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Uniformização da jurisprudência no sistema recursal

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11. Alterações apresentadas ao PLNCPC

CAPÍTULO XV

DO PRECEDENTE JUDICIAL

Art. 520. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

§ 1º Na forma e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.

§ 2º É vedado ao tribunal editar enunciado de súmula que não se atenha às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.

Art. 521. Para dar efetividade ao disposto no art. 520 e aos princípios da legalidade, da segurança jurídica, da duração razoável do processo, da proteção da confiança e da isonomia, as disposições seguintes devem ser observadas:

I – os juízes e tribunais seguirão as decisões e os precedentes do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

II – os juízes e tribunais seguirão os enunciados de súmula vinculante, os acórdãos e os precedentes em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;

III – os juízes e tribunais seguirão os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

IV – não sendo a hipótese de aplicação dos incisos I a III, os juízes e tribunais seguirão os precedentes:

a) do plenário do Supremo Tribunal Federal, em controle difuso de constitucionalidade;

b) da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em matéria infraconstitucional.

§ 1º O órgão jurisdicional observará o disposto no art. 10 e no art. 499, § 1º, na formação e aplicação do precedente judicial.

§ 2º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.

§ 3º O efeito previsto nos incisos do caput deste artigo decorre dos fundamentos determinantes adotados pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado.

§ 4º Não possuem o efeito previsto nos incisos do caput deste artigo os fundamentos:

I – prescindíveis para o alcance do resultado fixado em seu dispositivo, ainda que presentes no acórdão;

II – não adotados ou referendados pela maioria dos membros do órgão julgador, ainda que relevantes e contidos no acórdão.

§ 5º O precedente ou jurisprudência dotado do efeito previsto nos incisos do caput deste artigo poderá não ser seguido, quando o órgão jurisdicional distinguir o caso sob julgamento, demonstrando fundamentadamente se tratar de situação particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica não examinada, a impor solução jurídica diversa.

§ 6º A modificação de entendimento sedimentado poderá realizar-se:

I – por meio do procedimento previsto na Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de 2006, quando tratar-se de enunciado de súmula vinculante;

II – por meio do procedimento previsto no regimento interno do tribunal respectivo, quando tratar-se de enunciado de súmula da jurisprudência dominante;

III – incidentalmente, no julgamento de recurso, na remessa necessária ou na causa de competência originária do tribunal, nas demais hipóteses dos incisos II a IV do caput.

§ 7º A modificação de entendimento sedimentado poderá fundar-se, entre outras alegações, na revogação ou modificação de norma em que se fundou a tese ou em alteração econômica, política ou social referente à matéria decidida.

§ 8º A decisão sobre a modificação de entendimento sedimentado poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.

§ 9º O órgão jurisdicional que tiver firmado a tese a ser rediscutida será preferencialmente competente para a revisão do precedente formado em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas, ou em julgamento de recursos extraordinários e especiais repetitivos.

§ 10. Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante, sumulada ou não, ou de precedente, o tribunal poderá modular os efeitos da decisão que supera o entendimento anterior, limitando sua retroatividade ou lhe atribuindo efeitos prospectivos.

§ 11. A modificação de entendimento sedimentado, sumulado ou não, observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.

Art. 522. Para os fins deste Código, considera-se julgamento de casos repetitivos a decisão proferida em:

I – incidente de resolução de demandas repetitivas;

II – recursos especial e extraordinário repetitivos.

Parágrafo único. O julgamento de casos repetitivos tem por objeto questão de direito material ou processual. (Fonte:http://pauloteixeira13.com.br/wp-content/uploads/2014/03/REDACAO-FINAL-PL-6025-2005.pdf)

Entende-se que o capítulo do precedente jurisprudencial é um dos mais importantes dispositivos do Projeto. Pode-se dizer que é um dos seus pilares. O texto vem ao encontro do pensamento atual sobre o tema, porquanto os tribunais pátrios têm o dever de uniformização e o dever de velar pela estabilidade da jurisprudência.

Há tempos se debatia sobra a efetividade de reformas pontuais do Código de Processo Civil e a necessidade de formulação de uma nova lei processual à luz da Constituição Federal para o contingenciamento da litigiosidade.

Tanto é verdade, que se pode constatar a receptividade da doutrina do precedente no direito processual pátrio a partir de determinadas reformas (art. 102, § 2º e art. 103-A, CF; art. 285-A, 518, § 1º, 543-A e 543-B, todos do CPC).

A partir de tal panorama reformista no direito brasileiro, no primeiro semestre de 2009, uma Comissão de Juristas foi instituída pelo Ato do Presidente do Senado Federal nº 379/2009, destinada a elaborar o Anteprojeto de Novo Código de Processo Civil.  Essa Comissão foi presidida pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luiz Fux, com relatoria-geral de Teresa Arruda Alvim Wambier e composto também pelos seguintes juristas: Adroaldo Furtado Fabrício, Benedito Cerezzo Pereira Filho, Bruno Dantas, Elpídio Donizetti Nunes, Humberto Theodoro Junior, Jansen Fialho de Almeida, José Miguel Garcia Medina, José Roberto dos Santos Bedaque, Marcus Vinícius Furtado Coelho e Paulo Cezar Pinheiro Carneiro.

 Referida Comissão entregou no dia 08 de Junho de 2010 o seu trabalho final, que deu início ao Projeto de Lei nº. 166/2010 (“Novo CPC”). Na exposição de motivos, a valorização da jurisprudência (ou do precedente) é declarada como um fator determinante na elaboração de um novo Código:

“Mas talvez as alterações mais expressivas do sistema processual ligadas ao objetivo de harmonizá-lo com o espírito da Constituição Federal, sejam as que dizem respeito a regras que induzem à uniformidade e à estabilidade da jurisprudência. O novo Código prestigia o princípio da segurança jurídica, obviamente de índole constitucional, pois que se hospeda nas dobras do Estado Democrático de Direito e visa a proteger e a preservar as justas expectativas das pessoas. (...) Se todos têm que agir em conformidade com a lei, ter-se-ia, ipso facto, respeitada a isonomia. Essa relação de causalidade, todavia, fica comprometida como decorrência do desvirtuamento da liberdade que tem o juiz de decidir com base em seu entendimento sobre o sentido real da norma. A tendência à diminuição do número de recursos que devem ser apreciados pelos Tribunais de segundo grau e superiores é resultado inexorável da jurisprudência mais uniforme e estável. Proporcionar legislativamente melhores condições para operacionalizar formas de uniformização do entendimento dos Tribunais brasileiros acerca de teses jurídicas é concretizar, na vida da sociedade brasileira, o princípio constitucional da isonomia.”

Cassio Scarpinella Bueno - acerca do precedente jurisdicional e o processo civil da atualidade - ressalta que “Não é o caso, aqui, de criticar ou elogiar estas modificações legais ou constitucionais. Suficiente, também aqui, a constatação desta nova realidade normativa, deste novo “padrão” da norma jurídica, para compreender como se deve pensar hoje o direito processual civil. Seja porque determinadas decisões têm efeitos vinculantes, seja, quando menos, porque têm efeitos “meramente persuasivos”; nunca para a experiência jurídica nacional, foi tão importante saber como eles vão decidir nos sucessivos ‘novos” casos que lhes são apresentados para julgamento. O que vale destacar é que cresce cada vez mais a tendência do direito processual civil brasileiro a lidar com “precedentes jurisdicionais”, assim entendidas como gênero as expressões usadas com frequência pela lei processual civil brasileira, a “jurisprudência dominante” e as ‘súmulas”.

Essa tendência, inegável na atuação do Supremo Tribunal Federal de mais de quarenta anos e, mais recentemente, assumida expressamente nas novas regras de direito processual civil e que se mostra irreversível até como assunção de um novo e necessário trabalho nos Tribunais em virtude do enorme acúmulo de trabalho, leva o processualista a ter que compreender adequadamente o que é e o que não é um “precedente jurisdicional” e sua carga normativa correspondente. E mais do que isto: ciência do que é trabalhar com “precedentes”, com “súmulas” ou, de forma mais ampla, com “jurisprudência”. Não é correto, por exemplo, “interpretar” os meros enunciados das Súmulas como se fossem “leis”, esquecendo-se, nestes casos, do que realmente importa quando se trata de um precedente jurisprudencial: verificar em que medida, no caso atual, o caso que será julgado, mostram-se suficientemente presentes as mesmas condições fáticas e jurídicas que, presentes, levaram à decisão do caso pretérito. E mesmo que se tratasse da interpretação de uma “lei’, não há como fechar os olhos às considerações apresentadas pelos números anteriores.

O fato é que cada vez mais a existência de “precedentes jurisdicionais” tem sido responsável pela produção de efeitos para dentro do processo e, como tais, eles não podem, desde sua gênese, até sua aplicação diuturna, passando, evidentemente, por suas inevitáveis transformações, ser olvidados por quem se predispõe a estudar o direito processual como um todo.

Se, como relação ao tema, há ecos de “segurança jurídica” ou de “isonomia” – princípios constitucionais prestigiados pela Constituição Federal -, a dificuldade em se aceitar este novo padrão reside em verificar que, diferentemente do que sempre se deu no direito processual civil brasileiro, cada vez mais o julgamento de uns poucos casos têm condições de vincular (de forma mais ou menos intensa; com ânimo de obrigatoriedade, ou não) o resultado de outros futuros. A dificuldade deve ser sublinhada mesmo quando o “ser afetado” pela decisão pretérita significa, quando menos, que o procedimento a ser adotado para resolução de uma nova demanda sofrerá alterações profundas justamente em face do que já se decidiu em demanda anterior.” (Curso sistematizado de direito processual civil : teoria geral do direito processual civil, vol. 1 / Cassio Scarpinella Bueno. – 7. ed. rev. e atual. – São Paulo : saraiva, 2013). 


13. Conclusão

A reforma legislativa é a maneira mais segura de afirmar os conceitos lançados na Emenda Constitucional nº 45/2004, o que permite mais segurança para a população em geral, mais eficiência na prestação jurisdicional, bem como nas relações financeiras, comercias e econômicas.

Mauro Cappelletti adverte para a necessidade de se adaptarem os espíritos dos operadores do direito, sob pena de nada valerem as reformas (DINAMARCO, 1996, p. 4).

É possível afirmar que o direito brasileiro passa por um período singular de transição e necessária aproximação com o sistema da common law e o respeito ao precedente judicial, em razão da urgente necessidade de contingenciamento litigioso. O Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, ao inovar, por exemplo, com o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, poderá assegurar maior respeito ao precedente judicial, atribuindo-lhe eficácia vinculante nos casos de igual questão de direito, sendo possível a aplicação de uma tese jurídica universalizável (a ratio decidendi).

Por todo exposto, evidencia-se que insegurança jurídica e a constante modificação de jurisprudência não correspondem aos preceitos constitucionais de acesso à justiça, da garantia da duração razoável do processo (celeridade processual), estabilidade e segurança jurídica, igualdade, dignidade da pessoa humana e com o princípio da confiança.

Logo, observa-se que os precedentes vinculantes representam o melhor modelo constitucional que processo civil busca alcançar, além de representarem mais estabilidade e segurança jurídica para a sociedade e um sistema coerente.

Defende-se a uniformização de jurisprudência nos tribunais, cuja finalidade é propiciar maior certeza na aplicação do direito.

Para finalizar, transcreve-se a ementa do AgRg nos embargos de divergência em REsp nº 228.432/RS, da lavra do Min. Humberto Gomes de Barros que demonstra a preocupação e a necessidade em se observar a jurisprudência. Vejamos:

“O Superior Tribunal de Justiça foi concebido para um escopo especial: orientar a aplicação da lei federal e unificar-lhe a interpretação, em todo o Brasil. Se assim ocorre, é necessário que sua jurisprudência seja observada, para se manter firme e coerente. Assim sempre ocorreu em relação ao Supremo Tribunal Federal, de quem o STJ é sucessor, nesse mister. Em verdade, o Poder Judiciário mantém sagrado compromisso com a justiça e a segurança. Se deixarmos que nossa jurisprudência varie ao sabor das convicções pessoais, estaremos prestando um desserviço a nossas instituições. Se nós - os integrantes da Corte - não observarmos as decisões que ajudamos a formar, estaremos dando sinal, para que os demais órgãos judiciários façam o mesmo. Estou certo de que, em acontecendo isso, perde sentido a existência de nossa Corte. Melhor será extingui-la.

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4. Bibliografia.

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Notas

[1]. in Comentários ao Código de Processo Civil, José Carlos Barbosa Moreira, op. cit., p. 10.

[2]. Sem embargo do teor literal do dispositivo, que parece limitar à hipótese do inciso II a possibilidade de provocação da parte, inclinamo-nos a admiti-la também no tocante às causas de competência originária do tribunal. Não é suficiente para justificar a opinião contrária a consideração de que o requerimento da parte necessariamente pressuporia divergência jurisprudencial já configurada antes do julgamento. Basta ver que, mesmo em causa de competência originária, a existência do dissídio bem pode ser apurável a priori: assim, quando se tenha de enfrentar quaestio iuris a cujo respeito haja pronunciamentos discrepantes, anteriores, de órgãos distintos do tribunal.

Em semelhante perspectiva, a expressão parte, no parágrafo único, abrangerá quem quer que ocupe tal posição no processo de competência originária: autor, réu, qualquer dos litisconsortes ativos ou passivos, se for o caso, e o próprio assistente, que no sistema do Código é sem dúvida parte, embora não parte principal, e exerce os mesmos poderes do assistido (art. 52, caput). ( in Comentários ao Código de Processo Civil, op. cit., p,. 16).

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Sobre a autora
Janine Paula Guimarães Calmon Cézar

Mestranda em Direito pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CÉZAR, Janine Paula Guimarães Calmon. Uniformização da jurisprudência no sistema recursal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3935, 10 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27409. Acesso em: 24 abr. 2024.

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