Uma das questões que mais atormenta os contribuintes do ICMS poderá chegar ao fim. Trata-se da glosa de créditos decorrentes de benefícios fiscais concedidos indevidamente.
Foi publicado no dia 29 de julho de o Convênio ICMS 70/2014, que trata sobre a concessão de remissão e anistia de créditos tributários relativos a incentivos e benefícios fiscais e financeiros, vinculados ao ICMS autorizados ou concedidos pelas unidades federadas sem aprovação do CONFAZ; e, ainda, sobre a concessão ou prorrogaração dos benefícios já existentes nos casos em que trata o referido convênio.
Nos termos do art. 155, § 2.º, XII, 'g', da Constituição Federal, cabe a Lei Complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos ou revogados. Como a Lei Complementar nº 24, de 07.01.75, foi recepcionada, expressamente, pelo § 8º do art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, permaneceu no Sistema Tributário Nacional a sistemática utilizada anteriormente à edição da Constituição de 1988 para a concessão e revogação de isenções e incentivos fiscais relativos ao ICMS, ou seja, cabe ao Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, órgão deliberativo encarregado de promover a celebração de Convênios, concedendo ou revogando isenções, reduções de Base de Cálculo, créditos presumidos e outros incentivos e benefícios fiscais relacionados ao ICMS.
Como todo e qualquer benefício fiscal no âmbito do ICMS somente pode ser concedido mediante aprovação prévia do CONFAZ, nos casos em que um Estado Membro se depare com um benefício fiscal concedido por outro Estado Membro, sem a aprovação do Órgão, poderá o respectivo estado Membro, destinatário da mercadoria, glosar os créditos decorrentes do benefício indevido, isto é, excluir no todo ou em parte o crédito de ICMS destacado na nota fiscal de entrada interestadual que não corresponde a um recolhimento efetivo na unidade federativa de origem, e cobrar do contribuinte a diferença resultante.
Através deste convênio, pretende-se, portanto, a anistia e remissão dos créditos tributários constituídos em decorrência de benefícios fiscais concedidos pelos Estados Membros e Distrito Federal até a data de publicação do referido convênio, sem aprovação pelo CONFAZ.
Entretanto, para tornar eficaz o Convênio, foram impostas aos Estados e Distrito Federal algumas condições: as unidades federadas, até 90 (noventa) dias da data de produção de efeitos do convênio, deverão: I - publicar, nos seus respectivos Diários Oficiais, relação contendo a identificação de todos os atos normativos relativos a incentivos e benefícios, fiscais e financeiros, já concedidos; II - efetuar o registro e o depósito, junto à Secretaria Executiva do Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ, da documentação comprobatória correspondente aos atos concessivos dos incentivos e benefícios, fiscais e financeiros, mencionados no item anterior.
Caso as unidades federadas não cumpram com os requisitos estabelecidos, poderão os Estados e o Distrito Federal manter os créditos decorrentes de glosas dos benefícios fiscais concedidos sem permissão.
Importante mencionar, neste ponto, que a remissão e anistia conferida alcançam inclusive os incentivos e benefícios, fiscais e financeiros, desconstituídos judicialmente por não atender o disposto no art. 155, § 2º, XII, “g”, da Constituição Federal, ou que ainda estão sendo discutidos perante a Administração Publica ou o Poder Judiciário. Neste caso, porém, a manutenção do benefício fica condicionada ainda: I - à desistência de ações ou embargos à execução fiscal, com renúncia ao direito sobre o qual se fundam, nos autos judiciais respectivos, ou à desistência de impugnações, defesas e recursos apresentados no âmbito administrativo; II - quitação integral pelo sujeito passivo das custas e demais despesas processuais; III - desistência pelo advogado do sujeito passivo da cobrança de eventuais honorários de sucumbência da unidade federada.
Autoriza ainda o convênio 70/2014 a concessão ou prorrogação dos benefícios fiscais vinculados ao ICMS, nos prazos que dispõe o referido convênio. Assim dispõe a cláusula terceira do convênio:
Cláusula terceira. Fica a unidade federada que editou o ato concessivo publicado, registrado e depositado junto ao CONFAZ, relativo aos benefícios e incentivos, fiscais e financeiros, vinculados ao ICMS de que trata a cláusula primeira, autorizada a concedê-los e a prorrogá-los, nos termos do ato vigente na data de publicação deste convênio e cujo prazo de fruição não poderá ultrapassar:
I - 31 de dezembro do décimo quinto ano posterior à produção de efeitos deste convênio, quanto àqueles que forem destinados ao fomento das atividades agropecuária e industrial, inclusive agroindustrial, e a investimento em infraestrutura rodoviária, aquaviária, ferroviária, portuária, aeroportuária e de transporte urbano;
II - 31 de dezembro do oitavo ano posterior à produção de efeitos deste convênio, quanto àqueles destinados à manutenção ou ao incremento das atividades portuária e aeroportuária, vinculada ao comércio internacional, incluída a operação subsequente à da importação, praticada pelo contribuinte importador;
III - 31 de dezembro do terceiro ano posterior à produção de efeitos deste convênio, quanto às operações e prestações interestaduais com produtos agropecuário e extrativo vegetal, in natura;
IV - 31 de dezembro do primeiro ano posterior à produção de efeitos deste convênio, para os demais.
Certamente, o convênio 70/2014 representa uma vitória dos contribuintes de ICMS, que poderão aproveitar mais despreocupadamente dos benefícios e incentivos conferidos pelas unidades federadas. Contudo, a vitória ainda não pode ser completamente celebrada, haja vista as demais condições estabelecidas para que o convênio possa produzir efeitos, ex vi da cláusula décima do convênio:
Cláusula Décima. A produção de efeitos deste convênio condiciona-se, cumulativamente, à:
I - edição pelo Senado Federal, com fundamento no inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, de resolução que estabeleça a redução gradual da alíquota do ICMS, nas operações e prestações interestaduais, de conformidade com o disposto no Anexo Único deste convênio;
II - promulgação de emenda constitucional que promova a repartição, entre o estado de origem e o estado de destino, do ICMS incidente sobre as operações e prestações interestaduais que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do imposto, aplicando-se nessa hipótese a alíquota interestadual, cabendo ao estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre as alíquotas interna do estado destinatário e interestadual;
III - aprovação de lei complementar que disponha sobre a instituição dos seguintes fundos federativos, com recursos da União, considerados como transferências obrigatórias, não sujeitas a contingenciamento:
a) de auxílio financeiro pela União aos Estados, Distrito Federal e aos respectivos Municípios, para compensar as eventuais perdas de arrecadação do ICMS decorrentes:
1. da redução gradual das alíquotas do ICMS, nas operações e prestações interestaduais;
2. da implementação da Resolução do Senado Federal nº 13, de 25 de abril de 2012;
3. da repartição, entre o estado de origem e o estado de destino, do ICMS incidente sobre as operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto;
b) de desenvolvimento regional no valor de, no mínimo, R$ 296.000.000.000,00 (duzentos e noventa e seis bilhões de reais);
IV - prestação, pelos Estados e pelo Distrito Federal, das informações solicitadas pelo Ministério da Fazenda, necessárias à apuração do valor do auxílio financeiro de que trata a lei complementar a que se refere a alínea “a” do inciso III do caput desta cláusula;
V - aprovação de lei complementar que afaste possíveis restrições decorrentes da aplicação do art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, que possam comprometer a implementação deste convênio.
Enfim, não podemos afirmar se e quando as condições para que o convênio surta seus efeitos serão implementadas, mas a sua edição sem sobra de dúvidas representa uma maior segurança jurídica aos contribuintes do imposto.