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Pseudo-evolução do Direito Penal

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01/03/2002 às 00:00
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Capítulo – II: HISTÓRIA DO DIREITO PENAL BRASILEIRO

1. BRASIL COLONIAL

1.1. Ordenações Afonsinas

Ao tempo da descoberta do Brasil, em 1500, o regime jurídico que regia Portugal eram as Ordenações Afonsinas, promulgadas em 1446. Pois bem, foi este nosso primeiro ordenamento jurídico.

Contudo, praticamente não chegou a ser aplicado, pois em 1514 começariam a vigorar as Ordenações Manuelinas.

1.2. Ordenações Manuelinas

Foram editadas em 1514 por ordem de Dom Manuel. As penas geralmente não eram pré-fixadas, o que ficava ao arbítrio do juiz que a regulava de acordo com a classe social.

embora formalmente estivessem vigorando ao tempo das capitanias hereditárias, as Ordenações Manuelinas não constituíam a fonte do direito aplicável no Brasil, pois o arbítrio dos donatários, na prática, é que impunham as regras jurídicas.[21]

Ficaram em vigor até 1603, quando revogadas pelas Ordenações Filipinas.

1.3. Ordenações Filipinas

Quando da época da União Ibérica, o rei da Espanha e Portugal, Filipe II, em 1603, editou as Ordenações Filipinas que em quase nada distinguiam das já revogadas Manuelinas e Afonsinas.

Mesmo com a Revolução de 1640, que pôs fim à dominação de Castela sobre Portugal. A validade das ordenações Filipinas continuou por muito tempo e João IV de Bragança, que sucedeu Filipe IV da Espanha, confirmou, de maneira geral, todas as leis que haviam sido promulgadas sob a dominação de Castela.[22]

As penas eram severas e com requintes de crueldades, como a pena de morte que poderia ser na forca (morte natural), antecedida de torturas (morte natural cruelmente) ou mesmo a denominada morte para sempre, onde o corpo do condenado ficava suspenso, putrefando-se, até que a confraria o recolhesse, além de várias outras.[23]

O elenco dos tipos de infrações são também contrários á ordem racional moderna, pois nestes eram confundidos direito, moral e religião.

O regime era fantástico e terrorista como se verifica pela enorme variedade dos tipos de autores, das infrações e do arsenal punitivo: hereges, apóstatas. Feiticeiros, blasfemos (contra Deus ou contra os santos), benzedores de cães e outros bichos sem autorização de rei; sodomia, o infiel que dormisse com algum cristã, e o cristão que dormisse com infiel; entrada em mosteiro ou retirada de freira "ou dorme com ella, ou a recolhe em casa"; vestir-se o homem com trajes de mulher ou a mulher com trajes de homem "e dos que trazem máscara".[24]

De qualquer forma, foi o ordenamento jurídico penal que mais tempo vigorou no Brasil, mais de dois séculos (1603 até 1830).

2. O Império

Em 07.09.1822 o Brasil conquista sua independência em relação à Portugal. Contudo como para redigir um novo ordenamento penal seria utilizado um grande tempo, pois não se cria um arcabouço jurídico da noite para o dia. Então por força da lei de 20.10.1823 mandou-se que seriam conservadas as Ordenações Filipinas até que surgisse um Código nacional.

Em 16.12.1830 foi sancionado por D. Pedro I o Código Criminal do Brasil, o qual, sob influência da Escola Clássica, fixava os princípios da responsabilidade moral e do livre arbítrio, segundo o qual não há criminoso sem má-fé, sem o conhecimento do mal e sem intenção de praticá-lo.

As penas eram de: prisão simples e prisão com trabalhos forçados, banimento, degredo, desterro, multa, suspensão de direitos e também, a mais cruel de todas, morte na forca (para os crimes de insurreição de escravos, homicídio agravado e roubo com morte).

Entretanto a terrível pena de morte foi mais tarde revogada tacitamente por D. Pedro II (pois a este era dado o direito de clemência e, então, passou a distribui-la a todos os condenados à morte). Conta-se que o Imperador ficou impressionado quando soube do erro judiciário que levou o fazendeiro Manoel da Motta Coqueiro à forca.[25]

3. A República

Em 15.11.1889 é proclamada a República dos Estados Unidos do Brasil. Além da abolição da escravatura (1888) outros fatos incorreram sobre a legislação penal o que veio a implicar na necessidade de um novo Código. Foi assim que, durante o Governo Provisório de Deodoro, o então Ministro da Justiça e futuro presidente, Campos Sales, encarregou o professor João Baptista Pereira de elaborar um novo Código. Rapidamente (em três meses) o mesmo apresentou-o, entrando em vigência através do Decreto n. 774 de 20.09.1890.

Todavia, não se sabe se pelo curto tempo de elaboração ou por apresentar idéias da Escola Clássica quando a Positiva estava em seu auge, acolhendo adeptos entre a maioria dos juristas, Código foi veementemente criticado por apresentar alguns erros. Então, para corrigi-los, várias leis extravagantes foram promulgadas. Porém este emaranhado de normas, por ser de difícil manuseio, necessitava que se reunissem num único documento o Código e as leis complementares. Esta tarefa foi dada ao Dês. Vicente Piragibe, resultando na Consolidação das Leis Penais que entrou em vigor através do decreto n. 22.213 de 14.12.1932, sendo, pois, revogada pelo atual Código Penal.

Em 1940 foi promulgado o novo Código Penal que teve seu início de vigência marcado para 1.01.1942. Código esse que teve origem no projeto de Alcântara Machado, submetido ao trabalho de uma comissão revisora composta por Nélson Hungria, Vieira Braga, Marcélio de Queiroz e Roberto Lyra.

Em 21.10.1969 veio a lume outro Código Penal elaborado pelo então Ministro Nélson Hungria, contudo esse foi revogado em 11.10.1978.

Em 1984 a parte geral – que trata dos princípios básicos do Direito Penal – do Código é integralmente reformada, através da lei 7.209, de 11 de junho, com a introdução de novos e modernos conceitos, e a consolidação do novo sistema de cumprimento de penas – com progressão de regime mais severo – fechado – a mais brando – aberto – e também a regressão, a possibilidade de novas modalidades de penas, chamadas de alternativas, de prestação de serviços à comunidade e restrição de direitos. A lei 7.210, da mesma data, reformulou ampla e positivamente a execução penal.[26]


Capítulo – III: CONCLUSÃO

Exposição de Idéias

Num primeiro momento acredita-se que o Direito Penal no decorrer da história da humanidade conseguiu traçar uma linha evolutiva, onde o que foi deixado para trás seja de qualidade pior do que aquilo que o substituiu, ou seja, que há um processo de acumulação quantitativo que leva a um aprimoramento qualitativo.

Contudo, não que este pequeno ramo das ciências sociais tenha apresentado uma evolução, mas sim que o mesmo apenas acompanhou e acompanha o trilhar dos homens pelo mundo, suas conquistas, suas mudanças de costumes, acabando por necessitar de mudanças também nessa área do conhecimento. Como o direito é fruto das condições históricas em que está inserido, o modelo penal então vigente em determinada época da história é vinculado às condições do momento.O que nega a idéia de uma evolução do direito. O que se pode acolher é que exista um acúmulo de experiências, agora que esse acúmulo venha a garantir que o sistema jurídico que hoje em dia empregamos seja superior, ou mais avançado, ou mesmo mais evoluído que outro utilizado na Antiguidade seria um grande erro, pois aquele direito da Antiguidade, por exemplo, era o que as condições da sociedade daquela época podiam criar. Lógico, porque o direito é uma criação humana, e como tal sucetivo de vicissitudes. Pois as condições materiais, em especial ênfase as econômicas, condicionam o modo de pensar e ver as coisas, e quando as primeiras mudam, as últimas, por conseqüência, são obrigadas a acompanhá-las. Fazendo uma remissão às idéias marxistas de que a infraestrutura condiciona a superestrutura.

Pois bem, o Direito Penal tem que ser condizente com a realidade da época em que se propõe a reger as atividades humanas, sob pena de cair em desuso.

Circunscrevendo-se no caso brasileiro, nosso atual Código Penal já não mais está espelhando nossa sociedade, havendo, pois, uma extrema necessidade por aprimoramentos. Descriminalizar uma série de crimes, que já não mais são considerados como tais pela sociedade. Criminalizar outros fatos, principalmente o relacionado com o desvio de verbas públicas, se já existentes, operacionalizá-las de modo satisfatório para o bem coletivo.

Como a pena de prisão é algo tão drástico que marca o condenado de forma indelével pelo resto de sua vida e não atinge os fins a que se destina. A proposta de uma intervenção penal mínima[27] parece ser a mais indicada para a atual situação. A aplicação das penas alternativas ao invés das privativas de liberdade apresenta-se como o caminho a ser seguido.

E um retorno ao estudo de outras áreas que estão intrinsecamente relacionadas com o Direito Penal, como a criminologia, a vitimologia, a política criminal, a antropologia, a sociologia, a psicologia, a penalogia e outras ciências, mostra-se necessário para uma melhor compreensão do objeto que é a Justiça Penal.


BIBLIOGRAFIA

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TELES, Ney Moura - Direito Penal - vol. I - São Paulo: de Direito, 1996.


NOTAS

1.Prefere-se falar em "justiça penal" a dizer "direito penal" por se acreditar que o Direito é algo que nasce juntamente com o Estado e como este último é uma construção da modernidade seria um paradoxo afirmar que na pré-história existiu alguma forma de direito penal, o que nos aparece são apenas formas embrionárias do mesmo.

2.FERRI, Enrico - Princípios de Direito Criminal: o criminoso e o crime - tradução de Paolo Capitanio- 2 ed. – Campinas: Bookseller, 1998, p. 33.

3.MIRABETE, Julio Fabbrini - Manual de Direito Penal: Parte Geral - vol. 1 - 17 ed. - São Paulo: Atlas, 2001, p. 35.

4.FERRI - Op. cit. - p. 35.

5.DUARTE, Maércio Falcão - Evolução Histórica do Direito Penal - In: Jus Navegandi, n. 34. (Internet) https://jus.com.br/artigos/932 (Capturado), p. 3.

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6.Levítico 24, 17-25.

7.SILVA, José Geraldo da - Direito Penal Brasileiro - vol. I - São Paulo: de Direito, 1996, p. 39.

8.NORONHA, E. Magalhães - Direito Penal - vol. 1 - São Paulo: Saraiva, 1997, p. 21.

9.NORONHA - Op. cit. - p. 21.

10.FERRI - Op. cit. - p. 37.

11.NORONHA - Op. cit. - p. 23.

12.BECCARIA, César Bonesana, Marquês de - Dos Delitos e das Penas - trad. Flório De Angelis – Bauru: Edipro, 1993.

13.GARCIA, Basileu - Instituições de Direito Penal - vol. I - tomo I - 4 ed. - 37 tiragem - São Paulo: Max Limonad, 1975, pp. 46-47.

14.GARCIA - Op. cit. - p. 69.

15.NORONHA - Op. cit. - p. 30.

16.Idem - p. 31.

17.GARCIA - Op. cit. - pp. 90/91.

18.FERRI – Op. cit. - p. 65.

19.NORONHA - Op. cit. - p. 38.

20.SILVA - Op. cit. - p. 71.

21.DOTTI, René Ariel - Bases e Alternativas para o Sistema de Penas - São Paulo: RT, 1998, p. 43.

22.PIERONI, Geraldo - A pena do degredo nas Ordenações do Reino - In: Jus Navegandi, n. 51. (internet) https://jus.com.br/artigos/2125 (Capturado), p.4.

23.Nesse sentido interessante é conhecer a sentença condenatória de Tiradentes: "Portanto, condemnam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas Gerais a que um baraço e pregação seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em o lugar mais público della será pregada, em poste alto até que o tempoa consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e, pregados em postes, pelo caminho de Minas no sitio de Varginha e das Sebolas aonde o Réu teve suas infames praticas, e os mais nos sitios de maiores povoações até que o tempo tambem os consuma; declaram o Réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens applicam para o Fisco e Camara Real e a casa em que vivia em Villa Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos seus bens confiscados, e no mesmo chão se levantará um padrão, pelo qual se conserve em memoria a infamia deste abominável Réu"(DOTTI - Op. cit. - p. 47-48).

24.DOTTI - Op. cit. - p. 45.

25.A crônica do acontecimento pode ser lida no livro de Carlos Marchi - Fera de Macabu: A História e o Romance de um Condenado à Morte - 2 ed. - Rio de Janeiro: Record, 1999. Após haver sido enforcado, Motta Coqueiro considerado responsável pela chacina perpetrada contra Francisco Benedito e toda a sua família, soube-se que o autor do crime naõ fora ele, mas sim sua esposa, Úrsula das Virgens, quem tinha mandado fazer o serviço, em razão do ciúme que sentia do seu marido em relação a uma das filhas de Francisco que esperava um filho do mesmo.

26.TELES, Ney Moura - Direito Penal - vol. I - São Paulo: de Direito, 1996, p. 65.

27.Ver sobre o assunto: GUIMARÃES, Isaac N. B. Sabbá - A Intervenção Mínima para um Direito Penal Eficaz - Revista Direito e Sociedade, Curitiba, v. 1, n. 1, pp. 165-193, set-dez 2000.

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Sobre o autor
Fábio Bergamin Capela

juiz de Direito em Pérola/PR, Especialista em Processo Civil

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAPELA, Fábio Bergamin. Pseudo-evolução do Direito Penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 55, 1 mar. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2795. Acesso em: 22 nov. 2024.

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