grant McCracken

WILLIAM CORNETTA[1]

Resumo: O presente artigo estuda a produção histórica do consumo moderno segundo a teoria de Grant McCracken.

O Grant McCracken é um antropologista Norte Americano que fez um interessante estudo no inicio do consumo moderno no seu livro “Cultura e Consumo. O autor afirma que o consumo moderno acima de tudo é um produto histórico, sendo resultado de vários séculos de profunda mudança social, econômica e cultura no Ocidente.

O autor coloca que o marco inicial para a sociedade do consumo ocorre no século XVI, época na qual novos hábitos, bens e práticas de consumo surgem, principalmente na Inglaterra e França.

Apesar da falta de consenso sobre seu inicio, curiosamente pela negligência das ciências sociais que ignoraram o fato da ocorrência da “Revolução do consumo” , como também pelo quantidade limitada de estudos com tal enfoque, o Autor dedica seu estudo de Neil McKendrick, Rosalind H. Williams e Chandra Mukerji, que se dedicaram a analisar tal fenômeno.

O autor ainda argumenta que o consumo é um fruto histórico identificando três momentos históricos.

O primeiro momento histórico apresentado ocorre no final do século XVI, na chamada Inglaterra Elizabetana, quando ocorre um boom do consumo principalmente causado por dois importante desenvolvimento no período.

Primeiro, Elizabeth I utilizou a despesa como um instrumento de governo com o objetivo de fazer da corte uma espécie de desfile, de espetáculo teatral. Alem disso, Elizabeth foi bem-sucedida em persuadir a nobreza a pagar uma boa parte da conta por toda esta cerimônia. Ela acabou forçando a nobreza a gastar extravagantemente em seu lugar e esbanjar recrusos neste processo.

O segundo fator foi a competição social que tomou lugar entre a nobreza elizabetana. Como eles dependiam dos favores reais para sua sobrevivência, este fato gerou indiretamente uma despesa adicional feita em nome de si próprios, pois os nobres disputavam entre si a atenção da rainha. Desta forma, os nobres passaram a consumir mais com o objetivo de se destacar na corte entre seus pares.

A escalada do consumo gerada pela monarquia e pela nobreza deram origem a importantes mudanças na família e na localidade. As demandas de consumo tornaram as obrigações em relação a família e à localidade muito mais difíceis de serem cumpridas. A unidade de consumo deixou de ser a família para ser o indivíduo, o que gerou uma grande mudança no processo de decisão de consumo.

Esta nova decisão de consumo levou uma mudança da compra tradicional pátina, ou seja, a compra familiar com o objetivo de que o bem permanecesse na família por diversas gerações, tornando tais bens valiosos pela sua antiguidade e história na família, pela compra impulsionada pela moda.

Os nobres passaram a realizar um consumo exagerado enquanto os subordinados observavam atônicos seus gostos e excessos. Estes gastos excessivos mudaram a natureza da família elizabetana, a localidade e iniciaram uma série de transformações que viriam a consolidar a história do consumo.

O segundo momento histórico ocorre no século XVIII, quando ocorre a própria explosão do consumo, criando novas oportunidades para a compra de móveis, cerâmicas, pratas, espelhos, tecidos, etc. O consumo então passa a ser mais presente na sociedade e seus reflexos redefinem a sua organização e o papel do status dos grupos sociais.

Os bens de consumo deixam de ser simplesmente objeto de status e começam a ter um significado próximo do atual, ou seja, o consumo é instalado na sociedade de modo mais freqüente.

Esta explosão do consumo integrou os grupos subordinados, gerando o fenômeno do “tickle-down”, ou seja, a popularização do consumo para as classes de mais baixa renda, que passou a ser explorado pelos comerciantes da época.

Outro ponto de destaque é que o consumo “pátina” foi integralmente substituído pelo consumo ditado pela moda. Este fenômeno pode ser atribuído pela evolução das técnicas de marketing, pelo entendimento da dinâmica social, pela compreensão e manipulação do mercado realizados pelos produtores.

Nesta segunda fase podemos dizer que o mundo do consumo estava se consolidando firmemente no contexto social.

A terceira e última fase apontada pelo autor é o consumo no século XIX. Neste momento, o consumo já estava enraizado na sociedade e fazia parte da estrutura da vida social. As transformações na sociedade tornaram o fenômeno do consumo em um fato social permanente, e ao mesmo tempo que ele causava uma mudança na sociedade, a sociedade por sua vez mudava seus hábitos, forma e desejos de consumo.

Não houve nesta época um boom de consumo, pois já existe uma relação dinâmica, contínua e permanente entre as mudanças no consumo e na sociedade.

Merece destaque nesta época o surgimento das lojas de departamento, que mudou o hábito de consumo. Nas lojas de departamento todas as classes passaram a ficar mais próximas dos objetos de desejos, passando então a ter contato direto com eles, a democratização do consumo como diz o autor.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Além disso, não mais passava-se a negociar os preços, pois eles eram fixo e estavam presente nos produtos, o consumidor aceitava ou não o valor deles pela decisão da compra ou não.

 As lojas de departamento mudaram definitivamente o local onde as pessoas consumiam e também forneciam todas as informações necessárias para a realização do consumo. Outro ponto que merece destaque é a criação do fenômeno do crédito, as lojas de departamento passaram a realizar vendas a prazo ou em parcelas aos consumidores, fato este que expandiu a possibilidade do consumo.

As técnicas de marketing tornaram-se mais presentes e persuasivas para os consumidores, criando cada vez mais novos objetos de desejos e ditando a moda e a obsolescência dos produto.

A revolução do consumo é um produto histórico que teve seu início no século XVI. Sua histórica não é clara e também não existe um consenso sobre seu inicio como também de sua evolução. Contudo, o consumo é fato presente na sociedade e já desde o século XVIII está consolidado na sociedade.

O autor ainda considera que o consumo pode ser visto sim como um instrumento político. Como fundamento ele apresenta o exemplo de Elizabeth no século XVII, que aprendeu a governar a Inglaterra através de objetos e de seu consumo.

Primeiramente, pode-se notar o consumo na corte de Elizabeth pelo fato da corte ter se tornado uma espécie de desfile e de espetáculo teatral.  Tais objetos tinham o objetivo de mostrar a qualidade do governo, seu status, sua capacidade de hospitalidade, e, por fim, mostrar a posição de divindade da monarca.

Elizabeth também foi bem sucedida em persuadir a nobreza a pagar por parte da conta de seu consumo como também forçou a nobreza a gastar extravagantemente em consumo.

Pelos gastos excessivos da nobreza, Elizabeth conseguiu uma posição de domínio, pois os nobres passaram a necessitar do quinhão da generosidade real. Os nobres passaram a ter a necessidade de se destacar na corte, o que era realizado através do consumo, e ao mesmo tempo das benesses da rainha, que era limitada aqueles que demonstravam lealdade a ela.

Este ciclo vicioso significou a ruína dos recursos dos nobres e a dependência cada vez mais da rainha.

O resultado do processo foi o fortalecimento da rainha e ao mesmo tempo em que significou a ruína dos nobres e sua dependência em relação à Elizabeth.


[1] Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUCCAMP, especialista em Direito da Economia e da Empresa pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e em Administração e Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing - ESPM, Extensão em Direito Americano pela Boston University. Mestre e Doutorando em Direito das Relações Sociais, sub-área de Direitos Difusos e Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP. Intercâmbista na Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE do Ministério da Fazenda em 2005. Membro da Comissão de Aparelhos Celulares – Direito do Consumidor da Abinee - Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica de 2006 a 2010. Membro do Comitê Estratégico Jurídico da Amcham Campinas. Advogado da Motorola Solutions em São Paulo.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
William Cornetta

Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUCCAMP. Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela Fundação Getúlio Vargas - FGV e em Administração e Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing - ESPM . Extensão em Direito Americano pela Boston University. advogado da Motorola em São Paulo

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos