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O custo do sweatshop como prática de comércio desleal

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27/04/2014 às 12:22
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Conclusão

O presente trabalho se propôs a abordar temas que parecem irreconciliáveis, apesar de sua estreita ligação: a economia de mercado, com seu objetivo de atingir máxima produtividade e lucro, e a massa de trabalhadores, com sua necessidade de proteção. Não haveria produtos e serviços a serem comercializados se não houvesse pessoas engajadas nessas atividades. Mesmo em uma época eminentemente tecnológica como a em que vivemos, há funções que só podem ser exercidas por seres humanos. Já os trabalhadores não teriam onde empregar a sua energia se não existisse coisas a serem produzidas e serviços a serem prestados. Como um elo a fechar essa cadeia, há a contraprestação percebida pelos obreiros, primordial à subsistência desses e que os tornará consumidores, essenciais para a prosperidade do mercado.

Tendo isso em mente, é deveras importante manter esses diferentes fatores em sintonia, em fino equilíbrio. De um lado, há que se fomentar a iniciativa privada, possibilitando que esta floresça e atinja altos níveis de produtividade e alcance os frutos financeiros esperados. Por outro, é imperativo que o exercício da atividade econômica não ocorra se sacrificando a energia vital do empreendimento – a energia humana.

A OIT construiu um verdadeiro Código Internacional do Trabalho, composto por suas normas internacionais. Ainda que estas sejam alvo de críticas por ter caráter programático, é justamente nessa prudência que reside a razão de tantas ratificações e adesões aos seus instrumentos.

A OMC, por seu turno, possui importante instrumental de caráter judicial, sendo a maior qualidade de seu Sistema de Solução de Controvérsias a efetividade das decisões dele emanadas. Assim, ainda que com um viés comercial, visando proteger o mercado e a livre concorrência, a OMC desempenha importante papel na abolição dessas práticas nocivas, impondo medidas sancionatórias aos países que as adotam.

Procuramos demonstrar que a atuação conjunta destes organismos internacionais viabilizaria maior controle e assistência ao desenvolvimento integral das nações. Os críticos a tal atuação defendem a não normatização internacional sobre o dumping social, estatuindo que tais medidas constituiriam entraves ao crescimento econômico. Todavia, o desenvolvimento econômico de um país só poderá ser considerado legítimo quando não for construído sobre o desrespeito dos direitos trabalhistas e, principalmente, quando os frutos dele advindos não se limitarem apenas aos empreendedores.

No decorrer do trabalho, partindo da premissa o de que Direito do Trabalho está incluído no rol dos Direitos Sociais, consagrados na chamada 2ª Geração de Direitos Humanos, portanto uma das formas de exteriorização dos Direitos Humanos, procuramos demonstrar que o Direito do Trabalho deve ser considerado de suma importância, como instrumento viabilizador das mudanças sociais, políticas e econômicas necessárias para atingir-se a proteção dos direitos mínimos dos trabalhadores. O alegado custo com a mão de obra não pode sobrepor-se ao valor da dignidade da pessoa humana.

Por fim, não se deve esquecer que a atuação das diferentes esferas de poder, em nível nacional e internacional, deve ser objetivando a conciliação entre a obtenção do lucro e a garantia da proteção aos trabalhadores, pois, como ensinou Ihering, a luta pelo direito é a poesia do caráter.


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Notas

1 PERES, Antônio Galvão. O Dragão Chinês: dumping social e relações de trabalho na China. São Paulo: Ltr, Vol. 70.n.4. Abril, 2006. p. 468.

2Idem. p. 467.

3 JOHANNPETER, Guilherme. Antidumping- Prática desleal no comércio internacional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996. p. 60.

4 Idem, p. 80.

5 Idem, p. 70.

6 SILVEIRA, Vladmir Oliveira da. O Direito ao Desenvolvimento na Doutrina Humanista do Direito Econômico. Tese de Doutorado apresentada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2006. p. 181.

7 Idem. p. 284.

8 Fórum Internacional sobre Direitos Humanos e Direitos Sociais / organização e realização Tribunal Superior do Trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p. 546.

9 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7. ed. rev., ampl. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2006.p. 111.

10 Para análise aprofundada vide: FINKELSTEIN, Cláudio. ´Jus cogens´ como paradigma do metaconstitucionalismo de Direito Internacional. Tese de Livre-Docência em Direito Internacional Público, apresentada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2010.

11 HUSEK, Carlos Roberto. Curso de Direito Internacional Público e Privado do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009. p. 75.

12 URIARTE, Oscar Ermida. Fórum Internacional sobre Direitos Humanos e Direitos Sociais / organização e realização Tribunal Superior do Trabalho. São Paulo: LTr, 2004. p. 283.

13 JOHANNPETER, Guilherme. Antidumping- Prática desleal no comércio internacional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996. p. 60.

14 “Envolve o direito à vida, os direitos pessoais tradicionais, os direitos econômicos, os direitos educacionais, os direitos à saúde, as liberdades públicas em geral e os direitos sociais. É o valor constitucional supremo, um sobreprincípio, abrangendo, portanto, todos os demais.” Em: HUSEK, Carlos Roberto. Curso de Direito Internacional Público e Privado do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009. p. 65.

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15 KAUFMANN, Christine. Globalisation and labour rights – the conflict between core labour rights and international economic law. Oxford: Hart Publishing, 2007. p. 284.

16 GATT – General Agreement on Tariffs and Trade. Um “tratado” resultante da Carta de Havana, que previa, originariamente, a instituição de uma Organização Internacional do Comércio (OIC). Tendo o Senado norte-americano rejeitado a OIC, em 1947 passa a vigorar o GATT – cujo objetivo era, basicamente, estabelecer disposições sobre desmontes tarifários e efetivar a liberalização do mercado internacional.

17 Mais em: THORSTENSEN, Vera e JUNK, Marcos J. (coord.). O Brasil e os grandes temas do comércio internacional.1ª.ed. São Paulo: Aduaneiras, 2005.

18 LAFER, Celso. A OMC e a regulamentação do comércio internacional: uma visão brasileira. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998.

19 Artigo 3.7 do ESC.

20 BARRAl, Welber (org.). O Brasil e a OMC: os interesses brasileiros e as futuras negociações multilaterias. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p.15.

21 Dispositivo bastante subjetivo, abrindo brecha para ilegalidades e polêmicas. Se é necessário que se interprete as normas e orientações da OMC, como definir com exatidão quais são os direitos e as obrigações? Corre-se o risco de pecar por uma interpretação demasiadamente restrita, superficial, extensa ou vaga. Torna-se, portanto, uma ameaça à previsibilidade e segurança, revestindo as decisões dos painéis e do Órgão de Apelação dotadas de menor eficácia e credibilidade.

22 Sendo uno e regrado por poucas disposições, torna-se ínfimo o risco de fragmentação do processo. Esta concepção não é nova. BOBBIO, explicando o movimento iluminista, diz que “a natureza profunda, a essência verdadeira da realidade, é simples e suas leis são harmônicas e unitariamente coligadas; por isso, também o direito, o verdadeiro direito fundado na natureza, podia e devia ser simples e unitário”. BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico. São Paulo: Ícone, 1995.

23 “Na arbitragem existe o exercício da verdadeira jurisdição, só que exercida por órgãos – pessoas, aos quais o Estado reconhece, em certa medida, uma parcela do seu poder, e cujas decisões ele chancela com o selo de sua autoridade, outorgando-lhes idêntica eficácia à que confere às decisões de seus próprios juízes (órgãos- ente). Daí chamar-se sentença arbitral as decisões finais dos árbitros”. ALVIM, J. E. Carreira. Teoria Geral do Processo. 8ª. Ed. Rio de Janeiro: Malheiros, 2002. p. 81.

24 “Intervenção amistosa e benévola oferecida por uma nação para que se ponha termo a dissidências havidas entre dois ou mais Estados, cujas relações se encontram cortadas ou estremecidas”. SILVA, De Plácido E. Vocabulário Jurídico. Vol. I. São Paulo: Forense, 1975, p. 260.

25 O artigo 25 do ESC é dedicado à arbitragem, sendo esta definida como um “meio alternativo de solução de controvérsias pode facilitar a resolução de algumas controvérsias que tenham por objetivo questões claramente definidas por ambas as partes”.

26 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e Processo – influência do direito material sobre o processo. 2ª.ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 13.

27 BARRAl, Welber (org.). O Brasil e a OMC: os interesses brasileiros e as futuras negociações multilaterias. Florianópolis: Diploma Legal, 2000. p. 60.

28 Os países desenvolvidos possuem fundamentos para tanto, uma vez que o princípio da reciprocidade rege o ordenamento da OMC: “...les objectifs des Parties Contractants devant être réalisé ’par la conclusion d´accords visant sur une base de réciprocité et à la elimination entraves aux échanges et des discriminations dans les relations commerciales internationales’”. DAILLIER, Patrick, GHÉRARI, Habib; LA PRADELLE, Géraud de (org.). Droit de L´Économie Internationale. Paris: Éditions A. PEDONE, 2004. p. 352.

29 “Um dos pontos de maior interesse desses países é que o Acordo admita espaço para a implementação de políticas de desenvolvimento que envolvam a concessão de subsídios” THORSTENSEN, Vera e JUNK, Marcos S. (coord.). O Brasil e os Grandes Temas do Comércio Internacional. São Paulo: Aduaneiras, 2005. p. 197.

30 Vide: LAMBERT, Jean-Marie. Regência Neoliberal. Goiânia: Kelps, 2000.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ABREU, Fernanda Miranda. O custo do sweatshop como prática de comércio desleal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3952, 27 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27948. Acesso em: 19 abr. 2024.

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