Inúmeros são os casos de particulares autuados pela prática de alguma infração ambiental. As pessoas a cada dia se sentem mais atraídos pela idéia de ter um animal, não autorizado pela legislação, em sua posse.
A Constituição Federal, em seu art. 225, dispõe que o meio ambiente é um direito de caráter coletivo, todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, devendo ser preservado em favor de todos. O Poder Público tem o dever de desempenhar, por meio do seu poder de polícia, formas efetivas para tutelá-lo.
A Administração Pública exerce funções típicas de Estado, compreendendo o poder de polícia, os serviços públicos, e restrições ao uso da biodiversidade brasileira.
Porém, essa tutela do Estado tem limites a serem observados. Todos os atos da Administração devem respeitar aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade administrativa, publicidade e eficiência (art. 37 da CF). O que não ocorre muitas vezes.
A lei nº 9.605/98 regula, de modo amplo, os crimes e infrações ambientais. No seu art. 70, § 3º, dispõe que todo o agente público que tiver ciência de crime ou infração ambiental deverá apurar de imediato o fato.
Entre as diversas normativas ambientais, surge a figura do termo de depósito. Este tem como objetivo deixar particular como fiél depositário de determinado animal silvestre. Um exemplo seria a situação de uma pessoa qualquer ser pega com um Amazona aestiva, papagaio-verdadeiro, sem procedência legal, devendo o animal deveria ser recolhido pela autoridade ambiental, mas devida às dificuldades que podem existir no recebimento do animal, o agente ambiental poderá emitir termo de depósito em favor do infrator.
O Decreto nº 6.514/2008 dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente. Em seu art. 21 está previsto o prazo prescricional de 5 anos para Administração aplicar qualquer sanção administrativa a quem tenha cometido infração ao meio ambiente.
“Art. 21. Prescreve em cinco anos a ação da administração objetivando apurar a prática de infrações contra o meio ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver cessado.
§ 1º Considera-se iniciada a ação de apuração de infração ambiental pela administração com a lavratura do auto de infração.”
Segundo a lei nº 9.605/98, são competentes para instaurar processo administrativo, afim de apurar infração ambiental, os órgãos integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, é o órgão executor do SISNAMA, exercendo o poder de polícia ambiental conforme dispõe a Lei nº 11.516/2207:
“Art. 5º O art. 2º da Lei no 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 2º É criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de:
I - exercer o poder de polícia ambiental;
II - executar ações das políticas nacionais de meio ambiente, referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos naturais e à fiscalização, monitoramento e controle ambiental, observadas as diretrizes emanadas do Ministério do Meio Ambiente; e”
É certo que o ato de manter animal silvestre sem permissão é considerado infração de caráter permanente. Sobre infração permanente, explica Rogério Greco:
“São aqueles cuja execução ou consumação se prolongam no tempo.(...) Enquanto a infração estiver se prolongando no tempo, até que cesse a permanência, não terá início o prazo prescricional.” (GRECO, 2012, p. 720).
Diante o exposto, se vem o questionamento: No caso de autoridade/agente ambiental ter ciência de que determinada pessoa tem animais sem autorização em seu poder, mas por negligência (ou outros fatores) não apreende os animais ou emite termo de depósito, correrá o prazo prescricional de 5 anos para Administração Pública aplicar sanção?
A questão existe devido à desorganização no controle de animais da fauna silvestre que se encontram em posse de particulares sem a devida licença ou permissão.
Por muitas vezes os agentes ambientais, Polícia Militar Ambiental, Secretaria do Meio Ambiente dos Estados, IBAMA, etc, não iniciam de imediato o procedimento para apuração de infração ambiental quando verificam animais sem autorização em posse de particular.
Atualmente a Instrução Normativa nº 169/2008/IBAMA regula o uso e manejo de animais da fauna silvestre. Anterior a esta normativa, um particular que quisesse ser criador de animais silvestres, deveria enviar ao IBAMA “Carta Consulta”, aonde constaria as espécies desejadas e a estrutura do criadouro. O interessado muitas vezes informava ao IBAMA, por meio da carta consulta, que tinha em sua posse animais silvestres sem autorização, os quais queria regularizá-los. Porém, o interessado não entregava os animais voluntariamente e o Estado também não realizava o recolhimento deles. Assim, os animais continuavam irregulares e em poder do particular.
Nessas situações o interesse do particular entra em choque com o interesse da coletividade. Ao ser autuado pela Fiscalização Ambiental Federal do IBAMA, o particular alegava em sua defesa a prescrição administrativa, no caso de ter passado 5 anos ou mais da entrega da carta consulta que informava a existência dos animais ilegais. No entendimento do particular, se o órgão ambiental teve ciência, pois o próprio particular informou, de animais ilegais e nada fez, haveria uma legalização tácita das espécies.
O argumento utilizado pelo particular é incoerente e sem respaldo legal. Em nenhuma norma ambiental está prevista qualquer espécie de autorização tácita para uso e manejo de animais silvestres.
A negligência de uma servidor específico não pode ser empecilho para o poder de polícia da Administração Pública.
Nesse caso, inexiste a prescrição, pois a conduta consistente na manutenção em cativeiro de animais da fauna silvestre brasileira sem autorização é considerada infração da caráter permanente. Enquanto houver a manutenção em cativeiro, persiste a infração.
A inércia da Administração não importa em hipótese de depósito tácito, pois a atividade administrativa deve se pautar nos princípios da legalidade e da formalidade. Não havendo um documento formalizando a legalização das espécies, não há que se cogitar início de prazo prescricional.
Não estando presente a figura da entrega espontânea, que se caracteriza pela efetiva entrega da espécie, deve o infrator ser atuado e responder a Processo Administrativo por infração contra o meio ambiente. Sobre a entrega voluntária, prevê o Decreto nº 6.514/2008:
“Art; 24.
(…)
§ 5º No caso de guarda de espécime silvestre, deve a autoridade competente deixar de aplicar as sanções previstas neste Decreto, quando o agente espontaneamente entregar os animais ao órgão ambiental competente.”
Por todo o exposto, outra não pode ser a conclusão senão a de que devem ser mantidos os atos punitivos praticados pelo IBAMA no exercício do seu Poder de Polícia Ambiental, não se aplicando a prescrição administrativa nos casos da infração de caráter permanente, em específico a de manter animais silvestres em cativeiro sem autorização.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
AMORIN, Gustavo Henrique Pinheiro de. Direito Administrativo/ Gustavo Henrique Pinheiro de Amorin. São Paulo: Barros, Fischer & Associados, 2006.
BELTRÃO, Antônio F. G. Curso de direito ambiental/ Antônio Beltrão – Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: MÉTODO, 2009.
BRASIL, Coletânea de Legislação Ambiental, Constituição Federal/ organização Odete Medauar. 10 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
GRECO, Rógério. Curso de Direito Penal/ Rogério Greco. - 14 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012.
MILARÉ, Édis. Direito penal ambiental: comentários à Lei nº 9.605/98/Édis Milaré, Paulo Ricardo da Costa Júnior. Campinas: Millennium, 2002.
MIRANDA, Robinson Nicácio de. Direito ambiental/Robinson Nicácio de Miranda – 2 ed. São Paulo: Rideel, 2010.
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial/ Diogo de Figueiredo Moreira Neto. - 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.