O crime de peculato e os princípios constitucionais orientadores da administração estatal

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Resumo:


  • O artigo discorre sobre o crime de peculato e os princípios constitucionais orientadores da administração estatal, com foco na aplicação da lei penal às práticas ilícitas contra o Estado.

  • Objetiva apresentar a definição de Estado e responder a uma indagação controversa sobre a definição e importância da Administração Pública, trazendo análises doutrinárias e jurisprudenciais para definir o peculato.

  • Apresenta o modo como o Poder Judiciário aplica a jurisdição em casos de crimes contra a Administração Pública, buscando controlar e aplicar as leis que sancionam os infratores.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

6. O REFLEXO DO CONTROLE PENAL EM FACE DO CRIME DE PECULATO

Frente os atos ilícitos contra a Administração Pública, encontram-se entendimentos jurisdicionais que o judiciário aplica a lei aos infratores.

Em razão disso, o ordenamento jurídico comina sanção aos agentes públicos que violarem o seu dever de imparcialidade, estabelecendo tal conduta como ato de improbidade administrativa, nos termos do art. 11, caput, da Lei nº 8.429/92, in verbis:

Art. 11 - Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições.

Estabelece o atual parágrafo 2º do artigo 327 do Código Penal, uma causa de aumento de pena para os agentes públicos, aqueles que não forem concursados terão a pena aumentada da terça parte quando praticarem os crimes previstos no atual título XI, capítulo I do Código Penal, o qual trata dos crimes praticados por funcionário público contra a Administração em geral.

[...]

§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. (Acrescentado pela L-006.799-1980).

[...]

Consoante precedentes dos Egrégios Tribunais são encontrados, na aplicação da lei aos atos ilícitos que ferem aos princípios constitucionais, da seguinte forma28:

Habeas corpus liberatório. Crimes contra a administração pública (fraude à licitação, emprego irregular de verbas públicas, peculato, corrupção ativa e passiva, entre outros). Prisão preventiva. Garantia da ordem pública, da ordem econômica e da instrução criminal. Existência de fortes indícios de que o paciente seria o líder e principal articulador da organização criminosa, atuante em inúmeros municípios do interior baiano e com trânsito entre o empresariado e as prefeituras envolvidas. Gravidade concreta dos fatos. Precedentes do STJ. Parecer do MPF pela denegação da ordem. Ordem denegada.

STJ, Processo: HC 190017 DF 2010/0206939-2. Relator (a): ministro Napoleão Nunes maia filho. Julgamento: 22/02/2011. Órgão julgador: quinta turma. Publicação: dje 21/03/2011.

Neste habeas corpus, observa-se que o judiciário manteve a prisão preventiva em crime contra a Administração Pública29:

Peculato-Consequências do crime. Mostra-se razoável a fixação da pena-base em um ano acima do mínimo previsto para o tipo - de dois, com teto de doze - ante as circunstâncias do crime, o fato de haver sido praticado o peculato por servidor do próprio judiciário.

STF, Processo: HC 101295 Rj. Relator (a): Min. Marco Aurélio. Julgamento: 29/03/2011. Órgão julgador: primeira turma. Publicação: dje-082 Divulg 03-05-2011 Public 04-05-2011 Ement vol-02514-01 pp-00059.

Neste crime de peculato, encontra-se na ementa uma pena superior do mínimo que a lei tipifica.

Apelação criminal - corrupção passiva - art. 317 do Código Penal - crime contra a administração pública - farta prova testemunhal corroborada por prova documental - decreto condenatório que se mantém. Perda do cargo público - art. 92 do Código Penal - critérios objetivos e subjetivos - decisão que aponta somente um deles - falta de motivação - recurso provido parcialmente.

Processo: ACR 69001 SC 2009.006900-1. Relator (a): Moacyr de Moraes Lima Filho. Julgamento: 04/06/2009. Órgão Julgador: Terceira Câmara Criminal. Publicação: Apelação Criminal n. , de Guaramirim.30

Desta ementa, observa-se que o judiciário manteve a perda do cargo público.31

Habeas Corpus. Constitucional. Penal. Imputação dos crimes de peculato e corrupção passiva em concurso material à promotora de justiça. Denúncia recebida pelo tribunal de justiça do Pará. Habeas corpus impetrado no superior tribunal de justiça que não teve apreciado pedido de medida liminar nem julgado o mérito. Alegações de inépcia da denúncia e de ausência de justa causa para o oferecimento da ação penal. Impossibilidade de exame dessas questões sob pena de supressão de instância. Habeas corpus ao qual se nega seguimento.

STF, Processo: HC 105120 Pr. Relator (a): min. Cármen Lúcia. Julgamento: 24/08/2010. Publicação: Dje-166 Divulg 06/09/2010 Public. 08/09/2010.

Neste habeas corpus proferido pelo STF, encontra-se a aplicação da lei, ao negar seguimento à promotora de justiça.

Crime contra a administração pública. Concussão. Defensor nomeado. Equiparação a funcionário público para fins penais. Fato típico. Delito configurado. Mantença do voto majoritário. Rejeição

Processo: EI 293534 SC 2010.029353-4. Relator(a): Irineu João da Silva. Julgamento: 26/04/2011. Órgão Julgador: Seção Criminal. 32

Na ementa, observa-se que o defensor nomeado equipara-se como funcionário público e responde pelo crime de concussão.

Na função do Poder Judiciário em resolver situações contenciosas entre a Administração Pública e o indivíduo, Fagundes33 assim entende:

Ao Poder Judiciário é vedado apreciar, no exercício do controle jurisdicional, o mérito dos atos administrativos. Cabe-lhe examiná-la, tão-somente, sob o prisma de legalidade. Este é o limite do controle, quanto à extensão.

Desta forma, o Poder Judiciário busca incriminar e intimidar as práticas ilegais dos funcionários públicos aplicando a lei, para que sejam estritamente observados os princípios constitucionais da Administração Pública.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

É cediço que vivemos num Estado, este que é um governo político do povo constituído em nação. Os representantes do povo, exercem suas funções com o propósito de alcançar o bem comum através da Administração Pública.

Destarte, é obrigação do Estado manter a ordem interna estabelecendo normas que dizem respeito a sua própria organização ou às relações que mantém com os indivíduos; fazendo com que essas normas sejam tuteladas e executadas, promovendo o fim a que elas visam.

Como o Estado é uma Pessoa Jurídica de Direito Público e suas atividades têm de ser desempenhadas pela Administração Pública, esta terá o papel de governar a sociedade com o fito de obter resultado harmônico em face aos princípios constitucionais que cerceiam a Administração Pública, quais sejam, a legalidade, a impessoalmente, a moralidade, a publicidade e a eficiência.

Entretanto, quando a Administração Pública não obtém êxito quanto a finalidade que almeja, como é o caso da ocorrência do crime de peculato, aplica-se o Código Penal para repreender as condutas ilícitas praticadas por funcionários públicos no exercício de suas respectivas funções.

Em face disso, conforme as jurisprudências trazidas alhures, o Poder Judiciário tem repelido com probidade os casos de crimes que atentam contra a Administração Pública, respeitando os deveres de imparcialidade, honestidade, legalidade e lealdade às instituições. Inclusive, o Judiciário entende que o crime de peculato e suas modalidades são práticas ilícitas que desvirtua os princípios constitucionais administrativos, devendo assim, esse delito ser censurado energicamente, observados os parâmetros da legalidade.

Assim, buscou-se efetuar um estudo panorâmico acerca do crime de peculato perante os princípios constitucionais orientadores da Administração Pública, resta caracterizado o relevante papel que exerce o Poder Judiciário e a Administração Pública no intuito de se buscar o bem de todos, motivo pelo qual é amplamente tutelada através dos respectivos postulados constitucionais.

O tema merece um estudo mais aprofundado, ensejando maiores reflexões, tendo em vista a sua complexidade e tamanha repercussão no âmbito social.


REFERÊNCIAS

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SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Embargos infringentes, nomeação confirmada, equiparação a Funcionário Público, concussão, delito confirmado. Seção Criminal. Publicação: Embargos Infringentes n. 2010.029353-4, de Imbituba. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19792026/embargos- infringentes-ei-293534-sc-2010029353-4-tjsc.> Acesso em: 10 nov. 2011.

SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação criminal, crime contra a Administração Pública corrupção, perda do cargo público. Apelação criminal. Processo ACR 69001 SC 2009.006900-1. Guaramirim. Órgão Julgador: Terceira Câmara Criminal Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8260165/apelacao-criminal-acr-69001-sc-2009006900-1-tjsc> Acesso em: 11 nov.2011.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

VADE MECUM. 9. ed. Atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.


Notas

  1. omissis

  2. omissis

  3. ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Administrativo descomplicado. São Paulo: Método, 2009. p. 13.

  4. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 98.

  5. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros , 2002. p. 35.

  6. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 69.

  7. FAGUNDES, M. Seabra. O controle dos atos administrativos pelo poder judiciário. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. p. 3.

  8. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 22. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1997. p. 59.

  9. FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo. 3. ed. São Paulo: Atlas. 2004, p. 17.

  10. CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios Constitucionais da Administração Pública: (de acordo com a Emenda Constitucional n.º 19/98). IN MORAES, Alexandre. Os 10 anos da Constituição Federal. São Paulo: Atlas, 1999. p. 150.

  11. HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal. v. 9. arts. 250-361. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. p.400.

  12. FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo. p. 64.

  13. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. p. 74.

  14. MELLO, Celso Antonia Bandeira de. Regime constitucional dos servidores da administração direta e indireta. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991. p. 12.

  15. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito administrativo. São Paulo: Celso Bastos, 2002. p. 411.

  16. MORAES, Isaias Fonseca. Manual do direito administrativo. Curitiba: Juruá, 2008. p. 149-150.

  17. GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 139.

  18. FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Fundamentos de direito administrativo. p. 137.

  19. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. 5: parte especial: dos crimes contra a administração pública e dos crimes praticados por prefeitos (Lei n. 10.028/2000). São Paulo: saraiva, 2007. p. 3.

  20. NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.995.

  21. HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal. p. 334.

  22. GRECO, Rogério. Código penal comentado. 4 ed. Ampl. Atua. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. p.818.

  23. ROCHA, Fernando A. N. Galvão da. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 78.

  24. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 24-26.

  25. GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Dos crimes contra os costumes aos crimes contra a administração pública. 11. ed. rev. e atual. de acordo com a Lei n. 11.106/2005 - São Paula: Saraiva, 2007. p. 123.

  26. FAZZIO JUNIOR, Waldo. Corrupção no poder público: peculato, concussão, corrupção passiva e prevaricação. São Paulo: Atlas, 2001. p. 133.

  27. GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 9. ed. São Paulo: Rideel, 2007. p. 221.

  28. BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. Habeas-corpus liberatório, crimes contra a Administração Pública, prisão temporária, fatos precedentes. Habeas-corpus nº 190017, da 5ª turma. Disponível em <http//www.stj.gv.br>. Acesso em: 11 nov. 2011.

  29. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Processo Penal. Habeas-corpus. Fixação da Pena-base. Habeas-Corpusnº 101295, da 1ª turma. Disponível em: <https://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=peculato&base=baseAcordaos.> Acesso em: 11 nov. 2011.

  30. SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação criminal, crime do artigo 317 do CP corrupção contra a Administração Pública, perda do cargo público. Processo: ACR 69001 SC 2009.006900-1. Guaramirim. Órgão Julgador: Terceira Câmara Criminal. Disponível em: <https://www.jusbrasil. com.br/jurisprudencia/8260165/apelacao-criminal-acr-69001-sc-2009006900-1-tjsc.> Acesso em: 10 nov. 2011.

  31. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Crime de peculato e corrupção, denúncia recebida pelo tribunal de justiça do Pará, habeas corpus que se nega seguimento. Habeas Corpus nº 105120 PR, Disponível em: <https://www.stf.gov.br>. Acesso em: 11 nov. 2011.

  32. SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Embargos infringentes, nomeação confirmada, equiparação a Funcionário Público, concussão, delito confirmado. Seção Criminal. Publicação: Embargos Infringentes n.2010.029353-4, de Imbituba. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19792026/embargos- infringentes-ei-293534-sc-2010029353-4-tjsc.> Acesso em: 10 nov. 2011.

  33. FAGUNDES, M. Seabra. O controle dos atos administrativos pelo poder judiciário. p.145.

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Sobre os autores
Cristiano Poter

Advogado. OAB/PR 68402. Poter Advocacia. Pós-Graduado em Direito Tributário pela UCAM/RJ.

Jorge Roberto Krieger

Professor. Graduado em Letras (hab. Francês) pela UFSC e Direito pela FURB. Pós-graduado pela FURB e com Mestrado na UFSC.  Professor Universitário desde 1998. Professor de Direito Penal e Processo Penal da UNIVALI desde 2004.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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