INTRODUÇÃO
Inicialmente há de se esclarecer que este trabalho não tem o intuito de afastar as controvérsias que pairam no sistema processual tributário sobre a questão da aplicabilidade do instituto da preclusão e a busca pelo alcance da verdade material.
Analisaremos adiante a função social da administração tributária, porém, podemos brevemente nos antecipar afirmando que o seu objetivo fulcral é fazer, por meio de mecanismos legais e administrativos, com que o contribuinte cumpra os preceitos da legislação tributária e as consequentes obrigações tributárias (principais e acessórias).
Quando o contribuinte não cumpre esses preceitos e suas obrigações tributárias, o Fisco, por meio de auto de infração ou notificação de lançamento, lança e constitui o crédito tributário, decorrente dessa suposta infração tributária, como forma de comprovar o ilícito e intimar o contribuinte a se manifestar, ou então a recolher o tributo.
Entretanto, caso o contribuinte não concorde com a autuação, poderá impugná-la no prazo de 30 (trinta) dias contados da ciência, demonstrando os fatos e as provas que o levaram a discordar, parcialmente ou integralmente, com a autuação do Fisco. É nesse momento, somente, que o impugnante poderá levar aos autos as provas que o levaram a impugnar o crédito tributário constituído e lançado para o fim de criar a convicção do julgador. Porém, caso assim não o faça, terá precluso o seu direito de apresentar provas ou então novas provas até o final do processo.
A partir desse momento é que o presente trabalho começa a analisar o limite do instituto da preclusão, que nada mais é que o direito da parte em ter praticado um determinado ato processual em determinado momento e assim não o fez, ou que tornou imutável uma decisão.
Veremos que, apesar do instituto da preclusão ter sido criado para criar uma ordem no sistema processual para que houvesse um desempenho mais célere e justo do processo, ele acaba por vezes sendo aplicado de forma exagerada.
Isso porque, a ausência de um ato no devido prazo legal por algum dos sujeitos e, consequentemente, a perda de seu direito, pode levar o julgador a proferir uma decisão administrativa definitiva, mesmo que revestida de ilegalidade! Claro, ao não permitir a atividade probatória posterior ao protocolo da impugnação/defesa/manifestação de inconformidade tempestiva, o julgador poderá deixar passar informações importantes que poderiam leva-lo a proferir uma decisão diferente e, consequentemente, correta.
Em contrapartida, cabe ao julgador do contencioso administrativo tributário ter o efetivo conhecimento dos fatos para que haja a correta observância das leis que lhe são aplicáveis, devendo-se utilizar todos os meios de provas disponíveis que se encontram ao seu alcance, não se satisfazendo com o que as partes trazem aos autos.
Nesse sentido, no âmbito administrativo, a atual vice-presidente do Conselho Superior de Recursos Fiscais, Susy Gomes Hoffmann, em voto proferido no acórdão nº 9202-002.295 prolatou justamente o que o presente trabalho demonstrará adiante, vejamos:
A previsão de um momento próprio para a produção probatória, em princípio e em tese, funciona como uma baliza, uma orientação acerca do momento mais propício para a comprovação dos fatos que serão analisados nos autos. Não pode servir de obstáculo intransponível, pois que, neste caso, como no presente caso, tal baliza importaria violação dos princípios que devem sempre nortear a condução do processo administrativo fiscal, como a verdade material.
[...]
Deve-se ter em mente, sempre, que as normas de cunho processual e procedimental são constituídas por uma característica essencial: a instrumentalidade. Não são normas que encerram uma finalidade em si mesmas. Elas devem servir, devem instrumentalizar, da melhor maneira possível, a aplicação do direito material. Se, num caso concreto, a aplicação cega de uma dada norma procedimental importar, como importa no presente caso, uma violação da sua instrumentalidade, violando a finalidade para que fora editada, tal aplicação não pode imperar.[1]
Já no âmbito judicial, a Ministra Nancy Andrighi do STJ também se manifestou pela prevalência da busca da verdade real sobre o formalismo processual em voto no REsp 331.550:
Antes do compromisso com a lei, o magistrado tem um compromisso com a justiça e com o alcance da função social do processo, para que este não se torne um instrumento de restrita observância da forma, distanciando-se da necessária busca pela verdade real.[2]
Assim sendo, discutiremos e analisaremos o instituto da preclusão e a busca pela verdade material. Vejamos.
1. DO INSTITUTO DA PRECLUSÃO
Apenas em 1933, após inúmeros e longos estudos pelo autor italiano Giuseppe Chiovenda, foi publicado seu ensaio: Cosa giudicata e preclusione (SICA, 2008, p. 74) que finalmente deu contorno ao instituto da preclusão que, até àquele momento, era um tanto indefinido.
1.1 Conceito e acepções do termo “preclusão”
No processo administrativo fiscal, assim como no processo civil em si, nos deparamos com algumas situações que podem causar embaraçamento ao andamento do processo, por exemplo, quando há a perda do prazo para apresentação da defesa/recurso, ou então a não compatibilidade de um ato processual com outro já existente, ou até, a recorrência de um ato anteriormente praticado.
Nesses casos, por ter sido alcançado os limites assinalados por lei, a preclusão apresenta-se como uma importante ferramenta destinada a manter a ordem e promover celeridade para o desfecho da lide.
O termo "preclusão" advém do latim “praeclusio, onis”, que emana de “praecludere” (GOMES, Abril, 2003), que, por sua vez, tem o significado de fechar, encerrar, impedir, conforme ensinamentos de Antonio Cabral (1993, p. 172):
Quando o prazo processual se expira ocorre o que se denomina preclusão, cuja palavra latina praecludere tem a mesma raiz que o verbo claudere (fechar, encerrar, cercar, murar, deter, fazer parar, acabar, terminar). O verbo praecludere tem o sentido de fechar diante da ou na cara de alguém, tapar, obstruir. É de se notar que a praeclusio não é apenas o fechamento no tempo, mas também o fechamento no espaço.
O termo latino é muito feliz para indicar que a preclusão significa impossibilidade de se realizar um direito, quer porque a porta do tempo está fechada, quer porque o recinto onde esse direito poderia exercer-se também está fechado. O titular do direito acha-se impedido de exercer o seu direito, assim como alguém está impedido de entrar num recinto porque a porta está fechada.
No direito processual se classifica como a perda de uma faculdade ou de atos inerentes a um processo. Logo, a preclusão ocorre quando, no momento processual para a prática de determinado ato, a parte deixa de fazê-lo.
Para melhor compreensão do termo, Chiovenda (apud THEODORO JÚNIOR, 2010, p. 548) assim definiu a preclusão como "perda, extinção ou consumação de uma faculdade processual pelo fato de se haverem alcançado os limites assinalados por lei para o seu exercício”.
Entretanto, o referido termo designa dois institutos diversos. O primeiro diz respeito ao fenômeno que impede o sujeito de praticar um ato fora do momento processual adequado, seja depois de já tê-lo praticado ou, então, depois de ter praticado um ato incompatível; o segundo quando torna imutável uma questão já decidida (decisão definitiva).
Dadas as vertentes, segundo Chiovenda (2008, p. 220-221 apud SICA, 2008, p. 74) a primeira acepção encontra-se assim definida:
entendo por preclusão a perda, ou extinção, ou consumação de uma faculdade processual. que se sofre pelo fato: (a) ou de não ser observado à ordem prescrita em lei ao uso de seu exercício, como os prazos peremptórios, ou a sucessão legal de atividades e das exceções; (b) ou de se haver realizado uma atividade incompatível com o exercício da faculdade, como a propositura de uma exceção incompatível com outra, ou a realização de um ato incompatível com a intenção de impugnar outra sentença; (c) ou de já se haver validamente exercido a faculdade (consumação propriamente dita).
Já a segunda assim se reproduz (CHIOVENDA, 2008, P. 515 apud SICA, 2008, p. 75): "a perda da faculdade de propor questões" de modo que "preclusas todas as questões propostas ou proponíveis, temos a coisa julgada", porém "não se apresenta só no momento final, como expediente para assegurar a intangibilidade do resultado do processo, mas apresenta-se também durante o processo, à proporção que, no curso deste, determinadas questões são decididas e eliminadas" .
Por fim, vale-se dizer que o instituto compreende-se no direito da parte em ter praticado um determinado ato processual em determinado momento e assim não o fez, ou que tornou imutável uma decisão.
1.2 Espécies de preclusão
Preclusão é gênero, e constitui suas espécies (MONTENEGRO FILHO, 2013, p. 273):
a) da preclusão temporal, marcada pela fluência do prazo sem a prática de qualquer ato (como a fluência do prazo de quinze dias para a apresentação da contestação, sem que o réu pratique qualquer ato), podendo ser ilustrada por meio da expressão não ato;
b) da preclusão lógica, que representa prática de ato processual incompatível com outro ato praticado no âmbito extraprocessual ou processual, como a interposição da apelação no curso de ação de despejo por falta de pagamento, após o réu (locatário) ter sido procurado pelo locador, que a ele entregou as chaves do imóvel locado, comportamento que demonstra a aceitação tácita aos termos da sentença, sendo obstáculo para o conhecimento da espécie recursal (art. 503 do CPC),12 podendo ser ilustrada com a expressão atos antagônicos;
c) da preclusão consumativa, representando a prática do ato de forma incompleta, como ocorre com a interposição do recurso sem a realização do preparo, infringindo o art. 513 do CPC, podendo ser ilustrada com a expressão ato incompleto.
Poderíamos resumir, “ordinariamente” a título de exemplo, que a preclusão temporal verifica-se quando o contribuinte podendo realizar um ato, não o fez; a preclusão lógica como o fato da parte na fase recursal apresentar novas “informações” e; a preclusão consumativa se dá quando o CSRF profere a decisão terminativa, onde não há a possibilidade de interposição de novo recurso.
Para a realização deste artigo, o que importa é a preclusão temporal.
1.3 Natureza jurídica da preclusão
Não há um entendimento generalizado no que tange a natureza jurídica da preclusão. Há quem entenda se tratar de uma sanção, penalidade sui generis, ou um simples mecanismo de alcance do provimento final, porém, prevalece na doutrina ser fato jurídico processual impeditivo.
Inicialmente, tendo em vista que não há na doutrina uma compreensão uníssona acerca da natureza jurídica da preclusão, apreciaremos todas as hipóteses sob o ponto de vistas dos doutrinadores que as defendem.
Respectivamente, iniciaremos com a possibilidade de ser a preclusão uma sanção.
Apesar de nossos Tribunais pátrios e os Superiores, em sua maioria, admitirem ser a preclusão uma sanção à parte que se absteve de apresentar provas no momento adequado, essa não alcança o magistrado, que deverá se valer da verdade material. Avistamos julgado do STF:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISÓRIA. DESPACHO SANEADOR. REALIZAÇÃO DE PROVAS POR INICIATIVA DO JUIZ. ARTIGO 130 DO CÓDIGO DE Processo CIVIL. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA. 1. A preclusão é instituto processual que importa em sanção à parte, não alcançando o magistrado que, em qualquer estágio do procedimento, de ofício, pode ordenar a realização das provas que entender imprescindíveis à formação de sua convicção. 2. Código de Processo Civil, artigo 130. Aplicação do princípio do livre convencimento do juiz, a quem cabe a direção do processo, determinando, inclusive, as diligências necessárias à solução da lide. Instrução probatória.Preclusão pro judicato. Inexistência. Agravo regimental não provido. (STF, AR 1538 Agr-Agr/MG. Relator Min. Maurício Corrêa. Tribunal Pleno. Julgamento 04/10/2001. DJ 08/02/2002) grifos acrescidos
No mesmo sentido:
PRECLUSÃO Preclusão pro judicato - Inocorrência Juiz que obriga o exequente a pagar remuneração de depositário pode em decisão posterior reconsiderar aquele ato e remeter o interessado à vias próprias para receber o seu crédito - A preclusão é sanção imposta à parte, uma vez que consiste na perda de uma faculdade processual, dando, portanto, ideia de pena, não podendo ser dirigida ao juiz do feito.EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL Penhora online de ativos financeiros do exequente para remunerar a depositária, terceira na relação processual Inadmissibilidade Depositária que não é parte na execução deve cobrar a sua remuneração em ação própria à luz do contraditório, não sendo possível para esse fim a penhora online de ativos financeiros do exequente.Agravo desprovido. (TJSP, AI 0045221-89.2012.8.26.0000, Rel. Dês. Álvaro Torres Júnior. 20ª Câmara de Direito Privado. Julgamento 01/10/2012. DJE 15/10/2012) grifos nossos
Porém, GIANNICO (2005, p. 59-60 apud FERREIRA, 2010, p. 162) descarta essa ideia sob o seguinte argumento:
[...]inexiste, por exemplo, dever de recorrer, tampouco obrigação de provar determinado fato, não cometendo qualquer ato ilícito aquele que opta pela não-interposição de certo recurso ou, da mesma forma, omite-se na tarefa de provar determinado fato.
O que GIANNICO pretende demonstrar é que a preclusão seria um ônus processual ao invés de uma sanção. Evidente, pois o ônus corresponde a uma faculdade, incumbência e não uma obrigação propriamente dita. Sendo assim, não há que se falar em preclusão como sanção.
Vemos também que há autores que compreendem ser a preclusão uma penalidade sui generis. Entretanto, afirmar que a preclusão seria uma penalidade e não uma sanção seria basicamente incoerente.
Como simples mecanismo defende Humberto Theodoro Jr. apud Rel. Desembargador Mário César Ribeiro:
[...] 2. No direito processual moderno, a preclusão é apenas o mecanismo que provoca a passagem de um estágio processual para outro, preservando a firmeza e inatacabilidade dos atos processuais já consumados. Com a preclusão simplesmente se fecha, pela superveniência de nova etapa processual, o estágio processual anterior (Humberto Theodoro Júnior). (TRF 1ª Região, REsp-AP 0016596-89.2003.4.01.0000, Rel. Desembargador Mário César Ribeiro. Julgamento 28/02/2013. E-DJF1 07/03/2013)
Como dito anteriormente, a maior parte da doutrina acredita ser fato jurídico processual impeditivo, vez que, seja qual for a espécie de preclusão, ela sempre será impeditiva (perda). Na doutrina estrangeira: Stefano Riccio, Carlo Guarnieri e na doutrina pátria: Maurício Giannico e Egas Dirceu Moniz de Aragão, entre outros.
Para SICA (2008, p. 178), apesar da grande maioria da doutrina adotar essa posição, a preclusão não corresponderia a um fato processual ou jurídico, visto que se trata de um resultado: perda da faculdade de agir, e não propriamente um ato. Por exemplo, o contribuinte ao deixar de apresentar provas na impugnação perdeu o seu direito de apresentá-las futuramente, ou seja, a preclusão se deu como o resultado da falta de agir e não com o deixar de agir:
A preclusão, em si, não é fato jurídico, nem mesmo processual, pois não se trata de acontecimento do mundo real verificado no processo e com consequências jurídicas sobre ele projetadas, mas sim a própria consequência jurídica atribuída pela lei a um determinado fato ou ato processual.
Entretanto, para o trabalho, adotaremos a natureza jurídica de fato processual jurídico impeditivo.
1.4 Preclusão no processo administrativo fiscal federal
A preclusão no processo administrativo fiscal federal e em regra também nos demais (estadual e municipal), se dá quando o sujeito passivo não apresenta a prova documental no momento da impugnação, precluindo o direito de fazê-lo em outro momento processual, a não ser quando reste demonstrada a impossibilidade de sua apresentação oportuna, por motivo de força maior, refira-se a fato ou a direito superveniente ou destine-se a contrapor fatos ou razões posteriormente trazidos aos autos (parágrafo 4º, do art. 16, do Decreto nº 70.235/72).
Limitar a apresentação de provas a um único momento processual e sem vislumbrar o caso em questão, fere, dentre outros princípios norteadores do processo administrativo fiscal, os princípios da ampla defesa e do contraditório, que permite ao indivíduo contrapor fatos e propor novas provas em defesa de seus interesses.
Além disso, a atual vice-presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais “CARF”, a Conselheira Susy Gomes Hoffmann, assim já previu em sua tese de doutorado, que a inobservância de provas em processo administrativo tributário acarretará em sérios danos ao contribuinte, pois, permitirá à Fazenda a inscrição em Dívida Ativa de um suposto débito que não foi devidamente provado:
Há de ser salientado que a falta do direito ao devido processo legal, ao contraditório e a ampla defesa no processo administrativo tributário acarreta uma grave consequência ao contribuinte, pois o resultado do processo administrativo tributário propiciará que a Fazenda Pública crie um titulo em seu favor que será cobrado do contribuinte. Esse titulo – que é a inscrição em dívida no órgão competente – tem a seu favor a presunção de liquidez e certeza, que somente poderá ser modificada por meio de ação anulatória do lançamento ou de embargos à execução fiscal e, nos dois casos, a presunção milita em favor da Fazenda e o ônus da prova é todo carreado ao contribuinte. Além do mais, para se defender numa ação de execução fiscal, o sujeito passivo deve garantir o juízo, tendo, necessariamente (e no mínimo), um prejuízo financeiro e até mesmo moral.
Nesse contexto cumpre a seguinte transcrição (NEDER, 2010, p. 47): “Importante frisar que, na hipótese de a decisão administrativa ser proferida sem respeitar o contraditório e a ampla defesa, ela é considerada nula por falta de elemento essencial à sua formação”.
Ora, não pode o julgador, ou então, não deveria, se recusar a apreciar provas produzidas após a impugnação por afrontar violentamente o direito do contribuinte ao contraditório e ampla defesa. Seja na hipótese em que se apresenta antes da decisão de 1ª instância:
PROVAS APRESENTADAS APÓS IMPUGNAÇÃO E ANTES DA DECISÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA. PRECLUSÃO NÃO É ABSOLUTA E DEVE SER INTERPRETADA SISTEMATICAMENTE COM AS DEMAIS NORMAS E PRINCÍPIOS NORTEADORES PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. PROVAS ESSENCIAIS À GARANTIA DE PRINCÍPIOS. AUSÊNCIA DE ANÁLISE. NULIDADE. Em respeito ao princípio da verdade material, o julgador deverá valorar as provas a ele apresentadas livremente, sempre buscando a verdade material dos fatos. Sendo apresentadas provas após a impugnação e antes da decisão de primeira instância, a preclusão deverá ser interpretada sistematicamente com as demais normas e princípios norteadores do processo administrativo fiscal. Se as provas apresentadas após a impugnação, mas antes da decisão em primeira instância, forem essenciais à garantia dos princípios norteadores do PAF, esta deverá ser analisada pele órgão julgador de primeiro grau. A análise das provas por órgão de segundo grau, sem a apreciação da câmara “a quo”, resultaria em decisões proferidas em razão de uma mesma situação fática, partindo de fundamentos probatórios diversos. Tal situação configura evidente afronta ao princípio do duplo grau de jurisdição. g.a. (CARF. 2ª Câmara/1ª Turma Ordinária. Primeira Seção de Julgamento. Acórdão 1201-000.820. Julgamento: 11/06/2013).
Seja na hipótese em que se apresenta na fase recursal:
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ Ano-calendário: 2004 NULIDADE. LANÇAMENTO. INEXISTÊNCIA. Não é nulo o procedimento fiscal que glosou despesas com juros após lavrar diversas intimações com pedidos de esclarecimentos sobre a matéria, aguardando prazo razoável para apresentação de documentos antes da lavratura do auto de infração. PRODUÇÃO DE PROVAS NO VOLUNTÁRIO. POSSIBILIDADE PARA SE CONTRAPOR ÀS RAZÕES DO JULGAMENTO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA. PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL. Como regra geral, a prova documental deve ser apresentada na impugnação, precluindo do direito de fazê-lo em outro momento processual. Contudo, tendo o contribuinte trazido os documentos que julgava aptos a comprovar seu direito, ao não ser bem sucedido no julgamento de 1a instância, razoável se admitir a juntada das provas no voluntário, pois é exceção à regra geral de preclusão a produção de novos documentos destinados a contrapor fatos ou razões posteriormente trazidas aos autos. Ademais, seria por demais gravoso, e contrário ao princípio da verdade material, a manutenção da glosa de deduções sem a análise das provas constantes nos autos. E ainda, sendo esta a última instância administrativa, tal postura exigiria do contribuinte a busca da tutela do seu direito no Poder Judiciário, o que exigiria do Fisco a análise das provas apresentadas em juízo, e ainda condenaria a União pelas custas do processo. DESPESAS COM JUROS. COMPROVAÇÃO PARCIAL. Restabelecem-se as deduções relativas a despesas com juros devidamente comprovadas. DESPESAS FINANCEIRAS. JUROS PAGOS EM EMPRÉSTIMOS JUNTO A TERCEIROS EM CONCOMITÂNCIA COM EMPRÉSTIMOS FEITO A SÓCIOS SEM ÔNUS. DESNECESSIDADE. Somente são dedutíveis as despesas necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora, nos termos do art. 299 do RIR/99. Não é possível se admitir como necessária a despesa relativa a pagamento de juros relativos a empréstimos tomados com terceiros, quando ao mesmo tempo se realiza empréstimo a sócio sem a cobrança de juros, ou ainda com juros abaixo da taxa de captação. Assim, correta a glosa das despesas de juros passivos relativos a contratos de mútuo firmados com terceiros em valor equivalente aos juros ativos que seriam devidos sobre o valor emprestado ao sócio calculados pela taxa média dos empréstimos tomados pela empresa. JUROS DE MORA SOBRE A MULTA DE OFÍCIO. INCIDÊNCIA. A obrigação tributária principal surge com a ocorrência do fato gerador e tem por objeto o pagamento tanto do tributo quanto da penalidade pecuniária decorrente do seu não pagamento. O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta, e, portanto, envolve tanto o tributo quanto a penalidade pecuniária. Como consequência, é legítima a incidência de juros de mora, à taxa Selic, sobre todo o crédito tributário, o que inclui o valor da multa de ofício proporcional, não paga no vencimento. LANÇAMENTO REFLEXO DE CSLL. MESMA MATÉRIA FÁTICA Aplica-se ao lançamento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL o decidido em relação ao lançamento do tributo principal, por decorrer da mesma matéria fática. Preliminar Rejeitadas. Recurso Voluntário Provido em Parte. g.a. (CARF. 2ª Câmara/1ª Turma Ordinária. Primeira Seção de Julgamento. Acórdão 1102-000.940. Julgamento: 08/10/2013)
Assim, verificamos que a preclusão decorrente da dilação probatória tardia não é absoluta, devendo ser interpretada sistematicamente com as demais normas e princípios norteadores do processo administrativo tributário, pois, caso não sejam analisadas as provas no âmbito administrativo, o contribuinte que se sentir prejudicado, poderá recorrer ao âmbito judicial para valer seus direitos e fazer com que o Fisco aprecie suas provas em juízo e arque, provavelmente, com as custas processuais.