INTRODUÇÃO
Em decorrência das mudanças nas estruturas jurídicas no país, com constantes atualizações da legislação, a administração pública demanda por permanente atualização, qualificação, e reciclagem dos seus servidores, de forma a assegurar a aplicação correta das normas inerentes e efetiva prestação dos serviços públicos, o que se dá pela promoção de eventos como cursos, seminários, etc.
Desse modo, por vezes surge a necessidade da contratação de profissionais especializados, de renome, o que requer a instauração de procedimento administrativo próprio, que quando devidamente justificado enseja inviabilidade de competição, sendo estes profissionais contratados de forma direta por inexigibilidade de licitação, nos termos do art. 25 da Lei 8.666/93, o que não destoa dos regramentos legais.
Nesse contexto, o presente artigo trata acerca da possibilidade de contratação de profissional de notória especialização e renome, de forma direta pela administração pública por inexigibilidade de licitação, consubstanciado nos entendimentos doutrinários, decisões do Tribunal de Contas e na Lei Geral de Licitações e Contratos.
DESENVOLVIMENTO
A licitação é um procedimento administrativo formal que tem como escopo proporcionar à Administração uma aquisição, uma venda, ou uma prestação de serviços da forma mais vantajosa, respeitando-se os princípios constitucionais da legalidade, isonomia, impessoalidade, moralidade e publicidade.
A licitação visa a garantir a moralidade dos atos administrativos e dos procedimentos da Administração Pública, e também a valorização da livre iniciativa pela igualdade no oferecimento da oportunidade de prestar serviços, bem como de comprar ou vender ao Poder Público.
Como toda regra tem sua exceção, a Lei 8.666/93 permite como ressalva à obrigação de licitar, a contratação direta através de processos de dispensa e inexigibilidade de licitação, desde que preenchidos os requisitos previstos na lei.
Nessa toada, a inexigibilidade de licitação ocorre quando há inviabilidade de competição, melhor dizendo, quando é impossível promover-se a competição, tendo em vista que um dos contendores reúne qualidades tais que o tornam único, exclusivo, sui generis, inibindo os demais pretensos participantes. Há, portanto, impossibilidade de ser realizado o procedimento de competitividade para aquisição da proposta mais vantajosa para a Administração.
Desse modo, a ausência de licitação somente se admite por exceção, nos casos indicados em lei, ressalte-se, que os dispositivos legais prevendo hipóteses de dispensa ou inexigibilidade devem sofrer interpretação estrita (sem alargamento do seu conteúdo), privilegiando-se sempre a ampla disputa entre os interessados.
Conceituando, genericamente, a inexigibilidade de licitação, DIÓGENES GASPARINI estabelece que:
“é a circunstância de fato encontrada na pessoa que se quer contratar, ou com quem se quer contratar, que impede o certame, a concorrência; que impossibilita o confronto das propostas para os negócios pretendidos por quem, em princípio, está obrigado a licitar, e permite a contratação direta, isto é, sem a prévia licitação. Assim, ainda que a Administração desejasse a licitação, esta seria inviável ante a absoluta ausência de concorrentes. Com efeito, onde não há disputa ou competição não há licitação. É uma particularidade da pessoa que se quer contratar, encontrável, por exemplo, no profissional de notória especialização e no artista consagrado pela crítica especializada. È circunstância encontrada na pessoa com quem se quer contratar a qualidade de ser proprietária do único ou de todos os bens existentes.
(…) é impossível por impedimento de ordem fática, relativo à pessoa que se quer contratar ou com quem se quer contratar. Não se trata, assim, de uma faculdade outorgada à pessoa obrigada, em tese, a licitar, mas do reconhecimento legal de que esta em certos casos pode celebrar o negócio de seu interesse sem o prévio procedimento licitatório, haja vista a inviabilidade de se instaurar uma competição para a escolha da melhor proposta. Portanto, será inexigível a licitação sempre que houver inviabilidade fática de competição, concorrência, confronto, certame ou disputa. Nesses termos, é obvio que tal situação levaria a pessoa, em princípio obrigada a licitar, a ser excluída dessa obrigação mesmo que a hipótese não estivesse prevista em lei, como acontecia no Direito anterior.”[1] – destaques nosso
No mesmo sentido são os ensinamentos de HELY LOPES MEIRELLES:
“(…) a licitação é inexigível em razão da impossibilidade jurídica de se instaurar competição entre eventuais interessados, pois não se pode pretender melhor proposta quando apenas um é proprietário do bem desejado pelo Poder Público ou reconhecidamente capaz de atender às exigências da Administração no que concerne à realização do objeto do contrato.”[2]
A Lei 8.666/93 que regulamenta a Licitação e Contratos Administrativos, em seu artigo 25, inciso II, permite que esta se formalize, mediante inexigibilidade de licitação, sempre que houver inviabilidade de competição, em especial para a contratação de serviço fornecido com exclusividade, in verbis:
Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
I – (...)
II – para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;
(...)
Art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:
(...)
VI - treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;
(...)
Assim, sempre que se estiver diante de uma situação que caracterize inviabilidade de competição, a administração pública está autorizada a proceder à contratação direta, tendo em vista que ausente uma das condições essenciais do processo licitatório, qual seja, a competição.
No caso em apreço, restará configurada uma situação de inviabilidade de competição, desde que seja um serviço profissional especializado, de natureza singular e notória especialização, habilitado-o para ministrar um curso específico, seminário, etc., o que deverá coadunar com o currículo ofertado e histórico de trabalhos, palestras, cursos e seminários realizados pelo profissional.
Em decisão nº. 578/2002 do Plenário do Tribunal de Contas da União, a Corte de Contas assim se pronunciou:
“Considere que as contratações de professores, conferencistas ou instrutores para ministrar cursos de treinamento ou aperfeiçoamento de pessoal, bem assim a inscrição de servidores para participação de cursos abertos a terceiros, enquadram-se na hipótese de inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do art. 25, combinado com o inciso VI do art. 13 da Lei no 8.666/1993.”
Sendo concludente, diante dos argumentos e embasamentos carreados em uníssona relação com o disposto na legislação específica, permite-se deduzir que o trabalho do profissional é de destaque na sua área profissional, quando sob a visão e justificativas plausíveis da Administração é o mais adequado à satisfação do objeto que se busca contratar, além do que deve oferecer preço proposto compatível com o praticado no mercado. Ademais, há de ser considerado que apesar de não ser único no mercado, tem suas particularidades, especialidades, que outros profissionais não possuem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desta feita, entendemos pela possibilidade da administração pública proceder à contratação direta nos termos do artigo 25, inciso II, e art. 13, inciso VI, ambos da Lei 8.666/1993, por existir inviabilidade de competição, não havendo qualquer impedimento à contratação, desde que tenha por objeto um serviço profissional especializado, de natureza singular e notória especialização, além de oferecer preço proposto compatível com o praticado no mercado, devendo o administrador público manter as todas as cautelas ao decidir pela contratação direta, constituindo ilícito penal inexigir licitação fora das hipóteses legais, ou sem as formalidades legais.
[1] GASPARINI, Diógenes. In Direito Administrativo. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 542.
[2] MEIRELLES, Hely Lopes. In Direito Administrativo Brasileiro. 34.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008. P. 287.