Sumário: 1. Apresentação; 2. Preliminares; 3. O tratamento dado ao erro jurídico-penal; 3.1. Erro de tipo; 3.2. Erro de proibição; 3.2.1. Espécies de erro de proibição; 4. O Garantidor no Código Penal Brasileiro; 5. O erro do Garantidor: erro de tipo ou erro de proibição?; 6. Conclusão; 7. Bibliografia, 8.Notas
1. Apresentação
Ao tratarmos do erro em matéria penal, estamos sempre por debater um assunto por demais nebuloso dentro da órbita jurídica.
Adequar um caso concreto a uma espécie de erro jurídico-penal prevista pelo nosso código (erro de tipo e erro de proibição) nem sempre é tarefa fácil. A dificuldade se mostra maior quando o assunto se volta a dois casos particulares: o erro relacionado às causas excludentes da ilicitude em suas modalidades putativas e o erro relacionado à posição de garante.
Diante deste segundo caso, em relação ao garantidor, a adequação fica mais prejudicada por falta de tipo expresso disciplinando tal situação, cabendo à doutrina e à jurisprudência o exame do tema. Aí reside o problema, uma vez que não há pacificação quanto à questão. Há quem afirme que o erro que vicia a vontade do garantidor seja erro de tipo. Não obstante, a posição majoritária é no sentido de determinar sempre como erro mandamental, espécie do gênero erro de proibição, o erro incidente no atuar do garantidor. A controvérsia existe e, conseqüentemente, a dúvida permanece.
No presente trabalho, analisaremos os aspectos relevantes acerca dos erros de tipo e proibição e sua relação posição do garante, fazendo análises de conceitos essenciais ao debate do tema. Outrossim, faremos referência às teorias que a eles possam se relacionar, tentando com isso determinar qual espécie de erro pode influenciar os desígnios do garantidor.
2. Preliminares
Segundo a teoria causal clássica da ação de Franz von Liszt e Ernest von Beling, ação seria toda causa voluntária ou não impeditiva de uma modificação no mundo exterior. Dentro deste entendimento, foram detectados por Welzel, em relação à ação humana, dois segmentos distintos: "o querer interno do agente e o processo causal visível"[1]. Estariam, de acordo com orientação dessa teoria, na culpabilidade todos os elementos subjetivos do crime, entre eles o dolo e a culpa. Os elementos objetivos, por sua vez, encontrar-se-iam no injusto.
Posteriormente Welzel reformula a teoria causal da ação, acrescentando-lhe a nota da voluntariedade, afirmando ser a ação uma "causalidade dirigida"[2]. Com isso explicava o referido autor que nem toda causa modificativa do mundo exterior poderia ser considerada "ação" aos olhos do Direito Penal. Deveras, só aquela modificação do mundo exterior que fosse produto de um ato humano dominado ou dominável pela vontade de atingir um determinado fim, lícito ou ilícito, e que tivesse potencialidade de causar um dano, poderia vir a ser relevante ao Direito Criminal. Fora da esfera da voluntariedade ou do dano potencial o fato seria penalmente irrelevante.
Com a afirmação de que ação é ato dirigido a um fim, um comportamento essencialmente voluntário, Welzel retirava o dolo e a culpa da culpabilidade, trazendo-os para a ação, e conseqüentemente, para o interior do tipo penal, o qual descreve abstratamente a conduta proibida. Esta mudança de localização decorre do fato de existir tanto no dolo quanto na culpa o elemento vontade: no dolo a vontade está na intenção de se alcançar um fim ilícito; na culpa o fim almejado pelo agente é lícito, mas os meios empregados para alcançá-lo é que são contrários ao direito, residindo a vontade justamente na causação de uma conduta ilícita previsível, embora não desejada.
Seguindo os rastros da teoria causal da ação, surgem as teorias do dolo (limitada e extremada), afirmando que o dolo e a culpa integravam a culpabilidade, e esta, por seu turno, teria como pressuposto a imputabilidade. O dolo, para essas teorias, era composto por um elemento normativo, que seria a consciência da ilicitude do fato, e outro volitivo: a vontade de se alcançar o fim ilícito. A diferença entre as duas teorias estava apenas no estado de atualidade ou potencialidade da consciência da ilicitude. Na teoria extremada necessitava-se de uma consciência atual da ilicitude do fato para se determinar a existência do dolo. Para a teoria limitada, entretanto, a consciência da ilicitude pelo agente no momento da prática do fato delituoso era desnecessária, desde que fosse possível atingi-la por meios simples e idôneos. Tratava-se de uma potencial consciência da antijuridicidade do fato.
De acordo com o finalismo de Welzel, o dolo seria caracterizado por dois elementos, mas não um volitivo e outro normativo, como propunham as teorias do dolo.
Para o referido autor, possui o dolo um elemento cognitivo, que é a consciência do fato constitutivo da ação típica, e um elemento volitivo, qual seja a vontade de realizá-la, onde o primeiro elemento é pressuposto de existência do segundo. Forma-se um dolo naturalístico. O elemento normativo "potencial consciência da ilicitude do fato", que segundo as teorias do dolo dele fazia parte, restou na culpabilidade, compondo sua estrutura juntamente à exigibilidade de conduta diversa e à imputabilidade. A essa nova concepção da culpabilidade foi dado o nome de teoria normativa pura da culpabilidade, uma vez que apenas era integrada por elementos normativos.
Desse entendimento, surgiram duas teorias acerca da culpabilidade, a extremada e a limitada, que apenas divergiam quanto ao erro referente às causas de justificação. Por não tratar de objeto do presente trabalho, não abordaremos tais teorias.
O importante a lembrar é que, hodiernamente, a potencial consciência da ilicitude é elemento aparte ao dolo, estando este no tipo penal e aquela na culpabilidade.
3. Tratamento dado ao erro jurídico-penal
Entende-se por erro um estado que vicia a vontade do agente de forma tal que este é levado à prática de uma ação em princípio não querida. Jimenez de Asúa distingue o erro da ignorância dizendo que "a ignorância supõe a falta absoluta de toda representação e consiste em uma inteira ausência de noção sobre um objeto determinado, é um estado negativo. O erro, por sua vez, é uma idéia falsa, uma representação errônea de um objeto certo, é um estado positivo. São, portanto, momentos psicológicos distintos"[3]. A ignorância seria um erro absoluto.
A dúvida, todavia, não é abrangida pelo erro, já que nela, uma das representações do agente é verdadeira. Como exemplifica Soler: "o caçador que duvida se o que vê é um animal ou um homem e, apesar desta dúvida, dispara, não obra em erro". A dúvida, até porque coincide em inúmeros casos com a figura do dolo alternativo, não pode, então, ter o mesmo tratamento dado ao erro; não exclui o delito ou um de seus elementos, serve apenas quando da dosimetria da pena [4].
O erro pode ainda ser provocado por terceiro, dolosa ou culposamente, respondendo o provocador por dolo ou culpa, conforme seja o caso (art. 20, §2º, CP)[5]. Pode também ser escusável ou inescusável, ou seja, que isenta ou não o agente de uma pena. Entretanto essa característica só poderá ser determinada com a análise particular de cada caso concreto.
Várias circunstâncias podem levar o agente a atuar em erro. Em princípio, cada circunstância que vicie a vontade do agente dá origem a um erro específico (erro de tipo, erro de proibição, erro na relação de causalidade - aberratio causae, erro quanto à pessoa, erro na execução – aberratio ictus etc.), e cada um deles teria um tratamento. Contudo, a principal divisão feita quanto às espécies de erro é a bipartida, que reconhece primordialmente o erro de tipo e o erro de proibição, sendo os demais subespécies destes.
De acordo com as concepções das teorias do dolo, onde a consciência da ilicitude faz parte de sua estrutura, os efeitos decorrentes dos dois tipos de erros seriam os mesmos: o erro de tipo excluiria o dolo, sua característica peculiar; e o erro de proibição também o excluiria, já que tal espécie de erro exclui a consciência de antijuridicidade, e sendo esta elemento essencial do dolo, sua eliminação acarretaria numa descaracterização lógica deste.
Entretanto, com a nova concepção de conduta punível revelada pela teoria finalista da ação, os efeitos do erro dependerão de seu objeto. Se o erro incidir sobre elemento do tipo penal, ocorrerá o erro de tipo. Porém, se o erro se referir à potencial consciência da ilicitude do fato, tratar-se-á de erro de proibição[6].
O Código Penal, adepto às modernas características de um direito penal da culpabilidade, adota a concepção finalista da ação, reconhecendo a existência do erro de tipo, que exclui o dolo da ação (art. 20, CP), e o erro de proibição, que pode escusar da pena o agente se for inevitável (art.21, CP). Configuram-se erros distintos, com objetos diferentes e efeitos diversos
Analisemos tais espécies de erros.
3.1 Erro de tipo
No regime anterior da Parte Geral do Código Penal, usava-se a expressão "erro de fato", que abrangia apenas os elementos factuais da figura típica. Sabe-se, porém, que o tipo contém, ora sim ora não, elementos normativos, de caráter jurídico, revelando-se insuficiente o "erro de fato", o qual não conseguia abarcar todos os elementos da figura típica[7].
A expressão "erro sobre elementos do tipo" passou a ser adotada, e por sua amplitude engloba tanto os elementos factuais quanto os normativos. Não se tratou de modificação meramente terminológica, mas de caráter essencial.
Do exposto, pode-se dizer que erro de tipo é todo aquele que recai sobre qualquer elemento constitutivo do tipo penal (incriminador ou permissivo), seja ele referente às condições fáticas ou normativas da conduta abstratamente descrita na lei penal.
Como o dolo e a culpa são elementos do tipo, a factualidade típica do comportamento há de resolver-se no plano da tipicidade[8], ou seja, o erro que exclui o dolo é um erro quanto à tipicidade do fato, é, portanto, erro de tipo. Quando um agente atua nesta espécie erro, desaparece de sua esfera intelectiva o elemento consciência, constitutivo do dolo natural, resultando sua necessária descaracterização.
Entretanto, há de se observar a existência de duas espécies de erro de tipo: o essencial e o acidental.
Erro de tipo essencial é aquele que recai sobre qualquer elemento do delito que seja essencial a sua subsistência; o agente atua sem ter o elemento cognitivo do dolo, por isso ocorre a exclusão deste. Por outro lado, se permite a punição do agente pela modalidade culposa, quando prevista em lei, já que não se altera a essência do tipo subjetivo nem se interfere na caracterização da culpabilidade. É exemplo elucidativo alguém que, querendo matar o cachorro incômodo do vizinho, vem a assassinar o filho deste, movido por erro decorrente da falta de luminosidade. Ocorre aqui um erro de tipo concernente ao elemento cognitivo do dolo, pois o agente não possuía o conhecimento de que estava a agir contra uma criança, alguém, elemento essencial ao delito de homicídio, que não é alcançado pela intenção do sujeito ativo. Exclui-se, nesse caso, o dolo, mas se permite a punição do agente em nível de homicídio culposo, previsto em lei, devido à inobservância do dever geral de cuidado.
Segundo Toledo[9], erro de tipo acidental é aquele que incide sobre circunstâncias acessórias ou estranhas ao tipo, sem as quais o crime não deixa de existir. Exemplo pelo mesmo autor dado é o de alguém que desejando matar Tício, mata Caio por engano. Fala-se aqui em erro acidental, visto que o equívoco quanto ao objeto material do delito, que seria a pessoa sobre a qual incorre a ação danosa, neste caso, não é relevante para a caracterização do delito de homicídio. A intenção de matar (elemento volitivo) e a consciência de que se estar a matar um ser humano (elemento cognitivo), subsistem. Não se pode cogitar a exclusão do dolo, permanecendo o delito.
Decorrente do exposto, frise-se que apenas o erro de tipo essencial tem o condão de excluir o dolo da ação, levando a uma atipicidade da conduta na modalidade dolosa, mas permitindo a adequação da conduta ao tipo culposo, quando previsto. Se não prevista em lei a modalidade culposa, o erro de tipo essencial se torna totalmente escusável. O erro acidental, por não alterar a substância de qualquer dos elementos do tipo penal, é tratado como irrelevante para dele decorrer a exclusão do dolo.
3.2 Erro de proibição
Vimos que a culpabilidade passou a ser constituída por três elementos: imputabilidade, exigibilidade de conduta diversa e potencial consciência da ilicitude do fato. Faltando qualquer dos três elementos a culpabilidade não se forma em sua plenitude, impedindo a caracterização do delito.
Erro de proibição é aquele que incide sobre a contradição existente entre a conduta e a vontade do ordenamento jurídico. Aqui o agente atua sem saber que sua conduta é ilícita. Engana-se a respeito da antijuridicidade do fato, objeto do erro. O sujeito sabe o que faz, tem consciência plena do ato que está a praticar (dolo), mas erroneamente crê que sua atitude é permitida pelo Direito. Exclui-se a consciência da ilicitude, esta entendida como a aptidão do sujeito apreender o caráter ilícito de seu comportamento.
Fragoso afirma que o desconhecimento da lei, embora seja erro de proibição, é uma espécie deste irrelevante parente nosso Código Penal[10], que expressamente afirma, na primeira parte de seu art. 21, ser inescusável o desconhecimento da lei.
Reconhecida à existência do erro quanto à ilicitude do fato, e tendo em vista a nota da potencialidade da consciência de antijuridicidade, tem-se que se perquirir, num segundo momento, se tal erro era evitável ou não pelo agente, para que de tal conclusão surtam os efeitos devidos à conduta do sujeito ativo.
Então, o erro de proibição pode ser evitável ou inevitável.
Evitável é o erro em que o agente, empreendendo esforço mental normalmente considerável, ou pelo simples fato de poder informar-se, teria amplas possibilidades de atingir a consciência do desvalor de sua ação. O conhecimento da antijuridicidade permanece, mesmo que de forma potencial. Neste caso, a culpabilidade permanece intacta, posto que nenhum de seus elementos se desnatura. O agente será então punido a título doloso, mas com pena reduzida, pois injusto seria punir alguém que não possui consciência da antijuridicidade de sua conduta, embora pudesse atingi-la, com a mesma pena daquele que age com consciência plena de que sua conduta é contrária ao Direito.
Inevitável é aquele erro onde o agente, empreendendo um esforço mental normal, ou mesmo consultando alguém a respeito da conduta, não tem capacidade de conhecer a ilicitude do fato. Descaracteriza-se a potencial consciência de antijuridicidade, e com ela a culpabilidade. Inexistindo culpabilidade, não se pode falar em reprovação. Se alguém age ilicitamente, mas não pode ser reprovado por seu agir, também não poderá ser apenado. Exclui-se o delito e, conseqüentemente, a pena.
Note-se que tanto no erro evitável quanto no inevitável o dolo permanece intacto, pois este não mais figura como elemento da culpabilidade.
3.2.1 Espécies de erro de proibição
O Direito Penal como um todo é basicamente constituído por três espécies de normas: as normas proibitivas, as normas permissivas e as normas preceptivas.
As normas proibitivas, como o próprio nome nos revela, são aquelas que demonstram situações onde o atuar humano, no sentido de sua determinação, é juridicamente vedado. É o exemplo do art. 121 do Código Penal, que diz "matar alguém". A norma implícita neste enunciado normativo proíbe o atuar humano no sentido de tirar a vida de seus semelhantes. Da violação das normas proibitivas originam-se os crimes comissivos, que necessitam de uma ação positiva (um atuar real do agente) e de um resultado naturalístico para que se concretizem.
As normas permissivas são aquelas que excluem a ilicitude da conduta, autorizando a ação do agente frente a fatos que inicialmente seriam antijurídicos. São as chamadas causas de justificação, previstas no art. 23 e seguintes de nosso Código Penal.
Preceptivas são aquelas normas que obrigam ao agente a agir, frente determinada situação, para impedir a lesão, ou exposição a perigo de lesão, de um bem jurídico. Violando-se tais normas, surgem os delitos omissivos. Nestes tipos de crimes, a simples inatividade (ação negativa) do agente, quando este era obrigado agir, consuma o delito, não necessitando de resultado.
A divisão do erro de proibição em três espécies (erro de proibição direto, indireto e mandamental), se faz com bases nesses três tipos de normas.
O erro de proibição direito se relaciona com a falta de consciência de ilicitude em relação a uma norma proibitiva. Neste caso, o agente atua enganando-se a respeito do comando estabelecido por esse tipo de norma. Atua sem saber que o que está a fazer é contrário a uma norma que o proíbe de tal ação. Age pensando lícito seu comportamento.
O erro de proibição indireto, por sua vez, relaciona-se com a existência ou limites de uma causa de justificação; a respeito de uma norma permissiva. Aqui o agente, embora possa conhecer a proibição incidente sobre seu comportamento, imagina que está sob o amparo de uma causa de justificação. Não se inclui neste tipo de erro aquele referente aos pressupostos de fáticos de uma causa de justificação, pois se trataria de erro de tipo permissivo.
Ao tratarmos do erro de mandamento, estamos a adentrar no âmbito dos delitos omissivos, que se subdividem em próprios e impróprios. Os delitos omissivos próprios são aqueles onde há uma violação de uma norma preceptiva. Aqui o agente não atua por não ter consciência do desvalor de sua inatividade. Poder-se-ia chamar esse tipo de erro de mandamento de próprio. Já nos crimes omissivos impróprios, da violação de uma norma preceptiva, consuma-se um delito determinado por norma proibitiva, típica de conduta comissiva. Daí sua denominação de crimes comissivos por omissão. Um exemplo do erro mandamental nos delitos omissivos impróprios é a do sujeito que provoca incêndio em sua casa e não impede que o fogo se alastre à casa do vizinho, constituindo o delito comissivo de dano por sua omissão. Este tipo de erro mandamental (impróprio) só pode ser alegado pelo agente que, de acordo com a ordem jurídica, tenha o dever de evitar o resultado danoso: o garantidor ou garante. Afirma, parte da doutrina, que este é o único tipo de erro que pode incidir sobre a conduta do garantidor.
Analisaremos a veracidade de tal afirmativa (objeto central de nosso trabalho) partindo da concepção dada pelo Código Penal brasileiro acerca do garantidor, verificando a quais tipos de erro é passível a conduta do garante.
4. O Garantidor no Código Penal Brasileiro
O § 2º do art. 13 do Código Penal revela a posição de garante, ou seja, daquela pessoa que, por força de um dever jurídico, assumiu a responsabilidade de garantir a não ocorrência do resultado danoso[11]. Trata-se aqui não de uma simples atividade exigida, e sim de uma obrigação imposta pelo Direito ao agente de atuar com o fito de impedir o surgimento de um dano concreto ou potencial.
O Código estabelece três situações onde podem se verificar a posição de garantidor: a) quando o agente tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância. Esta hipótese se verifica no caso da mãe que não alimenta seu bebê, levando-o à morte. A genitora viola, por meio de sua omissão em alimentar a criança, dever este imposto por lei, a norma proibitiva do art. 121, que trata do homicídio; b) quando o agente de outra forma, que não a legal, embora juridicamente permitida, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado. É o caso de uma enfermeira que contratualmente se obrigou a cuidar de um enfermo[12]. Omitindo-se do dever, responderá por possíveis lesões ao paciente; c) quando o agente, com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. Aquele que produz uma situação perigosa para terceiros, independentemente da natureza dolosa ou culposa de seu comportamento, tem o dever de impedir que o dano se consume. Destarte, quem, por negligência, deixa torneira aberta provocando inundação de seu apartamento, tem como obrigação de impedir que a água invada a casa do vizinho. Se não evitá-la, será responsabilizado pelo dano causado.
Por último, saliente-se que o garante, para ser responsabilizado por sua conduta, tem que ter tido a possibilidade física de agir para impedir o resultado. Necessita-se concomitantemente da existência do dever de impedir o resultado e do poder agir para impedi-lo. Não se pode, por exemplo, cogitar a punição de um pai por sua omissão em salvar seu filho que se afogava se ele não estava no local. Outrossim, tem-se que restar de todo verificado o nexo causal entre a conduta omissiva do garantidor e o resultado danoso por ela produzido. Sem a relação de causalidade, impossível se tornará a imputação do resultado ao garante (caput do art. 13 do Código Penal).