A proposta de emenda constitucional (PEC) que possuía como finalidade a redução da maioridade penal de dezoito para dezesseis anos no caso de crimes hediondos, tortura, terrorismo e tráfico de entorpecentes não obteve sucesso.
A decisão tomada pelo Senado causou revolta por boa parte da população brasileira, já que na atualidade o índice de crimes cometidos por menores de idade está em constante crescimento, apesar de ainda ser menor perante o índice de crimes realizados por indivíduos imputáveis. Outro fator desencadeador para tal comoção é a ênfase que a mídia vem dando aos delitos cometidos por menores de dezoito anos, por serem cada vez mais frequentes e bárbaros, assim, disseminando o medo e o aumento da discussão a cerca do assunto.
A decisão quanto à idade fixada para considerar um indivíduo imputável penalmente é bastante questionável e inconsistente, considerando que seu embasamento se justifica por fatores subjetivos. Os critérios utilizados para tal escolha vêm de elementos:
- Biológicos – pressupõe o desenvolvimento mental incompleto sem que possa entender perfeitamente o caráter criminoso;
- Psicológicos – onde o individuo pratica o ato inconscientemente, sem a percepção exata da realidade. Porém o critério psicológico possui características duvidosas quanto à análise, pois é difícil definir a exata ausência de consciência e a vontade do indivíduo no instante do delito;
- Biopsicológicos – consiste na combinação dos dois critérios mencionados.
Uma das posições mais discutidas é a de D’urso (1999, s.p), ele afirma que a maioridade penal é algo fictício. Como em um “passe de mágica” o jovem detém a compreensão de tudo que faz? Aderindo como critério ideal o biopsicológico, alguns países são adeptos e definem uma idade como patamar mínimo, sendo o mesmo relativamente baixo para obter-se uma melhor abrangência. Por exemplo, doze anos e baseando-se nessa idade, poder-se-á atribuir responsabilidade penal, desde que o indivíduo possua a compreensão dos seus atos. A análise realizada é individual, respeitando a particularidade de cada situação.
De acordo com Costa Jr. (2000) as condições sociais e de desenvolvimento da atualidade são extremamente distintas quando comparadas as de 1940, ano em que foi estipulada a imputabilidade penal aos dezoito anos. O critério biológico não é mais o mesmo, hoje, aos dezesseis anos praticamente todos os indivíduos possuem condições de discernir sobre o caráter delituoso do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento. Certamente a idade cronológica não corresponde à idade mental. O fácil acesso a informações e aos meios de comunicação levam a um amadurecimento precoce e a uma evolução drástica dos jovens.
Em outros termos, a definição absoluta de inimputabilidade do menor de dezoito anos está ultrapassada para os dias de hoje. A sociedade evoluiu e porventura seja o momento da lei também mudar.
Aqueles que contrariam a redução da maioridade penal contam com o auxílio de Damásio (2007), que expõe ser contrário à redução da maioridade penal, porque tal ideia pode parecer extraordinária, mas o tempo e o lugar são inadequados. O sistema penitenciário do país não possui requisitos para atender a necessidade de reabilitação desses jovens. Dessa forma, apenas teoricamente seria favorável à redução. Considera ainda, que essa disposição não vai alterar os índices de criminalidade.
Porém, se, de um lado, a análise do tema sob um critério mais realista e prático pode mesmo justificar a redução da maioridade penal, tenho que, de outro, uma reflexão mais humana e jurídica do assunto ainda justifica a manutenção dos dezoito anos, da forma como sempre foi.
A triste realidade que presenciamos é de jovens que esnobam da legislação presente e da falta de “punição”, aproveitando da mesma para conscientemente cometer atos ilícitos sem ao menos se preocuparem em escondê-los, enquanto a sociedade se mantém refém de crimes que nos surpreendem ao tomarmos ciência da idade de seus respectivos autores.
As regras do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) são aplicadas aos menores infratores, tal norma, tem como principal intuito habilitá-los e recuperá-los para o regresso ao convívio social. Assim, pelo fato de serem jovens e estarem em processo de formação, presume-se que a recuperação dos mesmos seria mais fácil.
É função do Estado fornecer educação de qualidade, para que futuramente possam ser incluídos no mercado de trabalho e consequentemente, afastar do mundo cruel do crime muitos que adentram-no por falta de oportunidades. Dificilmente algum jovem sonha em participar desse universo sombrio com destino certo. Talvez aí, devêssemos refletir sobre a verdadeira prevenção para essa criminalidade prematura, que é a primária, e não mascará-la diante de uma diminuição da maioridade penal.
As unidades da Fundação Casa são consideradas por muitos como formação para criminosos cada vez mais asquerosos e articulados. Para suportar e reabilitar esses “novos criminosos”, essas unidades devem acompanhar a evolução da sociedade e seus delitos. Sem mudanças não existe progresso, assim, uma reestruturação desse sistema deve ser realizada para recepcionar os precoces delituosos e então aplicar medidas que os resgatem para paralisar essa explosão da porcentagem de crimes cometidos por estes infratores.
Providências eficazes relacionadas a uma formação e capacitação profissional devem ser aderidas, para que quando o menor infrator retorne ao corpo social disponha de artifícios para se manter afastado de eventuais delitos e possua uma visão mais otimista sobre um futuro promissor.
Muitas pessoas consideram a redução da maioridade penal uma boa solução para a criminalidade, porém se trata de uma punição tardia e não de uma correta prevenção e eliminação do problema na sua origem. Logo, demonstraria resultados apenas instantaneamente, sua falha se apresentaria novamente. Tanto a diminuição de crimes cometidos por menores de idade, como por criminosos imputáveis, somente será eficiente quando o sistema apresentar subsídios para afastá-los do crime definitivamente. O que se verifica é a incompetência do Estado em concretizar políticas públicas necessárias para se cumprir o que está previsto na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
REFERêNCIAS
COSTA JUNIOR, Paulo José da. Comentários ao Código Penal. 6. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2000.
CHAVES, Antônio. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. ed. São Paulo: LTr, 1997.
D'URSO, Luiz Flávio Borges. A impunidade e a maioridade penal. Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2006/artigo-a-impunidade-e-a-maioridade-penal/>. Acesso em 12 mai. 2014.
JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal: parte geral. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 1985.
LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e ato infracional: medida sócio-educativa é pena?. São Paulo: Juarez de Oliveira, Ltda, 2003.