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Proteção nacional e internacional do meio ambiente:

reflexões sobre a história da defesa constitucional e infraconstitucional brasileira

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3 Desenvolvimento constitucional brasileiro e vedação ao retrocesso.

Ao se refletir acerca de uma verdadeira e sólida efetivação à proteção ambiental dentro do território brasileiro, a Carta Republicana Cidadã de outubro de 1.988 inaugurou o esmero do legislador pátrio para com o meio ambiente como um todo. Essa atitude louvável do Poder Público nacional ocorreu depois de passados 487 anos da existência de lutas ferrenhas e constantes entre o poder econômico dominante, nacional e estrangeiro bem como, da classe política de então, desinteressada pelo desconhecimento da temática ambiental ainda pouco, isso para não dizer nada, compreendida. De acordo com Raul Machado Horta, a presente constituição “promoveu a incorporação do meio ambiente ao contexto constitucional, em decisão que não encontra precedentes nas Constituições que a precederam no Direito Constitucional Brasileiro”[36]. Neste passo, se demonstrará a partir deste momento que o Brasil ensaia uma singela proteção constitucional ao meio ambiente desde o período colonial o que, em verdade, se constituiu em importante conscientização para se chegar ao atual ponto em que se encontra.

A primeira constituição a reger o Brasil foi a imperial de 1.824[37]. No fim dos anos 1.700 e início dos anos 1.800 pairava no ambiente cultural do mundo europeu, ideias de cunho liberal as quais, surtiram grande influência no Brasil, já nos tempos de D. João VI. Com a volta da Família Real a Portugal e a regência de D. Pedro I, surgem no território brasileiro um ideal no sentido de se adotar uma constituição a fim de se regular a vida social, política e institucional. Em 1.823 a Assembleia Constituinte estava em pleno funcionamento, contudo foi dissolvida pelo Imperador, o que levou a criação de um Conselho de Estado que detinha a função de refazer outro projeto a ser submetido à apreciação das Câmaras, mas, D. Pedro I outorga a Carta de 1.824 antes que ela fosse referendada pelas mencionadas Câmaras. Das curiosidades desta constituição a primeira foi um quarto Poder chamado Moderador, que surgiu por intermédio de Benjamin Constant. De outra parte tratou-se de uma Constituição Semi-rígida, ou seja, “há que se ressaltar, portanto, a grande plasticidade e adaptabilidade do Texto Constitucional de 1.824”[38]. Finalmente, houve a introdução do Parlamentarismo que, de acordo com as palavras de Octaciano Nogueira[39]uma das notáveis qualidades desta Constituição foi a de “(...) permitir que um sistema político nele não previsto, o parlamentarista, fosse sendo paulatina e progressivamente adotado, à medida que se cristalizavam os costumes parlamentares (...) enquanto o País se civilizava”. Porém, sobre tudo, jamais poderá ser olvidado que foi sob sua regência que o Brasil conseguiu manter-se uno em um território de proporções continentais, além, de ter sido o texto constitucional de maior duração que o Brasil já possuiu, qual seja, 67 anos sete meses e 22 dias.

Dessa maneira, a Constituição do Império do Brazil, de 25 de março de 1.824, não teve nenhuma preocupação no que se refere ao meio ambiente e seus desdobramentos, segundo menciona Paulo de Bessa Antunes[40]. De outro lado, informa Luís Paulo Sirvinskas situação um pouco diferente, na qual, segundo este autor, “a Constituição de 1.824 e o Código Criminal de 1.830, na Monarquia, previam o crime de corte ilegal de árvores e a proteção cultural”[41]. Mesmo com essa ligeira, mas considerável, contradição de informações, deve-se ter em mente que naquela época, a humanidade não possuía os conhecimentos tecnológicos e culturais que, hoje, se possui e, por isso, sua preocupação não ultrapassava a das questões econômicas, uma vez que os abundantes recursos existentes, não pareciam poder acabar nem em um futuro longínquo.

De outro lado, há que levar também em consideração, que o Brasil era essencialmente exportador de produtos agrícolas e minerais[42]e, tinha como sentido norteador, o de que o Estado não deveria opinar nas questões econômicas, sendo, portanto, sem nenhuma utilidade que a Constituição destinasse qualquer atenção à economia. Assim, ao se juntar o desconhecimento, ainda que a legislação infraconstitucional tentasse timidamente cuidar do meio ambiente, com a ganância econômica que sempre arrebata os seres humanos, não haveria outra situação provável, que não, o desinteresse constitucional para o tema do meio ambiente, principalmente o meio ambiente natural.

Biologicamente a vida sempre encontra caminhos e recursos, com relativo sucesso, os quais, a princípio, não possuem qualquer ligação plausível para seu bom desfecho. Juridicamente não foi diferente, pois, no corpo desta mesma Constituição do Império do Brazil, de 25 de março de 1.824, encontra-se o artigo 169 que diz[43]:

TITULO 7º

Da Administração e Economia das Provincias.

CAPITULO II.

Das Camaras.

Art. 169. O exercicio de suas funcções municipaes, formação das suas Posturas policiaes, applicação das suas rendas, e todas as suas particulares, e uteis attribuições, serão decretadas por uma Lei regulamentar.

Com este dispositivo normativo constitucional, a vida pôde continuar. Lógico que nesta situação a continuidade se deu pelo meio jurídico e, não, biológico. Assim, as Câmaras dos municípios tiveram suas atribuições incrementadas por meio da “Lei de 1º de outubro de 1.828, que dá nova forma às Câmaras Municipais, marca suas atribuições e o processo para sua eleição e dos Juízes de Paz”[44]. No mesmo sentido, Raul Machado Horta[45].

Não se pode esquecer, entretanto, que no que se refere ao meio ambiente, esta lei tinha sua sistematização efetivada por intermédio das chamadas normas de posturas municipais as quais, poderiam ser encontradas em seu art. 66, entre elas e a título exemplificativo, há que se mencionar o §2º que dizia respeito ao esgotamento de águas de pântanos e demais águas infectas; sobre a limpeza de currais; sobre matadouros; sobre curtumes; sobre depósitos de imundícies e, o §4º “sobre as vozeiras nas ruas em horas de silêncio...”, etc.[46].

Como se vê, ainda que a Constituição Imperial brasileira não tenha se interessado pela temática ambiental, conforme preceitua Paulo de Bessa Antunes[47]ou, que pouco tenha se interessado, de acordo com Luís Paulo Sirvinskas[48], as regras de posturas das municipalidades, acabavam por se interessar, pois, caso se quisesse viver em condições mínimas de higiene, conforto e dignidade, teriam que, consciente ou inconscientemente tratar da temática em questão.

Geralmente ao se mencionar golpe de Estado dentro dos limites territoriais brasileiros, pensa-se logo nos militares em 31 de março de 1.964, ou, no máximo, alguém se lembra do golpe de Getúlio Vargas em 1.937 com a implantação da República Nova. O que ninguém se recorda, ou desconhece completamente, é que a Carta de 1.891[49]adveio com o golpe de Estado de 15 de novembro de 1.889 que destituiu o Imperador D. Pedro II e instituiu o modelo republicano e federativo no Brasil. Fato importante é que a proclamação da República não foi fruto de “grandes movimentações populares ou em uma parte da opinião pública”[50]foi, em verdade, “um movimento de tropas situadas no Rio de Janeiro, a que a nação limitou-se a assistir”[51]. Rui Barbosa, insubstituível pensador do Direito no Brasil, foi o responsável pela redação do primeiro ato jurídico da Revolução que levou ao Golpe 1.889, qual seja o Decreto nº. 1 que estabelecia provisoriamente o Brasil como República Federativa. “De outra parte houve a criação, pelo Governo Provisório, de uma comissão especial para elaborar o Anteprojeto de Constituição, composta de cinco membros passando a ser conhecida como ‘Comissão dos Cinco’”[52].

O grande significado da Lei Maior de 1.891 foi a de criar definitivamente no território nacional a Federação e a República o que, trouxe maiores esperanças a todos, uma vez que por obvio, se não acabou, ao menos diminuiu significativamente “as desigualdades oriundas da hereditariedade, as distinções jurídicas quanto ao status das pessoas, as autoridades tornaram-se representativas do povo e investidas de mandato por prazo certo”[53].

No que pertine ao Direito Ambiental Constitucional, foram conferidas ao legislador constituinte, instrumentos para começar a traçar as primeiras linhas no rumo de efetivas melhorias ambientais, ainda que estas tenham sido discretas. Desse modo, com a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 24 de fevereiro de 1.891, deu-se o primeiro passo constitucional concreto, rumo à conscientização ambiental. Isso se fez possível com o art. 34, item 29 que conferiu competência legislativa para que a União legislasse acerca do tema minas e terras[54]. A partir daí estava dado o primeiro passo por se ter o primeiro Texto Constitucional brasileiro da recém-inaugurada República voltado diretamente ao meio ambiente[55]:

Art. 34 - Compete privativamente ao Congresso Nacional:

(...)

29º) legislar sobre terras e minas de propriedade da União;

Falar sobre a Lei Maior de 1.934 é, conforme diz Celso Ribeiro Bastos[56]cuidar de dois pontos, quais sejam, “o extremo caráter compromissório assumido pelo Texto ante as múltiplas divergências que dividiam o conjunto das nossas forças político-ideológicas da época”[57]e “a curtíssima duração de sua vigência, visto que, promulgada em 1.934, estava condenada a ser abolida já em 1.937 pela implantação do Estado Novo”[58]. Relevante se torna mencionar que, não foi exatamente, ao contrário do que pela lógica se pensaria, o Texto Constitucional de 1.934 que pôs fim a Carta de 1.891, em verdade, com a Revolução de 1.930, esta anterior Constituição foi substituída pelo Decreto 19.398 de 11 de novembro de 1.930. A Lei Maior de 1.934 rompeu, portanto, com as práticas e costumes político-jurídicos de então, “sepultando a velha democracia liberal, instituiu a democracia social, cujo paradigma era a Constituição de Weimar”[59]. Ou seja, apesar de ter sido a constituição brasileira mais curta, isso não a impediu de trazer algumas mudanças para o cenário nacional, tais como o voto secreto e, o direito de as mulheres[60]o exercerem, o mandado de segurança, a ação popular[61], dentre outros. Entretanto, segundo também preceitua o mestre constitucionalista brasileiro Celso Ribeiro Bastos “do ponto de vista histórico, a Constituição de 1.934 não apresenta relevância. É no fundo, um instrumento circunstancial que reflete os antagonismos, as aspirações e os conflitos da sociedade daquele momento (...)”[62]. Por derradeiro, pede-se venia aos leitores para se citar literalmente outros dois trechos de Celso Ribeiro Bastos[63], pois por amor à didática ao se usar as palavras literais deste autor, passa-se maior intensidade e veracidade ao contexto deste trabalho, dessa maneira, tem-se que “a curta duração que teve não deve ser explicada pelos defeitos que trazia em si, mas, em verdade, pela radicalização do clima social de então” uma vez que “tanto a extrema esquerda quanto a extrema direita tornaram inviável a sua plena aplicação, gerando condições para que fosse possível o Golpe de 1.937”.

De outro lado, ao se tratar da proteção constitucional ao meio ambiente, o legislador constituinte de 1.934 foi além. Na nova Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 16 de julho de 1.934, o legislador instituiu, no art. 5º XIX, “j”, uma listagem com maiores competências para a União legislar. Por esta, era competência da União, legislar e explorar o subsolo, a mineração, a metalurgia, a água, a energia hidrelétrica, as florestas, a caça e a pesca. Desta forma tem-se o Texto Constitucional[64][65]:

Art. 5º - Compete privativamente à União:

(...)

XIX - legislar sobre:

(...)

j) bens do domínio federal, riquezas do subsolo, mineração, metalurgia, águas, energia hidrelétrica, florestas, caça e pesca e a sua exploração;

Passados três anos da normatização constitucional de 1.934, um Golpe de Estado que deu início ao denominado Estado Novo, garantiu a permanência de Getúlio Vargas na Presidência da República. A nova Carta com características autoritárias foi outorgada sob a inspiração do modelo fascista[66]então reinante. Segundo o magistério de Celso Ribeiro Bastos “não havia a divisão de poderes, embora existissem o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, visto que estes últimos sofriam nítidos amesquinhamentos”[67]como por exemplo, a retirada do Senado[68]e a colocação em seu lugar de um Conselho Federal além de ter o Presidente da República o poder de pô-lo em recesso e avocar para si todas as suas competências. Por sua vez, o Poder Judiciário[69]também perdeu a competência exclusiva para decretar inconstitucionalidade, esta, ao ser decretada, deveria passar sob o crivo do Poder Legislativo que por dois terços poderia rejeitá-la. Na mesma linha, ao ser decretado o estado de emergência ou de guerra, o Judiciário não poderia tomar conhecimento dos atos do Governo, conforme expunha o artigo 170. O curioso deste Texto Constitucional é que em termos jurídicos, conforme preceitua o constitucionalista Celso Ribeiro Bastos, nunca esteve em vigor, pois sua vigência decorria dos termos de seu artigo 187 que mencionava necessidade da existência de um plebiscito a ser regulado por decreto presidencial e, este, nunca ocorreu. Ou seja, em verdade, “o que prevaleceu nesta época foi o chamado Estado Novo, estado arbitrário despojado de quaisquer controles jurídicos, onde primava a vontade inconteste do ditador Getúlio Vargas”[70].

Ocorre, porém, que mesmo eivada de características de autoritarismo, a nova Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 10 de novembro de 1.937 deu continuidade à defesa do meio ambiente nacional, repetindo-se em sua quase totalidade o anterior art. 5º, XIX, “j” da Constituição de 1.934, todavia aqui, no art. 16, XIV suprimiu-se o dizer “riquezas do subsolo”. Assim, conforme o novo texto constitucional[71][72]teve-se:

Art. 16 - Compete privativamente à União o poder de legislar sobre as seguintes matérias:

(...)

XIV - os bens do domínio federal, minas, metalurgia, energia hidráulica, águas, florestas, caça e pesca e sua exploração;

A Segunda Guerra Mundial começava a demonstrar que se encaminhava para o final e com isso, Getúlio Vargas já vislumbrando os seus vencedores, buscou adequar nosso Direito Constitucional as modificações políticas do pós-guerra que despontavam como tendência. Dessa maneira, no início de 1.945, por intermédio da Lei Constitucional[73]nº. 9 foram introduzidas emendas à Constituição de 1.937. Fato de relevância era o de que esta Lei nº. 9 não possuía como fulcro uma nova constituição para o Brasil, mas, apenas modificar a já existente. Todavia, em 29 de outubro de 1.945 Getúlio Vargas cai e, com isso, a ideia inicial de emendar o Texto de 1.937 se transforma em uma reforma, o que efetivamente se concretiza com a edição da Lei Constitucional[74]nº. 13 de 12 de novembro de 1.945 a qual conferiu Poder Constituinte ao Parlamento de então e, no dia 2 de fevereiro de 1.946 é convocada a Constituinte.

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A Carta de 1.946 tinha como função, por termo ao autoritarismo que reinou no território nacional desde a década de 1.930 devolvendo a democracia e os direitos individuais aos brasileiros nos moldes dos regimes democráticos ocidentais, conforme ocorrera na Primeira República, é dizer, o Brasil conseguiria retomar suas origens deixando no passado o Estado Novo[75]. Segundo informa Celso Ribeiro Bastos “(...) do ponto de vista ideológico traçava nitidamente uma linha de pensamento libertário no campo político sem descurar da abertura para o campo social que foi recuperada da Constituição de 1934”[76]. Fato significativo desta nova Lei Maior é que volta a se vivenciar o sistema parlamentarista, o que ocorreu no ano de 1.961 com a Emenda a Constituição de nº. 4, de 2 de setembro deste ano[77].

A nova Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 18 de setembro de 1.946, além do retorno a democracia, deu continuidade à tradição brasileira de defesa do meio ambiente e, inclusive, em seu art. 5º, XV, l, retoma a expressão “riquezas do subsolo”, conforme os seguintes termos[78][79]:

Art. 5º - Compete à União:

(...)

XV - legislar sobre:

(...)

l) riquezas do subsolo, mineração, metalurgia, águas, energia elétrica, floresta, caça e pesca;

Com o Governo Militar instituído em 31 de março de 1.964, a Carta de 1.946 ainda que em vigor restou limitada pelo Ato Institucional nº. 1, de 9 de abril deste ano e que, por intermédio deste mesmo Ato Institucional convoca o Congresso Nacional “para a discussão e a aprovação de um novo texto enviado pelo governo”[80]. É de se notar que está a se tratar de uma constituição com perfil centralizador, tendo em vista que trouxe para a esfera federal uma gama de competências que pertenciam aos Estados Membros e aos Municípios e aumentou os poderes do Presidente da República, ademais, por mais que houvesse menção aos três Poderes estava certo que apenas o Executivo comandava[81]. “Os decretos-leis se tornaram uma arma poderosíssima diante de expressões vagas tais como: urgência e interesse público relevante, assim como (...) segurança nacional”[82]. Deu-se dessa maneira, em 24 de janeiro de 1.967, uma nova Constituição da República Federativa do Brasil que, apesar de ter sido promulgada nesta data, somente entrou em vigor em 15 de março do mesmo ano[83].

Da mesma maneira, que a Carta de 1.967, sua Emenda Constitucional nº 01 de 1.969, também deu continuidade à visão ambientalista do Estado brasileiro, como abaixo se vê[84][85]:

Art. 8º - Compete à União:

(...)

XII - organizar a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente a seca e as inundações;

(...)

XV - explorar, diretamente ou mediante autorização ou concessão:

(...)

b) os serviços e instalações de energia elétrica de qualquer origem ou natureza;

Paulo de Bessa Antunes assim se pronuncia acerca da Carta Constitucional de 1.967 e de sua Emenda nº 1[86]:

(...) Em termos de competência legislativa, naquela Carta, a União era dotada das seguintes: direito agrário; normas gerais de segurança e proteção da saúde; águas e energia elétrica.

A emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969, manteve os termos daquilo que foi acima apontado. Houve, entretanto, uma pequena mudança no que diz respeito às competências legislativas em relação à energia, que foi subdividida em, elétrica, térmica, nuclear ou de qualquer natureza.

Essa foi, portanto, a evolução do Direito Constitucional voltada para o meio ambiente. De certa forma poderia se dizer que teve um caráter eminentemente tímido, mas, que em verdade veio agregar com muito custo, avanços que hoje podem ser efetivados sem maiores dificuldades, bem como ampliados.

A grande transformação, entretanto, veio com a Carta Republicana de 05 de outubro de 1.988. Esta Constituição deu ao Brasil a grande e verdadeira transformação rumo à efetiva proteção constitucional ao meio ambiente saudável e efetivo para todos, brasileiros ou não. Não por outro motivo é conhecida como a Constituição Cidadã.

Da mesma maneira que a Carta de 1.946 o Texto de 1.988 teve início sem a existência de um Projeto preteritamente elaborado[87], o que em si não se trata de uma novidade jurídica uma vez que a Constituição portuguesa de 1.976, da mesma maneira, teve seu processo constituinte iniciado sem que houvesse um projeto específico anterior[88].

Foram criadas ao todo 24 subcomissões com a finalidade de iniciar a elaboração do futuro Texto que, em 25 de maio de 1.987 passou para uma fase posterior com apenas 8 comissões temáticas, agora sim, foram elaborados anteprojetos à Comissão de Sistematização[89]. Informa o estudioso do Direito Constitucional Celso Ribeiro Bastos que “em 25 de junho, o seu relator, Bernardo Cabral, apresenta um trabalho em que reúne como pode estes anteprojetos em uma só peça de 551 artigos, que acabou por ganhar o nome de ‘Frankenstein’”[90]. Em 26 de agosto de 1.987 o Relator apresenta na Comissão outro substitutivo, agora com 374 artigos, fruto de 122 emendas populares e outras 20.790 do plenário, é chamado de Cabral 1. Em 15 de setembro após a análise de 14.320 emendas a este substitutivo, a relatoria elabora outro substitutivo com 336 artigos, trata-se do Cabral 2 que, em 24 de setembro de 1.987 é votado pela Comissão de Sistematização e, assim se dá continuidade a tudo novamente[91]. Em 27 de janeiro de 1.988 o plenário finalmente se reúne para as primeiras votações do Texto Constitucional, entretanto, não há quórum suficiente e as votações são retomadas no dia seguinte quando são aprovados o preâmbulo e o Título I o que, em verdade somente teria fim em 05 de outubro de 1.988[92].

Claro que críticas poderiam ser levantadas uma vez que a proteção ao meio ambiente estaria resumida ao Capítulo VI do Título VII da Constituição de Cidadã[93], compreendida pelo seu único art. 225 conforme pode ser averiguado:

Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.

Conforme o magistério de Alexandre de Moraes, a afirmação de que “as nossas Constituições anteriores, diferentemente da atual que destinou um capítulo para sua proteção, com ele nunca se preocuparam”[94]. Ou seja, realmente de acordo com a atual Carta Republicana há apenas um capítulo com um artigo destinado à defesa ambiental, o que, de outro lado nunca houve nas constituições anteriores. O mesmo autor dando prosseguimento em seu raciocínio cita o mestre ambientalista Édis Milaré[95]no seguinte sentido:

Marco histórico de inegável valor, dado que as Constituições que precederam a de 1.988 jamais se preocuparam da proteção do meio ambiente de forma específica e global. Neles sequer uma vez foi empregada a expressão ‘meio ambiente’ a revelar total despreocupação com o próprio espaço em que vivemos.

Alexandre de Moraes faz o desfecho, acerca deste tema, afirmando que a atual constituição segue uma tendência contemporânea na busca da proteção dos interesses difusos dos cidadãos, todavia, com uma especial atenção com o tema meio ambiente, nos moldes do ocorrido em junho de 1.972 na Suécia, conforme a Declaração sobre o Ambiente Humano nos seguintes termos[96]:

O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar e é portador solene de obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente, para as gerações presentes e futuras.(...) O homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judiciosamente o patrimônio representado pela flora e fauna silvestres, bem assim o seu ‘habitat’, que se encontram atualmente em grave perigo, por uma combinação de fatores adversos. Em consequência, ao planificar o desenvolvimento econômico, deve ser atribuída importância à conservação da natureza, incluídas a flora e a fauna silvestre.

Com referência ao acima exposto temos que, primeiramente, ainda que seja apenas um artigo, há que se observar que se trata de um artigo, sem sobra de dúvida, completo. Em segundo lugar, de acordo com o aludido dispositivo da Lei Maior da República, todos e não apenas os brasileiros natos e naturalizados, possuem direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, uma vez que este se constitui em um bem comum do povo, propiciador da sadia qualidade de vida. Para tanto, cabe ao Poder Público e a sociedade civil a sua defesa e proteção, não apenas para seu próprio bem-estar, mas também ao de todas as gerações vindouras como, aliás, pode ser visto na transcrição acima da Declaração sobre o Ambiente Humano feita na Conferência Sueca de 1.972. Assim sendo, dentro dessa estruturação de normas constitucionais se encontrará mandamentos processuais, penais, econômicos, sanitários, tutelar administrativo e, de competência administrativa[97]. Por derradeiro, a proteção constitucional ao meio ambiente pode ser encontrada por toda sua extensão ou, de acordo com as palavras do mestre ambientalista Édis Milaré[98]“a Constituição de 1.988, em vários de seus dispositivos, cuidou dos recursos ambientais”, no mesmo sentido diz Paulo de Bessa Antunes[99]que “ao longo de diversos outros artigos, trata das obrigações da sociedade e do Estado brasileiro para com o meio ambiente” sendo ao todo, 2 artigos nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias e, outros 20 no corpo da Carta Maior da República propriamente dita, como pode ser conferido de acordo com o autor anteriormente citado[100]:

Em sede Constitucional, são encontráveis os seguintes pontos dedicados ao meio ambiente ou a este vinculados diretamente:

art. 5º, incisos XXIII, LXXI, LXXIII; art. 20, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, IX, X, XI e §§ 1º e 2º; art. 21, incisos XIX, XX, XXIII, alíneas a, b e c, XXV; art. 22, incisos IV, XII, XXVI; art. 23, incisos I, III, IV, VI, VII, IX, XI; art. 24, incisos VI, VII, VIII; art. 43, § 2º, IV e § 3º; art. 49, incisos XIV, XVI; art. 91, § 1º, inciso III; art. 129, inciso III; art. 170, inciso VI; art. 174, §§ 3º e 4º; art. 176 e §§; art. 182 e §§; art. 186; art. 200, incisos VII, VIII; art. 216, inciso V e §§ 1º, 3º e 4º; art. 225; art. 231; art. 232; e, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, os artigos 43 e 44 e §§.

Vale a pena, aqui, rever a afirmação anteriormente exposta, qual seja a de que todos e não apenas os brasileiros natos e naturalizados, possuem direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. De acordo com o artigo 225 da Carta Maior “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”[101]. Há que se ter em conta que em um documento da magnitude de uma Constituição não existem palavras postas ao acaso. O Brasil, país seguidor fiel das próprias leis, bem como das leis internacionais as quais se tornou signatário possui profundo respeito aos avanços dos Direitos Humanos em âmbito internacional, bem como, aos Direitos Fundamentais que esposou no corpo de seu Texto Primordial de 05 de outubro de 1.988. Nesse sentido temos o jurista brasileiro Luiz Flávio Gomes[102]que afirma que “o Estado brasileiro já não é só apenas um Estado de Direito constitucional: agora passou a ser também um Estado de Direito Internacional” que, encabeça o último estágio do Direito, o assim denominado Direito Universal. Desta maneira, com este tem-se um “Estado Constitucional e Humanista de Direito, que constitui, hoje, uma macrogarantia de proteção dos direitos humanos fundamentais frente ao exercício (ilegítimo) do poder”. No mesmo sentido encontra-se a obra encabeçada por Luiz Flávio Gomes e Valério de Oliveira Mazzuoli intitulada Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos[103]. De nossa parte, sempre acreditamos que o termo que melhor define esta ideia seria o do Estado Constitucional, Democrático e Multinormativo de Direito, uma vez que hoje não se tem apenas a Constituição, as leis, a jurisprudência e doutrina internas, a nos guiar pelos caminhos da democracia e da retidão, mas, também a legislação internacional e tudo que dela advier como, p. ex., os Tratados Internacionais de Direitos Humanos.

A Declaração sobre o Ambiente Humano fruto da Conferência de Estocolmo em 1.972 preceitua que “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna”[104]. A Declaração de direitos do homem e do cidadão de 26 de agosto de 1.789 preceitua em seu artigo 1º. que “os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum”[105], já a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1.948 menciona no artigo 2º de seu texto que “toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, (...), língua,(...) origem nacional ou social, (...) nascimento, ou qualquer outra condição”[106]e complementa em seu artigo 13 itens 1 e 2 que “toda pessoa tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado”[107]bem como que “toda pessoa tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a este regressar”[108]. Por derradeiro a Convenção Americana de Direitos Humanos, mais conhecida como Pacto de San José da Costa Rica preceitua na norma de seu artigo 1º itens 1 e 2 que “os Estados-partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e liberdades (...) a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma, por motivo (...) idioma, (...) origem nacional ou social(...)”[109]bem como define que “para efeitos desta Convenção, pessoa é todo ser humano”[110].

Como é facilmente perceptível, as legislações internacionais as quais o Brasil é signatário, são claras em declarar que não apenas os nacionais e os naturalizados são passíveis de direitos e liberdades civis, mas, sim, que qualquer ser humano que neste território nacional se encontrar tem o direito de desfrutar os direitos e de cumprir as leis, o que faz com que o preceito constitucional do artigo 225 que diz “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”[111]signifique que todo ser humano possui esse direito, independentemente de sua nacionalidade ou do lugar em que se encontre.

Frente ao exposto, tem-se que os Direitos Fundamentais/Direitos Humanos são uma construção constante, paulatina e irreversível, das sociedades humanas, conforme ditames[112][113]da teoria do efeito cliquet ou do princípio da vedação ao retrocesso. De nada adiantaria nascer livre e igual em direitos e obrigações, se, contudo, não se puder desfrutar da qualidade ambiental propiciadora de dignidade em qualquer lugar do planeta que se estiver. Não há como a boa qualidade do meio ambiente valer apenas para os nacionais ou naturalizados, sendo negada aos estrangeiros de passagem ou em férias, pois, principalmente estes últimos buscam no Brasil a tão propalada qualidade ambiental para seu lazer. Acerca da construção lenta e constante dos direitos fundamentais, Raul Machado Horta assim leciona[114]:

A recepção dos direito individuais no ordenamento jurídico pressupõe o percurso de longa trajetória, que mergulha suas raízes no pensamento e na arquitetura política do mundo helênico, trajetória que prosseguiu vacilante na Roma Imperial e Republicana, para retomar seu vigor nas ideias que alimentaram o cristianismo emergente, os teólogos medievais, o protestantismo, o renascimento e, afinal, corporifica-se na brilhante floração das ideias políticas e filosóficas das correntes de pensamentos dos séculos XVII e XVIII. Nesse conjunto, temos as fontes espirituais e ideológicas da concepção que afirma a precedência dos direitos individuais, inatos, naturais, imprescritíveis e inalienáveis do homem. Direitos oponíveis aos grupos, às corporações, ao Estado e ao poder político. Direitos Individuais e Direitos Humanos, identificados e incindíveis, pois o indivíduo, a pessoa, é, ontologicamente, o ser humano.

Portanto, para a defesa de nossas liberdades constitucionais inalienáveis, existe o princípio do efeito cliquet ou a chamada vedação ao retrocesso que garante que as conquistas humanitárias já solidificadas, não sejam deixadas de lado ou retrocedam nos momentos em que a emoção popular fale mais alto, exemplo disso são as conquistas ambientais constitucionais do artigo 225 da Constituição Federal de 1.988 e demais artigos da mesma Carta ou dos documentos internacionais aos quais o Brasil aderiu.

O constitucionalista Alexandre de Moraes[115], explica, se utilizando da classificação de Raul Machado Horta[116], que “para possibilitar a ampla proteção a Constituição Federal previu diversas regras divisíveis em quatro grandes grupos” os quais são divididos em regras de garantia, de competência, geral e específica. Continua ainda o mencionado autor dizendo que[117]:

Tais regras consagram constitucionalmente o direito a um meio ambiente saudável, equilibrado e íntegro, constituindo sua proteção, conforme reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, “prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social”.

Dessa maneira, como acima mencionado, de forma pulverizada dentro do Texto Constitucional, vários instrumentos na busca da mais completa proteção ambiental por parte do Estado a todos que nele se encontre e, sua concretização pode ser vislumbrada da seguinte maneira: 1) regra de garantia[118]existente na norma do inciso LXXIII do artigo 5º., a qual nos dá fundamentação constitucional para a impetração da Ação Popular. Por ela, todo cidadão poderá adentrar com esta ação, na busca de se anular ato lesivo, visando à proteção ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Importante é não se esquecer de que este dispositivo engloba tanto o meio ambiente natural como o artificial; de outro norte, 2) as regras de competência[119]são visualizadas dentro dos dispositivos dos artigos 23, III, IV, VI e, VII; juntamente com o 24, VI, VII e VIII; e o 129, III, todos da Carta Maior de 05 de outubro. O primeiro dispositivo (art. 23) nos traz a competência administrativa comum entre a União, Unidades Federativas, Distrito Federal e Municípios para a proteção dos patrimônios naturais e artificiais, sendo eles materiais ou imateriais, é dizer, caberá a todos estes entes a proteção administrativa aos “documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos”[120], devendo-se além disso “impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural”[121]; e “proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”[122]; bem como “preservar as florestas, a fauna e a flora”[123]. No segundo dispositivo tem-se a competência legislativa concorrente entre a União, Estados Membros e o Distrito Federal, buscando proteger as “florestas, a caça, a pesca, a fauna, conservação da natureza, a defesa do solo e dos recursos naturais, a proteção do meio ambiente e o controle da poluição”[124]; visando ainda “a proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico”[125]; bem como a “responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico”[126]. Por último, cabe ao Ministério Público, em virtude de sua função institucional “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”[127].

Também são encontradas no corpo constitucional 3) as regras gerais[128]que, tratam acerca 3.a) da ordem econômica e do desenvolvimento sustentável[129]; 3.b) da responsabilização penal da pessoa jurídica[130]; 3.c) do cooperativismo e desenvolvimento sustentável[131]; 3.d) da função social da propriedade e desenvolvimento sustentável[132]; 3.e) da proteção ao meio ambiente do trabalho[133]; 3.f) do patrimônio histórico-cultural material e imaterial[134]e; 3.g) das terras indígenas tradicionais[135]. Com base nestes dispositivos, é que existem diversos princípios difusamente estabelecidos visando conferir alicerce a preservação do meio ambiente em suas diversas faces; por último há as 4) regras específicas[136]insculpidas no artigo 225. De acordo com esta norma, tem-se assim que a degradação ambiental em virtude da exploração mineral demanda sua posterior recuperação; que resultará em responsabilidade penal à pessoa jurídica; que cabe ao Poder Público, p. ex., responsabilidades como a de preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País etc.

Ou seja, há que se admitir, também, que além de o direito ao meio ambiente saudável estar exposto de maneira enxuta em um artigo e espalhado por todo corpo constitucional ele não se resume unicamente aos conceitos de Direito, sendo que para estudá-lo e, verdadeiramente compreendê-lo é necessário fazer-se uso da interdisciplinaridade da estrutura do conhecimento humano, conforme abaixo se expõe[137]:

(...) A adequada compreensão do capítulo e dos dispositivos Constitucionais voltados para o meio ambiente exige uma atenção toda especial para disciplinas que não são jurídicas. Em realidade, toda uma série de conceitos pertencentes à Geografia, à Ecologia, a Mineralogia etc. são extremamente importantes para que se compreenda a verdadeira dimensão da norma inserida na Constituição. Dessa forma, o profissional do Direito que pretenda encaminhar-se para o estudo do Direito Ambiental não deve, e não pode, restringir-se ao mero jurisdicismo.

(...) Vê-se, com clareza que há, no contexto constitucional, um sistema de proteção ao meio ambiente que ultrapassa as meras disposições esparsas. Faz-se necessário, portanto, que as normas ambientais sejam consideradas globalmente, levando-se em conta as suas diversas conexões materiais e de sentido com outros ramos do próprio Direito e com outras áreas de conhecimento.

Édis Milaré[138], ao mencionar o artigo 225 da Carta da República de 1.988, afirma que o meio ambiente possui caráter patrimonial. Ou seja, esse caráter é facilmente perceptível uma vez que o constituinte confere extremado valor ao meio ambiente como patrimônio de todos os brasileiros no presente, não se olvidando que também terá o mesmo valor no futuro. No mesmo sentido a Declaração sobre o Ambiente Humano[139]de junho de 1.972 na Conferência das Nações Unidas em Estocolmo na Suécia.

Portanto, está claro que a Constituição da República traz em todo seu corpo e, não apenas no artigo 225, instruções normativas buscando com que o Estado, em todas as suas esferas, efetivamente proteja o meio ambiente que é patrimônio vivo de todos os brasileiros natos, naturalizados, bem como de toda a humanidade.

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Sobre o autor
Raphael Ricardo Menezes Alves Vieira

Advogado OAB/MS sob o Número de Inscrição 9165<br>Membro da Comissão de Meio Ambiente da OAB/MS<br>Pós Graduado em Direito Ambiental e Urbanístico<br>Pós Graduado em Direito Eleitoral.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, Raphael Ricardo Menezes Alves. Proteção nacional e internacional do meio ambiente:: reflexões sobre a história da defesa constitucional e infraconstitucional brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3932, 7 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27251. Acesso em: 22 nov. 2024.

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