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Responsabilidade pessoal do agente público por danos ao contribuinte

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01/08/2002 às 00:00
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Sumário: 1. Introdução 2. O Dano Indenizável 2.1. O direito à indenização 2.2. O dano e suas espécies. 2.3. Dano simplesmente moral, ou dano moral puro 2.4. Dano moral com repercussão econômica 2.5. Lucro cessante 2.6. Distinção entre lucro cessante e repercussão econômica do dano moral 2.7.Danos decorrentes de execução fiscal injusta 3. A Responsabilidade do Estado 3.1. Nas Constituições anteriores 3.2. Na Constituição de 1988 4. A Responsabilidade Pessoal do Agente Público 4.1. O agente público 4.1.1. Os agentes políticos 4.1.2. Agentes administrativos 4.2. O dever e a responsabilidade 4.3. A responsabilidade e a sanção 4.4. Responsabilidades do agente político. 4.5. Responsabilidade do magistrado 4.6. Responsabilidade do agente fiscal. 5. As vantagens da responsabilidade pessoal 5.1.Insuficiência da responsabilidade do ente público 5.2. O efeito preventivo 5.3.Efeito na harmonia entre os poderes 5.3. Efeito moralizador 6. Questão da insegurança jurídica 6.1. Como argumento do agente fiscal. 6.2. Divisão eqüitativa 6.3. Padronização de comportamentos 7. Aspectos processuais 7.1. As questões suscitadas 7.2. A denunciação da lide 7.3. Ação contra o agente público e contra o Estado 7.4. Ação apenas contra o Estado 8. Conclusões.


1. Introdução

Tem sido freqüente a referência de empresários a atos de arbitrariedade do fisco, praticados em circunstâncias várias e por várias razões, muitas vezes inconfessáveis. Quem vivencia a relação tributária sabe muito bem que ela, embora teoricamente seja uma relação jurídica, na prática é hoje muito mais uma relação de poder, na medida em que os direitos fundamentais do contribuinte são publica e flagrantemente desrespeitados pelas autoridades fazendárias. Basta citarmos as ameaças públicas de cancelamento do CPF de contribuintes omissos (O contribuinte que deixa de cumprir um dever legal submete-se à multa correspondente. A inscrição no cadastro respectivo é a identidade do contribuinte, colocada hoje como condição para o exercício de inúmeros direitos do cidadão na sociedade. O inscrever-se, antes de ser um direito, é um dever. Quem o cumpriu, inscrevendo-se, não pode ser colocado na clandestinidade. Salvo quando comprovada a falsidade da inscrição, em nenhuma outra hipótese pode ser esta cancelada pela autoridade. O cancelamento de inscrições dos que não apresentaram a denominada declaração de isento é um ato covarde, repleto de arbítrio, praticado contra pessoas indefesas, a pretexto de colher na imensidão de pobres inocentes alguns poucos espertos que estariam burlando a Fazenda Pública), e as humilhações sofridas por quantos buscam as repartições fazendárias para solucionar problemas surgidos na relação tributária.

O dever de pagar tributo, na atualidade, certamente integra o feixe de relações jurídicas que se pode denominar o estatuto do cidadão. Embora nem sempre tenha sido assim, pagar tributo é atualmente um dever fundamental do cidadão. Há mesmo quem diga que o tributo é o preço da cidadania. Ocorre que o desrespeito, pelas autoridades fazendárias, aos direitos do contribuinte, deteriora o sentimento da cidadania e a própria crença no Direito como instrumento de regulação das relações sociais. Tendo a toda hora os seus direitos fundamentais desrespeitados pelo fisco, sente-se o contribuinte moralmente desobrigado de cumprir a lei, que somente contra ele se mostra eficaz. A violência ao Direito, praticada constantemente pela parte poderosa na relação tributária, faz crescer no contribuinte a idéia de que as leis são apenas um instrumento da força, desprovido de todo e qualquer fundamento moral, porque os deveres morais são sempre bilaterais e assim, nas relações fundadas na moral, quando uma parte não cumpre os seus deveres nada pode exigir da outra (Dizem que o único dever moral sem contraprestação é o dever dos pais para com os filhos).

As autoridades daAdministraçãoTributária certamente consideram necessárias certas práticasautoritárias, emesmo arbitrárias, em face da sonegação praticada peloscontribuintes. Taispráticas seriam justificáveis como instrumento de defesa doErário. Ocorre que oEstado tem meios para coibi-las sem violar as leis, não sejustificando,portanto, em nenhuma hipótese, que alimente o círculo viciosodailegalidade.

Não se pode negar a existência de sonegação, nem muito menos a necessidade de defender-se o Erário contra as práticas evasivas do contribuinte. Mas não é razoável admitir-se que a defesa do Erário se faça mediante práticas arbitrárias, pois estas produzem evidente e progressivo desgaste da relação fisco contribuinte. Desgaste que não pode ser superado pela intimidação, hoje consubstanciada na definição do ilícito tributário como crime, com a conseqüente e permanente ameaça de pena prisional.

A defesa do Erário há de dar-se, em primeiro lugar, mediante a edição de leis justas e também noutros aspectos obedientes à Constituição. E em segundo lugar, mediante um trabalho de fiscalização mais efetivo e competente, capaz de detectar as práticas evasivas e punir os infratores. Não apenas os pequenos, mas também os grandes, pois a punição destes funciona como exemplo capaz de exercer incomensurável influência positiva.

A lei justa e em todos os aspectos obediente à Constituição permite que a relação tributária se desenvolva em clima de respeito mútuo das partes nela envolvidas. E para ser justa a lei deve colocar as partes, fisco e contribuinte, em posição de equilíbrio. Aliás, essa posição de igualdade chega a ser mesmo da própria essência do Direito, posto que, como ensina Arnaldo Vasconcelos,

"tendo sido o Direito chamado a realizar a compartição das liberdades, a fim de possibilitar-lhe a convivência, nunca se poderia admitir que a parcela atribuída a um fosse maior ou melhor do que a parte destinada ao outro. A intervenção do Direito só se deu para que a compartição obedecesse ao princípio da igualdade dos homens. Não fosse assim, seria inteiramente prescindível" (Arnaldo Vasconcelos. Direito, Humanismo e Democracia. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 23).

É lamentável que essa posição de igualdade, mesmo teoricamente, ainda esteja longe de ser alcançada na relação tributária, que ainda é muito mais uma relação de poder. Basta ver-se que a lei tributária comina penalidades para a violação de seus dispositivos, pelo contribuinte, mas em geral não comina penalidades para as violações dos direitos do contribuinte, praticadas pelos agentes e pelas autoridades da Administração Tributária. Estabelece penas pecuniárias para a não prestação, pelo contribuinte, de suas obrigações tributárias, principal e acessória, mas no âmbito administrativo ou cível não estabelece nenhuma sanção para o agente público que exige do contribuinte, indevidamente, a prestação de qualquer de suas obrigações.

É exatamente por isto que se impõe ao jurista a busca de soluções capazes de viabilizar o aperfeiçoamento da relação tributária, tornando-a uma relação efetivamente jurídica. Enquanto os detentores do poder político não promovem a edição de leis que regulem mais adequadamente a atuação das autoridades da administração tributária, fazendo-as responsáveis pessoalmente pelos ilícitos que eventualmente cometam, cabe ao jurista buscar no ordenamento um caminho para o equilíbrio das partes e o conseqüente aperfeiçoamento da relação de tributação, com vantagens para o cidadão e para a Fazenda Pública.

Temos sustentado que um desses caminhos é a responsabilização pessoal do agente público pelos danos por ele causados ao contribuinte, em decorrência de práticas ilegais no trato da relação tributária. Responsabilização que, não obstante respeitáveis opiniões em contrário, pode dar-se em face da Constituição e das leis vigentes, como se vai neste pequeno estudo demonstrar.


2. O Dano Indenizável

2.1. O direito à indenização

Estabelece a lei as penalidade para os cometimentos ilícitos praticados pelo contribuinte na relação tributária, e nenhuma penalidade estabelece para a Fazenda Pública para os casos de cometimentos ilícitos por esta praticados na mesma relação. Isto não quer dizer que não exista sanção para o ilícito cometido pela Fazenda Pública. Tal sanção consiste precisamente na indenização pelo dano resultante do cometimento ilícito.

O direito à indenização decorre da conduta ilícita da Fazenda Pública, lesiva do patrimônio, moral ou material, do contribuinte. Como qualquer outra pessoa, o contribuinte tem direito a que a Fazenda Pública seja obediente às leis na relação de tributação. Em outras palavras, tem direito a que a Fazenda Pública não adote na vivência da relação tributária nenhum comportamento contrário ao direito. Se adota, e se daquele comportamento ilícito seu decorre qualquer dano para o contribuinte, tem este o direito à indenização correspondente.

2.2. O dano e suas espécies

A palavra dano designa prejuízo, ou detrimento. Geralmente tem sentido econômico, ou patrimonial. "A noção patrimonialista de dano teve notáveis influências do direito romano, merecendo destaque a definição atribuída ao jurisconsulto Paulo, que reduz o dano a uma equação de diminuição patrimonial." (Flori Antonio Tasca, Responsabilidade Civil – Dano Extrapatrimonial por Abalo de Crédito, Juruá, Curitiba, 1998, p. 49). Mas o dano pode atingir elementos não patrimoniais, elementos da personalidade que não são expressos em dinheiro, e neste caso geralmente vem qualificada pelo adjetivo moral.

A expressão dano moral é empregada quase sempre para designar os prejuízos ou detrimentos ditos não patrimoniais. Há, aliás, quem prefira, em vez de dano moral, a expressão dano extrapatrimonial (Cf. Flori Antonio Tasca, Responsabilidade Civil – Dano Extrapatrimonial por Abalo de Crédito, Juruá, Curitiba, 1998). Mais adequada em certo aspecto, posto que a palavra moral parece menos abrangente do que a palavra extrapatrimonial. Entretanto, leva a uma outra questão terminológica, qual seja a de saber o significado da palavra patrimônio, que pode ser empregada em sentido restrito, para designar o conjunto de bens de valor econômico, ou em sentido amplo, para designar o conjunto de todos os bens e direitos, sejam ou não de conteúdo econômico.

É comum, aliás, o uso da expressão patrimônio moral, que de certo modo invalida a distinção entre o que seja patrimonial, e extra patrimonial. Assim, certos de que nesta, como nas questões jurídicas em geral, não se consegue palavras e expressões incontroversas, preferimos a expressão dano moral, à qual atribuímos um sentido amplo, sem prejuízo do emprego de qualificativos destinados a lhe restringir o alcance, quando for o caso.

O dano moral consiste em um detrimento, uma agressão, a elementos relacionados a uma pessoa, física ou jurídica, que não afeta imediatamente o patrimônio da vítima, considerado este como o conjunto de bens de valor econômico, e que, em se tratando de pessoas jurídicas, geralmente é objeto de registros e demonstrações contábeis. O dano moral pode afetar o patrimônio de forma indireta ou futura, e pode até não afetá-lo. Quando afeta, diz-se que há dano moral com repercussão econômica, e quando não afeta diz-se que há dano moral puro, ou dano simplesmente moral.

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A idéia de dano moral, todavia, não se limita à questão de honra. Abrange aspectos físicos, especialmente em se tratando de pessoas naturais, que nada dizem com a honra, ou honorabilidade, mas simplesmente com a estética, ou beleza. Muitos, então, referem-se ao dano estético, como algo diverso do dano moral. Preferimos, porém, considerá-lo incluído no conceito de dano moral, mesmo sem desconhecer que em certos casos a distinção pode ser relevante.

Para o adequado exame da questão de saber se a pessoa jurídica pode sofrer dano moral, e se o imposto de renda incide sobre a indenização acaso devida, relevante é a distinção entre dano moral com repercussão econômica, e dano moral puro, bem como a distinção entre dano moral e lucro cessante.

2.3. Dano simplesmente moral, ou dano moral puro

O dano moral é sempre de natureza subjetiva. Afeta sempre elementos imateriais que embora possam ter valor econômico não são objetivamente avaliáveis. Pode ter, e pode não ter repercussão econômica. Quando não tem, diz-se que se trata de um dano simplesmente moral, ou dano moral puro.

Distingue-se do dano moral com repercussão econômica porque não implica diminuição do patrimônio da vítima, nem atual nem futura. Afeta somente o patrimônio moral, a honra, o bom nome, o conceito de que a vítima desfruta no meio social em que vive. Atinge apenas sentimentos.

Dizer-se que se trata de dano simplesmente moral, ou dano moral puro, depende das circunstancias de cada caso concreto. Uma ofensa que em determinadas circunstâncias pode ser simplesmente moral, em outras pode ter repercussão econômica negativa, e em certos casos, excepcionalmente, até pode ter repercussão econômica positiva.

Seja como for, importante é a certeza de que ocorrendo o dano, ainda que simplesmente moral, há direito a indenização (Constituição Federal, art. 5º, incisos V e X).

2.4. Dano moral com repercussão econômica

O dano moral pode ter, e pode não ter repercussão econômica. Mesmo quando tenha tal repercussão, todavia, não se confunde com o denominado lucro cessante, como adiante será explicado. Tem caráter subjetivo, e a repercussão econômica é uma potencialidade, que não se confunde com o próprio dano.

Assim, se alguém publica um fato que evidencia a falta de higiene de um hospital, ou de um restaurante, tal publicação pode ferir o bom nome, o bom conceito, e por isto mesmo constituir um dano moral de que é vítima a pessoa, física ou jurídica, proprietária do hospital, ou do restaurante. É provável que algumas pessoas deixem de ir ao hospital, ou ao restaurante, em conseqüência da referida publicação. Trata-se, pois, de um dano moral com repercussão econômica, que é sempre presumida em face das circunstâncias qualificadoras do dano moral, e de sua vítima.

Se alguém noticia prática desonesta de um determinado profissional, a notícia pode consubstanciar um dano moral de que é vítima o referido profissional. Dano moral que pode ter, ou não ter, repercussão econômica negativa, e em certos casos pode ter até repercussão econômica positiva. Se a notícia mostra o profissional de modo indesejável para sua clientela, certamente poderá ter repercussão econômica negativa, mas pode ocorrer que uma notícia, não obstante moralmente negativa, aumente a clientela do profissional (Uma notícia que aponte um advogado como pessoa de grande habilidade para ganhar causas perdidas, porque lida muito bem com armas escusas, pode ser moralmente detrimentosa mas lhe trazer um aumento de clientela). É clara, portanto, a diferença entre o dano moral e sua repercussão econômica.

Diferença também existe entre o dano patrimonial, ou econômico, e o dano moral com repercussão econômica. No primeiro, a diminuição do valor econômico do patrimônio é atual e pode ser demonstrada, enquanto no segundo é futura e há de ser presumida.

Há quem se refira a dano material como sinônimo de dano econômico, ou patrimonial, e a dano moral como sinônimo de dano imaterial. Pode parecer que o dano material é aquele que atinge um bem de existência física, enquanto o dano moral seria aquele que atinge os bens de existência imaterial. Também aqui a questão da terminologia pode causar dificuldades. Na verdade existem bens imateriais com valor patrimonial ou econômico, como o nome comercial, a marca de fabrica, o bom conceito de um profissional, entre outros, e o dano a esses bens certamente é um dano imaterial, se por materialidade entendermos a existência física. Não é a materialidade do bem, no sentido de sua existência física, de sua corporalidade, que importa, mas ter ou não ter o bem uma expressão econômica.

2.5. Lucro cessante

O denominado lucro cessante é também uma espécie de dano, que consiste na privação de um aumento patrimonial esperado em razão do patrimônio ou da atividade de quem dele é vítima. O taxista que tem o seu automóvel abalroado, ou de qualquer outra forma danificado, e por isto deixa de trabalhar durante algum tempo, deixa de auferir a remuneração pelos serviços que ficou impedido de prestar. Sofre, assim, dois tipos de perdas, o prejuízo material, correspondente ao valor dos reparos de que o veículo necessita para voltar a ser utilizado, e o lucro cessante, consubstanciado no valor dos serviços que deixou de prestar durante o tempo em que o veículo teve de ficar parado para a realização dos reparos.

Inúmeras são as situações nas quais se pode caracterizar o lucro cessante. Basta que se tenha a possibilidade efetiva, em virtude do desempenho de uma atividade econômica, de obter incrementos patrimoniais, e estes deixem de ocorrer em virtude da ação de outrem.

Diversamente da repercussão econômica do dano moral, que em muitos casos é presumida, como acima se disse, o lucro cessante tem caráter objetivo e carece de demonstração. É sempre quantificável, ainda que não se exija nessa quantificação uma exatidão matemática.

Como contabilista, participamos de uma comissão que apurou o lucro cessante de uma indústria, cujas máquinas foram danificadas em virtude da queda de um avião da FAB. Não participamos da determinação dos danos materiais, ocorridos nas edificações e nas máquinas e equipamentos, que foi efetuada por uma equipe de engenheiros e economistas. Fizemos apenas a apuração do lucro cessante. Verificamos qual era o volume da produção diária daquela indústria e a margem de lucro líquido que a mesma auferia sobre os seus produtos. Com esses dados, e considerado o número de dias que a empresa deixou de funcionar até que fossem feitos os reparos em suas máquinas e equipamentos, indicamos o valor do lucro cessante.

2.6. Distinção entre lucro cessante e repercussão econômica do dano moral

Embora seja sutil, é inegável a distinção que há entre lucro cessante e repercussão econômica do dano moral. O lucro cessante está ligado a um dano patrimonial (Poder-se-ia dizer que o lucro cessante é, em si mesmo, um dano patrimonial. Penso, porém, que é mais adequado considerar dano patrimonial apenas aquele que afeta o patrimônio presente. Não o patrimônio vindouro, em formação, porque preferimos distinguir patrimônio de renda, considerando patrimônio a riqueza vista em sua realidade atual, estática, e renda a riqueza em sua formação, como expressão dinâmica), do qual decorre a privação dos meios para produção do lucro, ou a ou a essa privação, ainda que não decorrente de qualquer tipo de dano, seja patrimonial ou moral. Caracteriza-se, em qualquer hipótese, por sua objetividade. E em conseqüência, pela possibilidade de seu dimensionamento econômico. É sempre uma decorrência certa da privação dos meios de produção do lucro. Privação que pode decorrer de um dano patrimonial, como acontece ao taxista que tem o seu automóvel abalroado e por isto fica sem poder utilizado enquanto está na oficina para reparos. Ou pode decorrer de um ilícito qualquer, que não consubstancia por si mesmo um dano patrimonial, como acontece com o taxista que tem o seu automóvel ilegalmente apreendido por uma autoridade do Departamento de Trânsito.

A repercussão econômica do dano moral, por seu turno, está sempre ligada a um dano moral. Dano que é subjetivo e, em conseqüência, de dimensionamento econômico impossível. É sempre uma decorrência apenas provável, embora tal probabilidade seja de tal ordem que afasta a necessidade de prova, autorizando a presunção da ocorrência. A repercussão econômica do dano moral presume-se em virtude das circunstâncias. É induvidosa mas não pode ser quantificada. Melhor dizendo, a sua quantificação é impraticável.

2.7. Danos decorrentes de execução fiscal injusta

Os danos a cuja indenização o contribuinte tem direito podem decorrer dos mais diversos comportamentos do fisco na relação de tributação. Não se pode admitir que o fisco, porque tem o direito ao tributo, esteja na cobrança deste agindo sempre licitamente. O tributo é devido nos termos da lei, e há de ser cobrado pelos meios por lei estabelecidos.

Quando o fisco adota formas oblíquas de cobrança, mediante o que temos denominado sanções políticas (Sobre as sanções políticas, veja-se nosso texto na Revista Dialética de Direito Tributário, nº 30, pág. 46), pode estar provocando danos pelos quais assume inteira responsabilidade. E pode estar provocando danos mesmo quanto realiza a cobrança do tributo através do meio próprio, que é a execução fiscal, pois esse meio pressupõe a existência efetiva de crédito líquido e certo, de sorte que se é utilizado abusivamente pode esse abuso implicar dano indenizável.

No dizer autorizado de Liebman,

"Quís-se favorecer a posição do credor reconhecendo a probabilidade da existência a proteção que só deveria corresponder à absoluta certeza de sua existência: essa arma, que se lhe põe entre mãos, não encontra paralelo em nenhum outro instituto do direito moderno. É imperioso, por conseqüência, estimular-lhe o senso de responsabilidade, deixando-lhe a cargo o dano eventualmente provocado por sua imprudência ou impulsividade. Nem de outra forma se lhe pode qualificar a conduta, se o crédito não existir, porque esta é uma circunstância que o credor bem dificilmente ignora, e, no caso de incerteza, não lhe falece o modo de procurar seguro conhecimento das coisas antes de deitar mão sôbre o patrimônio do devedor.

Só a plena responsabilidade pelos danos ocasionados por qualquer espécie de execução injustificada pode compensar o favor dispensado à rapidez de realização do crédito e impedir que ela se converta em insuportável injustiça." (Enrico Tullio Liebman, Embargos do Executado, tradução de J. Guimarães Manegale, 2ª edição, Saraiva, São Paulo, 1968, pág. 243).

Pelos danos que de ilícitos praticados pelo fisco decorram para o contribuinte responde, em princípio, o Estado, como se passa a demonstrar.

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Sobre o autor
Hugo de Brito Machado

professor titular de Direito Tributário da UFC, presidente do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET), juiz aposentado do Tribunal Regional Federal da 5ª Região

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACHADO, Hugo Brito. Responsabilidade pessoal do agente público por danos ao contribuinte. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3014. Acesso em: 29 mar. 2024.

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