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O estagiário de advocacia

01/11/2000 às 00:00
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Orienta e regula a Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil) a inscrição de estudantes e de bacharéis em Direito que desejem ingressar no quadro de estagiários da OAB, com vista a disciplinar o estágio profissional respectivo, exigindo, para esse efeito, o atendimento aos seguintes requisitos: a) capacidade civil; b) inscrição eleitoral e quitação relativa ao serviço militar; c) não exercer atividade incompatível com a advocacia; d) possuir idoneidade moral; e, e) prestar compromisso perante o Conselho Seccional (art. 9º).

A inscrição deve ser requerida perante o Conselho Seccional em cujo território esteja localizado o curso jurídico do estagiário, devendo ter a duração de dois anos. Oportuno ver que o aluno de curso jurídico que exerça atividade incompatível com a advocacia, observadas as situações previstas no art. 28 da Lei 8.906/94, pode frequentar o estágio ministrado pela respectiva instituição de ensino superior, mas apenas para o efeito de aprendizagem, vedada, no entanto, a sua inscrição na OAB (art. 9º, § 1º).

Requerida e sendo deferida a inscrição ao estagiário, cumpre saber que atos poderão ser por ele praticados validamente, sem que para isso tenha que sofrer constrangimentos ou embaraços que usualmente são vistos no dia-a-dia. O tema acha-se disciplinado pelo Regulamento Geral ao Estatuto da Advocacia e da OAB, instrumento editado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, atendendo ao comando e à autorização inscrita no art. 78 da Lei 8.906/94. Aludindo ao estágio profissional de advocacia como instrumento necessário à inscrição no quadro de estagiários e meio adequado de aprendizagem prática, informa o Regulamento Geral, em seu art. 29, que o estagiário pode praticar, em conjunto com advogado, os atos privativos previstos no art. 1º da Lei 8.906/94. Ou seja, defere-se ao estagiário a prerrogativa de postular perante qualquer órgão do Poder Judiciário, bem como exercitar as atividades de consultoria e assessoria jurídicas, desde que coadjuvado pela presença e sob a supervisão do advogado.

Além dos atos privativos anteriormente vistos, dispõe o Regulamento Geral que o estagiário, isoladamente, pode praticar, sob a responsabilidade do advogado, os seguintes atos:

a) retirar e devolver autos em cartório, assinando a respectiva carga;

b) obter junto aos escrivães e chefes de secretarias certidões de peças ou autos de processos em curso ou findos;

c) assinar petições de juntada de documentos a processos judiciais ou administrativos.

Além dos atos especificados, permite-se ao estagiário praticar, também isoladamente, quando autorizado pelo advogado, os atos extrajudiciais de interesse do escritório e do cliente.

Não raro, todavia, autoridades e serventuários despreparados, imbuídos por mero espírito de emulação e decerto por despreparo, resolvem criar, sem fundamento legal, óbices a essa atuação do estagiário que, humilhado e constrangido, vê-se compelido a ouvir que a sua condição não admite e não permite a prática de atos simples e corriqueiros como, por exemplo, retirar autos com vista ao advogado com quem atua. A atitude verificada, além de arbitrária e abusiva, mostra-se contrária aos interesses da própria Justiça e de quem a ela recorre, porquanto embaraça o exercício de uma prerrogativa legalmente assegurada e geralmente retarda ou dificulta a prática de atos processuais.

É válida e não pode ser vetada ou obstada a atuação do estagiário regularmente inscrito na OAB, desde que regularmente credenciado perante o juízo, seja por documento expresso e específico firmado pelo advogado, seja por estar incluído como beneficiário dos poderes ad judicia inscrito no instrumento de mandato.

Oportuno registrar que o Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, por intermédio da INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 6, de 11 de outubro, publicada no DJ de 16.10.2000, regulamentando procedimentos judiciais e administrativos no âmbito daquela Corte, estabeleceu, no art. 14 da norma em comento, que "Durante o transcurso de prazo recursal, somente poderão retirar processos da Secretaria advogados com procuração nos autos e estagiário devidamente habilitado" (grifou-se).

É ainda no âmbito daquela mesma Egrégia Corte que se vai encontrar orientação jurisprudencial firmada no sentido de assegurar ao estagiário a garantia de atuação em juízo, para que possa ele cumprir, de forma efetiva, as atividades curriculares previstas, consolidando os conhecimentos teóricos recebidos, bem como agregando ao seu currículo a necessária prática forense[1] exigida em concursos públicos diversos.

Veja-se, nesse sentido, o aresto que a seguir vai transcrito que, de forma induvidosa, proclama essa prerrogativa ao afirmar que:

Recurso ordinário em Mandado de Segurança. Retirada dos autos do cartório. Direito do advogado. Veto a auxiliares de escritório e estagiários sem procuração nos autos. A retirada dos autos do cartório é direito do advogado, extensivo aos estagiários inscritos na OAB, nos termos dos arts. 40, III, do Código de Processo Civil e 7º, XV, do Estatuto da Advocacia. Não cerceia este direito portaria do juiz que veta a entrega de autos aos auxiliares de escritório, secretarias e estagiários sem procuração nos autos, ainda que portem recibo do advogado patrono da causa. Recurso Ordinário a que se nega provimento. (Grifou-se).

(STJ – 1ª Turma – ROMS 6631/GO (1996/0000796-9) – Rel. Min. José de Jesus Filho – pub. DJ de 16.09.1996, pág. 33.676).

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Normas de Serviço da Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo determinam que "A retirada de autos cíveis de cartório é reservada unicamente a advogados ou estagiários regularmente inscritos na OAB, constituídos procuradores de alguma das partes" - NS 91 (Grifou-se).

A atuação em juízo do estagiário de Direito é legalmente prevista e admitida em todos os níveis, bastando para isso que esteja inscrito na OAB e haja recebido do advogado a quem presta a sua colaboração, a competente credencial, seja mediante autorização específica ou por meio de substabelecimento de procuração. Não é lícita e muito menos razoável a atitude de quem quer que seja – juiz, membro do Ministério Público, delegado ou escrivão de polícia, serventuário, servidor público etc. – que sem qualquer fundamento válido, ou por mero arbítrio, visa a embaraçar essa atuação regulada e devidamente autorizada pela legislação em vigor.

O abuso, se ocorrente, deve ser comunicado à Ordem dos Advogados sempre que se fizer presente, para que providências sejam tomadas com o escopo de punir a postura inadequada, podendo, ainda, gerar a impetração de mandado de segurança com vista à proteção do direito líquido e certo que ao estagiário é em lei assegurado.


NOTAS

1. STJ – 3ª Turma – MS 5136/DF – Rel. Min. Fernando Gonçalves – pub. DJ de 15/12/1997, p. 66197

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Sobre o autor
Airton Rocha Nobrega

Advogado inscrito na OAB/DF desde 04.1983, Parecerista, Palestrante e sócio sênior da Nóbrega e Reis Advocacia. Exerceu o magistério superior na Universidade Católica de Brasília-UCB, AEUDF e ICAT. Foi Procurador-Geral do CNPq e Consultor Jurídico do MCT. Exerce a advocacia nas esferas empresarial, trabalhista, cível e pública.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NÓBREGA, Airton Rocha Nobrega. O estagiário de advocacia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 47, 1 nov. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/299. Acesso em: 23 abr. 2024.

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