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Novas formas de comércio internacional.

O comércio eletrônico. Desafios ao direito tributário e econômico

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01/08/2002 às 00:00
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5.Desafios do Direito Tributário

            5.1.Internet: Tributar ou não tributar?

            Uma preocupação internacional que não surgiu ainda no Brasil, mas que surgirá inevitavelmente, é a questão de se impor ou não tributação sobre a Internet, nos mesmos moldes do que ocorre com o telefone, a televisão, etc (16).

            É importante aqui fazer uma distinção que nos parece óbvia, mas que não é observada pela maioria das pessoas que tratam do assunto. A Internet não é sinônimo de comércio eletrônico, e o comércio eletrônico não é sinônimo de Internet. A Internet é um meio de comunicação, assim como o rádio, o telefone e a televisão. O comércio eletrônico é o comércio realizado através de computadores, cujo principal meio é a Internet. Se eu me conecto diretamente de casa ao computador do meu banco, não utilizo a Internet. Se me conecto à Internet para pesquisar páginas pessoais, não realizo ato de comércio. Um não depende do outro, apesar de estarem intimamente ligados.

            Tendo isso em mente, questionamos a conveniência da imposição de impostos sobre a Internet. Do ponto de vista do capital, as empresas de tecnologia, os provedores de acesso e todos aqueles ligados à Internet defendem a não tributação. Isso tornaria suas atividades mais caras e diminuiria o seu lucro. Já do ponto de vista social, a tributação também não é bem-vinda, pois tornaria mais difícil o acesso das camadas mais baixas, uma vez que aumentaria o custo. Ambos, os interesses, são legítimos.

            A criação ou não de tal imposto é questão de política pública e como tal deve levar em consideração o interesse público e não o interesse estatal. O primeiro claramente deseja a, literal, popularização da Internet, enquanto o segundo almeja o incremento das receitas.

            No que pese nossa opinião, somos completamente contra a criação de impostos sobre a Internet, pois ao fazê-lo, o Estado estaria criando barreiras à efetivação do seu potencial de democratizar a informação, podendo comprometer sua taxa de crescimento. Não que ela não sobreviveria à criação do imposto eletrônico, mas tornaria as coisas mais difíceis. A decisão que deve ser tomada é se o Brasil reconhece na Internet uma oportunidade de desenvolvimento ou apenas mais um serviço.

            Para falar a verdade, as barreiras tarifárias sobre a Internet já são enormes. Se somarmos os tributos estaduais e federais que incidem sobre a telefonia, podemos chegar a índices superiores a 40%, isso sem contar o imposto correspondente ao serviço de acesso à Internet (que ainda se discute se deve ser o ICMS ou ISS). A criação de um tributo eletrônico não melhoraria este quadro.

            Não estamos a sustentar que os serviços de acesso a Internet devam ser isentos de impostos, mas tão somente a Internet. Com isso queremos evitar que, como a CPMF, se crie mais um tributo cujo fato gerador não representa uma demonstração de capacidade contributiva, violando, assim, princípios constitucionais que regem o sistema tributário nacional.

            5.1.1.O bit tax

            Já foi levantada a hipótese de se estabelecer um imposto sobre o fluxo de informações, esse novo imposto teria duas vertentes: um impostos sobre o correio eletrônico e um sobre o fluxo de informações propriamente dito. A arrecadação do primeiro seria canalizada para um fundo destinado a financiar obras nas áreas de telecomunicação e a do segundo visaria a substituir a possível perda de receitas causada pelo comércio eletrônico.

            De acordo com o Internet Freedom Act, bit tax significa qualquer imposto sobre comércio eletrônico expresso em ou medido pelo volume de informações digitais transmitidas eletronicamente, ou o volume de informação digital por unidade de tempo transmitida eletronicamente, mas não inclui os impostos incidentes sobre fornecimento de serviços de telecomunicação (17).

            Um vez que todo que todo provedor de acesso é registrado e é possível controlar o fluxo de informações e o número (ou tamanho) de e-mails, seria, em tese, viável o controle de quanto utiliza cada pessoa. O problema de estabelecimento de tais impostos não encontra qualquer barreira tecnológica, ele é viável hipoteticamente falando. O problema é que ambos não fazem o menor sentido do ponto de vista tributário.

            Quem ousará defender que o fluxo de informações, em última análise, o números de bits que transita por aquela conta de acesso, é revelador de capacidade contributiva? Teríamos uma CPMF informática, ainda mais distorcida do que a original. Não faz o menor sentido, ainda mais com o oferecimento de acesso ilimitado e até mesmo acesso gratuito. Se o usuário não paga pelo fluxo, mas uma taxa fixa apenas, como pensar em tributá-lo pelo fluxo? E se ele não é nem mesmo cobrado, como justificar? Não tem o menor cabimento. Seria como tributar o contribuinte por andar no shopping ou passear de carro, o simples fato de se movimentar já seria fato gerador de obrigação tributária.

            O imposto sobre correio eletrônico, pelo mesmo motivo acima exposto não tem cabimento, ele em si não se diferencia do tráfego de informações quaisquer. O e-mail é apenas um formato, um modo diferente de transmitir os mesmos dados. Se o simples tráfego não pode ser tributado, por que absurdo, o mesmo tráfego em outro formato também não pode sê-lo.

            Além de absurdo do ponto de vista tributário, politicamente o imposto seria completamente impróprio, uma vez que aumentaria os custos de acesso a um meio de comunicação que por si só já tende a excluir socialmente os menos preparados. Os menos afortunados teriam mais dificuldade ainda para utilizar o serviço, e no caso do e-mail, as pessoas tenderiam a utilizá-lo menos. A diminuição de demanda pressiona os investimentos, que também diminuem, freiando o desenvolvimento da rede. De todos os lados esses impostos levariam ao absurdo, e obviamente foram rejeitados de pronto pelos entes fiscais.

            5.2.Comércio Eletrônico: Tributar ou não tributar?

            No entanto, é importante ressaltar que o mesmo enfoque não deve ser aplicado ao comércio eletrônico, que não se confunde com Internet, e é uma atividade comercial como outra qualquer. Este deve sim ser tributado. A não tributação do comércio eletrônico é subsídio que só deve ser dado em casos especiais.

            Muito foi dito que, a exemplo dos Estados Unidos, o comércio eletrônico não deveria ser tributado. No entanto, o comércio eletrônico é tributado nos Estados Unidos como outro comércio qualquer. Após a promulgação do Internet Tax Freedom Act, uma série de erros de interpretação foi repetida pela mídia e por alguns incautos que não tomaram o cuidado de ler o Ato, cujo próprio nome pode levar ao engano. Diz ele:

            (a) MORATARIUM.–No State or political subdivision thereof shall impose any of the following taxes during the period begging on October 1, 1998, and ending 3 years after the date of the enactment of this Act–

            1.taxes on Internet access, unless such tax was generally imposed and actually enforced prior to October 1, 1998; and

            2.multiple or discriminatory taxes on electronic commerce.

            O que de fato se estabeleceu foi uma moratória isentando de impostos o acesso a Internet, que não se confunde com o comércio eletrônico como já dissemos antes, salvo aquelas que já vinham sendo aplicadas anteriormente a 1º de Outubro de 1998; e a proibição da aplicação de impostos múltiplos ou discriminatório sobre o comércio eletrônico. Não foi proibida a tributação do comércio eletrônico, tão somente a imposição de impostos ou taxas discriminatórias, específicas para o comércio eletrônico. Os antigos impostos sobre vendas e demais transações continuam valendo normalmente. E se já existia um imposto sobre o serviço de acesso à Internet, criado especificamente ou estendida a aplicação de tributo preexistente, desde que já estivesse sendo cobrado antes de 1º de Outubro de 1998, ele poderia continuar sendo cobrado.

            Outro dado que se deve lembrar, é a moratória instituída no âmbito da OMC (18). A moratória sobre transmissões eletrônicas foi instituída de maneira provisória. em Maio de 1998, até que os países tivessem condições de avaliar o que era melhor para todos. Ela abarca apenas as transmissões eletrônicas, incluindo os produtos entregues eletronicamente, excluindo os bens que pedidos pela Internet devem ser entregues pelas vias ordinárias.

            Os países desenvolvidos, e principalmente os Estados Unidos, querem que ela seja perpetuada e tornada definitiva. Em Seattle não houve um posicionamento oficial, o que se espera mantenha tal moratória. Esta é a perspectiva do governo americano (19). A pergunta é: será ela de interesse dos países em desenvolvimento? E do Brasil? Pode até não ser, mas se eles não se prepararem para responder tal pergunta, outros o farão em seu lugar.

            Não podemos esquecer jamais que o jogo do comércio internacional é um jogo para profissionais e o que está em discussão agora na OMC são as regras que regerão o comércio internacional do futuro. Abrir mão do poder de barganha agora, referendando a moratória sobre transmissões eletrônicas, pode significar a repetição dos erros do passado. Os países em desenvolvimento devem se unir para ganharem algo neste jogo internacional de toma-lá-dá-cá. Em um jogo em que tudo é meticulosamente calculado e negociado, tomar tal decisão pode ser um tiro no escuro. Principalmente no caso de países que, como o Brasil, são importadores deste tipo de produtos.

            Os governos não devem cair na armadilha de abrir mão de seus direitos sobre o comércio eletrônico internacional como vem sendo proposto pelos Estados Unidos (20) e vem sendo aceito na moratória sobre transmissões eletrônicas, mantida até hoje. O comércio eletrônico não precisa de subsídios para crescer, e não tributá-lo é subsidiá-lo. Porque um vendedor de software de prateleira deve pagar impostos de importação e o que transmite eletronicamente, com custos de envio menores, não? Não faz o menor sentido. O comércio eletrônico em si já traz vantagens competitivas mais do que suficientes para aumentar a sua adoção crescente, não precisa de incentivos artificiais que podem levar à distorções na economia.

            Feitas essas observações, é bom lembrar a questão do impacto das políticas fiscais nacionais no comércio eletrônico internacional. Enquanto a política de tributação interna aumenta a arrecadação, as implicações de tal política podem impedir ou limitar o crescimento potencial do comércio eletrônico com o exterior. Da mesma forma, a política fiscal de outros Estados pode afetar o crescimento do comércio exterior ou comprometer a possibilidade as pequenas e médias empresas competirem globalmente. Para evitar este tipo de situação, a OECD estabeleceu cinco princípios tributários básicos:

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            -.Neutralidade: bens e serviços devem ser tributados da mesma forma, independentemente do meio como eles são vendidos;

            -.Eficiência: os custos de implementação devem ser o mais baixos possível, tanto para os governos quanto para os comerciantes;

            -.Certeza e Simplicidade: comerciantes e contribuintes devem ser capazes de interpretar facilmente a implementação de suas obrigações tributárias;

            -.Proporcionalidade (Efetividade e Adequação): os tributos devem ser cobrados no ponto de venda apropriado e o potencial para a evasão e sonegação fiscal devem ser minimizados; e

            -.Flexibilidade: os sistemas tributários devem ser capazes de acompanhar o desenvolvimento tecnológico e comercial.

            5.3.Desafios Tributários no Direito Comparado

            5.3.1.O Sistema Tributário Americano e o Sales Tax

            Os Estados Unidos, em decorrência de seu modelo federativo, tem um modelo tributário altamente ligado aos estados-membros e limitados por sua soberania. Hoje, ao se comprar um livro na livraria local em Nova York o contribuinte tem que pagar imposto sobre consumo de 8,25%, mas se compra em um site fora do estado, como a Amazon, não paga nada. Essa vantagem competitiva está sendo fantástica para os varejistas eletrônicos na conquista de mercados. No entanto, se o comércio eletrônico crescer da forma como é previsto nos EUA, isto pode acarretar um rombo nas contas fiscais.

            Nos Estados Unidos, o imposto sobre vendas é cobrado no local e no estado do consumo ao invés de sê-lo feito de maneira centralizada, nacionalmente. Por motivos que explicaremos adiante, este modelo levou praticamente a uma não tributação das compras realizadas pela Internet, o que vem deixando muitos governos estaduais nervosos, a ponto de instituírem impostos sobre o acesso à Internet para compensar a perda de receitas.

            Na realidade, as compras feitas pela Internet não são isentas, como muitos passaram a crer com a promulgação do Internet Freedom Act. Como já comentamos acima, o que de fato se estabeleceu foi uma moratória isentando de tributo o acesso a Internet, salvo aquelas que já vinham sendo aplicadas anteriormente a 1º de Outubro de 1998; e a proibição da aplicação de impostos múltiplos ou discriminatórios sobre o comércio eletrônico. Não foi proibida a tributação do comércio eletrônico, tão somente a imposição de tributos discriminatórios, específicas para o comércio eletrônico. Os antigos impostos sobre vendas e demais transações continuam valendo normalmente. E se já existia um imposto sobre o serviço de acesso à Internet, criado especificamente ou estendida a aplicação de tributo preexistente, desde que já estivesse sendo cobrado antes de 1º de Outubro de 1998, ele poderia continuar sendo cobrado.

            Independentemente do Internet Freedom Act, o comércio eletrônico não é isento de impostos, o que ocorre é que na maioria dos casos, o varejista eletrônico simplesmente não tem a obrigação legal de coletar o imposto devido, graças a duas decisões da Suprema Corte Americana envolvendo questões tributárias e empresas de venda a distância por correio, no comércio interestadual. Em 1967, a Corte decidiu que os estados não podem exigir que uma empresa, fora de sua jurisdição, colete os impostos devidos sobre bens comercializados para dentro do estado, salvo nos casos em que a empresa vendedora tenha presença física ou um nexus dentro do estado. Esta decisão foi reafirmada em 1992, no conhecido caso Quill (21). Muitos advogados tributaristas acreditavam que o desenvolvimento tecnológico minaria o fundamento da decisão de 1967, que era a excessiva onerosidade para a empresa comerciante decorrente da eventual obrigação acessória de descobrir e controlar que imposto deveria o consumidor pagar.

            Legalmente, os consumidores que adquirem bens de empresas fora do estado são obrigados a pagar o imposto sobre consumo (use tax, de valor idêntico ao sales tax), o que está ocorrendo com o dito comércio eletrônico livre é uma sonegação em massa. Os varejistas exclusivamente eletrônicos, como a Amazon e o CDNow, não onerados com a obrigação tributária, uma vez que não têm um vínculo físico nos estados, também se omitem na hora de informar ao consumidor que o imposto é devido e que eles têm a obrigação legal de recolhê-lo. Muitos varejistas eletrônicos potencializaram seus benefício ao instalarem sua operação em um dos cinco estados americanos que não cobram impostos sobre as vendas, quais sejam, Alaska, Oregon, Delaware, Montana e New Hampshire.

            Esta estratégia não é livre de riscos, uma vez que, excepcionados os estados com legislação especifica sobre o assunto, como Nova York e Califórnia, é possível que as autoridades tributárias desafiem os varejistas eletrônicos com a tese de que ao utilizar-se de servidores ou estarem em contato com sites dentro do estado estaria estabelecido o vínculo de que fala a Suprema Corte, obrigando-os a coletar o imposto sobre vendas. De acordo com o jornal The Economist (22), as autoridades tributárias teriam de aguardar até o fim da moratória decretada pelo Internet Freedom Act, o que não faz o menor sentido, uma vez que os tributos sobre vendas já eram devidos, não haveria criação de novos tributos. Na nossa opinião, se aceita a tese de existência do nexus, a obrigação tributária acessória poderia ser exigida imediatamente. De qualquer forma, falta apenas mais um ano para o fim da moratória.

            Esta situação está afetando os varejistas tradicionais que não se beneficiam desta vantagem competitiva nos preços de suas mercadorias e não se arriscam a criar operações online por acreditarem que os tribunais não entenderiam as operações como distintas, de acordo com a opinião de alguns especialistas.

            Uma saída proposta por Hal Varian (23), assessor da Advisory Commission on Electronic Commerce, seria livrar-se do imposto sobre vendas e aumentar o imposto de renda ou criar um novo imposto sobre consumo baseado nos ganhos anuais menos poupança.

            Outra proposta, de autoria do Sr. McLure (24) da Hoover Institution, seria a federalização do imposto sobre consumo, unificando a alíquota e a cobrança do tributo, eliminando qualquer possível distorção ou guerra fiscal entre os estados. Ou ainda, segundo o governador do estado de Utah, bastava colocar a responsabilidade de coleta dos tributos em um terceiro não interessado, como as companhias de cartão de crédito.

            A questão é importante uma vez que 24,8% de toda a arrecadação estadual provem dos impostos sobre vendas e aproveitamento (25) e pesquisas apontam para um decréscimo nas receitas no ano de 2003. O desafio será uniformizar as soluções e, nos bens digitalizáveis, determinar o local e a identidade do consumidor para fins tributários sem violar os seus direitos a privacidade.

            5.3.2.O Sistema Tributário Europeu e o VAT

            A maioria dos países ricos adotam algum tipo de tributação sobre consumo diverso do sistema americano. Normalmente ele é nacional e centralizado. Na União Européia, os varejistas eletrônicos devem, coletar o imposto sobre valor agregado – IVA (value-added tax) sobre compras não-comerciais realizadas por indivíduos. Apesar de a alíquota do IVA variar de Estado para Estado na União Européia, o Parlamento Europeu determinou que os varejistas que realizassem transações internacionais (ou interestaduais, não decidimos ainda o que é melhor) deveriam calcular e coletar o imposto sobre as transações pela alíquota do país onde se dá o consumo.

            Na teoria, está posição deveria evitar que os varejistas eletrônicos escolhessem o Estado local de suas operações pela menor alíquota do IVA incidente sobre seus produtos e exportassem para aqueles que tivessem alíquotas maiores. No entanto, a aplicação desta política é um tanto quanto problemática, com certeza mais difícil do que esperavam os fiscais europeus. Pois, como bem expressou um fiscal da receita britânico (26), se ele visita uma empresa britânica e descobre que ela não está recolhendo o IVA sobre mercadorias que está embarcando para outros países, ele certamente dirá àquela empresa que ela deveria estar recolhendo o imposto; mas não é de sua competência coletar impostos estrangeiros devidos por empresas nacionais, nem avisar ao governo estrangeiro o não recolhimento.

            Não está claro ainda a cargo de quem ficará o dever de aplicar a política fiscal européia no tocante ao recolhimento do IVA, garantindo que as empresas recolham os impostos devidos e os entreguem aos respectivos governos. No caso de varejistas fora da União Européia o problema é ainda maior. Quando estamos trabalhando com bens tangíveis, o fiscal da aduana ainda pode, pelo menos, checar se os itens que estão entrando no país tiveram as obrigações aduaneiras cumpridas. Mas se o consumidor que comprou pela Internet descobrir que deve pagar ainda mais no momento da chegada de sua encomenda, é provável que ele fique insatisfeito o suficiente para pressionar os varejistas eletrônicos a obedecerem às normas tributárias.

            A União Européia decidiu que intangíveis entregues pela Internet deveriam ser tributados como serviço. Mas coletar impostos sobre serviços pode ser difícil e o comércio eletrônico só o tornar ainda mais problemático. Se o fornecedor se estabelece em um país que não exige imposto sobre a comercialização de produtos intangíveis e sua entrega pela Internet, é provável que o fiscal do país de destino jamais fique sabendo. Principalmente porque para serviços o sistema de cobrança é o reverse charge em que o próprio consumidor deve declarar e remeter o imposto devido.

            Muitos produtos que atualmente são comercializados de forma tangível, portanto facilmente tributáveis, podem migrar para versões eletrônicas. Música, por exemplo, já é comercializada eletronicamente, aguarda-se apenas a adesão das grandes gravadoras ao modelo. Os livros podem vir em seguida, o que não acredito muito pelo dificuldade atual de se ler nos e-books, mas isso pode mudar, é claro. A desmaterialização de certos produtos pode acelerar na mesma proporção de que novas tecnologias de banda larga são inventadas e colocadas a disposição da população. Obviamente há limites e, como já dissemos antes, o comércio internacional de bens potencialmente digitalizáveis não chega a 1% do valor agregado do comércio internacional total.

            Tributar bens digitais no local de consumo pode ser uma tarefa árdua que talvez se mostre impossível. Já coletar impostos diretamente do fornecedor parece ser mais fácil, e nos Estados Unidos, uma mudança para a política de tributação baseada na origem foi sugerida para os bens intangíveis. Obviamente, para um país que é o maior exportador do comércio eletrônico, esta é uma posição vantajosa.

            A União Européia reconheceu (27) dificuldades em implementar políticas tributárias sobre transações remotas ou eletrônicas. Para garantir a viabilidade do sistema, está se cogitando a criação de um sistema de registro para os negócios. Sob este processo de registro, que se assemelha ao que já existe no Brasil para as empresas brasileiras, companhias que conduzam um certo tipo de negócio dentro da União Européia seriam obrigadas a registrarem-se nas entidades fiscais e coletar e enviar o IVA sobre os itens comprados pela Internet e consumidos no âmbito da União Européia.

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Sobre o autor
Ivo Teixeira Gico Junior

Doutor pela USP, Mestre com honra máxima pela Columbia Law School, Coordenador do Mestrado do Instituto Brasiliense de Direito Publico – IDP e sócio fundador do escritório Dino, Siqueira & Gico Advogados. Autor do livro "Cartel – Teoria Unificada da Colusão".

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GICO JUNIOR, Ivo Teixeira. Novas formas de comércio internacional.: O comércio eletrônico. Desafios ao direito tributário e econômico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3122. Acesso em: 26 abr. 2024.

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