Oh, tú, al que el gusanillo de escribir atormenta como un demonio y que darías todas las minas del Perú por un grano de reputación: abandona el vil rebaño de autores vulgares que corren tras los demás o que hozan en el polvo de la erudición, abandona a los pesados sabios cuyas obras parecen llanuras interminables sin flores ni fin. O no escribas nada, o toma otro camino: sé grande en tus escritos como en tus acciones, muestra al mundo un alma robusta, independiente. (Julien Offray de La Mettrie)
Existem muitos tópicos (lugares-comuns) que delatam as crenças dominantes em nossa sociedade, os grandes ou mais ou menos inconscientes prejuízos coletivos conhecidos, transitados ou frequentados por todos ou por muitos, estas figuras retóricas que adota a mente coletiva e onde nos encontramos com a “maioria” anônima, impessoal e conformada. (A. Arteta)
Entre esses tópicos há dois em particular que geram um tipo de complacência acrítica e preguiça mental, que nos permitem evitar a tarefa de raciocinar e argumentar (já sabem, uma mente vagabunda), e que facilitam nossa comum e cômoda atitude de opinar sem a moléstia e o esforço de pensar. O primeiro, “que uma imagem vale mais que mil palavras”; o segundo, que “escutar aos demais” é fundamental para “aprender” o que necessitamos (quer dizer, que é determinante para o desenvolvimento e o aprimoramento de nossa capacidade para perceber, processar, discernir e assimilar cada novo conhecimento aprendido ou habilidade adquirida).
Falando com franqueza, não há maiores asnadas ditas com melhor consciência. Se prestarmos a devida atenção, ambos os tópicos visam, em última instância, liberar-nos da responsabilidade de pensar, razoar, julgar e atuar em consequência; ambos encerram um propósito suicida de fazer-nos permanecer em um vazio intelectual.
Por exemplo, quanto ao primeiro, melhor seria dizer que uma boa imagem vale mais que mil palavras estúpidas e/ou torpes, mas que uma palavra adequada vale mais que mil imagens por excelentes que estas sejam; e, em todo caso, que não há imagem que valha sem palavra que lhe acompanhe (quando estamos experimentando os efeitos de nossos ensaios mentais negativos, nossas depressivas emoções negativas, não buscamos uma “imagem amiga”, senão uma “palavra amiga”).
No que se refere ao segundo tópico, se escutar aos demais fosse igual a aprender, todos nós seríamos tão inteligentes que nem suportaríamos. Isso para não dizer que o “aprendizado por outiva”, quando exclusivo e/ou prioritário, fomenta o cultivo da mediocridade, da alienação e da idolatria, um tipo de passividade intelectual que não promove ao agente reflexivo, diligente e crítico, senão ao autômato obediente, inerte e ocioso, isto é, que não motiva ou incita o indivíduo a buscar, desde a “autonomia do espírito” a que se referia Kant, sua própria excelência – é muito provável que o excesso de dependência “do outro” seja próprio das pessoas que ainda não receberam o corretivo que a experiência administra àqueles que se empenham em negá-la.
Tudo isso para recordar que entre nossos melhores amigos de estudo devem estar os livros. Por que? Pois pelo simples fato de que são inúmeras as vantagens da linguagem escrita sobre a oral: o exercício das faculdades reflexivas sobre as mnemônicas, miméticas e repetitivas; a ganância em objetividade e estabilidade, graças à firmeza do texto e à possibilidade de ser repassado; a clareza e sistematização das ideias, graças à forma de raciocínio e ao estilo de argumentar que os bons livros trazem consigo...; por aí poderíamos seguir. O que implica que a leitura também nos permite dialogar com o texto de maneira pausada, reflexiva e reler o que não compreendemos de imediato: uma prática bastante normal, um hábito prudente mais que um signo de uma capacidade cerebral limitada.
Ademais, como aprendemos por associação, isto é, utilizando o que já sabemos para compreender o que desconhecemos, a leitura atenta e deliberada é o meio mais efetivo para lograr ocupar nossa percepção consciente em um pensamento, razoamento ou experiência, para meditar de maneira ponderada e repetida sobre temas mais complexos, para seguir nosso próprio ritmo de estudos e para estabelecer continuamente relações entre os conteúdos que estão diretamente vinculados.
De fato, o modo de acercar-nos mais diretamente ao conhecimento é através da leitura, o cenário mental donde se percebe com maior claridade os diferentes estilos de pensamento, assim como as ideias fundamentais geradas a partir deles. Imprescindível para uma formação sólida e duradoura, o hábito da leitura permite-nos não somente ter acesso ao próprio autor, senão que também constitui uma forma de viver dentro das palavras de outra pessoa.
Dito sem rodeios: o mais aconselhável é dedicar nosso valioso e limitado tempo (e energia) não a escutar aos demais, mas à pura e simples leitura. Devemos habituar-nos a conviver com os livros, a fazer um uso desmedido desses instrumentos com os que realizaremos em solitário a parte substancial de nosso aprendizado. “Os livros são companheiros, mestres, magos e banqueiros dos tesouros de la mente" (B. W. Tuckman) e sem eles estamos perdidos.
Com isso não queremos dizer, evidentemente, que há que ler por ler. Também com os livros há que ser seletivo. E algo desconfiado, pois nos encontramos em uma época em que “quase tudo” já faz parte dos objetos de cultura. Não é tão infrequente ouvir falar de um livro medíocre de um autor medíocre como se tratasse de um clássico vivente.
Quem não é consciente da notável proliferação de “gigantescos” livros jurídicos (especialmente para concursos) com escassa ou quase nenhuma discussão teórica de fundo ou de “grandes” obras dedicadas a anotações e/ou pobres comentários de textos de lei (e jurisprudências) de uso mais frequente? Como disse em certa ocasião Inocêncio Mártires Coelho, nesses “livros de ocasião, cujo peso vai aumentando a cada nova edição, em publicações que se sucedem a espaços de tempo sempre menores,... [os] textos de circunstância vão se transformando em páginas e páginas, a tal ponto numerosas, que mesmo os seus usuários habituais têm dificuldade crescente em localizar os dispositivos legais anotados...”, e às vezes, inclusive, o próprio conteúdo dos temas já estudados (ou a estudar).
E não se conhece nenhum sistema de pensamento que permita elaborar algo coerente a partir de tantas variáveis: o único que se sabe é que os alunos tentam memorizar o material de cada livro e o olvidam de imediato para liberar o espaço neurológico necessário para o próximo; quer dizer, aprendem muito pouco (R. Trivers). Porque não é o mesmo adquirir o conhecimento, a capacidade, a autoconfiança para reflexionar, para inquirir, para criar, para inovar e para aprender, que tentar acumular uma série fixada de dados que serão olvidados ao dia seguinte. O fato é que na atual “sociedade do espetáculo” em que vivemos há que ser muito cauteloso com os livros que estão “de atualidade”... e com as aparências.
Mas não somente isso. Se nos dedicamos a ler de forma fluída e com disposição autotélica (isto é, dedicada a uma atividade que vale a pena fazê-la por si mesma), com o tempo desenvolveremos o prazer de ler. E experimentá-lo é condição de outro prazer importante para nossos objetivos: o gosto pela escritura. Estamos falando de coisas elementares, que aprendemos na infância: ler e escrever. Hábitos, (não precisa insistir) essenciais para uma adequada preparação, uma vez que fomentar a plena capacidade de escrever, de expressar-se, de atuar, é uma eficaz ferramenta para refinar o pensamento.
Escrever insere-se na categoria de repetição elaborativa, porque ajuda a clarificar, a organizar e a expressar o que se está aprendendo. Constitui um dos modos mais efetivos para reforçar as informações significativas, assim como para associar e comparar temas novos ou desconhecidos com outros que já nos sejam familiares.
Assim que não há que retardar indefinidamente a tarefa de pôr-se a escrever: com a ação de escrever precisamos as ideias, advertimos que temos ideias confusas ou equivocadas e, o que é mais importante, também descobrimos em ocasiões que sabemos ou pensamos coisas que ignorávamos saber ou pensar. De resto, o aprendizado pela leitura e a escritura, por favorecer e exigir uma atividade mais ativa e comprometida da mente/cérebro, modifica com mais eficácia a estrutura e o funcionamento cerebral: "a leitura faz o homem completo;... o escrever, preciso." (Francis Bacon)
É verdade que sempre há algo de bem no pior mal e certa porção de mal no bem mais apreciado. Mas, em questão de estudo e aprendizado, somos os únicos responsáveis de ser como somos e fazer o que fazemos. E se o cérebro é uma “obra” em que somos seu sujeito, autor e resultado ao mesmo tempo, deveríamos começar por tentar reescrever nossas conexões neuronais, porque mínimas e valiosas variações ao começo do processo acarretam câmbios potencialmente gigantescos ao término.
Do contrário, renunciamos desempenhar o papel essencial, ativo, comprometido e carregado de responsabilidade sobre nosso próprio aprendizado e olvidamos deliberadamente a sentença de Mariano Baquero Goyanes: “Lo fundamental, lo esencial es leer y escribir, cualquiera que sea el modo. Mientras que la persona conserve el disfrute placentero por la lectura y la escritura, cualesquiera que sean las circunstancias que la rodean, conservará a la vez lo mejor de su condición humana”.
REFERÊNCIAS
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Capella, J. R. (2009). El aprendizaje del aprendizaje, Madrid: Editorial Trotta.
DiSalvo, D. (2011). What Makes your Brain Happy and why you Should do the Opposite, NY: Prometheus Books Publishers.
Fernandez, A. e Fernandez, M. (2013). “Concurso público e o inimigo interior. Fracasso, vontade e resistência”, São Paulo: Editora Biblioteca24horas.
Jensen, E. (1996) "Brain-Compatible Learning” International Alliance for Learning, Summer 1996, Vol. 3 #2. IAL, Encinitas, CA.
Malabou, C. (2007) ¿ Qué hacer con nuestro cerebro?, Madrid: Tiempo al Tiempo.
Marina, J. A. (2011). Pequeño tratado de los grandes vicios, Barcelona: Anagrama.
Mártires Coelho, I. (1997). Interpretação constitucional, Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor.
Restak, R. (2012). The Big Questions: Mind, Simon Blackburn (Editor), London: Quercus Publishing Plc.
Trivers, R. (2013). La insensatez de los necios, Madrid: Katz Editores.