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Processo judicial automatizado e virtualizado

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01/07/2002 às 00:00
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Quando foram editados os códigos de processo civil, penal e de organização judiciária, os legisladores pensavam, com a naturalidade do seu tempo, que os respectivos atos de registro, controle e de operação, seriam praticados pelo costumeiro manuscrito, em livros, folhas soltas e em fichas de cartolina.

Com o aparecimento da máquina de escrever, a caneta passou a ter função quase que exclusivamente para o registro da assinatura do operador do serviço forense.

Mais tarde, com a chegada do computador, foram efetuadas algumas adaptações para a realização dos serviços nos cartórios/secretarias e gabinetes dos magistrados e, apesar dessa modesta evolução, os códigos continuaram e ainda continuam iguais.

Nos últimos anos, todavia, diante das novas tecnologias advindas da informática, surgiu inevitavelmente a necessidade de reforma da legislação processual, própria e adequada para o processamento das ações judiciais.

Os atropelos já estão surgindo e, conforme pode ser visto na Revista Jurídica CONSULEX, em artigos publicados sob os títulos "A ciência do direito informático" e "Contratos eletrônicos internacionais" [1] há referência a uma lei que compatibiliza informática e processo judicial. Eis o inteiro teor dessa lei.

Lei nº 9.800, de 26 de maio de 1999.

Permite às partes a utilização de sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais

O Presidente da República

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º É permitida às partes a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar, para a prática de atos processuais que dependam de petição escrita.

Art. 2º A utilização de sistema de transmissão de dados e imagens não prejudica o cumprimento dos prazos, devendo os originais ser entregues em juízo, necessariamente, até cinco dias da data de seu término.

Parágrafo único. Nos atos não sujeitos a prazo, os originais deverão ser entregues, necessariamente, até cinco dias da data da recepção do material.

Art. 3º Os juízes poderão praticar atos de sua competência à vista de transmissões efetuadas na forma desta Lei, sem prejuízo do disposto no artigo anterior.

Art. 4º Quem fizer uso de sistema de transmissão torna-se responsável pela qualidade e fidelidade do material transmitido, e por sua entrega ao órgão judiciário.

Parágrafo único. Sem prejuízo de outras sanções, o usuário do sistema será considerado litigante de má-fé se não houver perfeita concordância entre o original remetido pelo fac-símile e o original entregue em juízo.

Art. 5º O disposto nesta Lei não obriga a que os órgãos judiciários disponham de equipamentos para recepção.

Art. 6º Esta Lei entra em vigor trinta dias após a data de sua publicação.

Brasília, 26 de maio de 1999; 178º da Independência e 111º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Renan Calheiros.

Neste trabalho, não há preocupação com determinadas normas projetadas para a reforma do Poder Judiciário, atualmente pretendida.

No âmbito geral, a visão está voltada unicamente para a racionalização dos serviços forenses, pensando sempre numa legislação processual moderna, e compatível com as técnicas exigidas pela informática, e que possa proporcionar a automação dos cartórios/secretarias e a transmutação do processo físico para o virtual.

Para tanto, impõe-se a parceria de técnicos das áreas do Direito e da Computação, conforme doutrina Luiz Adolfo Olsen da Veiga, quando afirma:

"Se queremos uma Justiça que atenda aos reclamos da cidadania com rapidez e eficiência, neste novo milênio, não poderemos prescindir dos sistemas inteligentes.

E, para construirmos sistemas inteligentes, verdadeiramente adaptados à ciência jurídica e contribuindo para a efetivação do ideal de Justiça, necessitamos da participação direta do profissional do Direito, em conjunto, sem dúvida, com os profissionais da área de informática, já que a matéria é decididamente interdisciplinar"

[2].

Nos dias atuais, a estatística revela que o Judiciário brasileiro, nas esferas federal e estadual, está abarrotado de processos pendentes de julgamento, em função da crescente demanda resultante, principalmente, das ações em que o Poder Público é parte interessada e, também, das novas e importantes tutelas jurídicas criadas pela vigente Constituição Federal.

Alguns altos agentes do Poder Judiciário reclamam, com razão [3], a falta de recursos humanos e materiais para atender a esse progressivo aumento do serviço forense. Com efeito, a todo instante sente-se a necessidade de admitir mais magistrados e serventuários e até de construir novos estabelecimentos para o foro de primeiro e segundo graus de jurisdição. Sob certo aspecto administrativo, isso pode criar um caos tal no setor, que mesmo um poderoso contingente de funcionários, que ocupam grandes espaços físicos, não conseguiria solucionar a morosidade do serviço público judicial, tão reclamada de forma repedida pelos jurisdicionados.

Observa-se que seria mais conveniente, dentro do possível, direcionar os minguados recursos financeiros para as áreas do planejamento e da pesquisa, tendo como meta final o aprimoramento da prestação jurisdicional, nos cartórios/secretarias e nos gabinetes dos magistrados.

Para a consecução desse objetivo, desponta a necessidade:

1)de reforma da legislação processual, editada somente de forma codificada;

2)dessa legislação ser compatível com as técnicas exigidas pela ciência da computação, notadamente para o funcionamento em rede mundial;

3)da criação e implantação de sistemas informatizados inteligentes (softwares);

4)de que esses sistemas permitam a automação dos cartórios/secretarias e, também,

5)a transmutação do processo físico para o virtual.

Automação e processo virtual

Na prática, o que é automação?

Aqui em Santa Catarina, a Justiça dispõe de sistema informatizado funcionando em rede, por onde o usuário pode, via internet, visualizar e imprimir dados relativos:

a)à identificação de processos;

b)à fase processual;

c)ao inteiro teor de acórdãos.

Isso não caracteriza, tecnicamente, automação. Diz-se que o sistema é automático quando os mecanismos controlam seu próprio funcionamento, quase sem a interferência do homem. Numa fábrica têxtil, por exemplo, o tecido é colocado numa máquina e ao final vê-se uma toalha felpuda totalmente acabada e, talvez, até já embalada e encaixotada para despacho; em uma montadora de automóveis, o chassi começa a percorrer uma trilha avante, em que até robôs aplicam peças e acessórios e, no final da produção em série, vê-se um lindo automóvel pronto para trafegar. Isso é automação!

No Judiciário isso também pode ser feito. Mas, de que modo?

As principais casas de crédito brasileiras, tais como Itaú, Bradesco, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, apresentam exemplos fantásticos sobre a produção de serviços destinados a atender o numeroso público, através da moderna tecnologia informatizada [4]. Por força da demanda, se as casas de crédito tivessem que funcionar do mesmo modo que o Judiciário, fatalmente estariam fadadas ao insucesso e à falência, por problemas de ordem econômica e administrativa. Nota-se que elas prezam e se fazem prezar pela qualidade, pelo bom desempenho e pelo atendimento que dispensam à sua clientela. É falso dizer-se que elas funcionam assim porque as atividades são outras e diferentes das praticadas pelo Judiciário. Ora, segundo as técnicas de organização e métodos - de que se preocupa a ciência da administração - não importam os tipos de serviços, pois todos podem ser processados, sempre, pela adoção de metodologias próprias, típicas de trabalho informatizado, bastando apenas dispor-se de sistemas inteligentes (softwares) e de computadores.

Veja-se, a título de exemplo parcial, como um processo de execução de quantia certa, no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), contra devedor solvente, com base em nota promissória, poderia funcionar num sistema automatizado inteligente e autorizado por legislação processual compatível com a informática, no cartório ou secretaria de foro provido de mais de uma vara cível [5]:

1)o advogado do credor, de posse da procuração e do título executivo extrajudicial, compõe a inicial em seu microcomputador;

2)em seguida, faz o depósito das custas iniciais, em conta vinculada ao juízo, por meio de guia [6];

3)a seguir, extrai cópias da procuração, do título e da guia [7], pela técnica de imagem, para a formação de arquivo informatizado;

4)feito isso, o advogado envia ao cartório/secretaria, via internet [8], os arquivos informatizados que compõem a inicial e seus anexos [9];

5)o cartório/secretaria recebe esse material, aciona o comando para que o sistema lhe dê um número seqüencial de processo e, após a leitura dos requisitos mostrados no vídeo pelo sistema, caso cumpridos no momento ou posteriormente [10], efetua o definitivo cadastramento dentro do sistema informatizado, sendo que a distribuição do feito se fará automaticamente para uma das varas cíveis;

6)ao fazer a distribuição, o sistema, também automaticamente, expede o ato de citação para que seja cumprido: a) pelo oficial de justiça; b) ou pelo correio; c) ou por fax; d) ou por e-mail; e) ou ainda por outro meio de comunicação permitido pelo código processual ou de organização judiciária;

7)no caso de o devedor manter-se em silêncio no prazo legal que lhe foi concedido para pagar ou nomear bens à penhora [11] e se defender, o sistema expede o mandado de penhora para ser cumprido pelo oficial de justiça sorteado automaticamente para o caso;

8)o devedor poderá efetuar o depósito do valor reclamado pelo credor e respectivos acessórios, através de guia já preenchida, denominada, por exemplo, DAJ (documento de arrecadação judicial) que acompanhará o instrumento citatório, com menção de que os valores serão atualizados de acordo com o índice monetário informado;

9)o devedor poderá, entretanto, oferecer bens à penhora, através de documento, por exemplo, denominado TEP [12] (termo extrajudicial de penhora), preenchido pelo advogado, sob a fé do seu grau, onde, entre outros dados, apareçam a sua assinatura, a do devedor e de sua mulher, se casado for, e a do depositário, com menção do seu CPF e endereço profissional e residencial, bem como, a descrição completa da coisa, seu registro, localização e declaração da existência ou não de ônus real;

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10)o advogado do devedor, de posse da procuração e do TEP, extrai cópias pela técnica de imagem, para a formação de arquivo informatizado;

11)feito isso, o advogado envia pela internet os arquivos informatizados que são automaticamente inseridos no processo virtual em andamento;

12)a partir da data do envio dessas peças processuais, começa a correr para o devedor o prazo legal de dez (10) dias para opor-se por meio de embargos (art. 736 e seguintes do CPC) e/ou de simples petição no processo de execução [13], cujas peças processuais são enviadas pela internet;

13)assim que o advogado do credor fizer procura [14] no sistema, sobre o andamento do seu processo de execução, começa a correr igual prazo para, querendo, impugnar os embargos à execução (art. 740 do CPC);

14)é nos embargos ou no processo de execução que o devedor ou o credor pode opor-se à penhora efetivada, cabendo ao juiz decidir mediante despacho sobre a apontada irregularidade do ato e, conforme o caso, determinar o cumprimento de sua decisão interlocutória;

15)o oficial de justiça cumpre as diligências nos lugares onde possa haver registro ou a existência de bens penhoráveis [15], e, ao final, lavrará o respectivo auto de penhora;

16)nas dependências do fórum, o oficial, ao ter acesso ao sistema automatizado, responde a um questionário a ele apresentado, sobre o cumprimento do mandado que lhe foi entregue, a fim de que o ato de penhora seja integralmente cumprido com todos os dados previstos pela legislação processual e assim não possa posteriormente ser declarado incompleto ou írrito [16]. O auto de penhora e, eventualmente, outros originais de documentos transformados em arquivos eletrônicos, serão guardados como se fossem autos suplementares, no arquivo geral do fórum para que possam futuramente ser examinados pelas partes interessadas;

17)na ausência de bens penhorados, o sistema, automaticamente, faz a anotação desse fato no campo próprio da fase processual, a fim de que o advogado do credor, quando na procura de informação pela internet, tome ciência disso e, no prazo legal, peça o que achar conveniente, sob pena de o processo ser arquivado administrativamente;

18)lavrado o auto de penhora (porque o devedor não pagou e nem ofereceu bens à penhora), na mesma oportunidade o devedor é intimado desse ato e cientificado de que dispõe de prazo para defesa (vide item 12 acima);

19)dentro do prazo legal, sendo o caso, o advogado do devedor, de posse da procuração e de documentos com os quais pretende desconstituir o título executivo extrajudicial, compõe a inicial em seu microcomputador;

20)a seguir, extrai cópias da procuração e daqueles documentos, pela técnica de imagem, para a formação de arquivo informatizado;

21)feito isso, o advogado envia pela internet os arquivos informatizados que compõem a defesa (embargos) e seus anexos, inclusive a petição referida no item 12 acima, se for de seu interesse;

22)o cartório/secretaria recebe esse material, dá comando para que o sistema lhe dê um número seqüencial de processo (vinculado/conexo ao respectivo processo de execução forçada) e, após o exame dos requisitos mostrados no vídeo pelo sistema, caso cumpridos no momento ou posteriormente, efetua o definitivo cadastramento dos embargos do devedor dentro do sistema informatizado;

23)feito isso, o serventuário anota no campo próprio que a ação de embargos está processada, que existe garantia de juízo e o credor pode, querendo, apresentar a impugnação do seu interesse;

24)o advogado do credor, assim que fizer procura na internet acerca do seu processo de execução, independentemente de qualquer prévia intimação oficial, terá ciência inequívoca da existência dos embargos do devedor, passando daí em diante a correr o prazo legal para apresentar, querendo, sua impugnação, a ser composta no seu microcomputador;

25)a seguir, extrai cópias de documentos comprobatórios de sua impugnação, pela técnica de imagem, para a formação de arquivo informatizado;

26)feito isso, o advogado envia pela internet os arquivos informatizados que compõem a impugnação e seus anexos, os quais, automaticamente, passam a compor o processo virtual, desde que apresentados tempestivamente ao sistema informatizado;

27)estando os processos de execução e embargos, em princípio, devidamente formalizados segundo as regras processuais estabelecidas pelo sistema automatizado, tudo mediante o gerenciamento informatizado, inclusive on-line, com o auxílio dos advogados e de serventuários, pessoa do cartório dá o comando para que o processo virtual seja encaminhado ao gabinete do juiz da causa, começando daí a correr um prazo estatístico controlado, em rede informatizada, pela Corregedoria Geral da Justiça;

28)pelo visto, até a esta fase o juiz não praticou qualquer ato processual em ambos os processos virtuais (execução e embargos), de forma que o seu tempo foi aproveitado para o julgamento de outras causas sob sua responsabilidade;

29)ao ter ciência dos processos conexos de execução e embargos, surge então a necessidade de o juiz ler, examinar, estudar e decidir sobre o processado;

30)assim agindo, poderá ele determinar o suprimento de eventuais lacunas, decidir a causa com ou sem exame do mérito ou, então, dar comando para o sistema marcar data para conciliação, instrução e julgamento, neste último caso, com as provas já devidamente especificadas [17] pelas partes durante a fase postulatória;

31)os advogados das partes, assim que fizerem procura pela via internet, sobre o andamento dos dois processos, ficarão automaticamente intimados sobre despacho, decisão interlocutória ou final proferida pelo juiz, podendo ou devendo, conforme o caso, suprir lacuna e/ou apresentar recurso no prazo legal;

32)sendo caso de recurso de apelação, por exemplo, o advogado compõe as razões do inconformismo no seu microcomputador;

33)em seguida, faz o depósito das custas para o processamento no segundo grau de jurisdição, em conta vinculada ao juízo, por meio de guia que automaticamente será inserida no processo virtual, onde já se encontra a sentença apelada inteiramente disponível aos usuários do sistema;

34)feito isso, o advogado envia pela internet, ao juízo da causa, o arquivo informatizado que compõe as razões do seu recurso, o qual é inserido automaticamente dentro do respectivo processo virtual. Com igual formalidade, o advogado do apelado envia, querendo, as contra-razões do recurso, dentro do prazo que começa a correr de quando faz procura via internet;

35)o escrivão/secretário é alertado automaticamente pelo sistema a respeito do recurso. Em seguida faz o exame dos requisitos mostrados no vídeo pelo sistema e, depois de dá-los como cumpridos no momento ou posteriormente, aciona o comando necessário para que os processos virtuais de execução e embargos, já com o recurso, sejam transmitidos via internet, para o segundo grau de jurisdição;

36)não parece haver a necessidade de que o recurso, de apelação cível por exemplo, ser previamente submetido à apreciação do juiz da causa, porque, quando o sistema automatizado detecta qualquer defeito processual na sua fase de interposição, automaticamente, o escrivão/secretário é instado a efetuar a devida correção ou até obrigado a devolver [18], pela via internet, ao causídico, a peça processual remetida intempestivamente ao fórum. Nem se diga que o juiz deva pronunciar-se em que efeito recebe o apelo. Na atualidade, o pronunciamento é, para o caso examinado, por exemplo, pelo artigo 520, V, da própria legislação processual (CPC).

Está apresentada, assim, uma amostra de como poderia funcionar, a partir de legislação processual compatível com a ciência da computação, sistema automatizado e informatizado numa rede de unidades judiciárias.

O leitor pode observar que o juiz só passou a atuar nos dois processos no exato momento em que a ação de embargos do devedor foi levada a seu conhecimento, completamente processada, para fins de determinar o cumprimento de eventual irregularidade, de julgar a lide com exame ou não do mérito, ou de marcar data para audiência.

Por força do disposto no artigo 133 da Constituição Federal, no caso aqui examinado, o advogado desenvolveu múltiplos atos processuais que não praticaria segundo o vigente Código de Processo Civil. A grande carga de trabalho forense não deve ficar unicamente sob a responsabilidade dos serventuários, porque isto aumentaria sobremaneira o custo operacional e comprometeria o orçamento do Poder Judiciário. Ora, o advogado é remunerado, pelo seu constituinte e/ou pela parte contrária na hipótese de sucumbência, de forma que também lhe cabe, como procurador, produzir serviço forense, como elemento indispensável à administração da justiça.

Ficou também demonstrada - fugindo às regras atuais - a quase dispensa total de intimação de advogado pela imprensa oficial. Desse jeito, o ato que dependa de intimação, é disponibilizado dentro do processo virtual, na internet. O advogado fica tacitamente intimado no momento em que tem acesso ao processo específico de seu interesse. Para se evitarem atos de chicana, em que o advogado não queira dar-se por intimado, via on-line, o sistema informatizado, depois de esgotado um tempo razoável em "compasso de espera", extrai o devido instrumento do ato de intimação a ser processado pelo diário da justiça. É que a intimação por e-mail - para a hipótese - não se mostra conveniente, pois pode o causídico destinatário, eventualmente, alegar que esteve, por exemplo, viajando e não abriu o correio eletrônico no seu escritório profissional, e por causa disso não tomou conhecimento da intimação judicial. Proceder a exame no microcomputador para provar o contrário, atentaria contra os princípios da inviolabilidade do serviço do advogado e produziria custo elevado numa perícia especializada para a recuperação de arquivo, talvez, já deletado.

Conforme revelado neste trabalho, o serviço de cartório/secretaria produzido por programa (software) autorizado por legislação processual compatível com a informática não é mais dirigido só e diretamente pelo juiz ou pelo escrivão/secretário, mas, sim, gerenciado pelo sistema de automação [19] e, evidentemente, coordenado pelo juiz da causa, auxiliado pelos serventuários [20] a serviço de todas as unidades judiciárias da mesma Comarca.

Com a adoção do processo virtual, evita-se, sempre que possível, o atendimento de balcão do cartório/secretaria, e a locomoção de advogado entre seu escritório e o fórum, para dar cumprimento a seu mandato, porque todas as informações estarão disponíveis na rede mundial informatizada. Citem-se, como exemplos: petição inicial e complementar, defesa/contestação, recurso, sentença, acórdão e cópias de documentos e dos atos e termos que compõem, em suma, o processo judicial virtual.

Os documentos originais fotocopiados por sistema eletrônico ficam depositados no arquivo geral do fórum para eventual exame, e aqueles mantidos em poder da parte, poderão posteriormente ser requisitados pela autoridade judiciária, contanto em que a lei imponha severas sanções pecuniárias contra quem praticar ato de chicana, não exibindo, por exemplo, o original requisitado ou, exibindo, não corresponda ao que tenha sido fotocopiado e usado na postulação judicial.

Recentemente tomou-se conhecimento do incêndio ocorrido no egrégio TRT do Rio de Janeiro, com capacidade de destruir milhares de processos judiciais. Em casos como este, o que fazer? Os operadores do Direito sabem que o caminho tortuoso é o da restauração de autos, tarefa difícil e que não é concluída com certeza e fidelidade para restaurar o que neles continham, todavia, seria fácil essa operação se a Corte tivesse à sua disposição backup [21] dos processos virtuais. Na comodidade administrativa, simplesmente bastaria realizar a tarefa de restore para que tudo voltasse ao statu quo ante. Tecnologia moderna, não é verdade?

Ao encerrar este breve ensaio de informática jurídica, acrescenta-se, ainda, o seguinte: a atual legislação processual civil prevê dezenas de procedimentos ou ritos para o processamento das ações judiciais. Os juízes, promotores, advogados e serventuários da justiça, na prática, não têm condições de decorar todos esses ritos. Com efeito, precisam identificar na lei qual o adequado ao seu caso e, para a adoção de um sistema informatizado/automatizado, os analistas e programadores da ciência da computação, em parceria com técnicos das áreas do direito, administração, economia e contabilidade, criarão tantos menus [22] quantos forem necessários para o processamento de todas as ações judiciais. Feito assim, o serventuário encarregado de efetuar o cadastro da ação no sistema, por ser bacharel versado em direito processual, não terá dificuldade em identificar o código eletrônico que irá gerenciar o respectivo processo judicial. Daí em diante, o processo será monitorado pelo sistema automatizado, dispensando, assim, a realização de múltiplas tarefas que atualmente ficam sob a responsabilidade humana, por falta de um programa inteligente informatizado, sendo que o gerenciamento realiza um importante trabalho destinado a garantir a produtividade em menor tempo possível. Certas tarefas que os técnicos elegem como essenciais ao bom desempenho do serviço judiciário passariam a ser monitoradas e, na falta de cumprimento no prazo pré-estabelecido, o sistema, automaticamente, estaria orientado a alertar a anormalidade no vídeo ou em relatório expedido pela impressora, para conhecimento do serviço de auditoria interna, da corregedoria ou do setor de controle da produção forense. Até juízes, promotores, escrivães e secretários judiciais passariam a ser atropelados pela máquina! 

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Sobre o autor
Pedro Madalena

Juiz de Direito aposentado e Advogado militante em Santa Catarina. Autor de livros e artigos jurídicos relacionados com informática e organização e gestão judiciárias. Graduado na Faculdade de Direito de Porto Alegre da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MADALENA, Pedro. Processo judicial automatizado e virtualizado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 57, 1 jul. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3003. Acesso em: 19 abr. 2024.

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