Natureza jurídica dos efeitos da decisão do STF no julgamento do mérito nos recursos extraordinário com repercussão geral

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11/08/2014 às 16:29

Resumo:


  • A EC n.45/2004 trouxe mudanças significativas no sistema normativo processual, com destaque para a Reforma do Judiciário.

  • A inserção do requisito da repercussão geral nas questões constitucionais discutidas no recurso extraordinário visava diminuir a demanda no STF.

  • O efeito vinculante foi consolidado para conferir eficácia contra todos e obrigar órgãos do Poder Judiciário e Administração Pública a respeitarem as decisões do STF.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

É possível falar em eficácia vinculante? É admissível a reclamação contra o desrespeito do precedente paradigma fixado?

Sumário: 1. Introdução; 2. Recurso Extraordinário e Repercussão Geral; 3. O Efeito Vinculante consolidado; 4. Limites objetivos e subjetivos do efeito vinculante; 5. Da Reclamação; 6. Conclusão; 7. Referencia Bibliográfica.

Palavras chave: Efeito Vinculante, Instituto, Recurso Extraordinário, Repercussão Geral, Supremo Tribunal Federal, Súmula Vinculante.

1. Introdução

           

            Foram necessários mais de uma década de tramitação para a EC n.45/2004 fazer significativas e importantes mudanças em nosso sistema normativo processual, o que convencionou chamar de a Reforma do Judiciário, com característica de transformação do procedimento legislativo, responsável pela modificação da redação de alguns dispositivos, inserindo outros tantos, forçando a regulamentação de novas normas, com isso aproximando uma interpretação diferenciada dos ordenamentos já existentes, não somente na legislação constitucional, mas naquelas de ordem infraconstitucional.

            A inserção do §3° no art. 102 da CF/1988, uma dessas modificações trazidas pela EC n.45, criou o requisito da repercussão geral das questões constitucionais discutidas, para a apreciação do recurso extraordinário, competência do Supremo Tribunal Federal, este novo artifício criado com a intenção de diminuir a intensa demanda que adentra a Corte Suprema. O §2° do mesmo artigo acrescido, disciplina que, a eficácia erga omnes e o efeito vinculante, responsabiliza agente público da administração direta e indireta, na esfera federal, estadual e municipal, que descumprir o determinado no julgado.

            Outra modificação foi delimitada pela Lei 11.418/2006 que introduz o art. 543A, 543B e 543C ao Código de Processo Civil, servindo para sobrestar recursos com idêntica controvérsia até o julgamento do mérito.

            A pesquisa, inicialmente, antes do tema propriamente dito e no intuito de facilitar a compreensão, responderá vários questionamentos, aclarando conceitos dos institutos mencionados e delimitando o conhecimento da natureza jurídica dos efeitos da decisão do STF no julgamento do mérito nos recursos extraordinários, aqueles com repercussão geral e da possibilidade de se falar em eficácia vinculante.

            Posteriormente a pesquisa se deterá na indagação acerca da admissibilidade da reclamação contra o desrespeito do precedente paradigma fixado, trazendo para a investigação legislações pertinentes, a produção jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, a doutrina da mais alta qualidade, a opinião de renomados juristas, visando demonstrar aspectos interpretativos adotados pela Corte Suprema.

2. Recurso Extraordinário e Repercussão Geral

           

            O recurso extraordinário entrou no ordenamento jurídico pátrio através da Constituição de 1934, permanecendo em todas as Constituições subseqüentes e tendo o Supremo Tribunal Federal como Suprema Corte do Poder Judiciário, apenas modificando a competência para o julgamento dos recursos em geral. O que não foi diferente com a Carta Política de 1988, que manteve o recurso extraordinário para julgamento de causas que envolvessem violação ao direito federal e para violação de atos normativos em confronto com a Constituição Federal, é remédio constitucional de competência do STF, cabível em decisão de juízo monocrático ou colegiado, em processos de única e última instancia. Com a criação do Supremo Tribunal de Justiça, que se deu com a Constituição Federal de 1988, a competência das causas à violação da legislação federal ordinária passou a ser revista pelo então criado recurso especial por esse órgão[1].

             A criação do STJ pelo legislador constituinte de 1988, a transferência de algumas das competências e na tentativa de reduzir o enorme volume de trabalho no Supremo Tribunal Federal não foi suficiente, houve nos últimos anos um aumento significativo de processos destinados a Corte Suprema, uma manobra frustrada de diminuir o número de recurso extraordinário que por “óbvio, trata-se de providência idealizada com o propósito de descongestionar o STF, coadunando-se com a pretensão de fortalecimento da excelência das funções jurídicas e políticas do órgão de cúpula do judiciário nacional”.[2]

            Neste sentido Miguel Reale Jr. Apresenta a seguinte síntese:

 “A intensa litigiosidade surgida após a promulgação da Constituição de 1988, que se revelou ultrapassada para atender à demanda decorrente da constitucionalização de diversos novos direitos, aliada ao maior acesso ao Judiciário. Essas circunstâncias e o próprio crescimento econômico do país aumentaram a já existente crise de moralidade do Judiciário, fazendo nascer junto aos jurisdicionados a importância ainda maior da celeridade da prestação jurisdicional[3].

 

            São muitas as observações de estudiosos e doutrinadores, mas cabe destacar o entendimento de CRISTIANE OLIVEIRA PETER DA SILVA, assevera:

“É mais do que chegada a hora de o Supremo Tribunal desvencilhar-se do recurso extraordinário, que teve sua inegável importância histórica e vinculação estreita a relevantíssima para o desenvolvimento e crescimento do próprio tribunal, e porque não dizer do ordenamento jurídico constitucional brasileiro, mas que hoje serve apenas para a chicana processual e retardamento da prestação jurisdicional, tendo em vista que se limita a servir de quarta instância e tomar o tempo dos ministros como questões repetidas, e assim afastá-los cada vez mais da missão que lhe foi constitucionalmente destinadas: interpretar as normas constitucionais e dar o tom da hermenêutica constitucional para a atividade dos demais tribunais”.[4]

            Ao longo da historia muitos foram os dispositivos jurídicos criados para dirimir ou pelo menos minimizar a já instalada excessiva demanda jurisdicional do STF, passando pelo aumento de seus Ministros[5], a argüição de relevância[6] que no passado recebia a apreciação do STF e nos dias de hoje é competência do STJ, que não cabe agora priorizar cada um desses institutos, preferimos nos ater a mencionar, não sendo, portanto, objeto desta pesquisa.

            Depois de todo percalço, necessário se fazia criar um instrumento que diminuísse a enxurrada de RE no STF, com a Emenda Constitucional 45 de 08.12.2004, que depois de mais de uma década tramitando no Congresso Nacional veio fazendo grandes modificações e acabou sendo chamado de Reforma do Judiciário, inseriu o §3° no art. 102 da Constituição Federal de 1988, in verbis: Art. 102 “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da constituição, cabendo-lhe: [...] §3° No recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de dois terços de seus membros”, este dispositivo criou a repercussão geral, requisito indispensável para admissibilidade do RE perante o STF, devendo conter real relevância e importância,           

            Oportuno dizer que a repercussão geral foi capaz de fazer a separação entre o “joio e do trigo”[7], o joio é uma planta que se parece em tudo com o trigo, somente na colheita se percebe a diferença, o joio não tem fruto, simbolizando com perfeição o RE sem o instituto da repercussão recusado pela manifestação de dois terços dos membros do STF.   Após a criação da repercussão geral pela EC n. 45/2004 a Lei n° 11.418 de 2006 regulamentou o dispositivo constitucional supracitado e acrescentou ao Código de Processo Civil no capítulo que corresponde ao RE e ao REsp para o STF e STJ, o art. 543-A, in verbis:

            Art. 543-A O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006). § 1° Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa. § 2° O recorrente deverá demonstrar, em preliminar do recurso, para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a existência da repercussão geral. § 3° Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal. § 4° Se a Turma decidir pela existência da repercussão geral por, no mínimo, 4 (quatro) votos, ficará dispensada a remessa do recurso ao Plenário. § 5° Negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. § 6º O Relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. § 7° A Súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão.

            E o art. 543-B in verbis: Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo. §1° Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte.

§ 2 ° Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente não admitidos.§ 3° Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. § 4° Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o Supremo Tribunal Federal, nos termos do Regimento Interno, cassar ou reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada. § 5° O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal disporá sobre as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos, na análise da repercussão geral.

            Também alterou o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal através da primeira emenda ligada a repercussão geral, Emenda Regimental n. 21, de 30 de abril de 2007, modificando a redação dos art. 13, inciso V, letra c, e art. 21 parágrafo 1°, e arts 322 a 329, revogando o parágrafo 5° do art. 321, mediante a qual a Repercussão Geral deve estar adequada à letra da lei, assim todo RE que adentrar ao STF deverá passar pelo crivo de dois terços de seus membros, (oito votos de onze), recebendo a negativa, o não reconhecimento de repercussão geral no RE.[8]

            A verificação preliminar formal da repercussão geral é de competência concorrente do Tribunal Regional Federal, Tribunal de Justiça, da Turma Recursal e do Supremo Tribunal Federal, já pacificado pela jurisprudência do STF, mas o reconhecimento e a presunção legal da repercussão geral, isto é a análise final compete exclusivamente ao STF[9].                                                                    

            Nos termos do acórdão:

PROCESSUAL CIVIL. Agravo Regimental NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE. DECISÃO CONFIRMADA EM SEDE DE AGRAVO DE INSTRUMENTO QUE HOMOLOGOU OS CÁLCULOS APRESENTADOS PELOS EXPROPRIADOS DETERMINANDO A EXPEDIÇÃO DE NOVO OFÍCIO REQUISITÓRIO. AUSÊNCIA DE PRELIMINAR FORMAL E FUNDAMENTADA DE REPERCUSSÃO GERAL. ARTIGO 543-A, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL C.C. ART. 327, § 1º, DO RISTF. DECISÃO QUE SE MANTÉM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. A repercussão geral é requisito de admissibilidade do apelo extremo, por isso que o recurso extraordinário é inadmissível quando não apresentar preliminar formal de transcendência geral ou quando esta não for suficientemente fundamentada. (Questão de Ordem no AI n. 664.567, Relator o Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 6.9.07). 2. A jurisprudência do Supremo fixou entendimento no sentido de ser necessário que o recorrente demonstre a existência de repercussão geral nos termos previstos em lei, conforme assentado no julgamento da Questão de Ordem no AI n. 664.567, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 6.9.07, II. Recurso extraordinário: repercussão geral: juízo de admissibilidade: competência. 1 . Inclui-se no âmbito do juízo de admissibilidade – seja na origem, seja no Supremo Tribunal – verificar se o recorrente, em preliminar do recurso extraordinário, desenvolveu fundamentação especificamente voltada para a demonstração, no caso concreto, da existência de repercussão geral (C.Pr.Civil, art. 543-A, § 2º; RISTF, art. 327). 2. Cuida-se de requisito formal, ônus do recorrente, que, se dele não se desincumbir, impede a análise da efetiva existência da repercussão geral, esta sim sujeita à apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal (Art. 543-A, § 2º). 3. Agravo Regimental desprovido. (AI 767825 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 10/04/2012[10].

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            O texto constitucional exclui todas as questões que não esteja imbuída de repercussão geral, devendo trazer em seu bojo questão econômica social e política, que atinja um número expressivo de pessoas, sobre assunto impactante ou muito controvertido, não deixa de ser uma forma de admissibilidade, diante disso entende-se que todas as outras questões que não estiverem dotadas desses atributos, estarão excluídas da possibilidade de reconhecimento de RE.[11]

            Importante destacar que ao buscar-se o significado da repercussão geral nota-se tratar de conceito vago e indeterminado significando que são idéias indefiníveis, não deve mesmo ser propriamente conceituado, mas apenas referidos, não há como deixá-lo estático de forma plena da lei posta. Essa é a opinião de parte da doutrina pesquisada.[12]

3. O Efeito Vinculante consolidado

           

            Em meio às divergências das decisões tomadas no controle difuso e no controle concentrado de constitucionalidade, pela necessidade da inserção de mecanismos jurídicos que visasse contornar o problema, a EC n. 3, de 17/03/1993 acrescentou o § 2° ao art.102 da CF/88, criou ação para declarar a constitucionalidade das leis, essa manobra jurídica trouxe resultados com o intuito de harmonizar a jurisprudência constitucional, mas o instituto não foi somente a ADC criada, foi também o efeito vinculante, “utilizado para lograr essa uniformização preservando a hierarquia entre as instâncias do Poder Judiciário” [13].

            Através da EC n. 45 o § 2° ao art.102 da CF/88 recebeu nova redação, in verbis: “As decisões definitivas de mérito proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”.

            Antes esse parágrafo tratava apenas dos efeitos das decisões da ADC, com a nova redação dada pela EC n. 45/2004, inclui a análise a ADI que terão o mesmo efeito da ADC, que estavam expressos apenas em normas infraconstitucionais. A ADC tem como objetivo declarar lei ou ato normativo federal, retirando a controvérsia de constitucionalidade, “não obstante partir de então a jurisprudência do STF passou a conferi-lo também às Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI), em razão do caráter dúplice (ambivalente) destas ações, com a edição da Lei 9. 868 em 10/11/1999, o efeito vinculante foi estendido expressamente à ADI”. [14]

“Trata-se de uma ação diretamente oposta a ADIn, que, por sua vez, pretende ver uma lei ou um ato normativa federal ou estadual declarados inconstitucionais, A decisão de mérito prolatada nessas ações terá efeito erga omnes, ou seja, poderá ser oponível, contra todos, indo além das partes envolvidas no processo o que decorre, logicamente, da forma de controle da qual faz parte: concentrado e abstrato. Por meio desse tipo de fiscalização, busca-se a proteção de um interesse público de defesa do texto constitucional, que, portanto, pertence a todos”.[15]

 

 

            A ADI e a ADC são reguladas pela Lei 9.868/1999 e a ADPF, pela Lei 9.882/1999, ambas regem o controle concentrado, objetivo ou abstrato, inserto no controle de constitucionalidade através da EC n. 16/1965, busca obter a constitucionalidade ou inconstitucionalidade das leis ou ato normativo por via de ação direta em um único tribunal, isto é no STF. Essas Ações têm eficácia vinculante, nesse sentido o parágrafo único do art. 28 da lei 9.868/1999 indica que “a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade, à interpretação conforme a constituição e à declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto tem eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública, federal, estadual e municipal”.

            O surgimento do efeito vinculante se dá com a edição do Acórdão que profere a constitucionalidade ou inconstitucionalidade e, após o transito em julgado no prazo de 10 dias é publicado em seção especial no Diário Oficial a parte dispositiva do Acórdão pelo STF, a partir de então dar-se ao feito vinculante caráter obrigatório e força de lei[16].

            A ADPF, prevista no original parágrafo único do art. 102 da CF/88, não existia nenhum outro dispositivo no ordenamento com semelhança, sendo objeto de interpretação por parte de alguns autores como uma autorização constitucional onde qualquer pessoa poderia criar uma ação em defesa de seus direitos constitucionais e recorrer a Corte Suprema, com a regulamentação do instituto viu-se que os legitimados para a propositura da ADPF são os mesmo da ADIn e essa interpretação perdeu sentido, já que o seu objeto é (art.1°da Lei 9. 882/1999) “evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do Poder Público” e no seu parágrafo único, I “quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição[17].

            Entretanto o efeito vinculante se estende às decisões do Supremo, através das leis supracitadas levou a OAB ajuizar ação direta de inconstitucionalidade contra ambas. Na reclamação n. 1.880 em 07/11/2002, o STF decidiu por oito votos a três em questão de ordem proposta pelo relator, à constitucionalidade do art. 28, parágrafo único da Lei 9.868/1999, reconhecendo o efeito vinculante de suas decisões em ADIn.

            Neste sentido os termos da ementa[18]:

“Na assentada de 7.11.2002, no julgamento do Agravo Regimental na Reclamação n. 1.880/SP, Relator o Ministro Maurício Corrêa, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu: “EMENTA: QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DE MÉRITO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 28 DA LEI 9868/99: CONSTITUCIONALIDADE. EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO. REFLEXOS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. “Para efeito de controle abstrato de constitucionalidade da lei ou ato normativo, há similitude substancial de objetos nas ações declaratórias de constitucionalidade e direta de inconstitucionalidade. Enquanto a primeira destina-se a aferição positiva de constitucionalidade, a segunda traz pretensão negativa. Espécie de fiscalização objetiva que, em ambas, traduzem manifestação definitiva do tribunal quanto à conformação da norma com a Constituição Federal. A eficácia vinculante da ação declaratória de constitucionalidade, fixada pelo § 2º do artigo 102 da Carta da República, não se distingue, em essência, dos efeitos das decisões de mérito proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade”

           

            Portanto o efeito vinculante tem o condão de proteger a segurança jurídica, proporciona igualdade e estabilidade às decisões judiciais, produzindo maior equilíbrio e eficácia as decisões da Corte Suprema.

4. Elementos objetivos e subjetivos do efeito vinculante

            O art. 102, § 2° da Constituição Federal e o art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/99, os dois institutos estabelecem que as ações declaratórias de constitucionalidade e as ações diretas de inconstitucionalidade têm eficácia erga omnes (força de lei), produz efeitos indiscutivelmente processuais, perde, portanto, a possibilidade de rediscussão pelo STF em nova demanda e o efeito vinculante abrange uma espécie de obrigação por parte dos demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, diz respeito não só a parte dispositiva no controle de constitucionalidade, mas entra no ponto que justifica a decisão, na fundamentação do julgado, sendo, portanto adaptado por analogia, para os fundamentos ou motivos determinantes, como disciplina GILMAR FERREIRA MENDES, são institutos afins, diferentes entre si, mas que se complementam:

Além de conferir eficácia erga omnes às decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle de constitucionalidade, a presente proposta de emenda constitucional introduz no direito brasileiro o conceito de efeito vinculante em relação aos órgãos e agentes públicos. Trata-se de instituto jurídico desenvolvido no Direito processual alemão, que tem por objetivo outorgar maior eficácia às decisões proferidas por aquela Corte Constitucional, assegurando força vinculante não apenas à parte dispositiva da decisão, mas também aos chamados fundamentos ou motivos determinantes (tragende Gründe) [19].

           

            Os fundamentos ou motivos determinantes, conteúdo essencial ou eficácia transcendente são expressões usadas pelo STF que identificam a parte dispositiva da decisão, significa dizer que os fundamentos que determinam ratio decidendi são essenciais a conclusão proferida na decisão judicial. O professor LUIZ GUILHERME MARINONI nos explica a diferença entre os institutos aplicados pelo STF.

O Supremo Tribunal Federal fala em motivos ou fundamentos determinantes, em conteúdo em eficácia transcendente. As expressões “motivos ou fundamentos determinantes e “conteúdo essencial” se referem à decisão. Querem expressar os fundamentos que determinam ou são essenciais à conclusão judicial. A eficácia transcendente é aquela que transcende ao caso, interferindo sobre os demais casos, embora não tratando da mesma norma, configuram igual questão constitucional, a ser solucionada mediante a aplicação dos mesmos fundamentos ou motivos que determinaram a decisão[20].

 

 

            Portanto no limite objetivo o efeito vinculante abrange os órgãos do poder judiciário e a administração pública direta e indireta, na esfera, federal, estadual e municipal, que não fazem parte do processo de controle, sendo que a decisão sai desse limite objetivo e transpassa o dispositivo com a mesma fundamentação de normas de igual teor, esta é a teoria da fundamentação transcendente. Já no limite subjetivo a coisa julgada ultrapassa as próprias partes, e é essa ampliação que enseja o uso da reclamação conforme consta no art. 102, I da Carta Magna, Conforme disciplina GILMAR FERREIRA MENDES:

Esse efeito vinculante em relação a órgãos ou autoridades que não integram de alguma forma o processo somente parece fazer sentido se se admitir que ele atinja não apenas a questão submetida ao Tribunal e por ele decidida, mas também outras questões de idêntico conteúdo (gleiche Rechtsfrage). Por isso mediante a vinculação de órgãos, pessoas ou autoridades estranhas ao processo, evita-se que, surgindo a mesma questão jurídica, sejam instaurados novos processos desse tipo (outras partes, outro pedido, mas idêntica questão jurídica). Opera-se, pois, uma ampliação do efeito vinculante, no plano subjetivo, para além dos limites da coisa julgada[21].

 

           

            O desrespeito à decisão transitado em julgado com eficácia vinculante autoriza o uso da reclamação constitucional contra decisão divergente, que poderá ser proposta por todos aqueles que forem atingidos, ao entendimento firmado pelo STF, em julgamento de RE.[22]

5. Da Reclamação

           

            A reclamação constitucional é um instrumento jurídico processual, prevista na Carta Constitucional de 1988, é uma proteção contra decisões arbitrárias dos órgãos do judiciário e da administração pública, preserva a competência dos tribunais superiores, garante a observância da competência e supremacia das decisões. Inserida no art. 102, inciso I, “processar e julgar, originariamente: e na alínea L, “a reclamação para preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões”, no art. 105 “Compete ao Supremo Tribunal de Justiça: inciso I processar e julgar, originariamente: alínea f a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões, também tem previsão na Lei n. 8.038/1990 e na Lei n. 11.417/2006 e no Regimento interno do STF e do STJ.

            Com a EC n.45/2004, foi inserido o art. 103 A §3° que dispõe “do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso”. Desde então, destaca-se a importância da reclamação, com funções vitais para o funcionamento e existência do sistema, com a nova finalidade dada pela EC n. 45/2004, impôs respeito à operacionalidade e eficácia da súmula vinculante, que depende da operacionalidade e eficácia da reclamação, para assegurar a atuação dos órgãos de cúpula do Poder Judiciário[23].

            A reclamação é medida judicial cabível oriunda de construção jurisprudencial do STF, disciplinada inicialmente pelo regime interno do Supremo, nas palavras de LEONARDO LINS MORATO: “A reclamação não tem cabimento para impor o cumprimento de jurisprudência, ainda que se trate de jurisprudência dominante, ou de súmula sem efeito vinculante, mesmo emitida pelo STF”. Para o ajuizamento da ação, o reclamante deve fazer parte do processo, com decisão desrespeitada pela autoridade reclamada e tenha sido atingido juridicamente pelos efeitos.[24]

            Neste sentido conforme a Rcl 14.367:

Segundo a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, são legitimados à propositura de reclamação constitucional todos aqueles que sejam prejudicados por atos contrários às decisões que possuam eficácia vinculante e geral (erga omnes). [...]. a reclamação não é instrumento de uniformização ou garantia da aplicação de jurisprudência (cf. Rcl 1.665-AgR, rel. min. Marco Aurélio, Pleno, DJ 17.06.2005; Rcl 1.639-AgR, rel. min. Octavio Gallotti, Pleno, DJ 24.11.2000; Rcl 1.880-AgR, rel. min. Maurício Corrêa, Pleno, DJ 19.03.2004).[...], os reclamantes não foram partes nos processos mencionados, nos quais teriam sido firmados os precedentes tidos por violados. Portanto, na linha jurisprudencial desta Corte, é evidente a ilegitimidade ativa dos reclamantes. Ademais, esta Corte já decidiu, reiteradamente, que não cabe reclamação quando utilizada, como no caso, “para fazer prevalecer à jurisprudência desta Suprema Corte ou para impor-lhe a observância, em situações nas quais os julgamentos do Tribunal não se revistam de eficácia vinculante [...]. Portanto, não basta para o cabimento da reclamação argumentar que a questão controvertida seja contrária à jurisprudência do STF (cf. Rcl 726-AgR, rel. min. Ilmar Galvão, Pleno, DJ 17.04.1998). sa linha, a ementa transcrita a seguir, proferida em precedente de minha relatoria (Rcl 6.135-AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, Pleno, DJ 19.02.2009): CONSTITUCIONAL. RECLAMAÇÃO. ALEGADA VIOLAÇÃO DA AUTORIDADE DE ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL SUMULADA. SÚMULA DA JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NÃO CABIMENTO. DECISÃO QUE NEGA SEGUIMENTO À RECLAMAÇÃO (ART. 161, PAR. ÚN., DO RISTF). AGRAVO REGIMENTAL. A reclamação constitucional (art. 102, I, l da Constituição) não é meio de uniformização de jurisprudência. Tampouco serve como sucedâneo de recurso ou medida judicial eventualmente cabível para reformar decisão judicial. Não cabe reclamação constitucional por alegada violação de entendimento jurisprudencial, independentemente de ele estar consolidado na Súmula da Jurisprudência Dominante do Supremo Tribunal Federal ("Súmula Tradicional"). Hipótese na qual a orientação sumulada tida por ofendida não era vinculante, nos termos do art. 103-A, § 3º da Constituição. Agravo regimental conhecido, mas ao qual se nega provimento [25].

 

            Se o julgamento da reclamação for procedente poderá ser arbitrado uma tutela mandamental, a Suprema Corte determinará que a autoridade reclamada obriga-se no “cumprimento da decisão desacatada, ou a respeito da norma de competência desrespeitada, ou a aplicação adequada, ou a inaplicação da súmula vinculante dependendo do caso submetido em questão”. Todas as medidas para a completa obediência da decisão por parte da autoridade reclamada serão tomadas para que se alcance o fim almejado[26].

            O julgamento de procedência da reclamação terá como efeito a cassação da decisão ou a anulação de um ato administrativo, o Supremo “determinará que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso”. A decisão tem uma “eficácia dobrada que além de ser eficaz para si mesma, torna eficaz também um provimento jurisdicional anterior” (art. 103A, §3° CF). “Em todos os casos, os prejudicados poderão reivindicar por meio das vias próprias, a reparação dos danos que por ventura tenham sofrido, em decorrência do desrespeito da súmula vinculante”. Após julgado o desrespeito a uma súmula vinculante, o Supremo entender necessária a sua aplicação, determinará e emissão de um ato ou de uma decisão por parte da autoridade reclamada, conforme a súmula, mas se não for caso de aplicação, “pode o supremo determinar que outro ato ou outra súmula sejam emanados da autoridade reclamada, sem a aplicação da súmula vinculante discutida na questão”[27].       

6. Conclusão         

            Ao término desse estudo observa-se que foram criados diversos mecanismos para minimizar a demanda dos trabalhos na Suprema Corte, o que muitos autores convencionaram chamar de “crise do judiciário”, alguns foram instintos enquanto outros permanecem até os dias de hoje, todos com a precípua finalidade de garantir a razoável duração do processo, promovendo a necessária celeridade, dessa forma respondendo aos anseios da sociedade.

             Para responder aos questionamentos propostos foi necessário se ater a alguns desses mecanismos com maior afinco, como a repercussão geral, servindo como filtro de admissibilidade do Recurso Extraordinário, trazendo a apreciação do STF somente questões de relevo social.

            A pergunta feita no titulo da possibilidade de se falar em eficácia vinculante, a resposta é sim, o efeito vinculante inserido no ordenamento jurídico brasileiro a partir da EC n.45/2004, visa construir o precedente com o foco também na celeridade processual, vinculando decisões judiciais. Os questionamentos com relação aos fundamentos ou motivos determinantes, na aceitação pelo STF, verificou-se indefinição com relação às jurisprudências, existindo forte divergência neste sentido entre os ministros.

            Certamente este trabalho elaborado de maneira bastante reduzida não expressou todo o alcance que tão rico e fascinante assunto deveria expressar, mas na certeza que todos os questionamentos foram respondidos.

7. Referencias Bibliográficas

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Sobre a autora
Sandra Mafra

Especialista em Direito Constitucional.

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Texto escrito para obtenção de avaliação na pós graduação em Direito Constitucional.

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