A Justiça Eleitoral: contextualização do caráter normativo atribuído ao Tribunal Superior Eleitoral

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18/05/2014 às 22:44
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O referido artigo científico enfatiza sobre a Justiça Eleitoral Brasileira, com principal enfoque no caráter regulamentar (normativo) conferido ao Tribunal Superior Eleitoral.

INTRODUÇÃO

O processo eleitoral não está vinculado à esfera jurídica, mas abrangente a sociedade em geral, haja vista a escolha dos dirigentes em todas as suas esferas: federal, estadual e municipal.

O sistema eleitoral não se encontra imune a irregularidades, mas, de modo a garantir a este processo eleitoral transparência, os regimes democráticos criaram diversos meios de fiscalização.

A Justiça Eleitoral possui como uma de suas atribuições, expedir as instruções necessárias para assegurar a organização e o efetivo exercício dos direitos políticos, a lisura de um processo eleitoral eficaz, bem como a aplicação e execução das normas eleitorais. Nesse contexto, a doutrina denomina de função normativa conferida a Justiça Eleitoral.

O fundamento legal do poder normativo encontra-se em dois diplomas legais: o Código Eleitoral – Lei nº. 4.737/65 e a Lei das Eleições – Lei nº. 9.504/97.

Embora a doutrina confira esta função normativa ao poder judiciário eleitoral, alguns doutrinadores opõem a tal prerrogativa, sob a alegação de usurpação de função legiferante – atividade exclusiva do Poder Legislativo.

Tendo como base as divergências apresentadas em torno do poder normativo conferido ao poder judiciário eleitoral, em especial ao Tribunal Superior Eleitoral, a presente pesquisa tem por finalidade apontar as nuances acerca do tema, com amparo na legislação vigente, bem como a ponderação do bom senso de justiça e de efetividade do processo e a legalidade dos institutos.

1. Justiça Eleitoral: Momento Histórico e Características Gerais

A Justiça Eleitoral Brasileira iniciou-se na época de Getulio Vargas, por meio do Código Eleitoral de 1932 – Decreto nº. 21.076/32, o qual passou a constar expressamente no texto da Constituição Federal de 1934. Sua criação tem por fundamento a transparência dos pleitos e a repressão das fraudes existentes no processo eleitoral brasileiro (MOREIRA, 2012).

O Processo Eleitoral Brasileiro abrange as atribuições nas três esferas do poder: executivo – execução e realização das eleições; legislativo – normatização dos atos que comportam o período eleitoral; judiciário – solucionar as controvérsias advindas das disputas eleitorais (MOREIRA, 2012).

Assim, preleciona Cândido (2008, p. 26) que o Direito Eleitoral pode ser conceituado como,

 

o ramo do Direito Público que trata de institutos relacionados com os direitos políticos e das eleições em todas as suas fases, como forma de escolha dos titulares dos mandatos eletivos e das instituições do Estado.

Nesses termos, esse campo especializado do Direito tem como escopo regulamentar o processo eleitoral, com abrangência acerca do sistema eleitoral, registro de candidaturas, apuração dos votos, filiação partidária, diplomação dos eleitos, bem como a disposição dos direitos políticos e da capacidade política de cada eleitor.

Assim, a justiça eleitoral é o meio eficaz de demonstrar a prevalência da soberania do povo na escolha dos seus representantes, de modo a preservar os direitos e garantias fundamentais conferidos pela Carta Magna de 1988, evitando o abuso de poder, captação de sufrágio e demais condutas vedadas pela legislação eleitoral (CÂNDIDO, 2008).

Em linhas gerais, a justiça eleitoral é caracterizada como sui generis, uma vez que comporta as funções de caráter consultivo e administrativo, bem como ponderar o exercício do poder jurisdicional (CASTRO, 2005).

Portanto, embora a justiça eleitoral apresente as funções judicantes conferidas pelos órgãos do poder judiciário, esta tem abrangência da função regulamentar, também conhecida como função normativa, tendo em vista a competência conferida ao Tribunal Superior Eleitoral nas expedições de instruções normativas e a adoção de providências e observância da legislação eleitoral.

Nesses termos, o poder normativo apresentado pela Justiça Eleitoral, encontra-se parâmetro no Código Eleitoral – Lei nº. 4.737/65 e na Lei das Eleições – Lei nº. 9.504/97, conforme transcritos:

Código Eleitoral, art. 1º, parágrafo único:

Art. 1º. Este Código contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado.

Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral expedirá Instruções para sua fiel execução. (BRASIL, 1965).[1]

 

Código Eleitoral, art. 23, IX:

Art. 23. Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior:

IX - expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código. (BRASIL, 1965).[2]

 

Lei 9.504/97:

Art. 105. Até o dia 5 de março do ano da eleição, o Tribunal Superior Eleitoral expedirá todas as instruções necessárias à execução desta Lei, ouvidos previamente, em audiência pública, os delegados dos partidos participantes do pleito. (BRASIL, 1997).[3]

 

Nesse contexto, de modo a embasar o caráter normativo conferido ao Tribunal Superior Eleitoral, adverte Costa (2004, p. 30-31):

Além de suas atribuições judicantes, a Justiça Eleitoral, por meio do Tribunal Superior Eleitoral, possui competência normativa ou regulamentar e, até mesmo, de certa forma, legislativa, resultante esta, da competência privativa desse órgão para expedir instruções que julgar convenientes à execução do Código Eleitoral, ou tomar quaisquer providências para a execução da legislação eleitoral, bem como estabelecer a divisão eleitoral do País.

 

2. Função Normativa conferida ao Tribunal Superior Eleitoral

 

O principio da legalidade é introduzido na sociedade contemporânea como um principio jurídico fundamental para estabelecer um parâmetro entre o ente estatal e a força imperativa da norma jurídica. Assim, esse princípio surge como garantia na proteção dos direitos individuais dos cidadãos em face da forma exorbitante exercida pelo Estado. Nesse paradigma, surgem na esfera jurídica o poder normativo e a teoria dos regulamentos para sopesar o princípio da legalidade material e formal existente no meio administrativo (MORAES, 2009).

Nesse contexto, o poder normativo, assim chamado de regulamentar, surge de um esfriamento do princípio da legalidade junto à atuação administrativa. Logo, o ente estatal, na figura do administrador, possui atribuição de elaboração e execução das normas perante a administração pública, de modo que a lei abre espaço ao regulamento com uma maior abrangência a atuação do agente público executivo. Portanto, o poder regulamentar origina-se da visão soberana do monarca diante do poder legislativo, em que o poder político exercido pelo parlamento sofre mutação, através da descentralização, em favor do poder executivo, de modo a garantir maior autonomia e eficiência da Administração Pública (CARVALHO FILHO, 2004).

Assim, a Carta Magna de 1988, em especial ao seu artigo 84, IV, dispõe que o poder regulamentar é aquele poder atribuído aos chefes do Executivo, para a edição de decretos e regulamentos com a finalidade de garantir a fiel execução à lei. (BRASIL, 1988).

Assevera Gasparini (2001, p. 44) que “o poder regulamentar é marcado por fundamentos políticos, que residem na conveniência e oportunidade conferida ao chefe do Executivo, para disciplinar os comandos legalmente previstos”.

Na mesma linha de pensamento, adverte o jurista Carvalho Filho (2004, p. 41):

Poder regulamentar, portanto, é a prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos gerais para complementar as leis e permitir a sua efetiva aplicação. A prerrogativa, registra-se, é apenas para complementar a lei; não pode, pois, a Administração altera-la a pretexto de estar regulamentado. Se o fizer, cometerá abuso de poder regulamentar. Por essa razão, o art. 49, V, da CF, autoriza o Congresso Nacional a sustar atos normativos que extrapolem os limites do poder regulamentar.

 

O Poder Legislativo tem atribuição de elaboração das leis, através do processo constitucional, ao passo que compete privativamente ao chefe do Poder Executivo a edição de regulamentos, prerrogativa conferida pela Constituição Federal de 1988. Portanto, embora ambos sejam normas jurídicas, apenas a lei tem a função de inovar no ordenamento jurídico, visto ser uma fonte primária do direito. Por sua vez, ao regulamento, é proibido alterar a lei, mas apenas desenvolvê-la, revelando uma fonte secundária do direito brasileiro (MORAIS, 2009).

Nesse contexto, o regulamento não tem a prerrogativa de criar um direito novo, uma vez que não constitui lei em sentido formal, conforme dispõe o inciso II do artigo 5º, da Constituição Federal de1988, transcrito:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade, nos termos seguintes:

II. ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.[4] (BRASIL, 2012).

O poder normativo apresenta uma submissão à lei, na medida em que não pode contrariar o disposto na lei (contra legem), sob pena de invalidação. Por sua vez, sua atribuição pode operar nos limites que a lei impuser, isto é, secundum legem. Portanto, a lei caracteriza-se como regra jurídica superior, de modo que o regulamento tem a sua eficácia sujeita ao amparo da lei geral.

Assim, a competência regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral na sua atribuição de expedição de resoluções para a execução das leis eleitorais não possui poder normativo geral, de modo que sua atuação é sub legem e jamais contra legem.

Portanto, de modo a embasar o caráter regulamentar do Tribunal Superior Eleitoral, o Ministro Sepúlveda Pertence, proferiu voto na Consulta nº 715, o qual gerou uma Resolução nº. 20.993/02, conforme transcrito:

Senhor Presidente, dispoe o art. 23, IX, do Código Eleitoral competir ao TSE expedir as instruções que julgar convenientes a execução deste código. Cuida-se de competência normativa, mas de hierarquia infralegal. O juízo de conveniência confiado a TSE, tem por objeto a expedição ou não da instrução, não o seu conteúdo. Este, destinado a execução do código e, obviamente, a todo o bloco da ordem jurídica eleitoral, está subordinado a Constituição e a lei. É verdade além de explicitar o que repute implícito na legislação eleitoral, viabilizando a sua aplicação uniforme pode o Tribunal colmatar-lhe lacunas técnicas, na medida das necessidades de operacionalização do sistema gizado pela Constituição e pela lei. Obvio, entretanto, que não as pode corrigir, substituindo pela de seus juízes a opção do legislador: por isso, não cabe ao TSE suprir lacunas aparente da Constituição ou da lei, vale dizer, o silencio eloquente de uma ou de outra. (apud, RAMAYANA, 2004, p. 23).

A competência do Tribunal Superior Eleitoral na expedição de suas Resoluções encontra-se amparo nos artigos 1º e 23, IX, ambos do Código Eleitoral e no artigo 105 da Lei nº. 9.504/97.

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Ressalta-se que o poder regulamentar tem como função elucidar as disposições apresentadas pela legislação ordinária, abordando determinada lei e possibilitando a sua fiel execução, muito embora sua abrangência tenha extensão maior do que lhe foi conferida. (CARVALHO FILHO, 2004).

Sabemos que no meio prático as resoluções são de grande valia, mas parece estranha a decisão proferida pelo próprio Tribunal Superior Eleitoral, no tocante que as mesmas têm caráter de lei ordinária federal, ao qual teve respaldo e entendido o Supremo Tribunal Federal.

Nesse contexto, ao proferir decisão sobre a força de lei das suas resoluções, o Tribunal Superior Eleitoral teve parâmetro em atribuição que não lhe é garantida pela Constituição Federal de 1988, demonstrando, em sentido material que suas decisões possuem equivalência às leis ordinárias federais, o qual configura como atos normativos primários.

De modo a corroborar o entendimento apresentado, colaciona-se parecer apresentado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal:

As Resoluções do TSE que têm conteúdo ‘regulamentar’ não são flagrantemente inconstitucionais a partir do momento que ‘tem força de lei’ e não ‘lei’ propriamente dita. Logo, estão fora da sanção ou veto do Presidente da República, porquanto fora do regime político de freios e contrapesos. A questão é técnica-jurídica, visando regulamentar eleições. Por isto o cuidado em não extrapolar e virar legislador positivo.

 

TSE pode legislar, criando direito, através de resoluções com força de lei ordinária federal (BE 15:13). Todavia, o que não pode é normatizar matérias de lei complementar ou constitucional, pois neste caso cabe ADI no STF.

 

Defendo que tanto TSE quanto TRE's podem editar resoluções, sejam como ato normativo primário ou secundário. Se primário, deve ter força de lei ordinária e não complementar ou constitucional. No caso do TRE/AL somente o que ofender a constituição ou lei complementar é que está sujeito a liminar do TSE pelo afastamento (exclusão do excesso – utille per inutille non vitiatur).[5]

Partindo do exposto, verifica-se que o poder normativo atribuído ao Tribunal Superior Eleitoral caracteriza pela autorização conferida pela lei para expedir resoluções e instruções, no intuito de regulamentação das eleições, bem como a fiel execução da legislação eleitoral brasileira. Ao contrário, nenhum precedente autoriza o Tribunal Superior Eleitoral a agir como legislador constituinte, de modo a inovar no ordenamento jurídico. (BRASIL, 1988).

Assim, as resoluções apresentadas pelo Tribunal Superior Eleitoral constituem em ato administrativo normativo, isto é, apenas um ato supletivo junto à lei, conforme interpretações nos seus aspectos lógico, literal e teleológico. (FIGUEIREDO, 2004).

Embora o caráter normativo atribuído ao Tribunal Superior Eleitoral tenha dimensões divergentes, vale salientar a importância e relevância das resoluções expedidas pelo órgão citado, uma vez que viabiliza a manutenção das eleições no período eleitoral, aborda demais assuntos referentes ao aspecto eleitoral, de modo a buscar uma melhor execução das atividades junto à população brasileira. (CERQUEIRA, 2004).

Por outro lado, vale lembrar que a interferência na independência dos poderes conferidos pela Carta Magna, no seu artigo 2º, retrata instabilidade nos direitos e garantias do eleitor, na medida em que o judiciário aplicaria regras pertinentes ao poder legiferante.(BRASIL, 1988).

Logo, partindo do pressuposto que o Tribunal Superior Eleitoral possui atribuição de inovar no mundo jurídico – exercendo funções de legislador -, surge uma transgressão as garantias fundamentais conferidas pela Constituição Federal de 1988.

Nessa esteira, verifica-se a título de curiosidade, que o Tribunal Superior Eleitoral agiu com excessos na apreciação de dois casos: um em relação ao Número de Vereadores e outro no tocante a questão da Lei Seca, de modo que viola a tripartição dos poderes e a harmonia entre os órgãos da jurisdição.

Nesse paradigma, pode enfatizar como pressupostos básicos para a validade das resoluções e instruções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral, a manutenção dos direitos e obrigações conferidos pela lei, de modo a não modificá-los, restringi-los e ampliá-los, bem como pautar no desenvolvimento dos princípios legais e na subordinação ao texto legislativo. Portanto, deve-se observar a norma infraconstitucional que introduziu o caráter regulamentar ao Tribunal Superior Eleitoral, preservando na sua essência, os princípios e garantias explícitos na Constituição Federal de 1988. (MOREIRA, 2012).

3. Natureza Jurídica das Resoluções preferidas pelo Tribunal Superior Eleitoral

O Tribunal Superior Eleitoral entende-se que a expedição de suas resoluções com respaldo no poder normativo eleitoral tem força de lei geral, no intuito de garantir a abrangência e execução do Código Eleitoral e decorrências, ensejando um recurso constitucional – ora recurso especial – em caso de ofensa ao seu texto pelas decisões proferidas por Tribunais Regionais.

Ementa: As resoluções do TSE, facultadas nos arts. 12, d e t, e 196, do Código, tem força de lei geral e a ofensa a sua letra expressa motiva recurso especial, nos termos do art. 167 do Código.[6]

 

As resoluções da justiça eleitoral, originadas das consultas formuladas aos seus tribunais, possuem força normativa.[7]

Assim, afirma doutrinadores que as resoluções proferidas pelo Tribunal Superior Eleitoral têm força de lei ordinária, destacando-se como fontes diretas no direito eleitoral.

Por sua vez, com a apresentação da resolução com força de lei não codifica que a mesma tenha caráter de uma lei ordinária em sentido estrito, de modo a sujeitá-la ao controle de constitucionalidade. Nesse caso, a resolução apenas sofrerá o controle concentrado de constitucionalidade se seu conteúdo obtiver função regulamentar.

A legislação eleitoral brasileira tem como escopo disciplinar as eleições em seus âmbitos estruturais, de maneira a fiscalizar os registros de candidaturas, a votação, a apuração, a propaganda partidária eleitoral, os calendários eleitorais e demais assuntos pertinentes, de maneira que as resoluções proferidas pelo Tribunal Superior Eleitoral tem essência de complementação da lei eleitoral, para o cumprimento e execução das normas eleitorais. Logo, as resoluções se restringem apenas em dispor assuntos tratados por leis eleitorais, ou seja, estas são simples regulamentos idênticos aos decretos regulamentares elaborados pelo chefe do poder executivo.

Na atual conjuntura, percebe-se que os partidos políticos, através de suas consultas ao Tribunal Superior Eleitoral, fazem com que esta Corte Superior indaga sobre assuntos não previstos na legislação, necessários ao bom andamento do pleito eleitoral. Assim, diante das consultas realizadas, o Tribunal Superior Eeleitoral realiza a expedição de resoluções, de modo que às vezes exorbita do seu poder regulamentar, o que vem gerando controvérsias sobre a inconstitucionalidade destas, ao fato de criar ato normativo primário, isto é, inovando os direitos e garantias sem o respaldo do princípio da legalidade.

Sobre o assunto posto, adverte Cerqueira (2004, p. 1396) que “as resoluções que criam direitos e garantias junto ao ordenamento eleitoral brasileiro, se materializam de caráter normativo autônomo, com abrangência geral”.

Sobre o aspecto de ilegalidade, o Tribunal Superior Eleitoral já realizou expedição de resolução que contraria o estipulado no Código Eleitoral, visto que contrapõe a lei federal, ao invés de apenas complementá-la ou regulamentá-la. Nesse contexto, é o que se depreende nos artigos 1º e 11 da Resolução 15.844/89, em contrapartida com os artigos 40 e 184 do Código Eleitoral – Lei nº. 4.737/65, conforme transcritos:

TSE, Resolução 15.844/89, Art.1º – A totalização dos resultados de cada urna será realizada pela Comissão Apuradora de cada Tribunal Regional Eleitoral, valendo-se, para tanto, dos Boletins de urna que forem emitidos pelas Turmas Apuradora de cada Junta Eleitoral, nos termos do art. 204 e seu parágrafo do Código Eleitoral. 

Art.11– Encerrada a totalização do município, a Comissão Apuradora enviará, por teleprocessamento, o resultado dele, remetendo, pela via aérea, o seu mapa totalizador, devidamente autenticado por seus membros e pelos fiscais de partido presentes no momento.[8]

 

Código Eleitoral, Art. 40 - Compete à Junta Eleitoral; I - apurar, no prazo de 10 (dez) dias, as eleições realizadas nas zonas eleitorais sob a sua jurisdição; II - resolver as impugnações e demais incidentes verificados durante os trabalhos da contagem e da apuração; III - expedir os boletins de apuração mencionados no Art. 178;

IV - expedir diploma aos eleitos para cargos municipais.

Art.184 - Terminada a apuração, a Junta remeterá ao Tribunal Regional todos os papéis eleitorais referentes às eleições estaduais ou federais, acompanhados dos documentos referentes à apuração, juntamente com a ata geral dos seus trabalhos, na qual serão consignadas as votações apuradas para cada legenda e candidato e os votos não apurados com a declaração dos motivos porque o não foram.[9]

As resoluções proferidas pelo Tribunal Superior Eleitoral possuem conteúdo simplesmente interpretativo junto à legislação eleitoral, tendo em vista as diversas consultas realizadas junto a Corte Superior para esclarecimento e aplicação de algum dispositivo legal eleitoral. A interpretação da lei eleitoral pelas resoluções se reveste de caráter meramente acessório, de forma a caracterizar um ato normativo secundário. (CERQUEIRA, 2004, p. 1398).

Ademais, mesmo a resolução apresentando forma interpretativa, não deve ser afastada a sua força normativa geral. Portanto, resta demonstrado que as resoluções do Tribunal Superior Eleitoral constituem atos normativos, moldados através de um dever-ser, para a fiel execução e aplicação dos direitos e garantias aos seus destinatários.

Nesse diapasão, pode se visualizar que as resoluções são atos normativos secundários, de caráter acessório, posto que apenas complementa a norma eleitoral. Por sua vez, as resoluções podem ser consideradas como ato normativo primário, quando da criação de regras não previstas na legislação eleitoral, extrapolando a função regulamentar, o que apresenta um ato normativo autônomo, podendo sofrer assim, um controle concentrado de constitucionalidade.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em breves argumentos, buscar-se-á apresentar um suporte mínimo acerca das questões envolvendo o poder regulamentar atribuído ao Tribunal Superior Eleitoral, uma vez que o tema é sujeito a divergências doutrinárias e entre estudiosos, de forma a encontrar a melhor exegese.

A Justiça Eleitoral é caracterizada como sui generis do direito brasileiro, ao qual possui como uma de suas atribuições à função normativa, que decorre de previsão legal, conforme o Código Eleitoral – Lei nº. 4.737/65 e a Lei das Eleições – Lei nº. 9.504/97.

Na conjuntura contemporânea, a Justiça Eleitoral foi contemplada com a competência de expedição de resoluções e instruções normativas para a fiel execução do Código Eleitoral, bem como a aplicação das funções eleitorais subsidiárias. Assim, fundamentos jurídicos embasam a atribuição normativa em questão, que fica submissa ao surgimento de nova legislação para o aprimoramento do ramo eleitoral.

Nessa esteira, a função regulamentar, também chamada de normativa, deve ser visualizada através do bom senso comum, na medida em que deve prevalecer o equilíbrio e a instabilidade das decisões judiciais proferidas diante dos casos concretos.

Numa visão geral, percebe-se que a Justiça Eleitoral constitui em uma executora fundamental e qualificada para mesclar a lei eleitoral, mediante a expedição de suas resoluções, de modo a coibir as práticas abusivas e erronias durante o período eleitoral, através de eficiência e agilidade junto aos seus destinatários e garantindo maior lisura ao processo eleitoral.

Em contrapartida, as resoluções expedidas pelo Tribunal Superior Eleitoral devem submeter a algumas restrições – limites constitucionais. Assim, o poder regulamentar deve estrita prevalência ao principio da legalidade, de modo que esta não deve inovar ao ordenamento jurídico ou contrariar disposição prevista na legislação vigente.

Portanto, em caso de violação as hipóteses levantadas, o Tribunal Superior Eleitoral incorrerá em usurpação de função legiferante – atribuição conferida ao Poder Legislativo na elaboração das leis. Logo, resta caracterizada essa usurpação quando da expedição de resolução nos casos da Lei Seca e da Fixação do Número de Vereadores. Logo, diante das ingerências cometidas pela Corte Superior, o meio constitucional eficaz para combater é através de um controle concentrado de constitucionalidade.

Controvérsias existem em torno da função normativa atribuída ao Tribunal Superior Eleitoral e posicionamentos diversos de doutrinadores sobre o instituto. Contudo, pode-se afirmar que as resoluções e instruções normativas expedidas pela Corte Superior Eleitoral são meios jurídicos úteis que a Justiça Eleitoral possui para executar e aplicar sua função primordial como justiça especializada do ramo do direito, pautando no fiel processamento do pleito eleitoral e suas decorrências, primando pela sua imparcialidade e fiscalização, bem como a observância dos direitos e garantias constitucionais dos eleitores brasileiros.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CÂNDIDO, Joel José. Direito Eleitoral Brasileiro, 4. ed., Edipro: Bauru - 2008.

CASTRO, Edson de Resende. Teoria e Prática do Direito Eleitoral, 2. ed. Belo Horizonte: Mandamentos Editora, 2005.

CARVALHO FILHO, José dos Santos, Manual de direito administrativo, 11. ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris - 2004.

CERQUEIRA, Thales Tácito Pontes Luz de Pádua. Direito eleitoral brasileiro, 3. ed., Belo Horizonte: Del Rey - 2004.

_______________Código Eleitoral Brasileiro – Lei nº. 4.737 de 15 de Julho de 1965.

_______________Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

COSTA, Elcias Ferreira da. Direito Eleitoral: legislação, doutrina e jurisprudência. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

COSTA, Tito. Recursos em matéria eleitoral, 8. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais - 2004.

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo, 7. ed., São Paulo: Malheiros - 2004.

GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo, 6. ed., São Paulo: Saraiva - 2001.

_______________Lei das Eleições – Lei nº. 9.504 de 30 de Setembro de 1997.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 6. ed., São Paulo: Atlas - 2009.

 

MOREIRA, Roberto de Almeida. Curso de Direito Eleitoral. 6ª ed. ampl. rev. e atual. Salvador: JusPodivm, 2012.

RAMAYANA, Marcos. Direito eleitoral, 3. ed.,Niterói: Impetus - 2005.

_______________Resolução nº. 15.844/89 do Tribunal Superior Eleitoral.

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Sobre o autor
Angelo Mendes Ferreira

Advogado com ênfase em Direito Público. Aluno Regular da Modalidade Intensiva para Doutorado em Direito Penal - Facultad de Derecho - Universidad d Buenos Aires (2013).

Informações sobre o texto

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